Capítulo Único – Sinais

–O mundo vai acabar. –Dean Winchester falou simplesmente, não sem antes beber mais um bom gole de sua cerveja, amargurado. O mundo acabaria, e ele sabia que as chances de salvá-lo era uma em um milhão. Não deixaria de tentar, porém, tinha de ser realista.

–Um dia tudo irá acabar, com certeza. –Jo, ao contrário de Dean, não parecia amargurada, muito menos feliz. Ela estava agindo naturalmente, como se nada demais estivesse para acontecer. Como se eles todos não fossem enfrentar o diabo amanhã, apenas com uma mera arma. As chances de voltarem vivos de lá eram mínimas, mas Jo não demonstrava medo. Ela sempre quis ser uma caçadora, afinal. E morreria por seu sonho de bom grado se ajudasse a fazer do mundo um lugar melhor.

Dean desviou a sua atenção da bebida pela primeira vez naquela longa noite, e começou a observar Jo. Seu cabelo louro parecia muito mais bonito do que estava na última vez que a viu. Seu olhar, contudo, continuava com a mesma intensidade de sempre. Aquela mulher tinha algo de diferente. Algo nela que se destacava muito. Talvez fosse aquela vontade voraz de viver e lutar sempre pelo que acreditava, pelo que achava certo e, principalmente, pelo legado que o pai dela deixara, no seu ponto de vista.

–Você é tão linda. –Dean se viu falando aquilo quando já havia escapado de sua boca. Ao contrário do que ele esperava, ela não ficou ruborizada, nem desviou o olhar. Continuou lhe encarando, como se quisesse que Dean continuasse. –Por que não saiu dessa vida quando pôde, Jo? Não vale a pena morrer por ninguém.

Ao indicar os sinais
De que ele não foi capaz de compreender o que ela queria
como um romance ideal dos premiados da vez
o pesadelo do óbvio na vida.

–Porque eu não quero sair, Dean. Pare de ser hipócrita. Você passou a sua vida inteira salvando as das outras pessoas. Não minta para mim dizendo que isso não lhe satisfaz.

Jo estava certa, como na maioria das vezes. Ele nunca se arrependeria de ter continuado o negócio da família junto de seu irmão, Sam. Contudo, isso não significava querer Jo neste meio. Quer dizer, mesmo amando o que fazia, Dean conseguia enxergar as desvantagens. Como o impedimento de nunca poder ter uma vida normal. Uma família.

–Devia ter saído. Se apaixonado, casado, dado netos à sua mãe. Caralho, toda essa coisa de vida normal, Jo! Você está jogando sua vida fora. –Ele se viu gritando com ela antes que pudesse se conter.

–Isso tudo seria um pesadelo. –Ao contrário de Dean, a voz de Jo estava estranhamente calma quando começou a falar. –Seria muito óbvio, você não vê? Eu me apaixonei, Dean. Por você.

Ela levantou-se lentamente da cadeira em que estava sentada e se aproximou de Dean.

Vai dizer que o mundo agora,

Não se parece com um

Esboço do que foi?

Dean sentiu quando os braços da belíssima mulher se enrolaram em volta de seu pescoço. Seus rostos ficaram próximos e a respiração dele acelerou ao sentir o doce hálito que vinha de Jo bater levemente em seu rosto. Não queria beijá-la. Inferno, queria sim, queria muito. Mas não podia, pois não era certo.

–Por favor, Jo. Não faça isso. –Ele implorou. Era estranho porque Dean Winchester nunca implorava, ainda mais para que não o beijassem. Mas Jo sempre teve algo de diferente. Sempre. –O mundo está de pernas para o ar, não é hora para isso.

O homem precisava de uma boa desculpa, mas aquilo tudo que saía de sua boca parecia mais como um incentivo para Jo.

Nós dois sabemos muito bem

Que fomos feitos um para o outro,

Mas existem outros 6 bilhões também.

–De fato. –A bela mulher continuou a hipnotizá-lo com aquela voz tão melodiosa e calma. Um de seus dedos foram em direção aos lábios de Dean, fazendo um singelo carinho no local. –Meu mundo está de pernas para o ar desde que eu conheci você, Dean.

Sem se conter mais, as mãos ágeis de Dean logo voaram para a cintura da mulher, segurando-a forte e puxando-a para si. Era bom demais se entregar ao desejo pelo proibido, pelo menos uma vez na vida. O mundo provavelmente iria acabar, então o que eles tinham a perder?

Sim, ainda tinham que tentar salvar o máximo de pessoas que pudessem, mas agora? Agora estavam presos naquele beijo tão errado, mas tão certo ao mesmo tempo. Não se importavam com a possibilidade de Bobby, Sam, Castiel, ou Ellen poderem entrar naquela sala a qualquer minuto. Não. Naquele momento só existiam os dois, o desejo palpável e a rendição. Ah, finalmente a rendição.

Linha a linha eu reli o contrato,
refiz todos os cálculos e sim, você tem razão.
Não há nada a reclamar se o que
ofereço é só um pedaço de mim.

Infelizmente, o ar se fez necessário em algum momento, e os dois tiveram de se separar. Ambos se olhavam intensamente e estavam ofegantes. Jo não tirou as mãos do pescoço de Dean, e tampouco Dean moveu suas mãos da cintura de Jo. Eles estavam bem daquele jeito. Estavam como deveriam estar. Confortáveis. Estranhamente confortáveis.

Dean se deu ao luxo de pensar em como seria sua vida se simplesmente desistisse de caçar. Será que ele se adaptaria a uma vida normal? Com Jo? E o mais importante: será que ela se contentaria com isso? Não, ele sabia que não. Ambos tinham em seus sangues o DNA de um verdadeiro caçador. E ambos sabiam também que não se misturava amor com trabalho. Afinal, onde o amor de Dean por Sam o levou, e vice-versa? O amor era uma fraqueza naquele trabalho. E Dean não podia ter mais uma além de seu irmão.

Se largasse a vida de caçador, Dean só teria um pedaço de si para oferecer a Jo. E se não largasse, também, pois sempre teria de ficar em alerta para que nada acontecesse a ela. Resumindo: não havia saída para o casal. E eles sabiam disso. Sabiam bem demais.

Vai dizer que o mundo agora

Não se parece com

Um esboço do que foi?

Os dois se soltaram assim que ouviram vozes se aproximando da sala. Sabiam que não ficariam sozinhos mais por um bom tempo, e nada poderiam fazer a respeito disso.

Nós dois sabemos muito bem

Que fomos feitos um para o outro,

Mas existem outros 6 bilhões também.

Quando Dean iria se afastar de Jo, ela o puxou pelo braço novamente.

–Dean, espere. –Pela primeira vez na noite, e talvez na vida, Dean viu Jo angustiada.

–Diga. –Ele também não estava muito diferente. Nunca tinha sentido nada tão forte por alguém como o que sentia por aquela mulher. Era assustador.

A gente pode mudar.

–Se voltarmos vivos da caça ao diabo, por favor, prometa que daremos um jeito de ficarmos juntos. –Os olhos e a voz de Jo eram suplicantes. O coração de Dean doeu só de ouvi-la.

–Jo, você sabe que... –Ele soltou um suspiro cansado antes de continuar, mas ela o interrompeu novamente.

–Impossível. Sim, eu sei que é impossível que fiquemos juntos. Mas, fala sério, você sabe que é impossível vencer o diabo também. Se conseguirmos vencê-lo, conseguiremos qualquer outra coisa, Dean.

Um sorriso verdadeiro nasceu na face de ambos. Não que estivessem esperançosos, mas sabiam que era verdade. Afinal, quem determinava o que era impossível e possível no mundo sobrenatural em que viviam? Destino? Claro que não. Apenas eles mesmos.

–Está certo, Jo. Eu prometo. –O casal selou a promessa com um beijo leve e rápido, antes que todos os outros entrassem na sala em que estavam.

Prevendo o que aconteceria, ou não, Dean passou o resto das poucas horas que lhe restava antes de enfrentar Lúcifer, olhando para Jo Harvelle, querendo memorizar seu rosto, seu cabelo, seu sorriso, seus olhos, seu corpo... Absolutamente tudo.

Talvez Dean já tinha uma noção que ninguém, ou talvez nem todos, voltariam vivos daquela missão suicida. E ficou feliz por ter olhado por tanto tempo para a mulher que amava antes de saírem da casa de Bobby.

Pois aquela foi a última noite na terra para Jo Harvelle. E, coincidentemente, a última noite tranquila que Dean realmente teve.

FIM