My Favorite Darkness escrita por Duds Marcato


Capítulo 7
A pousada de Cleveland


Notas iniciais do capítulo

Hey! Enfim, eis um capítulo curto e emo pra vocês.



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POV: Violet

Chegamos em Cleveland às 21:00(nunca vi tanto trânsito na minha vida) em meio à uma tempestade de neve. Eu não conseguia ver um palmo à frente da minha mão, e a única coisa que eu queria era sentar perto de uma lareira tomando chocolate quente. Eu não via a hora de entrar na pousada. Até eu ver o lugar.

Era uma mansão que em 1895 a.C. devia ter sido linda. Havia um jardim enorme com uma fonte de pedra no centro, que outrora devia ter atraído visitantes para tirarem fotos, mas agora só dava medo, pois os arbustos estavam malcuidados e cobertos de neve, as árvores eram só galhos em ângulos tortuosos, a fonte estava quebrada com a água congelada, e o anjo que ficava no meio da fonte estava sem a cabeça. Mas o jardim era melhor que o lugar em si.

A mansão estava parecendo uma ruína de algo que há muito tempo foi belo. Havia musgo na base das paredes, a pintura estava descascada e janelas enormes com alguns vidros faltando. Em cima da entrada principal, pendia uma plaquinha torta com letras descascadas em que dizia a lit l p ece of he ven. Típico cenário de filme de terror. E eu já havia estado lá.

Atravessamos o jardim e entramos no saguão. Era iluminado apenas por um único candelabro de velas, de modo que o lugar estava a meia luz, deixando-o ainda mais sinistro. Um tapete que uma vez foi vermelho ligava a porta à recepção, onde uma senhora entre 50 e 60 anos, olhava para a gente com desconfiança. Afinal, só um tipo de pessoa vai àquele tipo de lugar, e seria deplorável se pessoas da nossa idade fôssemos esse tipo de pessoa.

Andamos até o balcão e a senhora parecia cada vez mais intrigada com o porquê de estarmos ali. E sem que eu me desse conta, eu já estava odiando ela, simplesmente pelo fato de ela trabalhar naquele lugar, simplesmente por ignorar o que ela estava fazendo. Eu odiava cada centímetro daquela mansão, e também odiava cada pedacinho da senhora que estava sentada atrás do balcão.

–Posso ajudar?- perguntou timidamente, depois de olhar uns três segundos para nossa cara.

–Hã, sim. -disse Nico, provavelmente estranhando o comportamento da mulher- Nós meio que temos uma reserva aqui... Somos amigos de Quíron.

Uma expressão de alívio se espalhou pelo rosto da atendente, e ela nos disse para segui-la. Andamos até uma salinha onde se sentava em uma cadeira de rodas um homem com mais ou menos a idade da senhora em frente à TV. Pelo pouco que sei sobre centauros, aquele devia ser o amigo de Quíron.

–Vocês são os garotos que estão em missão?- Disse o homem, virando a cadeira de rodas em nossa direção. Ele devia ser o dono do local, o dono que provavelmente ignorava os gritos suplicantes por ajuda de uma inocente criança.

–Sim, somos nós.- Sophie respondeu- O senhor podia nos oferecer estadia? É só por uma noite...

–Se eu não pudesse vocês não estariam aqui certo?-Eu estava com mais raiva a cada palavra daquele cara.

–Sim... -Sophie disse, timidamente.

–Essas crianças de hoje em dia não tem educação? Quando se fala com os mais velhos você deve os tratar por senhor. Agora repita comigo: sim senhor.

–Sim senhor.-A garota deu um olhar mortal ao dizer isso ao sujeito.

–Ótimo. Agora me digam: Qual é o nome dos três pirralhos?

–Quem é que você esta chamando de...-Nico começou, mas eu o interrompi pisando em seu pé e dizendo:

–Somos Sophie, Nico e Violet senhor.- Eu pus o máximo de ódio que eu conseguia naquela última palavra.

–Hum. Louise, ponha-os no terceiro andar. A ruivinha vai no quarto 299, o menininho pálido no quarto 300 e a despenteada no 301. E vocês não fiquem andando nos corredores à noite. Não quero que ouçam ou vejam o que não devem. Agora, sumam.

Ele nos dispensou com um aceno de mão e voltou a assistir TV, enquanto a balconista nos levava aos nossos quartos.

Andamos um pouco, até que Louise suspirou e disse:

–Me desculpem por isso. Ele costumava ser muito alegre à uns 100 anos, quando esse lugar era belo, cheio de vida e gente importante. Até que sem motivo aparente, as pessoas passaram a frequentar cada vez menos esse lugar, o dinheiro apertou, e nossa pousada virou esse lugar horroroso. Só pessoas deploráveis vem aqui agora. É horrível, mas é o único jeito que temos de conseguir dinheiro pra viver. Então ele ficou cada vez mais ranzinza, porque ele odeia gerenciar aqui. Duro, mas é a realidade.

Sophie e Nico não entendiam o que estava se passando(dava para ler nas expressões deles) mas eu sabia. E cada vez que via um quadro, um tapete ou um abajur que reconhecia, as lembranças amargas daquele lugar vinham na memória. Eu estava sentindo a raiva em mim dissolvendo e a tristeza e o medo que eu estava sentindo naquela noite tomaram o seu lugar, as lágrimas prestes a irromperem. Mas eu tinha de ser forte, porque se eu chorasse traria perguntas, perguntas que eu não queria responder, ainda mais para os dois campistas que tinham vindo comigo. Não tenho certeza de que posso confiar neles. Não ainda.

Louise deixou cada um de nós em nosso respectivo quarto. Estava a frente da porta quando a balconista virou o corredor e eu abri a porta do 301. Eu não poderia dormir ali.

De todos os dormitórios que eu poderia ter pegado, eu peguei justamente aquele que eu tinha dormido aos 12 anos, quando fui àquele lugar. Estava exatamente igual ao que eu lembrava, com o abajur rosa, a estante de mogno e a cômoda ao lado da porta. Caminhei muito devagar até a cama baixa de ébano, com o mesmo lençol daquele dia. Eu nem ao menos vi quando comecei a chorar, sentada aos pés dela, onde eu havia tentado inutilmente me esconder, gritado e esperneado por ajuda, até que ele me agarrasse, naquele dia que eu tanto tentava esquecer.

Eu quase não vi quando uma figura de cabelos rebeldes pretos apareceu em minha porta e parou no ato de falar ao ver a minha situação. Então veio se aproximando devagar de mim, enquanto eu soluçava desesperadamente agarrada as minhas pernas.

–O que aconteceu?- Ele perguntou diversas vezes, antes de se sentar ao meu lado.

Eu apenas acenava a cabeça e me encolhia cada vez mais. Ele parecia não saber o que fazer, ao passo de que eu ficava pior cada vez mais. Então ele fez a coisa que eu consideraria muito estranha se não estivesse naquela situação, mas devido as circunstâncias eu precisava: Nico me abraçou, um abraço que retribuí com ardor.

Ele afagava meus cabelos enquanto repetia que tudo iria ficar bem, me apertando forte com o seu outro braço e eu parava de chorar em seu ombro. Devo ter ficado ali horas e horas, confortada por aquele -quase- estranho até finalmente adormecer.


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