Rainha dos Corações escrita por Angie


Capítulo 65
O Casamento Secreto | Aline e Layla


Notas iniciais do capítulo

Oi, gente! Hoje é quinta, hoje é dia de RDC!
Como prometido, aqui estou eu no dia 23 postando esse capítulo, que é, juntamente com o da semana passada e com os próximos que serão postados esse mês, um divisor de águas para a fanfic. Estou super animada para ver o que vocês estão achando, se estão gostando, se estão chocadas etc etc. Esses acontecimentos estão planejados desde 2015 e eu aguardei ansiosamente para poder escrevê-los nesse teeeeempo todo.
Ai, to nervosa.
Espero que gostem!
Até as



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A noite estava prestes a engolir os últimos raios do dia quando a forte luz dos carros de polícia quebrou a calmaria do céu. Logo em seguida, os estridentes sons das sirenes foram ouvidos, fazendo com que todos os habitantes do Palácio se alertassem. Inclusive Aline, que estava tranquilamente lendo um de seus livros sobre geopolítica — que a faculdade que cursava exigia — na grande biblioteca e que, assim que percebeu a confusão, desceu as escadarias com rapidez.

Praticamente todo o efetivo de moradores e de visitantes de Amalienborg se encontravam amontoados no Salão de Entrada. As criadas, que deixaram seus postos para satisfazer sua curiosidade, ainda tinham toalhas e outros utensílios em suas mãos e tentavam a todo custo espiar o que ocorria. As Selecionadas, que haviam acabado de voltar do discurso, se esquivavam por entre os funcionários para ficarem mais próximas do centro da roda. Mas Aline só pôde perceber o que realmente o que acontecia quando chegou perto dos nobres.

Juliane chorava como a jovem Princesa britânica jamais tinha visto, curvando-se para frente enquanto as lágrimas pingavam no chão e formavam uma poça a seus pés. Seus cabelos loiros, que geralmente caiam sobre seus ombros em perfeitas ombros, naquele momento não passavam de um emaranhado de fios em sua cabeça. Sua expressão era de desespero e suas mãos tentavam a todo custo achar apoio e consolo nas de seu marido. Ele, por sua vez, apesar de tentar ocultar a aflição, tinha nos próprios olhos o volume de água de um oceano inteiro. Os dois tinham a aparência de tão devastados que até sem saber o motivo de tanta tristeza, tinha vontade de se juntar a eles ou de tentar acalmá-los. Não aguentava ver uma parte tão amada de sua família daquela maneira.

Aos poucos, ela se aproximou dos dois. Seus braços envolveram o corpo tão frágil, naquela situação, da Rainha, tentando pegar todas as dores para si. Rapidamente, as duas já estavam sentadas no chão, as vestes creme de Aline banhadas pelas lágrimas da mais velha. Tudo que saía de sua boca naquele momento de desespero eram murmúrios incompreensíveis. Seus olhos não conseguiam encarar ninguém e apenas pareceram focar realmente quando a porta foi aberta, trazendo, assim como o vento gelado da noite, duas figuras assustadas.

Ambas trajavam vestidos brancos, que cobriam seus corpos por inteiro e tinham sobre os braços toalhas azuis, que provavelmente foram cedidas pelos policiais. Seus cabelos estavam presos em coques feitos às pressas. E, por mais que a preocupação por uma parte tão importante de sua família  tomasse conta de seus pensamentos, uma onda de alívio percorreu seu corpo quando viu os belos e aflitos olhos azuis da morena. De Layla. Tudo poderia ter ocorrido naquele final de tarde, mas pelo menos ela poderia ter a certeza que a futura — e comprovada — salvadora de toda a Europa estava ali, salva.

Deixando a Soberana nos braços de seu marido, Aline foi até as duas recém chegadas. Uma eternidade pareceu passar enquanto ela dava passos lentos até a porta sendo observada por um público tão curioso quanto ela. Apesar de não ter intimidade com nenhuma das duas, tocou seus ombros com carinho, focando sua atenção principalmente na morena. De perto, ela conseguia ver os pequenos machucados de tom vermelho vivo que se espalhavam por todo o seu rosto. Por anos de convivência com e de estudo sobre as maldades que o ser humano poderia cometer para chegar ao poder, ela já conseguia imaginar o que acontecera. O que, ela não poderia negar, a assustava muito.

— O que aconteceu, oficial? — a Princesa perguntou ao oficial que algum tempo depois adentrou o local.

— Ocorreu um atentado no Ørstedsparken há aproximadamente meia hora. Até onde se sabe, uma bomba explodiu dentro da carruagem que três Selecionadas utilizavam para cumprimentar o povo depois do discurso — ele respondeu com muita calma, analisando o ambiente à medida que proferia as, para Aline, dolorosas palavras. — Não descobrimos o culpado ainda, mas as investigações já iniciaram.

— Houve algum ferido? — ela questionou já um tanto aflita com a situação.

— Entre a multidão, apenas alguns ferimentos leves. A Princesa Isabella e Ulrika Amelie Senger, porém, foram encaminhadas para o centro de tratamento intensivo e estão recebendo cuidados médicos, no Rigshospitalet*¹ — ele explicou. — Não temos informações do estado de nenhuma das duas. A família da plebeia já foi avisada e também já está indo para lá acompanhar a filha.

— Muito obrigada, oficial — ela tentou manter a calma e a maturidade de sempre, mesmo com o turbilhão de inquietações que surgiam em sua mente. —E obrigada também por trazer essas duas em segurança até aqui.

O policial e a Princesa trocaram mais algumas palavras sobre o ocorrido, passando informações importantes. Mas, mesmo tentando focar na conversa, ela ao mesmo tempo pensava nos motivos que levaram a esse acontecimento trágico, principalmente por ter envolvido Layla. Será que Luther descobrira que ela era a Princesa Perdida e tentara matá-la? Será que outro chefe de estado apoiador do governo despótico germânico desvendara o mistério que rondara o país por anos e decidira acabar com tudo?

— Nós providenciaremos uma escolta para a Família Real até o hospital — o homem falou depois de algum tempo, apontando para o casal que ainda estava abalado no meio do Salão.

— Sim, sim, muito obrigada — Aline agradeceu, cruzando as mãos em frente a seu corpo. — Eu ficarei por aqui para acalmar os ânimos dos demais moradores.

Ele, então, se aproximou dos Soberanos, acompanhado de alguns outros oficiais. Em conjunto, todos tentaram acalmar a Rainha com palavras e toques cuidadosos. Aos poucos, as lágrimas pararam de cair por suas bochechas e seus soluços não eram mais ouvidos.  Quando um pouco de paz se instalou em seu coração, os policiais foram capazes de levá-la para o lado de fora, seguida pelo marido. Nesse momento, Aline percebeu que eles eram os únicos membros da Família que estavam ali presentes. Provavelmente, quiseram poupar Alexander, Saphira e Henrik de tanto sofrimento. Quiseram que a leveza de suas almas fosse preservada de tanta tristeza. Eles não mereciam.

— Atenção! Como vocês todos já devem ter ouvido, ocorreu um atentado em um dos parques onde as Selecionadas faziam seus discursos. Há feridos, mas não existe motivo nenhum para a nossa preocupação. Todas as providências já estão sendo tomadas e a situação logo será resolvida e esclarecida — a Princesa britânica aumentou seu tom de voz para falar com as demais pessoas ali presentes ao mesmo tempo que tentava não falhar a voz. — Então, por favor, voltem a seus postos e mantenham a calma. E, Jade, venha a cá.

Quase que imediatamente depois da fala da nobre, os criados e Selecionadas começaram a se movimentar. Antes que ela pudesse se dar conta, o local já estava totalmente vazio, sendo possível apenas ouvir os passos distantes das pessoas que antes ali estavam. Apenas quatro figuras permaneceram, paradas próximas à porta. A servente, Jade, era a única dos funcionários que Aline conhecia e confiava, por ter a acompanhado em seus aposentos em visitas anteriores. Seu sorriso e sua empatia com os outros eram perfeitos para a tarefa a que ela logo seria designada.

— Você poderia levar Wanessa até o quarto e servir um chá para que ela se recupere? — pediu ela. — Eu farei o mesmo com Layla.

— Claro, Alteza — a outra concordou. — Ela estará em boas mãos comigo.

Os dois pares de moças, então, se separaram pelos corredores do grande Palácio. A criada e a ruiva, para a esquerda, e a britânica e a morena, para a direita. O silêncio tomava conta de ambos os caminhos, principalmente do das duas princesas. Layla alternava seu olhar entre as paredes e o chão, encolhendo-se na toalha azul. Ela não proferiu nenhuma palavra à companheira, que apenas se conteve em seguir seu percurso sem pressioná-la. O escritório no qual elas conversariam parecia estar ainda mais longe, separado do restante da residência real por infinitos corredores.

Depois de alguns minutos, porém, elas avistaram a porta. Assim que entraram, a nobre pegou um pouco da água quente — já previamente preparada, visto que a menina apreciava tomar chá em muitos momentos do dia — e colocou em duas xícaras, misturando um pouco de erva e açúcar. A Selecionada já se encontrava em uma das poltronas, respirando fundo. Apesar de ter passado por tanto naquela tarde, ela parecia estar calma. Sua expressão era serena, com apenas algumas rugas de preocupação em sua testa. Ela possuía, naquele momento, mais maturidade que muitos adultos dos mais altos escalões da sociedade. E, assim, Aline soube que ela estava pronta.

— Eu sei que você acabou de passar por um evento traumático, mas é extremamente necessário que essa conversa aconteça agora — ela disse enquanto entregava a xícara à outra. — Tenho medo do que pode acontecer com você depois dos acontecimentos de hoje.

— Como assim? — ela segurava o objeto com as duas mãos, tomando longos e lentos goles do chá. — Esse atentado foi por minha causa?

— Não se sabe ainda, mas há fortes evidências que indicam que sim — ela respondeu com cuidado. — E existe toda uma explicação para isso. Preciso que você escute com atenção, só assim você poderá salvar sua vida e a de muitas outras pessoas.

Ela não respondeu, apenas mordeu o lábio inferior, claramente nervosa com as palavras que viriam a seguir.

— Durante a Seleção, a Princesa Eris, a famosa Princesa Perdida, foi muito citada. Com certeza você já conhece muito sobre a história dela e todo o mistério que a envolve. Entretanto, ninguém tinha certeza do paradeiro dela, se é que estava viva, por isso, eram poucos os que ainda tinham esperanças que ela um dia salvaria a Germânia — ela continuou e, notando o olhar aflito da garota morena, percebeu que ela já tinha ideia de qual seria o desfecho daquele pronunciamento. — Então minhas informantes e eu buscamos mais a fundo e encontramos uma certa senhora que morava no interior da Dinamarca com sua filha. Ela dizia ser uma viúva que fugira das maldades do destino na cidade grande para tentar uma vida melhor para as duas junto à Igreja, com a ajuda da caridade da comunidade. Mas com nossas fontes, descobrimos que ela não era o que dizia e que, na verdade, ela fugia dos territórios germânicos com ninguém mais ninguém menos que…

— A Princesa Eris — a garota completou, cruzando os dedos de forma nervosa. — E ela criou a menina utilizando o nome de Lisa Foester em uma simples casa de madeira ao lado da igreja. Essa história conheço bem, ou pelo menos pensava conhecer.

Logo depois de falar, ela encolheu os ombros, ficando ainda menor na grande poltrona de tecido vermelho. Ela estava em choque, tentando absorver todas aquelas informações, juntando-as a todos os conhecimentos que já possuía sobre a história dos Manteuffel. Aline compreendia a angústia, o medo, as aflições. O que Luther fizera à família da então garotinha era horrível, coisa que não deveria acontecer entre pessoas que compartilhavam o mesmo sangue.

E descobrir que alguém tinha tanto ódio pela sua vida era, com certeza, a pior sensação do mundo.

— Eu preciso que você vá ao Reino Unido comigo — a Princesa britânica disse após algum tempo, deixando a xícara de café na mesinha de centro. — A Dinamarca não é mais segura.

— Não, não posso — Layla não conseguiu encarar a outra garota.

— Não é uma questão de poder — ela disse com firmeza. — É uma questão de dever.

— Meu único dever é a Seleção no momento — a outra respirou fundo ao falar. — Se a competição está aqui, eu devo estar aqui também.

— Às vezes eu esqueço o quão pouco você sabe — ela se levantou. — Venha, se aproxime.

Quando a menina parou ao seu lado, Aline moveu um pouco de seu vestido creme, deixando nús seus elegantes ombros. Assim, ela expôs uma marca de nascença alaranjada, cujo formato se assemelhava ao de uma fênix. Depois, ela encostou as frias mãos nos ombros da outra, afastando seus longos cabelos negros e, dessa maneira, revelando algo até então oculto em sua pele alva. Uma marca exatamente igual.  

— Vê essa marca? Todos os primogênitos dos Manteuffel e descendentes a possuem. Todos carregam o fardo de ser o herdeiro da família mais importante da Europa e, automaticamente, têm a obrigação de honrá-la, cada um de sua maneira e com a missão que lhes foi designada — ela explicou, passando os dedos pelo contorno da fênix. — E, no momento, a sua é salvar voltar para seu país e salvar o seu povo das garras de um homem que por tanto tempo os fez sofrer.

— Mas e se eu não estiver pronta? E se eu não conseguir governar? E se Luther cometer novamente um atentado contra a minha vida? — ela questionou, deixando que sua voz alternasse de tom entre o normal e o extremamente agudo, típico de momentos em que os sentimentos tomavam conta. — Não tenho condições, Alteza. Durante todos os meus anos nesse mundo, fui uma simples plebeia, cuja única obrigação era garantir bons estudos para um futuro bom para minha mãe e eu. Ser Rainha… Não consigo nem imaginar.

— Isso corre em suas veias, mesmo que não perceba. Seu pai, Werner, foi um ótimo Soberano. Antes dele, foi Ivor III, seu avô. E assim por diante. A memória deles está em você, está nessa marca que você carrega no ombro — a britânica disse com muita calma, segurando as mãos da prima. — Eu imagino como você deve estar se sentindo. Até para mim, que nunca conheci outro mundo, a nobreza é caótica. Mas entenda. Toda uma nação depende de sua volta, nem que seja simbólica, estando no trono apenas para mostrar o retorno da tão adorada Princesa Perdida e, com ela, o período de glória dos Manteuffel. A Germânia não aguentará mais um ano sob o governo de Luther.

— Eu… Preciso… Pensar

Antes que Aline pudesse impedir, ela já tinha desaparecido.

***

Uma figura de vestido branco passava correndo pelos corredores do Palácio, deixando confuso qualquer um que cruzasse seu caminho. Seus pés se moviam apressados, praticamente planando sobre o mármore perfeito do chão. Seus cabelos voavam soltos, criando uma nuvem negra em volta de suas belas feições, que, no momento, traziam uma expressão desolada. Seus olhos quase se fechavam com o vento que a corrida fazia, e sua visão ficava mais turva a cada passo. Lágrimas banhavam sua face, criando cascatas que ela não conseguia controlar.

“Onde estão meus pais? ”

“Por que Luther fez isso comigo? ”

“Será algum carma, eu nunca desejei mal a ninguém e ele quis me matar! ”

Sua cabeça mantinha um turbilhão de pensamentos conflituosos enquanto percorria quase que toda a extensão de Amalienborg. Ela não era capaz compreender a maldade que existia na alma daquele tirano que fora capaz de trair o próprio irmão e desejar a morte de uma criança inocente. Seu coração se apertava cada vez que ela imaginava as possibilidades, em como as pessoas poderiam ser tão pérfidas. Não entendia como tudo aquilo havia ocorrido. E como, por tantos anos, ela tivera a chance de viver enquanto os pais sofriam. Como ela pudera acreditar em um mundo só seu enquanto tanto acontecia do lado de fora?

Sua mente estava longe, viajando pelos mais diversos mundos, como se a transportasse para novas realidades, para um local onde nada daquilo existia. Distraída, ela nem percebeu as sombras que cruzavam seu caminho. Embalado pela corrida, seu corpo inteiro se chocou com força com outra figura, que estava parada pacificamente em uma das passagens no jardim. Constrangida, ela ergueu delicadamente a cabeça, fitando aqueles tão belos olhos verdes que por tantas noites a fizeram sua alma sentir o transcendental.

— Ei, cuidado — ele disse com uma calma incomum para a situação ao mesmo tempo que mãos grandes, porém delicadas, a seguravam pelos braços. — Aonde vai com tanta pressa?

O rapaz percebeu que os olhos daquela bela criatura se encontravam marejados, como se uma tempestade feroz estivesse no auge de sua força. Seu coração apiedou-se da jovem naquele momento, doeria menos se fosse ele em seu lugar. Um anjo como Layla não deveria esbugalhar-se em lágrimas, pois era como se seu anjo estivesse sucumbindo a uma eterna agonia.

— O que houve? — questionou ele, sujando um pouco os braços finos da garota com a terra molhada que cobria suas mãos. — O que a aflige tanto, minha adorada?

A respiração da jovem continuava esbaforida e as lágrimas continuavam a cair copiosamente sobre sua pele leitosa. Layla tentava balbuciar alguma palavra, por menor que fosse, mas nada coerente saia de seus lábios.  A Germânia, seus pais a mercê de um malfeitor, ser uma princesa perdida, pivô de uma guerra…. Nada que pudesse ser decifrado pelos ouvidos do garoto.

Ele, então, mesmo sem entender os motivos de tudo aquilo, a entrelaçou gentilmente em seus braços, acariciando sua comprida e ondulada cabeleira negra. Em seu abraço, até aquele dia tão frio de outono parecia soprar os ventos quentes de verão. Desde o momento quando a viu pela primeira vez sentiu algo indecifrável, era como se fossem conectados por um elo mágico. Quando ela chorava, seu coração sofria. Quando sorria, sua alma sentia-se alegre. Não se tratava de um sonho, era muito mais que isso.

— Acalme-se — ele pediu, com um ar na voz que causava um suave formigamento em seu couro cabeludo. — Venha, é melhor você sair daqui e ir a um lugar mais calmo, sem toda essa aura pesada sobre você.   

O garoto limpou as gotas d’água que se acumulavam na face da menina, passando seus dedos de forma cuidadosa e carinhosa pela pele quase que perfeita, mas com tantas manchas avermelhadas consequentes do atentado, dela. Sua calma era imensurável, não havia nenhuma hesitação, nenhuma dúvida de seus movimentos. Por mais que os dois tivessem desenvolvido uma relação de confiança em seus breves contatos anteriores, nenhum toque como aquele havia ocorrido. Logo, a mão dele estava nos cabelos dela, seguindo todo o percurso dos fios negros pelas costas. Mesmo com toda a estranheza que sentia ao receber carinho dessa forma de alguém que ela não conhecia há muito tempo, Layla, de uma forma estranha, sabia que precisava daquele aconchego, de toda tranquilidade transmitida por ele.  

Assim, de mãos dadas, os dois enfrentam a escuridão da noite juntos, sendo a lua a única testemunha daqueles passos. Ela, completamente cegada pelas lágrimas, não via o caminho que percorriam, apenas seguia o andar firme daquele jovem em quem ela tanto confiava e que a guiava por passagens desconhecidas por muitos. As ruas pouco movimentadas dos arredores de Amalienborg foram cruzadas com rapidez. A luz dos carros, que quase não conseguia ultrapassar a névoa que cobria o chão da cidade como um cobertor, passava com celeridade por eles, como se fossem um turbilhão de raios em uma tempestade. Logo, então, os pés da menina, de forma tão simples envolvidos por uma sapatilha de pano, tocaram um mármore que fazia com que correntes de frio se espalhassem por seu corpo.

Quando subiu dos cinco degraus que a separavam do exterior, o rapaz ao seu lado empurrou a grande porta verde água, enquanto envolvia seus ombros com segurança.  Segundos depois, Layla se deparava com uma das mais belas visões que já tivera em sua vida, e, por um simples instante, todas as consternações que tomavam conta de sua alma pareciam desaparecer.

Um grande — porém não contornado de adereços, por conta das crenças protestantes — altar no fundo do ambiente trazia uma imponente cruz dourada, representando a presença sagrada no local. Ali eles estavam sendo olhados por Deus, e ela sentia a presença Dele. Seu coração transbordava em harmonia e ali ela sentia que estava protegida, que Luther não poderia tocá-la. Naquele momento, naqueles segundos ou horas de paz, ela tinha a chance de apreciar a calma que, desde o início da Seleção, não fora capaz de apreciar. Como se ela estivesse novamente em casa, rezando com sua mãe na pequena capela da cidade.

Apenas a fraca iluminação externa entrava pelas janelas elevadas do local, fazendo tudo parecer mais íntimo. Para Layla, só ela e seu acompanhante estavam ali, sozinhos. Não havia o que temer e ela, finalmente, poderia se sentir segura, poderia chorar sem ser julgada. E era isso mesmo que ela fazia, sentada em frente ao altar, sendo observada pelos olhos atentos do rapaz ao seu lado.

— Eu… Sou a Princesa da Germânia, que esteve perdida por mais de 17 anos — ela finalmente revelou, virando-se para ele. — Por tanto tempo, eu estava aqui na Dinamarca, sendo protegida por uma bondosa mulher que abriu mão de tudo para meu bem-estar, enquanto meu povo morria nas mãos de meu tio, um horroroso Rei e ditador. E agora devo voltar, assumir o que é meu. Não estou pronta… Isso tudo está acontecendo tão rápido. Eu estou tão confusa.

Ela soluçou mais um pouco, inclinando o corpo para frente. Com seus braços fortes, ele a segurou, envolvendo-a mais uma vez em um abraço apertado. Por mais alguns longos segundos, os dois permaneceram em silêncio, apenas aproveitando a presença um do outro. Até que ele, levantando o queixo dela com o dedo indicador, falou, massageando sua bochecha com a outra mão.

— Não é culpa sua. O destino quis assim, o Senhor traçou as linhas de sua vida. Assim como a guiou para mim, ele também a trouxe para essas terras e, agora, a leva de volta a suas origens — ele pronunciou cada palavra com muita clareza, como se lecionasse a uma criança. — Não podemos atribuir a nós fatos que só o céu pode revelar.

Ela o encarou no fundo dos olhos. Layla, em um ímpeto de coragem que lhe brotou no corpo, aproximou-se lentamente do belo rapaz, tocando em seu rosto carinhosamente ela encostou os lábios rosados aos dele, fugaz, docemente e acima de tudo apaixonada. Naquele gesto de puro afeto sob a presença do Altíssimo, a moça sabia que aquele homem à sua frente era seu predestinado.

O rapaz, deleitando-se naqueles sentimentos tão opíparos e puros que nasciam em seu peito, retirou do bolso de sua jaqueta uma pequena caixinha de madeira.

— Você merecia muito mais que isso, mas no momento não posso oferecer mais e também não consigo mais a ver chorando dessa forma. Eu sei que nos conhecemos a pouco tempo, naquelas poucas conversas que trocamos nos jardins, entretanto o que eu sinto por você não pode ser explicado. É algo que vem do fundo da minha alma — ele admitiu, com uma timidez que antes não demonstrara em sua voz. —Toda vez que sua beleza, bela como a noite, como diz o nome, de corpo e espírito me toca,  está salvando meu coração de viver em eterna escuridão. Eu quero você como minha companheira eterna, não saberei viver sem a alegria de viver ao seu lado. Sei que estou pegando você de surpresa, que nunca dei, e nem deveria dar, indícios disso. Mas, depois de vê-la tão triste, soube que não poderia deixá-la escapar... Eu quero você como minha esposa.

Ele, então, revelou dois simples anéis feitos, provavelmente, com um simples metal achado nas ferragens dos arredores do Palácio, mas que se tornavam únicos por contas dos adornos delicados com flores. As pétalas pequenas das cores azul e amarelo, que se cruzavam em volta da circunferência, significava a tranquilidade, a serenidade, a harmonia e também toda a alegria que a menina de cabelos negros sentia naquele momento. Pela primeira vez depois do choque das revelações de Aline, ela sentia seus olhos lacrimejando de felicidade, como se toda a angústia anterior tivesse sumido. As palavras do rapaz propunham algo tão desconhecido, tão novo e até assustador para ela, mas, mesmo assim, traziam o sossego, a certeza de um futuro que ela antes não tinha.

— Layla Sophie Foester, neste mundo de tamanhas incertezas, eu posso afirmar que não sou um homem de muitas posses e riquezas, meus bens materiais são poucos e talvez indignos de uma moça como você, porém possuo algo que estou disposto a entregar-lhe com toda minha alma e que ninguém jamais o fará com os mesmos sentimentos que meu coração. O que sinto vai além de todas as superficialidades — ele inseriu delicadamente o anel no dedo da jovem, que em nenhum instante deixou de encará-lo com um sorriso estampado no belo semblante, encantada e emocionada com cada palavra. — É com você que desejo dividir todos os anos restantes, desejo que seja minha eterna companheira, a futura mãe de meus filhos, pois a tenho como minha alma gêmea e para ti entrego todo meu amor.

— Jebediah Solberg, estrela que embeleza meu céu, sua luz equivale a uma miríade, você chegou devagar em minha vida, de uma maneira surpreendente, que nem meus sonhos puderam prever. Quando meu olhar cruzou com o seu, foi algo efêmero, mas simultaneamente foi como se uma intensa ventania preenchesse a todos os cantos. Este vento, está doce e bela sinfonia, era você, que tomou conta de todos os espaços do meu coração e alma, ocupando o lugar como o maior tesouro das lembranças que perpassam minha mente. Eu já sabia naquele instante que pertencemos um ao outro, neste exato momento apenas estamos selando o que já sabíamos há muito tempo — ela imitou o gesto do amado, colocando a pequena peça de metal em seus dedos com a elegância de uma verdadeira Princesa, como se estivesse tendo seu matrimônio na mais requintada das catedrais europeias. — Os anjos e o Senhor são nossas maiores testemunhas agora e isso só prova que nada e nem ninguém poderá nos separar, meu amado. Não iremos temer o destino que a vida nos propuser, pois em muitos capítulos desta eternidade nos reencontraremos, talvez com outros rostos e nomes, contudo com os mesmos sentimentos.

Os dois tocaram os lábios novamente, selando aquela união da maneira mais singela e honesta. Os dedos da garota deslizaram um tanto vacilantes pelos cabelos castanhos dele, puxando-o para mais perto. As mãos dele seguraram as costas dela, fazendo movimentos leves. Naquela posição, suas almas eram capazes de se abraçar, como se fossem feitas para fazer aquilo. Layla nunca mais queria sair dali, nunca mais queria se afastar daquele rapaz.

Suas ações ficavam cada vez mais íntimas. E a emoção os fez percorrer alguns metros até os porões do Palácio, onde se encontravam os aposentos dos criados e, inclusive, o de Jeb. O lugar era pequeno, sem todo o luxo que era encontrado no andar de cima, mas, mesmo assim, ela se sentia como a mulher mais rica do mundo. Rica de sentimentos, rica de amores.

A jovem pouco entendia daquele momento tão estranho, novo e ao mesmo tempo tão intenso para ela. Estar sozinha ali tão próxima àquele rapaz tão adorado fazia com que seus pelos se arrepiassem. Somente desejava sentir o calor daquele corpo abraçando o seu e as volúpias que o rapaz estava sendo capaz de despertar nela.

Seria um pecado?

Sentiu as mãos do jardineiro afastando uma parte de seus cabelos negros para o lado, um arrepio percorreu seu corpo. Ele beijou-lhe nos ombros ainda cobertos pelo tecido branco e, em seguida, a dobra de seu pescoço. Seu corpo foi girado de frente para o dele. Beijaram-se novamente. Intensamente.

E agora era de verdade. Ela era dele, e ele era dela.

Naquela noite, eles pertenciam somente um ao outro, seus corpos pareciam querer explodir com tantas novas sensações e prazeres imensuráveis. E com um encontrar final de lábios, o rapaz girou para o lado, deitando naquela cama simples, ambos estavam com a respiração ofegante e corações frenéticos quando finalmente permitiram-se descansar. Eram apenas jovens com a esperança de um final feliz, de um futuro incerto.

E se o nosso amor fosse um livro de histórias

Nós nos conheceríamos bem na primeira página

E o último capítulo seria sobre

O quanto eu sou grato pela vida que fizemos.

O plebeu se apaixonou pela princesa...

Breathless – Shayne Ward

Rigshospitalet significa o Hospital do Reino e é o hospital nacional da Dinamarca. Ele faz parte do Hospital Universitário de Copenhague. Nele nasceram os quatro filhos da atual Princesa Herdeira da Dinamarca (Christian, Isabella, Vincent e Josephine) e também as quatro crianças do Príncipe Joaquim (Nikolai, Felix, Henrik e Athena).


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Notas finais do capítulo

AI, GALERA, SEI NEM O QUE DIZER!!!
AAAAAAAA O QUE VAI ACONTECER COM A ULRIKA E COM A ISABELLA?
E O QUE FOI ESSE CASAMENTO IMPROVISADO??? VOU MORRER DE AMORES POR ESSES DOIS, MAS MESMO ASSIM AINDA TEMOS UMA QUESTÃO: LAYLA VAI À GERMÂNIA PARA REIVINDICAR O TRONO QUE É SEU POR DIREITO?
Ai, ai, muitos questionamentos, muitos acontecimentos....
Espero de verdade que vocês tenham gostado!
O próximo (tão louco quanto esse) sai (se tudo der certo e vai dar!) semana que vem, dia 30/03
Até lá e até os comentários!
xoxo ♥ ACE



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