Amor Contratado escrita por Julia


Capítulo 11
Mudança... de vida?




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Acho que a única coisa que Kyle não esperava naquela manhã era me ver plantada em sua porta, especialmente com uma grande mala nas mãos.

—Hã, que droga você está fazendo aqui a essa hora Katherine?

Ah, isso ia ser complicado.

Tentei me concentrar e explicar a situação de forma sensata, por mais maluca que parecesse; no entanto, os cabelos revirados e despenteados de forma selvagem, sua voz rouca matinal e aquela cara de garotinho inocente perdido, fizeram com que meu cérebro virasse algo decorativo por uns segundos.

É claro, não era como se eu já não estivesse acostumada. Finnigan tinha esse poder sobre as mulheres, principalmente sobre as de mente menos pura como a minha.

 __Eu... preciso conversar com você - Agradeci mentalmente todo o meu auto controle por não gaguejar feito uma maluca e sorri sem graça.

Morar com Kyle Finnigan... cada vez mais, aquela parecia ser a decisão certa a tomar.

 E ao mesmo tempo, mil vezes a errada.

Eu não era idiota, afinal. Sabia o quão impulsivo e louco era da minha parte acreditar que ele realmente me deixaria morar ali sem favores em troca (Kyle era ingênuo, não otário), além do mais, também estava ciente do descaramento que era pedir por algo assim.

Mas confesso que eu estava um pouco desesperada. Minha família já tinha deixado bem claro sua posição sobre mim quando vim para outra cidade (nem vamos comentar o surto sobre meu cabelo, por favor) e os poucos amigos que tinha... bem, eles já possuíam seus próprios problemas.

Sendo assim, podemos dizer que a melhor - e convenhamos, a realmente melhor- opção era o grande e luxuoso apartamento do meu falso namorado.

Agora, era só convence-lo de que essa era a opção certa também.

Sim, não tinha o porquê ficar nervosa. Era apenas dizer a situação, Finnigan iria entender.

—Tudo bem - Ele deu passagem, abrindo um pouco mais a porta - Essas malas que você está carregando tem a ver com essa conversa, por acaso?

Soltei uma risada nervosa e ele me encarou desconfiado.

—Sim, tem sim. Na verdade...

Kyle ergueu um dedo, me interrompendo e esfregou os olhos parecendo cansado. Eu só não tinha certeza se era pelo fato de ter acordado agora ou porque sabia que eu iria falar alguma coisa que o deixaria estressado.

Pois é, eu tinha esse tipo de dom.

—Preciso de um café, antes de tudo. Fique... - Ele olhou outra vez para as minhas malas antes de suspirar profundamente - Fique a vontade.

 Seus pés se arrastaram até a cozinha e, não sabendo direito o que fazer, eu o segui. Me sentei na bancada enquanto via seus músculos se contraírem através da camisa enquanto se movimentava para preparar a bebida quente.

Eu poderia me acostumar com aquilo todas as manhãs. Ah, poderia mesmo.

 __Tch, e ainda fala sobre mim... acho que na verdade, é você o viciado por aqui.

Kyle soltou uma risada curta com o meu comentário. O pouco tempo em que conhecia aquele homem, nunca o tinha visto sem uma xícara de café ao lado.

—Não posso negar isso - Virou com um sorriso de canto, segurando a caneca e se encostando na bancada as suas costas - Mas em questão de prejuízos, o seu vício é bem pior.

Revirei os olhos, mas não pude contestar. Ficamos olhando um para o outro em silêncio, enquanto o homem a minha frente esperava pacientemente pela explicação que eu daria para estar em plena manhã de segunda feira na porta do seu apartamento.

Bem, eu também queria ter a resposta. Ou melhor, a coragem para isso.

[...]

—_Deixa eu ver se entendi - Ele se levantou do sofá, passando as mãos pelos fios castanhos de seu cabelo freneticamente (como se já não estivessem revirados o bastante) - Você está me dizendo que foi despejada e que não tem nenhum, nenhum outro lugar para ficar, senão aqui?

Tentei abrir a boca para retrucar, mas ele me interrompeu transtornado.

—Você quer ficar aqui. No meu apartamento. Nós dois juntos! Perdeu todo o seu pouco juízo Heed?!

Me encolhi minimamente no estofado macio. Eu não era uma pessoa medrosa, mas Kyle estava com uma aura assassina a sua volta que ficava difícil não intimidar.

—Ah Finngan, qual é! Você sabe que se eu tivesse outro lugar para ficar, eu iria! Por que diabos, eu preferiria ficar na casa de um quase desconhecido ao invés na de um amigo?

Certo, aquilo era parcialmente verdade. Se o desconhecido em questão fosse alguém do tipo de Kyle, eu não teria nenhum problema em morar com ele. Nenhum mesmo.

—E outra coisa - Continuei antes que ele abrisse a boca e argumentasse contra, como já estava começando a fazer - Nós já somos adultos Finnigan! Sabemos as regras e limites, certo? Não é como se eu fosse te atacar no meio da noite ou coisa assim.

É, tudo bem, eu não podia afirmar aquilo com toda a certeza do mundo.

Ele praticamente rosnou ao ouvir meu último protesto e tentei prender o riso fortemente ao ver seu rosto se tingir de um vermelho claro - que aliás, fazia um tempo que não aparecia. Acabei notando que, algumas semanas antes, ele estaria quase explodindo de vergonha naquele momento e ficaria mil vezes mais indignado com a proposta que eu estava fazendo.

Ah sim, as maravilhas de se ter Katherine Heed por perto...

—Essa não é a questão aqui Heed - Sua voz estava bastante estranha (um pouco mais aguda, talvez?) quando se pronunciou novamente - Isso que você propôs é simplesmente ridículo! E eu já ouvi bastante das suas propostas para saber do que estou falando!

Revirei os olhos com o chilique que ele estava fazendo. _

—Tudo bem que é bastante idiota o que eu estou te pedindo, mas não pode nem ao menos considerar?

K.F

Considerar? Considerar?!

Já estava considerando até demais aquilo tudo.

O problema era que eu estava em um estado de demência temporário - sim, tinha que ser essa a explicação - que me levava a pensamentos nada elegantes sobre a absurda proposta que Kate havia feito.

Sinceramente! Tinha contratado aquela maldita para fazer Mackenzie me esquecer e não para que me transformasse em um homem com ideias contrárias as que eu possuía desde que me conhecia por gente.

Talvez 'aterrorizante' não fosse a palavra certa para descrever o sentimento sobre a direção em que meus pensamentos iam, (oras! Até o mais ingênuo dos homens sabe que pensamentos assim podiam ocorrer de vez em quando) mas sim, era tudo novo demais para processar.

"Não é como se eu fosse te atacar no meio da noite ou coisa assim".

Não pude deixar de corar com aquilo. Kate riu, certamente pensando que eu tinha achado sua ousadia, pervertida demais para os meus "delicados ouvidos" (era como ela chamava). No entanto, minhas bochechas tinham ficado vermelhas por um motivo bem pior. E muito mais vergonhoso.

Meu rubor, na verdade, se dava ao fato de pensar que, muito provavelmente, seria eu a pessoa que a atacaria no meio da noite.

Como já tinha dito, bastante diferente do comum; porém, não a primeira vez que isso acontecia. Aquilo havia ocorrido algumas vezes em situações onde Kate se tornava uma pervertida maluca (o que vamos admitir, era quase sempre).

—Hmm, você parece meio cansado Kyle, não quer se sentar? - Ela quebrou o silêncio e contorceu as mãos, nervosa com o meu olhar penetrante.

Tudo bem, não era a minha intenção intimidar, no entanto eu não podia evitar. Aquilo era demais para mim.

—Não tente mudar de assunto Katherine - Minha voz rouca não ajudou a amenizar o clima e para a minha surpresa e choque, ela se encolheu diante do que eu tinha dito.

—Ok, eu.. foi mal.

—É sério Heed, não ten... O que você disse?

Toda a minha pose de cara autoritário se quebrou diante daquela cena. Eu nunca tinha visto Katherine nervosa antes e percebi que ela não estava fazendo aquela proposta por alguma brincadeira estúpida.

A pirralha estava realmente precisando de ajuda.

—Eu disse “foi mal” tá legal? Sei que tudo isso é loucura.

Passei as mãos pelo rosto de forma exausta, bagunçando ainda mais meus cabelos no processo. Gemi inconformado antes de abaixar os ombros, derrotado.

—Ah, eu vou me arrepender tanto disso, juro que vou.

A garota me encarou desconfiada, com uma surpresa enorme na face. Acabei me perguntando o porquê do espanto. Como se ela não soubesse que eu faria tudo o que me pedisse com aqueles malditos olhos verdes.

—O que você quer dizer com se arrepender Finnigan? Vai me deixar ficar?! - Seu sorriso se alargou ainda mais, esperando por uma afirmação.

Ugh, sinceramente, era ridículo o fato de que eu estava quase implorando para que ela ficasse se significasse parar de me olhar daquele jeito.

Soltei uma risada forçada e bebi um gole do meu café.

—Você provavelmente iria virar uma mendiga resmungona terrível. Estou pensando nisso como um favor aos outros mendigos.

Olhei sem jeito para a minha caneca. Tsc, a bebida já estava fria, que pena. Coloquei-a de lado no balcão.

Não ousei falar com a cabeça erguida essas últimas palavras temendo que o que eu visse me causasse alguma reação estranha (e que não queria sentir, obrigado).

Por esse motivo, não pude prever os finos braços me envolvendo e um corpo sendo jogado contra o meu de forma violenta. Também não consegui me preparar para o aroma de shampoo que invadiu meus sentidos, um mar rosa cobrindo meu rosto, além de uma respiração quente e ofegante no meu pescoço.

Caralho.

—Kathe...

—Obrigada, obrigada Finnigan! Você é o melhor não namorado-amigo que alguém poderia ter! Obrigada mesmo!

Ri com aquela descrição sobre nosso relacionamento e minhas mãos, que estavam estendidas sem saber o que fazer, se enroscaram em torno da cintura fina, erguendo seu corpo para cima, pois pude senti-la na ponta dos pés enquanto me abraçava.

Eu só estava sendo um cavalheiro, entenda.

Por dois segundos parei de sentir sua respiração e meu sorriso se alargou sobre o pensamento de que eu possuía algum efeito sobre ela.

Ok, minha mente estava tomando rumos inesperados (outra vez) e a vontade de provoca-la ia aumentando. Eu tinha que me afastar logo dessa garota infernal antes que algo realmente acontecesse.

Ela riu, nervosa ao notar a situação.

 __Ah, foi mal. Eu esqueci que você é todo santinho. Vou tomar cuidado para não fazer isso enquanto estiver por aqui, prometo.

Apesar de todas os protestos que minha mente fazia, pude sentir que lentamente ia perdendo a batalha e o comentário de Katerine não fez efeito algum sobre mim como ela esperava que fizesse. Pelo contrário, meus braços contornaram sua cintura ainda mais.

Infelizmente, aquilo também não me impediu e mortificado com minhas próprias ações, enterrei meu rosto em seu pescoço, soltando todo o ar em meus pulmões para depois, puxa-lo novamente e sentir um perfume delicado vindo do local.

Não parecia combinar com a garota que eu conhecia e puxei sua cintura de encontro ao meu corpo ainda mais (certo, como se não já não estivéssemos perto o suficiente) na intenção de sentir aquele cheiro entorpecente outra vez.

Pude ouvir um som engasgado dela, mas não consegui associar qualquer coisa que não fosse seu corpo pequeno colado ao meu. Eu estava louco, só podia ser isso. Todos os meus instintos alertavam que estava fazendo algo errado e mesmo assim não conseguia parar.

E não queria.

—Você tem um cheiro muito bom Heed. Parece shampoo com... morangos. Hm, bom, realmente.

Rouca não parecia estar perto de descrever minha voz naquele momento. Kate não estava se mexendo um milímetro sequer e não sabia o que pensar sobre aquilo. Ela ofegava alto e seu peito subia e descia descontroladamente.

Algo em mim despertou quando notei aquilo.

Medo. Foi o primeiro pensamento que passou pela minha cabeça. Ela devia estar com medo de mim.

Levei um susto quando percebi o estado em que me encontrava; agarrado a ela, sem dar espaço para que tentasse fugir e arqueado em direção ao seu pescoço com o rosto enterrado em seu cabelo de forma quase animalesca.

Soltei-a bruscamente, com os olhos arregalados de pânico. A rosada parecia petrificada com o ocorrido.

Eu não sabia o que pensar de seus olhos verdes brilhando de forma estranha para mim, despertando novamente aquela vontade incontrolável de abraça-la. E beija-la, também, se fosse possível.

"Ela está com medo de você Kyle. Acorde."

A verdade veio como um soco no estômago e me deixou sem ar por alguns instantes. Sim, era isso. Kate me olhava com medo e sem qualquer outro motivo além daquele. Eu não era daquele jeito até alguns dias atrás e ela provavelmente devia estar bastante assustada.

 A culpa e o horror me invadiram e virei de costas, apertando minhas mãos no mármore frio incapaz de olha-la naquele momento. Tive que tossir algumas vezes antes de falar algo.

—D-Desculpe por isso Katherine. Eu... acho melhor você ir embora agora.

Minha voz saiu muito mais rouca do que pretendia e me amaldiçoei por aquilo. Ouvi ela pirraguear alto, e pareceu bastante envergonhada quando finalmente se pronunciou.

—Sem... Sem problemas. Eu tenho mesmo que, hm... Resolver umas coisas com o meu antigo síndico.

Meu corpo ficou mais tenso do que já estava ao ouvir aquilo.

 __Você vai... Querer ficar aqui, ainda?

Por alguns segundos torturantes nada pode ser ouvido além de nossas respirações.

—Ora, mas é claro que eu ainda vou querer ficar aqui Kyle! Você acha que eu tenho outro lugar para onde ir? - Heed pareceu indignada com a pergunta.

Mesmo assim, senti sua confiança tremer e aquela falsa atitude indiferente quase me fez sorrir outra vez. Quase.

Ela deve ter percebido minhas costas relaxarem um pouco, pois continuou o pequeno monólogo com mais entonação.

—Então, estamos combinados. Eu volto a noite, provavelmente - Sua voz soava mais ela mesma e gostei daquilo - Não faça nada estranho enquanto eu estiver fora hein Finnigan.

Me virei lentamente, meu rosto emburrado e minhas bochechas levemente quentes. Ela riu divertida pela situação.

—Pelo visto você entendeu - Andou até sua bolsa e foi em direção a porta - Até depois, namorado.

Deu uma piscadinha sacana, indo embora cantarolando uma música qualquer. E naquele momento, mais do que tudo, eu quis matá-la.

Aquilo ia ser bastante complicado.

K.H

Quando a porta fechou atrás de mim, minhas pernas tremeram e por pouco não cai sentada no chão gelado do corredor.

Tudo o que tinha acontecido a instantes atrás passou como um filme em minha mente e ofeguei com a lembrança daqueles braços fortes me envolvendo e sua respiração pesada batendo em meu rosto. Era a terceira vez que Kyle agia como... alguém que eu não conseguia prever.

Ao que tudo indicava, Finnigan estava adquirindo uma personalidade própria que “misturava” aquelas que eu já conhecia e que tentava reconhecer cada vez que ficava perto dele. Para o meu azar (ou não), o perfil másculo, desejável e confiante que tanto temia parecia se sobressair nessa mudança maluca e não sabia o que pensar sobre os acontecimentos futuros que poderiam vir.

Suspirei pesadamente. Justo quando eu tinha decidido me mudar.

—Tudo bem Kate. Não é como se você fosse uma garotinha com seu primeiro namorado. Ele não é alguém assustador – Tentei convencer a mim mesma, passando nervosamente a mão em meus cabelos e andando um tanto tremula em direção ao elevador – Na verdade, você já teve namorados piores.

Um pequeno flashback dos meus relacionamentos fracassados e perigosos passou pela minha mente e quase ri de alivio. O sentimento de confusão deu lugar a confiança de sempre e consegui me recompor, enquanto me olhava no espelho do cubículo de metal com as portas se fechando atrás de mim.

—Não acredito que fiquei em pânico por algo assim – Balancei a cabeça repreendendo minha própria idiotice, agora bem mais recuperada.

Bem, não podia me culpar totalmente, afinal. Kyle era sempre tão santinho, seguidor de regras e intocável que fiquei em choque com todos aqueles episódios de autoconfiança e agarrações. O fato do homem ser maravilhosamente em forma contribuiu bastante para me deixar atordoada e me fazer voltar para o tempo em que ainda não sabia como namorar funcionava.

Meus olhos fitaram o próprio reflexo e um sorrisinho brotou no canto dos lábios. Eu não era alguém tão maliciosa como fazia muitos pensarem, mas não podia negar minha mente de imaginar certas e invitáveis situações que poderiam acontecer ao dividir um apartamento com aquele deus grego.

Não seria minha culpa se por acaso a porta do banheiro não estivesse trancada durante o banho de Finnigan ou se eu tivesse medo de fantasmas durante a noite e não pudesse dormir sozinha não é?

—Do jeito que as coisas estão, talvez nem tenha a coragem para fazer todas essas coisas – Falei enquanto atravessava o térreo (muito maior e bem cuidado que aquela espelunca que eu chamava de ex-lar) a passos largos.

Uma coisa era provocar meu falso namorado ingênuo e tímido. Outra bem diferente era provocar aquele novo e sedutor Kyle Finnigan, que poderia muito bem revidar minhas investidas apenas pela diversão de me fazer corar e gaguejar, algo que eu havia experienciado – felizmente- muito pouco, mas já odiava imensamente.

Sem contar a possibilidade de consequências muito mais arrasadoras do que ficar vermelha, como, talvez, por algum acaso, me apaixonar.

Senti meu corpo tremer involuntariamente com a ideia. Muito mais arrasador, com certeza.

[...]

—Você vai fazer o que?!

Afastei o celular do ouvido, temendo que aquele zumbido agudo que escutava agora fosse permanente.

—Não precisa gritar Judy, eu consigo ouvir muito bem.

—Você ficou maluca? Não pode fazer isso!

—Por que não? Somos namorados, pelo amor de deus!

A garota ficou em silencio por um momento, tentando encontrar algo para retrucar enquanto eu revirava os olhos com vontade.

A alguns minutos atrás, havia ligado para a ruiva comunicando que tinha encontrado uma casa provisória já que minha amiga estava se sentindo a pessoa mais culpada do universo por não poder me abrigar (mesmo eu tendo dito que estava tudo bem).

No entanto, ela começou a surtar assim que falei que iria ficar no apartamento de Kyle – meu namorado para todos os efeitos. Ainda não entendia o porquê daquilo e ao que tudo indicava, não receberia uma explicação controlada e séria pois ela começou a gritar do outro lado da linha outra vez.

—Mesmo assim! É errado você pedir para ficar na casa dele, isso não se faz Kate!

—E o que você queria que eu fizesse? – Falei calmamente, enquanto colocava alguns DVD’s antigos que eu secretamente adorava, em uma das milhares caixas espalhadas pelo apartamento.

Ela soltou alguns sons irritados, mas eu sabia que tinha ganho aquela discussão sem sentido.

Mesmo que minha amiga estivesse certa em alguns aspectos, como o fato de ser um tanto errado da minha parte pedir por algo assim, ao mesmo tempo era reconfortante saber que tinha algum lugar para onde eu pudesse ir. A pequena culpa que sentia cada vez que pensava sobre o assunto não me impedia de continuar –e não sabia se aquilo era algo bom ou ruim.

—Vai mesmo continuar com isso, então?

—Vou sim. E nem sei porque está tentando me impedir, já que sabe que eu raramente mudo de ideia quando quero alguma coisa; nesse caso é uma moradia em jogo, logo era de se esperar que eu nunca desistiria.

A outra soltou um suspiro pesado.

—É, eu sei disso, mas não custava tentar colocar um pouco de juízo na sua cabeça.

—Isso eu já não tenho faz muito tempo Judy – Disse como se fosse uma coisa óbvia demais para se discutir e ela riu com vontade.

—Sim, você tem razão nisso também. Parece que esse seu namorado está te deixando mais inteligente e sensata Katherine Heed.

—Ah, vai à merda sua idiota.

As gargalhadas em meu ouvido se tornaram mais escandalosas e tentei não revirar os olhos outra vez (tinha visto em algum programa que aquilo fazia mal, sei lá, era melhor não arriscar). Ela continuou, provavelmente enxugando as lágrimas de crocodilo.

—Will está concordando plenamente comigo aqui.

Aquilo despertou minha atenção.

Pouquíssimas pessoas tinham ido ao apartamento da ruiva e isso era tanto pelos problemas familiares dela em que ninguém queria se meter, como pelo fato de que –nas próprias palavras do loiro – era perigoso ficar em um mesmo lugar sozinho com aquela maluca.

Bem, Will Knight já tinha sido o que podíamos chamar de “garanhão” em seu passado sombrio então não fiquei muito surpresa com a declaração na época.

—Will está ai? – Minha voz saiu engasgada pelo choque e ouvi ruídos altos de algo sendo revirado.

—Está. Ele tinha me ligado perguntando o porquê de não ter aparecido para a nossa sessão de cinema na casa dele e respondi que estava ajudando os empregados com os preparativos para a festa da companhia da minha mãe aqui em casa.

Ah, eu com certeza guardaria a informação de que o senhor Will eu sou fodão Knight estava todo ansioso por uma simples sessão de cinema com uma garota. O idiota pensaria duas vezes ao tentar zoar com a minha cara em algum futuro próximo.

Saber também que a Winston estava ajudando os empregados a enfeitarem a mansão que ela chamava de casa para alguma festa estúpida da empresa milionária de sua mãe não me surpreendeu como deveria. A garota era a pessoa mais doce que eu conhecia e tentava de todas as maneiras ganhar algum tipo de elogio daquela velhaca que tinha como parente.

Um dos grandes motivos para não me hospedar em um dos gazilhões de quartos da sua residência era o de que sua mãe não ia muito com a minha cara.

Ah, ok, ela não ia nada com a minha cara.

Xinga-la de bruxa caquética e sem coração na frente de um bando de acionistas importantes para um contrato internacional talvez tenha sido o ponto chave da história, mas havia mais alguns conteúdos que eu não precisava mencionar. Apenas vamos ficar com a informação de que até um cachorro sarnento era mais bem vindo naquele lugar do que minha ilustre pessoa.

—Me deixe adivinhar – Comentei irônica – Logo após a declaração de bondade que você fez ao telefone, ele apertou a campainha da sua porta dois segundos depois oferecendo ajuda.

Ouvi um resmungo alto e no minuto seguinte eu era insultada com os palavrões mais baixos que poderiam sair da boca de alguém tão musculoso.

—Ah, isso estava no viva voz então. Foi mal Will querido, por descobrir o cara espirituoso e solidário que você é. Não sabia desse seu lado.

—Eu te odeio demais Katherine Heed.

Não ouvi quase nada depois disso porque fiquei ocupada demais rindo de sua cara, imaginando que ele estaria trincando os dentes e as orelhas avermelhando por Judy estar ouvindo toda aquela conversa.

—Kate, porque você está sendo tão sarcástica? Will realmente está me ajudando muito, ele tem sido um ótimo amigo para mim aqui. Pare de destilar esse veneno.

Ouvi outro resmungo, bem mais contido e decepcionado enquanto minhas risadas se intensificavam. Meu amigo não tinha nenhuma sorte no amor mesmo.

—Ok, ok, vou parar – Soltei outra risada – Tenho mesmo que desligar de qualquer maneira, pois vou sair do apartamento antes que o velho me despeje de um modo menos gentil do que seu habitual.

—Ah, é verdade. Eu quase tinha me esquecido da sua ideia maluca de morar com o coitado do Kyle.

—Eu já disse, não é uma ideia malu... Espera ai. Coitado? O que você está insinuando?

—Obviamente que vai deixar o homem doido. Tem que ser um santo para aguentar por tanto tempo você e essas suas crises de humor.

—Estou me sentindo mortalmente traída nesse momento. Will seu idiota, fale alguma coisa.

—Eu não posso concordar mais com a Judy. Esse cara realmente deveria receber algum prêmio.

Pisquei algumas vezes e olhei para o celular por um momento antes de voltar a encosta-lo no ouvido.

—A partir de hoje, vocês estão oficialmente fora do meu círculo de amizades.

—Nós somos o seu único círculo de amizade Kate – Pude ouvir o loiro entortado a cabeça de modo irônico para a ruiva, enquanto continuava – Acho que isso comprova bastante nossa teoria do quão insuportável você é.

—Não acredito que convivi durante anos em um antro de cobras.

—Pare de ser dramática Heed. Tenho muita coisa para fazer e sei que você não fez nada desde que começamos essa conversa. Vou desligar, beijinhos.

Por incrível que possa parecer aquela frase maquiavélica e sem amor tinha sido dita por Judy, que logo depois desligou mesmo o celular e apenas o som da chamada encerada ecoou em meus ouvidos.

Suspirei e sorri. Eles eram realmente meus amigos idiotas.

[...]

—Não vou sentir sua falta. Mas obrigado por contribuir com as despesas.

Soltei um riso anasalado e meu rosto ficou sarcástico, como sempre acontecia quando eu e Cal Hermman (o pior sindico já existente no planeta Terra) começávamos a “conversar”.

—Também não vou sentir sua falta Cal. Mas obrigada por... É, por nada na verdade porque você sempre foi um pé no saco.

Ele soltou um grunhido meio animal que os velhos rabugentos normalmente faziam e deu um sorriso enviesado.

—Não vou ajudar com a mudança.

—Nunca esperei que ajudasse, sério. Estou até emocionada que você se deu o trabalho de erguer os olhos daquele jornal ridículo e vir aqui falar comigo.

Outro grunhido, menos paciente dessa vez.

—Espero que não precise te ver outra vez, sua pichadora de meia tigela.

—O sentimento é recíproco.

Nós dois sorrimos de um jeito estranho e olhei para o prédio velho e desgastado no qual eu passara cinco anos da minha vida.

—Não acredito que eu vá sentir falta desse lugar, mas tenho que admitir que ele fez parte de quem eu sou hoje.

—Não ofenda meu prédio. Ele não teve nada a ver com essa sua personalidade inútil.

O encarei carrancuda e me contive para não falar um palavrão. O homem realmente sempre conseguia me provocar. Talvez, mas só talvez mesmo, eu iria sentir falta daquilo.

Rumei até o caminhão de mudança parado ao meu lado e abri a porta do passageiro, sentindo meu coração bater feito louco por um motivo desconhecido (ou pelo menos era o que eu tentava dizer a mim mesma).

—Tente mudar um pouco de vida Heed – Cal disse me olhando de cima por conta da janela ser alta demais.

Ao invés de retruca-lo ironicamente como uma cartada final e de despedida, pensei no destino que estava indo. Eu rumava até o apartamento de Kyle, para conviver com aquele homem que me fazia perder todas as convicções que conhecia e que aparentemente estava mudado o suficiente para o papel de falso namorado se tornar algo perigosamente atraente.

—Acho que já estou fazendo isso.


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