Exergue-me - EM HIATUS escrita por Alihhh


Capítulo 4
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura! ^^



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Três pares de olhos me encaram. Um divertido. Um indiferente. E outro chocado. Luka tenta dizer algo, porém é interrompido pelo homem cujo nome ainda desconheço. Zene parece ter dificuldade de conter sua gargalhada, ele está avermelhado, suando e seus ombros balançam em intervalos curtos. Seus olhos estão esbugalhados e face enrugada. Por fim, sua histeria vence e o som de sua estridente hilaridade substitui o silêncio.

De alguma forma, não estou assustada. As pessoas tem medo da morte, pois não querem ser raptadas de suas vidas. Levadas contra sua vontade da rotina e comunidade: o familiar, o amigável e aconchegante são preciosidades para aqueles que valorizam sua passagem pelo tempo. A maioria das pessoas é assim, porém sou uma exceção. Não me lembro de ter uma rotina, viver em uma comunidade, ter família, amigos ou bens.

Minha vida não tem significado, pois não tenho história. Não tenho biografia.

Não tenho medo do fim, afinal não existe inicio nem meio.

Sou uma casca. Vazia por dentro. Se a superfície for quebrada, nada se perderá.

O silêncio retorna com uma pequena palavra do recém chegado. Zene parece ofendido. Luka ainda está perturbado. Contudo, nenhum deles se pronuncia. Olho para o misterioso homem de olhos cinzas e imagino quando o veneno fará efeito.

Desejo nunca ter ansiado o momento.

Esperava que fosse indolor, ou ao menos uma agonia crescente. Porém o baque inicial é insuportável. A dor se concentra em meu peito. Milhares de facas rasgando minha carne, estilhaçando meu coração. Torturando minha alma.

Não posso mais pensar, não posso raciocinar. Não há espaço para nada.

Não é uma dor física, meus nervos estão constantes e irrefutáveis. Porém, sinto como se perdesse um pedaço de quem sou. Como se perdesse fantasmas de um possível passado. Como se houvesse sangue em minhas mãos. Terror, mágoa, traição, desespero, agonia.

Mesmo quando se tem pouco, perder algo: É descomunal. Preferiria ter amado alguém de todo meu coração e a visto desfalecer em prantos. A dor seria menor. Preferiria uma tortura física.

Nunca poderia imaginar que simples emoções poderiam ser tão destrutivas e torturantes.

A única coisa que posso fazer é rasgar minha garganta no urro alucinante que explode em meu âmago e irrompe meus lábios.

Todavia, assim como a dor surgiu. Ela se foi.

Quando minha mente retorna a sanidade, percebo estar nos braços de alguém.

Me debato desesperada, preciso sair deste lugar. Preciso fugir. Preciso... Entro no pequeno banheiro e fecho a porta. Não há tranca. Não há janela. Uso meu corpo para manter a porta fechada. Ninguém tenta entrar no cômodo anexo.

– Acredito que isso prova seu argumento. - o som ultrapassa a parede. A voz pertence ao recém chegado.

– Isso não prova nada. Você a conhece muito bem, se ela quiser nos enganar, isso não é nada para ela. - Zene responde a afirmativa.

– Então o que sugere? - Antes de ouvir o restante da conversa, aproveitando que ninguém está interessado em me perseguir, aproveito minha chance. Percebo que mesmo não tendo lembranças, mesmo não tendo justificativa ou razão, temo a morte. Eu quero sobreviver.

Sou uma contradição.

Sou bipolar.

Me ajoelho ao lado do vaso sanitário e enfio o dedo na garganta. Coloco toda comida envenenada para fora. Toda minha bravura esvaiu-se na tortura, agora tenho tanto medo que me sinto paralisada. Desesperada.

A porta se abre, um calafrio percorre minha coluna. Me sinto dividida: uma parte de mim está grata por ter colocado o mal para fora, a outra lamenta não proteger de forma adequada meu esconderijo passageiro.

Zene lidera a invasão. Ele para tentando entender minha atitude, como se não fosse obvia.

– Você realmente acredita que a comida estava envenenada? - suas sobrancelhas estão unidas, irmãs de confusão. Irmãs chocadas com a descoberta. Não respondo, minha garganta está bloqueada, uma mão invisível me sufoca. Eu o quero longe de mim. Eu os quero a milhares de quilômetros longe de mim. Bilhares, trilhares de quilômetros. Eu quero fugir desta realidade. Eu quero fugir deste pesadelo.

Onde está a valente garota que estava ocupando esta carcaça, afinal? Talvez eu não seja corajosa, como supus. Nunca serei uma vespa, serei sempre uma mosca.

– Realmente? - ele pergunta novamente incrédulo.

– Tire-a do banheiro, Zene. - o líder comanda. Imediatamente sou arrastada para fora de minha toca. Meu esconderijo foi arrombado. As mãos de Zene não são delicadas, apertam meus braços com uma força desnecessária. Estou histérica. Me debato. É inútil. Ele é muito mais forte que eu. Seus olhos estão irritados.

– Silêncio. Fique quieta. - repentinamente minha boca se cala contra minha vontade. Não tenho domínio sobre ela. Por que? Como não posso me expressar? Como minha boca pode obedecer uma ordem dita e não minha própria consciência?

Você olhou em seus olhos.

Estou paralisada. Minhas pálpebras estão arregaladas. Primeiro minhas cordas vocais se rebelam e não me obedecem. Agora minha mente emite pensamentos sem meu consentimento.

A "voz" surge em minha cabeça repentinamente. Sei que não fui eu quem pensou a frase. Sinto como se alguém sussurrasse em meus ouvidos, mas não escutei nada. Fora dito diretamente em meu cérebro.

Sou colocada sentada na cama, meus músculos estão rígidos. Simplesmente é demais para lidar. Não posso, não consigo. Sinto como se fosse explodir.

Sinto muito.

A "voz" volta a minha mente. Estou ficando louca. A tortura retirou minha sanidade.

– Por que você vomitou? - O líder pergunta, não sei interpretar seu tom de voz, nem sua expressão. Estou apavorada demais para isso. Seus olhos me encaram novamente. - Responda.

– A comida estava envenenada. - Minha boca tem vida própria. Não dei o comando para resposta.

– Por que você acha que a comida estava envenenada? - ele continua.

– Senti o primeiro efeito do veneno. Doeu. - As palavras continuam escapulindo de meus lábios dormentes.

– Ryan, isso só pode ser brincadeira. - Zene urra.

Ryan, este é o nome do líder. Minhas mãos formigam ao ouvir seu nome pela primeira vez.

– Ou ela pode estar dizendo a verdade. Suponho que só há uma maneira de descobrirmos. - Soluço, o que será que farão a mim agora? Primeiro a comida, agora as ameaças entre linhas. - Luka, se conecte com a alma de Marie. Mude seus sentimentos, da mesma maneira que eu fiz.

Não fora a comida que me fizera mal, percebo. Porque você olhou em seus olhos. A voz havia explicado, eu que não quis entender. Conexão de alma. Eu já havia ouvido.

Porém, nada disso importava. Algo despertou no fundo do meu ser. Uma selvageria que tomou conta de meus sentidos.

– Não! - grito com todas as minhas forças. - Deixe Luka fora disso.


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Notas finais do capítulo

Obs: Estou escrevendo uma nova história. Quem quiser dar uma olhada.. sejam bem vindos.
NOME: Ininterrupto
TRAILER: https://www.youtube.com/watch?v=I2nfHQURqgQ
LINK: http://fanfiction.com.br/historia/551007/Ininterrupto/
SINOPSE: No futuro a tecnologia é obsoleta. Não existem ruas ou estradas, cada local foi ocupado pela crescente população. A ciência conseguiu resolver o problema da demanda e poluição causada por seus antepassados. Uma nova gnose sustenta os alicerces da nova sociedade: o desenvolvimento de ki, vulgarmente chamado Magia. Força, precisão, expertise, teletransporte, levitação podem ser facilmente adquiridos em lojas de departamento por pequenas quantias de dix de prata.
O futuro está aqui, seu destino ao alcance de suas mãos.
Você aceita?

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