Forget-me-not escrita por ohhoney


Capítulo 7
Cravo


Notas iniciais do capítulo

Peço encarecidamente a todos os meus leitores que façam a dança da chuva em suas respectivas casas e mandem todas as nuvens para São Paulo.

Além da ameaça de falta d'água, o tempo seco está me matando. Juro que faço um capítulo bônus se chover. Promessa feita é promessa cumprida.



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Cravo

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Izuki divide o olhar entre a bela moça que entrou em sua loja e o rosto aflito de Moriyama.

Ele nunca vira um homem com tanto sofrimento nos olhos.

–O que você deseja?

A moça olha fixamente para Moriyama e mal presta atenção em Izuki.

–Yoshitaka... - ela sussurra e sua voz soa que nem sinos.

–M-Mirai, o que está fazendo aqui? - a voz de Moriyama treme e ele está em pânico.

–E-Eu não sabia que você estava aqui.

Izuki dá dois passos e para na frente da moça, colocando as mãos na cintura.

–O que você quer? - ele franze a testa e soa rude.

–Eu só queria uma rosa. - Mirai tem o olhar surpreso e triste - Por favor.

Izuki vai pegar a flor. Fora acidentalmente rude com Mirai, mas não conseguiu se conter na hora.

Moriyama continua com aquele olhar sofrido, e isso mexe muito com Izuki. Ele só quer pegar a flor o mais rápido possível para que a moça vá embora de uma vez.

–Desculpe, eu não sabia que você estava aqui - ela diz - Desculpe, Yoshi- Moriyama.

Moriyama não responde. Não consegue responder.

–Veja, estava precisando falar com você. - ela diz suavemente - Vou me mudar e tem algumas coisas suas em casa, então... Então acho que vou deixá-las aqui, tudo bem?

Moriyama somente sacode a cabeça, e Izuki entrega a rosa branca a Mirai.

–Pronto.

–Obrigada.

Mirai paga pela sua flor e vai embora.

Izuki fora rude com ela.

"Não era minha intenção, não era. Nunca sou rude com os clientes. Foi um acidente". Ver Moriyama naquele estado o deixou confuso e bravo, não foi de propósito. Foi?

O sininho da porta soa e Moriyama tem que se apoiar na parede para não cair. Suas pernas tremem.

Izuki chega perto dele e coloca as mãos em seus ombros, olhando-o preocupado.

–Moriyama-san...

–Eu não consigo esquecer dela, Izuki-kun. Eu não consigo esquecer dela, nem do perfume, do cabelo... Eu não consigo. Eu a amo tanto, e ela rejeitou minhas tulipas...

–Moriyama-san...

–Eu quero me casar com ela, Izuki-kun. Eu quero me casar com ela, porque ela é a mulher da minha vida.

Moriyama encontra os olhos com Izuki. Estão arregalados e têm muita, muita dor.

Izuki Shun sente uma raiva absurda.

–Moriyama-san, porque não vai para o seu quarto?

Moriyama continua olhando os olhos de Izuki e isso é a única coisa que o impede de cair no chão. Ele sacode a cabeça mecanicamente e anda cambaleante até os fundos.

Ao ficar sozinho, Izuki vai até o vaso de copos-de-leite e ergue-o acima da cabeça para jogá-lo no chão. Ele, porém, se controla no último segundo.

Izuki Shun coloca os copos-de-leite no canto mais afastado e escuro da floricultura, ao lado dos jasmins e das orquídeas.

Sente uma raiva absurda, e não sabe o porquê disso. Não sabe por que está bravo, ou por que quer jogar os copos-de-leite no lixo.

Na verdade, sabe sim. Mirai, a moça que se parece com um copo-de-leite, feriu Moriyama, e Izuki tinha raiva dela e das flores.

O cheiro delas deixava-o enojado.

O peito de Izuki parece pesar trinta quilos. A raiva passa, e ele só fica triste. Triste porque nunca viu alguém mais triste na vida, triste porque Moriyama estava sofrendo por aquela garota estúpida, que obviamente não merece nenhuma tulipa.

Izuki não deveria ter lhe vendido as tulipas.

O dono da loja sente-se imensamente triste. Nem mesmo suas flores o animam. Ele tem vontade de deitar na cama e não sair de lá nunca mais.

Izuki senta-se no chão no meio dos cravos e abraça os joelhos, apertando o rosto contra seus braços.

Está tudo muito confuso. Nem deveria estar se sentindo assim, mas está. Está sentindo um mal estar terrível, raiva, mágoa, confusão. O peito dói, dói demais.

Izuki pega um cravo roxo e segura-o contra a face, fechando os olhos.

Kobato desce para chamar o irmão e Moriyama para jantar. O irmão não responde, somente fica sentado no meio dos cravos, quieto e encolhido. Moriyama está deitado virado para a parede e abraça o travesseiro.

O clima está péssimo, e Kobato percebe isso. Ela decide deixar um pouco de comida na cozinha da floricultura e sobe para sua casa.

O silêncio na floricultura é esmagador. O clima está tão pesado que parece que há vinte atmosferas em cima de suas cabeças.

Izuki quer jogar fora todas as tulipas e os copos-de-leite.

Deixa-o triste saber que Moriyama ainda amava Mirai, e que não conseguia esquecer dela.

"Ele ainda quer casar com ela". Lembrar de ouvi-lo proferir tais palavras tão desesperadamente fere-lhe o peito. "Ele disse que ela é a mulher da vida dele".

Isso o deixa imensamente triste. Izuki aperta o cravo roxo contra o rosto mais forte.

"Ele a ama e quer casar com ela".

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Moriyama Yoshitaka finalmente tinha parado de tremer e começava a se recuperar de seu encontro com Mirai.

Mirai, a mesma garota que namorou por dois anos. Mirai, a mesma garota que jogou fora as tulipas que ele comprara para ela, e dissera que tinha outro.

Mirai, a mesma garota a quem amava desesperadamente, e com quem queria se casar.

"Tolo. Idiota. Trouxa."

Após o choque inicial, Moriyama não conseguiu pensar em mais nada a não ser na dor no peito e como ela estava mais bonita do que nunca.

Infelizmente, Moriyama Yoshitaka ama coisas bonitas.

Mas agora que estava deitado em sua cama, só pôde pensar que ela estava com outra pessoa, e que essa pessoa compraria mais tulipas a ela, e que ela não as jogaria fora dessa vez.

A dor no peito ia passando conforme as horas soavam no relógio.

Depois de mais de três horas de reflexão, chegou a uma conclusão. Moriyama Yoshitaka, de fato, ainda amava Mirai; porém sentia muito mais falta do tempo que passou com ela do que dela em si. Moriyama amava mais a companhia dela do que a própria Mirai.

Isso o deu um pouco de esperança, afinal.

Moriyama afasta as cobertas e ergue-se, sentindo dor de cabeça. Fora isso, mais nada.

Nenhuma dor.

Ele sai de seu quarto para procurar por alguém, e se surpreende ao ver Izuki sentado no meio de suas flores, no escuro e encolhido.

–Izuki-kun?

Aproxima-se do jovem. Izuki segura vários cravos roxos nas mãos e tem o rosto escondido nos braços e entre as pétalas. Moriyama senta-se ao seu lado, e Izuki ergue o rosto.

Ambos tem olheiras muito escuras e olhos tristes. O relógio bate dez horas.

–Suas irmãs deixaram o jantar pra gente. - Moriyama chega mais perto de Izuki para poder olhá-lo nos olhos - Vem. Vamos comer.

"Os olhos de Moriyama-san são incrivelmente bonitos... Pena que estão tristes".

"Não quero vê-los tristes".

Izuki cerra os olhos e volta a afundar o rosto nos braços.

–Desculpe-me, Moriyama-san.

–O quê?

–Desculpe, desculpe, desculpe...

–Izuki-kun, a culpa não é sua.

Izuki para e presta atenção na voz de Moriyama.

–A culpa é minha, sabe? Quando saí de casa, não avisei pra onde iria, então ela não sabia que eu estava aqui. Você não tem culpa.

"A voz dele é reconfortante".

–Vamos comer. Vem.

Moriyama toca o ombro de Izuki e convida-o para levantar, puxando-o para cima pela mão. Izuki continua segurando seus cravos roxos e não planeja soltá-los tão em breve.

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Izuki não consegue encontrar uma explicação para a confusão mental que está sentindo.

Deitado em sua cama, tenta achar algum padrão entre as formas que as luzes da rua projetam em seu teto. Não há nenhuma. Izuki não tem certeza de mais nada, e até os fatos mais concretos parecem ter se tornado pontos de interrogação em sua vida.

Moriyama estava triste, e, consequentemente, Izuki estava triste também.

Não conseguia tirar da cabeça aquele momento desesperado e as palavras de Moriyama. Que ele ainda amava Mirai e queria se casar com ela. Apesar de não haver nenhum copo-de-leite por perto, sentiu-se enjoado.

"Moriyama-san merece alguém que não vá jogar fora as tulipas que ele comprar. Mais ainda, Moriyama-san merece alguém que aprecia flores tanto quanto ele".

"Moriyama-san merece alguém que cuidará perfeitamente de todas as tulipas que ele lhe der".

Não conseguia pensar em Mirai e não imaginar aquelas lindas tulipas vermelhas jogadas numa lata de lixo, assim sem mais nem menos. Era tão ridículo que chegava a ser engraçado, até mesmo trágico. Mirai, definitivamente, não merecia flores de ninguém. Porque qualquer um que faz Moriyama triste não merece nenhum tipo de flor.

Contudo, seu amigo ainda morria de amores pela garota estúpida e isso deixava Izuki doente. A cabeça estava em branco, mas o peito era um turbilhão de coisas; ao mesmo tempo em que estava calmo, queria levantar de sua cama e correr pela rua.

Estava eufórico e muito, muito confuso.

Izuki levanta-se de sua cama e vai até a cozinha beber um copo d'água. A luz dos postes entra pela grande janela da sala e ilumina a madeira do chão com uma luz amarelada. A brisa que vem da janela sacode as margaridas em seus vasos e eriça os cabelos da nuca de Izuki. Ele pega seu celular; onze e meia.

Estaria muito tarde?

Izuki, honestamente, não se importava.

–Alô?

–Alô, Kaena? Oi, aqui é o Izuki Shun, da floricultura.

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Moriyama Yoshitaka conseguiu dormir uma boa noite de sono, pois seu estômago estava cheio e seu coração, calmo.

O encontro com Mirai com certeza tinha-o afetado de uma maneira que ele nunca imaginou que afetaria, mas ele pôde dormir com um sorriso no rosto porque tomou conhecimento de seus sentimentos.

Oras, ele ainda gostava dela, é claro. Gostava e gostava bastante. Mas acima disso, achava Mirai uma menina tola, que rejeitara o próprio e as suas tulipas, e que não era madura o suficiente para tamanho comprometimento o qual Moriyama estava obstinado a propor.

Talvez essa não fosse a verdade, mas foi o que Moriyama Yoshitaka escolheu acreditar, e com isso pôde ter uma noite bem dormida e em paz.

Ah, sim. Ele ainda gostava de Mirai, mas agora a achava, no mínimo, patética. Sentia falta de passar tempo com ela? Sentia. Mas gostava demais de ficar na floricultura com Kobato, Suzume, e especialmente com Izuki para se importar muito com esse detalhe.

Moriyama estava se acostumando à rotina nova, à vida de solteiro e ao trabalho novo. Honestamente, Moriyama achava que sua vida não poderia estar melhor.

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O dia amanheceu frio, dando fim aos dias quentes que previram o início da primavera. Todos na rua vestiam seus cachecóis e casacos mais pesados, e o ventinho gelado sacudia com ânimo os brotos de flores das árvores, que esperavam ansiosamente pelo início da primavera para poderem desabrochar e espalhar seus perfumes e suas cores pela cidade de pedra.

Moriyama acorda com o barulho de passarinhos na sua janela e se espreguiça ao levantar. O relógio de seu celular marca sete e cinquenta. Era um ótimo dia para comer torradas e tomar um café quentinho com Izuki.

Ele veste as pantufas e troca de roupa, logo depois seguindo para o elevador do prédio atrás da loja. O apartamento de Kobato e Suzume permanece em silêncio, e o de Izuki tem a luz da cozinha acesa, pelo o que pode ver por debaixo da porta.

–Bom dia, Izuki-kun - Moriyama cumprimenta-o alegremente, mas Izuki não retribui seu sorriso. Ao invés disso, sente-se tão confuso quanto na noite anterior.

–Bom dia, Moriyama-san.

Ele entra no apartamento cheiroso de Izuki e senta-se numa das cadeiras. A mesa está posta e há um bule com café no centro, ao lado de um dos cravos roxos num vasinho.

–O que aconteceu? - Moriyama pergunta ao ver as olheiras de Izuki - Não conseguiu dormir?

–Ah? - Izuki vira uma das torradas na frigideira distraidamente - Mais ou menos isso.

Moriyama pisca, confuso. Ele se lembra de como Izuki pedira desculpas na noite anterior por algo que não tinha sequer a menor culpa, e como ele parecia abatido e extremamente triste sentado sozinho no meio de todas aquelas flores.

Moriyama sorri levemente, tanto para si mesmo quanto para o rapaz que prepara sua torradas.

–Izuki-kun, não precisa ficar se sentindo assim, porque eu...

–Izuki-kun! Você viu minha calcinha por aí?

O sorriso de Moriyama congela no rosto. Izuki olha por cima do ombro, ainda meio abatido, e volta a virar as torradas.

–Está embaixo da cama - ele responde num tom monótono.

Moriyama não se lembra de ter visto algum jasmim, mas o cheiro deles volta a irritar seu nariz e o faz querer vomitar.

Ele resolve se calar e o sorriso desaparece rapidamente. O café tem um gosto amargo em sua boca, apesar de ter recebido algumas colheres de açúcar.

Kaena sai do quarto de Izuki secando seus cabelos curtos numa toalha e deseja um bom dia a Moriyama. Ele se força a ser educado e cumprimenta-a de volta; Moriyama sente-se enjoado pelo cheiro demasiadamente doce dos jasmins. Só poderia ser por causa dos jasmins, não é?

Moriyama mal consegue olhar para Kaena.

–Gostaria de ficar mais um pouco, mas estou em cima da hora, Izuki-kun. - Kaena veste seus sapatos e abotoa o casaco - Desculpe, sério.

–Não tem problema.

–A gente se vê depois - ela vai até ele e dá-lhe um beijo - Tchau, Moriyama-san.

–Tchau - os dois respondem no mesmo tom seco.

Izuki coloca as torradas em um pratinho e joga-se na cadeira, apoiando o rosto nas mãos. Moriyama não quer mais ficar ali.

A casa não está tão cheirosa, e não tem nenhuma música alegre tocando no rádio. O próprio Izuki parece cansado e segura seu cravo roxo com afinco. Moriyama se força a engolir as torradas e o café, incapaz de sequer olhar em qualquer outra direção.

"Ele ainda quer casar com ela, não quer?".

"Não posso acreditar que eles estavam transando a poucos metros de mim e eu nem...".

Moriyama termina seu café e mente dizendo que precisa ir logo para o trabalho, deixando Izuki sozinho em seu apartamento com o cheiro infernal daqueles jasmins invisíveis.

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O clima na floricultura estava tão péssimo que até Suzume achou estranho; ela insistiu para que seu irmão lhe contasse o que havia de errado com ele, mas Izuki não falou. Como explicar algo que nem ele próprio sabia que estava acontecendo?

Moriyama conseguiu queimar dois bolos de chocolate e tomou uma bronca do cozinheiro-chefe por causa da distração.

A terça-feira foi frustrante tanto para Moriyama quanto para Izuki. O dia passou literalmente se arrastando. Suzume e Kobato queriam saber por que a loja tinha cravos roxos por todo canto; isso deixava-as preocupadas, além de seu irmão ter ficado quieto o dia inteiro. Não era normal.

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–Izuki-kun.

Moriyama segura-o pelo pulso logo depois que chega do trabalho. Izuki estava com o olhar triste ainda. Moriyama estava achando a situação toda muito estranha.

–Que foi?

–Vamos sair.

Izuki pisca algumas vezes.

–Quê?

–Vamos sair e tomar uma cerveja. Quer? Sinto que estamos precisando.

Moriyama continua encarando-o. Bom, o que havia a perder mesmo?

–Tá.

Moriyama sorri para ele, e Izuki até sorri um pouco também. É, seria bom tomar uma cerveja, estava precisando sair um pouco.

Estava ficando de saco cheio de ficar na floricultura.

Moriyama Yoshitaka e Izuki Shun foram tomar umas cervejas naquele bar ao lado do parque na terça feira, sete e meia da noite. A música era boa e a bebida, gostosa; eles sentaram num canto perto da banda que tocava.

Izuki dá mais um gole na sua cerveja e suspira lentamente.

–E Mirai? - ele pergunta aquela coisa que estava entalada em sua garganta o dia inteiro. Evita olhar para os olhos de Moriyama.

–Sei lá - Moriyama pousa seu copo na mesa e afasta o cabelo dos olhos - Não quero mais saber dela, cansei de ser trouxa.

Oh, meu Deus.

–V-Você não quer mais casar com ela?

–Acho que não.

Izuki quase deixa cair seu copo de cerveja, meio bobo.

–Parei pra pensar um pouco e vi que ela não... Não era tudo isso mesmo - ele sorri e dá de ombros.

–Entendi.

Izuki bebeu sua cerveja com um sorriso no rosto e sentiu-se imensamente mais leve.

–Fico feliz que tenha chegado a essa decisão, Moriyama-san.

–Ah, é? - Moriyama ergue as sobrancelhas por cima de seu copo - Por quê?

Por quê? Izuki não sabia muito bem o porquê, mas sentia-se feliz.

–Ela não merecia aquelas tulipas, eu acho.

Ah, sim, agora o dia estava mais feliz.

Moriyama ri e dá de ombros:

–É, acho que ela não merecia mesmo. Ah, além disso, estamos celebrando, Izuki-kun.

–Celebrando o que?

–Amanhã Mirai vai deixar minhas coisas e eu vou me mudar pra casa nova.

Ter Moriyama dormindo no quartinho da floricultura tinha virado uma rotina tão legal que Izuki mal percebeu que ele precisava de uma casa. Quer dizer, era bom e divertido ter Moriyama por perto, e já havia se passado quase duas semanas que ele estava lá.

Só não conseguia mais ver sua rotina sem ele. Seria... Vazia. Desinteressante. Porque Moriyama, além de trazer mais um cheiro gostoso para a floricultura, fazia a vida de Izuki Shun e de suas irmãs muito mais alegre e descontraída.

Seria estranho comer torradas e tomar café sozinho novamente.

–Vai amanhã mesmo? - Izuki se viu perguntando.

–Vou sim. Já tomei muito tempo seu, Izuki-kun, não quero continuar atrapalhando a rotina da loja.

Izuki tinha vontade de dizer que não atrapalhava; muito pelo contrário, até fazia a rotina mais agradável. A coisa que Izuki mais gostava era ver Moriyama chegando do trabalho e falando animadamente sobre alguma empresária bonita que fora na doceria, ou como conseguiu acertar no pão de ló.

–Já falei que não tem problema. - Izuki diz pela milésima vez, mas parece que não entra na cabeça de Moriyama.

"Ele poderia ficar na floricultura...".

Izuki sacode a cabeça. Que pensamento egoísta! É claro que Moriyama não iria querer passar toda a vida no quartinho pequeno da floricultura, e não ter um lugar próprio para viver. Izuki não se importaria, claro, mas não era o ideal para Moriyama, e ele sabia disso. Sabia que ele uma hora sairia da floricultura, só não que seria tão cedo.

–É claro que ainda tem muita coisa pra fazer, tipo limpar tudo e pintar as paredes e ajeitar o piso, mas o quanto antes eu puder parar de causar problemas, melhor.

–Eu, Kobato, e Suzume podemos ajudá-lo se quiser, Moriyama-san.

–Ah, eu apreciaria isso - ele ri.

Moriyama repara em duas garotas perto do bar e diz a Izuki para irem conversar com elas. Moriyama, Izuki percebe, é aquele tipo de cara que adora flertar e dar em cima das meninas, apesar de a taxa de sucesso ser incrivelmente baixa. Como assim?, Moriyama era um cara alto e bonito, e tinha um papo legal, como as garotas não gostavam dele?

Izuki era o oposto; não tinha muito, mas esforçava-se para conversar com as duas mulheres bonitas com quem Moriyama puxou papo. Elas eram realmente legais.

–E a Kaena? - Moriyama pergunta a Izuki quando eles vão pegar mais bebida - Pensei que você gostava dela.

–Ah, bom... Ela é linda e muito legal, mas...

"Mas ela não gosta do meu café nem de Frank Sinatra".

–Mas ela sabe que não é nada sério. Também, não quero nada sério com ela.

Moriyama vira o rosto pro outro lado e sorri que nem uma criança recebendo presente.

–Ela não gosta de Frank Sinatra.

–COMO ASSIM? - Moriyama vira rapidamente e abre a boca, espantado.

–Alguém que não gosta de Frank Sinatra não pode ser a pessoa da minha vida - Izuki pega sua nova cerveja e dá mais um gole.

Moriyama sente-se bobo.

"Eu gosto de Frank Sinatra".

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–Moriyama-san... Eu falei pra parar... Parar com a cerveja...

Os dois tropeçam na calçada e quase caem no chão. Moriyama tem o braço apoiado atrás do pescoço de Izuki e se esforça para andar em linha reta. Não consegue, porém.

–Eu disse pra não tomar aquela última cerveja.

–M-Mas estava tão boa...

–Ir pro trabalho de ressaca não é lá muito legal.

Izuki sabia que deveria ter tirado o copo da mão dele quando pôde, mas estava ocupado demais rindo das cantadas que Moriyama estava ensinando-o.

–Ah, tenho outra - Moriyama soluça - É assim: gata, você parece um beliche; tem dois coxão.

Izuki, que também deveria ter parado com a cerveja, não pôde deixar de rir.

–Eu sei um legal: você não é um sonho, é a padaria toda.

Moriyama ri tanto que até chora. O que a bebida não faz...

–Ah, eu te pegava se você falasse essa pra mim, Izuki-kun.

–Pegava, é?

–Você é tão bonitinho, Izuki-kun. Tipo, muito bonitinho. E fofo. E legal.

–E você é bonitinho também, Moriyama-san.

Subir a ladeira da colina demonstrou ser uma tarefa praticamente impossível para os dois homens bêbados e meio tontos, que carregavam um ao outro e faziam competições de cantadas.

–Izuki-kun, pra você virar bombom só falta a valsa, porque um sonho você já é.

–Moriyama-san, eu não sou garçom mas me entrego de bandeja pra você.

–Você não é oculista, mas só tenho olhos pra você.

Izuki vira a cabeça e olha nos olhos de Moriyama.

–Gosto muito dessa sua blusa, Moriyama-san.

–Sério?

–Sabe onde ela ficaria ótima?

–Onde?

–Toda amassada no chão do meu quarto amanhã de manhã.

O sininho da floricultura toca alegremente e Moriyama se pergunta até onde Izuki estaria brincando. Ou se estaria realmente brincando, porque ele disse aquilo com uma cara super séria. Por via das dúvidas, ele ri.

–Essa foi boa - diz, apoiando-se no balcão.

–Você achou? - Izuki ri, mais por conta da bebida do que por ser engraçado - Acho essa genial.

–Eu estou muito bêbado, Izuki-kun.

–Eu estou vendo.

–Eu estou tão bêbado que acho que te pegaria só por causa dessa última cantada...

–Aham...

–Mas vou dormir, tchau.

–Tchau.

Então Moriyama Yoshitaka se joga na cama sem ao menos trocar de roupa, e Izuki Shun sobe para sua casa e se pergunta se Moriyama estava falando sério.

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Na manhã de quarta-feira, Moriyama faz uma força enorme para levantar da cama e se preparar para o trabalho.

Estava com uma ressaca fenomenal.

Subiu para o apartamento de Izuki e deitou a cabeça na mesa, protegendo os olhos da claridade.

–Toma.

Izuki estende-lhe um par de óculos escuros, um copo d'água, e um comprimido.

–Valeu...

–Eu disse pra não beber aquela coca batizada.

–Eu deveria ter te escutado, Izuki-kun. Ugh, que dor de cabeça...

–A Suzume vai me matar se souber que estou de ressaca - Izuki massageia a testa e fecha os olhos - e a Kobato vai me matar se souber que você está de ressaca.

–Por quê?

–Elas odeiam quando eu saio pra beber.

Nenhum dos dois se arrisca a comer muito, mas o café forte de Izuki é essencial de manhã.

–Hoje é quarta, né? - Moriyama pergunta.

–Sim.

–Que merda.

–O quê?

–Esqueci que hoje é meu dia de folga.

Izuki ri um pouco, mas logo se arrepende. A dor de cabeça estava de matar.

–Sorte sua.

Moriyama e Izuki descem até a floricultura para esperar por Mirai, que passaria cedo para deixar as coisas de Moriyama.

Izuki começa a manhã tirando todos os cravos roxos de cima do balcão ou do chão da loja. Moriyama não entendia o porquê dos cravos roxos, mas não queria ter de perguntar. Por isso, quando Kobato chega à loja, ele a pergunta se há algum livro sobre flores.

–Tem um aí embaixo do balcão, pode dar uma olhada se quiser. - a menina responde.

–Ok, obrigado.

Moriyama espera Izuki ir para os fundos da loja e pega o livro. Ele é branco e tem umas flores amarelas na capa, além de o título "Enciclopédia das Flores" ser escrito em uma letra bonita. É um livro grande.

Moriyama abre na página dos cravos.

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Cravo

Nome científico: Dianthus caryophyllus L

Família: Caryophyllaceae

Árvore: craveiro

Origem: Sul da Europa

Significados

–Cravo branco: amor puro, inocência, boa sorte

–Cravo vermelho: respeito, amor, paixão, admiração

–Cravo amarelo: rejeição, desdém

–Cravo rosa: felicidade, gratidão, preferência

–Cravo roxo: solidão, inconstância, tristeza

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Tristeza? Solidão? Moriyama não entendia porque Izuki estava triste. Desde a noite anterior, quando Mirai apareceu na floricultura, Izuki colocava cravos roxos em todos os espaços disponíveis e parecia abatido.

Mas agora, Izuki tirava os cravos e os colocava de volta em algum vaso, e parecia excepcionalmente melhor. Se tinha uma coisa que Moriyama aprendera sobre Izuki era que podia-se saber do humor do outro por meio das flores que decoram a loja; felizmente, as de hoje eram prímulas (que Moriyama descobriu significarem felicidade e fortes laços de amizade) amarelas, e não mais os cravos roxos da tristeza.

As prímulas irradiavam a loja com os tons bonitos e o cheiro suave, e animavam tanto o lugar quanto o dono e o convidado.

Se Izuki estava feliz, então Moriyama estava feliz.


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Notas finais do capítulo

Curiosidades #4

—A bebida favorita de Izuki é Piña Colada, e a de Moriyama é Blood Mary;

—Moriyama tem um vasto conhecimento em cantadas (mas, por algum motivo desconhecido, elas não ajudam em nada).