A Herdeira (Livro 1 - Saga A Herdeira) escrita por Katerine Grinaldi


Capítulo 2
Capítulo 1




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Capítulo 1

A campainha tocava ininterruptamente e, meu sono acabou perdendo a disputa. Será que mamãe não tinha ouvido?! Joguei os lençóis para o lado e quando cheguei ao corredor pude ver vovó entrando na sala. Estava muito tarde para ela estar passeando pelas ruas e, calculei que alguma coisa estava errada. Comecei a descer os degraus, mas parei quando vi que mamãe não parecia feliz com a visita.

— Você tem que contar, filha. Prometa isso para mim. – vovó suplicava.

— Não mamãe! É perigoso demais. Quero dar a ela uma chance de fugir disso.

— Você sabe que não há chance, Vânia.

— Não mamãe. Você não deveria estar cobrando isso. Minha filha não será mais uma vítima. Desista disso. – minha mãe tentou ser firme em suas palavras apesar de serem perceptíveis as falhas em sua voz causadas pela tristeza em negar algo à vovó.

Escutei uns passos e eles ficavam cada vez mais próximos de onde eu estava. Caminhei sorrateiramente de volta ao quarto e me escondi debaixo dos lençóis fingindo estar dormindo. Não queria que elas soubessem que eu tinha espionado a conversa.

Alguém abriu a porta e passeou pelo quarto antes de agachar ao lado da minha cama. “Adeus, Kate”, vovó disse após me dar um doce beijo na testa. Estava muito difícil não demonstrar que eu estava acordadíssima, ainda mais porque, logo em seguida, ela empurrou algo para baixo do meu travesseiro. Virei para o lado oposto escondendo meu rosto. Ela não demorou muito a sair do quarto e, fiquei livre para descobrir qual era o presente que me deixara. Um envelope amarelo?! Retirei o pequeno “J” (em referência ao seu nome: Júlia) que o lacrava e puxei o papel pardo.

Sua herança

Vai chegar.

Aceite a mudança

Quando 21 primaveras completar.

S.D.

Repentinamente surgiu uma chama na ponta inferior do papel que foi o consumindo rapidamente. Só tive tempo para jogá-lo longe. O envelope também começou a queimar sobre os lençóis e em segundos as chamas se alastravam pelas roupas de cama. Droga!

Que coisa mais inexplicável! De onde tinha surgido aquele fogo e como ele estava aumentando tão apressadamente? Corri até o banheiro com a intenção de encher uma vasilha com água, mas...

O que as minhas irmãs faziam deitadas ali? Tinha alguma coisa muito errada porque nós não dividíamos o quarto há mais de dez anos. De qualquer maneira, eu tinha que acordá-las. Aproximei minha mão para sacudi-las, porém meu corpo atravessou o delas e os transformou em fumaças brancas.

Corri para o banheiro, onde eu pretendia ir antes da distração, e retornei com um pote cheio de água. Só que o fogo já tinha alcançado o tapete e as cortinas. Queima de arquivo?!

Se fosse isso, estava sendo bem eficiente porque queria queimar quem o lera também. Era mais fácil fugir com a minha mãe e deixar tudo para trás. Girei na direção da porta.

Sério! Acho que toda aquela fumaça tinha intoxicado meu cérebro e não estava raciocinando mais porque aquilo que eu via não podia estar acontecendo, na verdade, aquilo que não estava vendo.

ONDE ESTAVA A PORTA DO MEU QUARTO?!

Não havia mais nenhuma saída do meu quarto. No lugar onde deveria estar a porta só havia parede. Comecei a bater minhas mãos contra o concreto tentando encontrar uma brecha ou fazer com que minha mãe me ouvisse. Por que isso estava acontecendo? Vovó jamais faria isso comigo!

Continuei batendo com todas as forças que tinha e perdi a noção do tempo. Não sabia mais se tinha poucos minutos ou se já havia passado uma eternidade. A única coisa que eu sabia é que o fogo aumentava cada vez mais e já havia tomado parte do quarto. Sabia também que meu pulmão já estava bastante irritado por causa da fumaça e sentia dificuldade para respirar por causa da queimação. Sentei de frente para o lugar onde a porta deveria estar e continuei batendo um pouco mais fraco.

Foi então que repentinamente me senti sendo puxada para cima, pela cintura. Rapidamente a pessoa me colocou em seus braços e eu podia sentir a firmeza que aquele corpo tinha ao me segurar. Podia sentir, também, seus movimentos respiratórios e eles estavam bem agitados, assim como a sua respiração que era quente. Olhei para cima na tentativa de reconhecer quem era porque a única coisa que tinha certeza era de ser um homem. Lamentei o fato de estar tão escuro porque só consegui observar bem seus olhos azuis. Ou talvez só tivesse conseguido prestar atenção neles porque era algo muito diferente do que já tinha visto. Tão azuis como cristais ou como bolas de gude, aquelas mais claras e que são especiais e raras. E mais. Era como se fossem uma janela para a sua alma.

Percebi que ele caminhara e acompanhei seus passos com o olhar para saber aonde iríamos ou como ele encontrara uma saída. Melhor... Como ele tinha chegado até mim? O rapaz seguia na direção de onde deveria estar a porta e, ela ESTAVA lá. Tive vontade de pular de seus braços e apalpá-la para ter certeza de que era verdade, mas estava tão fraca...

Ele abriu a porta e me colocou sentada sobre o corredor, do lado de fora. Olhei esperando que ele viesse também, mas não. Ele voltara para o quarto.

Agachei-me e me preparava para levantar meu corpo quando o fogo o consumiu.

“Não!” “Não!”

Não conseguia parar de gritar e, como se algo quisesse me calar, a porta fechou violentamente, me impedindo de ver qualquer coisa que estivesse acontecendo com ele. Por que me salvou e por que precisava morrer?

Arrastei meus joelhos até a porta e bati algumas vezes. Dessa vez eu não queria pedir ajuda, não queria chamar a atenção, queria apenas descontar em algo os meus sentimentos.

O fogo estava se aproximando da porta. Eu sabia disso porque a temperatura ali estava aumentando bastante e meus olhos começaram a lacrimejar por causa da ardência. Parecia haver um bolo quente na minha garganta que me fazia desistir de respirar fundo. Apenas sugava um pouco de ar e tossia frequentemente tentando expelir aquilo. Minhas pernas estavam muito doídas e eu não tinha forças para sair da casa. Na verdade, eu não tinha vontade. Não sabia exatamente o porquê eu não conseguia abandonar aquele cara que me salvara. Ele já estava morto, não é? Não havia qualquer chance de sobrevivência.

Encostei minhas costas na parede ao lado da porta e fechei meus olhos. Estava muito cansada. Queria dormir. Mas senti meu corpo sendo sacudido e ouvi meu nome. Não podia ser minha mãe porque eu tinha rastejado até a porta do seu quarto e ele estava vazio. Quem era a mulher que me chamava?

“Kateeee!” “Abra os olhos!” “Agora!”.

“Agooooraaa!”

Abri os olhos e puxei meu corpo na direção da parede fugindo de quem me acordara. Puxei o ar profundamente porque era como se eu realmente não estivesse fazendo isso há alguns minutos. Ai! Que alívio! Não havia nenhum bolo fervendo na minha garganta. Continuando a conferir se tinha sido apenas um sonho, quer dizer... pesadelo, passei as mãos pelo corpo e foi então que senti.

A cada toque conseguia sentir a diferença para os toques do cara consumido pelo fogo. Era como se ele tivesse acabado de se afastar de mim e como se ainda pudesse sentir sua mão em meu braço esquerdo e mesmo sem saber nada sobre ele além dos olhos tão azuis, meu coração estava acelerado. Estava tão distraída pensando sobre tudo isso que Lola, minha melhor amiga, foi obrigada a passar a mão na frente do meu rosto. Acho que ela queria ter certeza de que não estava dormindo com os olhos abertos.

Ela e Jane estavam ajoelhadas sobre o colchão e olhavam-me preocupadamente. Normal. Quem não ficaria preocupada se uma pessoa começasse a berrar dormindo?! Acho que, no mínimo, assustado, né? E era isso que eu vinha fazendo desde os últimos cinco meses, mais precisamente uma semana após meu aniversário de vinte e um anos. Os pesadelos só vinham piorando.

— Gritei muito? – perguntei tentando demonstrar meu mal-estar com a situação. Nem sei como elas ainda são minhas amigas.

— Você não gritou. – Jane começou.

— Você começou a tossir. Muito. E falava “não” com dificuldade, como se estivesse engasgando. – Lola completou.

— Acho que a Lo gritou mais que você em todos os pesadelos. – Jane debochou.

— Desculpa.

Isso não era suficiente, mas era o que eu podia fazer para diminuir a minha culpa por acordá-las mais cedo do que o necessário. Ainda eram seis horas da manhã e, eu e Jane ainda teríamos, pelo menos, trinta minutos antes do despertador tocar. Para Lola tinha sido pior. Tinha acabado de conseguir uma bolsa para ela, no curso de Dança e, para os calouros as aulas só começariam depois do feriado. Esgueirei entre as duas e saí da cama.

— Kate. – Lola estava me chamando atenção. Elas sabiam que eu ficava péssima quando tinha esses sonhos e que me sentia a pior amiga do mundo. — Qual foi o sonho dessa vez?- ela enrolou seus longos e ondulados cabelos dourados no alto da cabeça e esfregou os olhos tentando demonstrar que estava disposta a me ouvir desabafar sobre os problemas noturnos.

— Não. Agora não. – peguei uma roupa no armário. — Mais tarde eu conto. Depois do ensaio. Prometo. – se eu não prometesse, ela não me deixaria tomar banho e não dormiria.

— Vou fazer uns alongamentos na sala. – Jane pulou da cama. — Não demora muito no banho.

Caramba! Esse tinha sido, com certeza, o pior pesadelo nesses últimos cinco meses. O tema era sempre o mesmo: o último dia antes de a vovó morrer em um acidente de carro. Primeiro tinha sido apenas a discussão. Depois eu via que ela deixava algo embaixo do meu travesseiro, mas sempre acordava antes de abri-lo e, nessa noite, eu tinha conseguido ler. O problema é que tinha sido muito real. Mais real do que eu poderia imaginar se não tivesse acontecido comigo.

O estranho é que mamãe já tinha afirmado que minha avó não esteve em nossa casa antes do acidente. E que nem tinha existido qualquer discussão entre elas. Mas o meu subconsciente teria inventado aquele texto todo elaborado? E esse pesadelo não podia se repetir tantas vezes apenas porque eu não consegui me despedir dela (explicação elaborada pela mamãe). Também não tinha me despedido do meu pai e nem por isso ficava sonhando coisas esquisitas com ele.

Peguei meu celular e anotei o que eu me lembrava do texto. Uma herança após vinte e uma primaveras. Tinha mais coisa e era bem mais bonitinho do que isso. Ah! Tinha uma estrela também e uma assinatura. S.D.

Por que vovó deixaria um recado assinado por outra pessoa em um dos seus envelopes colecionáveis e com o seu lacre personalizado?

Tinha a impressão de que aquilo era um recado para mim. Sei lá. Talvez vovó tivesse encontrado uma forma de se comunicar comigo e quisesse que eu interpretasse aqueles sonhos de alguma maneira. Sempre fomos tão próximas. Eu passava praticamente o dia inteiro com ela aprendendo sobre plantas com propriedades mágicas e vendo seus desenhos de joias. Só podia pensar que era uma forma dela me proteger, mesmo estando em outra dimensão.


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