A rainha encarava o sofá vermelho friamente. Seus olhos verdes brilhavam a luz do sol que escapava pelo canto da janela. Seus dedos batiam num ritmo regular na ponta da poltrona. Cinderela finalmente entrou no quarto de sua majestade com cuidado.

–Cinderela. –ela disse com um riso simples no canto da boca. –Sente-se.

–Sim, majestade.

–Sabe o porquê de eu lhe chamar aqui?

–Não majestade.

Cinderela se sentou no sofá vermelho e sem graça, olhou para nos olhos da rainha, que ainda não a encarava.

–O Príncipe Encantado é filho de um rei, ele é o único filho desse rei. Logo, ele será um rei também. A pedido do seu pai, que sempre afirmou que queria seu filho reinando apenas aos vinte anos, estamos esperando. Mas, se ele se casar antes disso ele pode assumir o trono. E eu acho que mesmo tendo só dezoito anos ele pode assumir, por isso, ele precisa de uma mulher. E, ele pretendia se casar com a minha filha, mas ela já não o ama mais, e mesmo querendo se casar com ela, eu vejo a forma que ele te olha, Cinderela. Quero que os dois fiquem juntos. Por isso, organizarei um baile daqui a três semanas, e chamarei todas as moças solteiras do reino. E você irá, e o conquistará.

–Eu não sei como te agradecer, majestade! –ela falou sorridente.

–Você tem um traje para a ocasião?

–Não majestade.

–Então eu lhe arranjarei um. E tudo o que você precisar, querida.

–Obrigada, majestade! Você é uma fada pra mim.

–Pode voltar a suas tarefas agora.

–Sim, majestade.

Cinderela saiu pulando pelo castelo, enquanto Anastácia, sem entender nada entrou no quarto.

–Eu não abrirei mão dele, não é mãe? –ela falou brava.

–Claro que não. E da próxima vez que eu te pegar ouvindo atrás da porta eu farei com que a Cinderela realmente se case com o príncipe, e não você. Entendeu?

–Sim, mamãe. –disse Anastácia saindo do quarto.

–Mais uma coisa, filha. Mande anunciar a todas da cidade sobre o baile, mas antes diga que não quer nada com o príncipe, mas que sua bondosa mãe já deu um jeito de não deixá-lo solitário. Cinderela jamais se esquecerá desta lição.

–Mas eu vou abandoná-lo para a Cinderela conquistá-lo? E depois voltar? Ele não vai querer.

–Vai sim, filha. Mas não se preocupe com isso. Eu vou dar um jeitinho.

...

Uma semana depois, no reino Oeste, onde governava Grimhilde, a rainha penteava seus lindos fios dourados que iam até a cintura. Seus olhos verdes, corpo magro e bonito faziam dela, certamente a rainha mais bonita de todos os reinos. Mas aquela beleza não enganava a todos. Os que não a conheciam, achavam ela apenas uma moça bonita, os que a conheciam achavam uma moça bonita e malvada, e aqueles que realmente a conheciam, sabiam o motivo desse coração negro. Mas acontece, que das pessoas que a conheciam, poucas estavam vivas, nem mesmo seus filhos sabiam sua verdadeira história, mas esses também não vinham sua mãe como uma bruxa. Ela tinha dois filhos: Eric, o mais velho de dezesseis, de cabelo castanho claro, uma mistura do cabelo de seus pais, e olhos verdes como os da mãe, e Frederick de quinze, um ano mais novo, de olhos verdes e cabelo loiro brilhante como a mãe. O rei do Oeste tinha sido morto quando as crianças eram pequenas pelo rei do Norte quando estava bêbado durante um jantar. E como já havia dito, o rei era incontrolável quando bêbado.

Apesar de historicamente o reino do Oeste servir ao do Norte, depois do assassinato há dez anos atrás, ocorreu uma grande rebelião e agora eram dois reinos distintos.

Existia um grande mistério envolvendo a rainha e um bebê, que hoje completava dezoito anos que veio junto com ela assim que a rainha se mudou para o castelo. Alguns, afirmam ser uma filha bastarda, outros não. Seu nome era Branca de Neve, e ela foi criada como uma empregada, assim como Cinderela. A rainha já tentara diversas vezes matá-la, ou se aproveitar dela fazendo ela se casar com algum nobre, mas nada dava certo. Branca sempre manteve uma relação saudável com os príncipes do Oeste, tratando Eric como um irmão, e dando um carinho especial a Frederick.

A rainha foi até o espelho em frente a sua cama e viu seu reflexo. Estava mais bonita do que nunca. Ninguém conseguiria afirmar a sua idade. Seus olhos estavam compenetrados no reflexo. Ela falou com sutileza no cômodo vazio:

–Espelho, espelho meu. Tem alguém neste reino mais bela do que eu?

A imagem ficou embaçada e uma imagem próxima de um rosto apareceu.

–Não, majestade.

Ela sorriu friamente, e se virou voltando para a cama.

–A não ser... –continuou o espelho. A raiva tomou o rosto da rainha. –A não ser a Branca de Neve.

–O que? Como? –ela perguntou nervosa olhando para o espelho. –Sempre fui a mais bela!

–Branca de Neve está numa fase diferente. Os olhos castanhos mais brilhantes do que nunca, e agora, quando lhe olham, já veem logo o porque de seu nome. Lábios vermelhos como sangue, cabelo negro como ébano e pele branca como a neve.

–Eu não acredito! Deveria tê-la deixado morrer quando tive a chance. –disse a loira brava. –Preciso mandar essa menina mais que nunca para outro reino.

–Mas todos os nobres já se casaram ou estão prometidos a alguém, majestade.

–Que se case com um pobre! Não vou lucrar, mas pelo menos me livro dessa menina.

–Acontece, minha rainha, que Branca de Neve está apaixonada por um rapaz neste mesmo reino, e a senhora não gostaria de saber quem é.

–Me diga logo, espelho! –ela falou brava.

–O príncipe Frederick, minha rainha.

Ela jogou um vaso em cima de sua escrivaninha no chão de raiva.

–Eu não posso aprovar isso.

–Majestade, posso lhe dar um conselho?

–Diga.

–Pense bem naquela proposta que lhe fiz ontem.

–Mas eu não quero a Branca de Neve casada com o príncipe do Norte. Se ela for, terei de ir também e não quero rever minha irmã, você sabe disso.

–Mas se ela se casar, a senhora se livrará da princesa, ganhará muito dinheiro, e como é o Norte que controla todos os reinos, poderá manipular o trono através dela.

–Então, de acordo com a sua proposta devo enviar a Branca de Neve para o tal baile que está sendo organizado para encontrar uma nova rainha e fazê-la conquistar o príncipe?

–Exato.

–Mas não posso me encontrar com a rainha! -Mande a menina para passar um tempo com os pobres, até porque o baile é só para os moradores do Norte, e não de outros reinos.

–E ela finge morar lá. Perfeito. –disse a rainha contente. –O que eu não entendo, é o porque da minha irmã organizar esse baile todo. Eu ouvi dizer que o príncipe estava praticamente noivo da Anastácia.

–Minhas fontes me asseguram que aquilo não era amor verdadeiro. Vai ver ele gostava de outra, e isso tudo foi um plano para impedi-lo de se apaixonar completamente por essa menina.

–Não entendi.

–Minhas fontes dizem que existe uma menina de quem o príncipe realmente gosta, uma criada. E como você e sua irmã sabem, o amor verdadeiro é a magia mais poderosa. Esse amor entre os dois ainda está começando, e se a rainha não fizer nada, o amor ficará mais forte, e será imbatível.

–Mas era só o príncipe se casar com a Anastácia.

–Não sei se seria o bastante, até porque, um baile com moças de todas as classes sociais dando em cima de seu amor verdadeiro não é muito agradável.

–Bom, o importante é que a Branca de Neve suma.