Os jardins do Palácio de Amalienborg estavam lotados como nunca estiveram antes. Crianças corriam e gritavam por toda a extensão da grama. Adultos conversavam com seriedade certamente sobre os assuntos mais leves — se é que isso era possível — da Guerra. Garotas riam em vários cantos do local, deslumbradas com seus vestidos novos. E Alexander estava ali, parado no meio daquilo tudo, pensando em por onde começar.

Mesmo sabendo que a mãe estava conversando com o intimidador Imperador soviético, o menino conseguia sentir o olhar julgador dela sobre ele. Provavelmente, ela não via a hora de ele falar com suas amadas pretendentes. A final, quanto mais ele as conhecesse, mais rápido ele encontraria seu amor. Mas o problema era que… Bem, não era tão simples quanto todos pensavam…

Qual dos grupos seria o primeiro? O que estava perto da mesa altamente decorada dos doces? Ou seria melhor o que estava mais ao canto? Ou será que aquelas a sua esquerda, com quem ainda não havia tido uma conversa decente, eram suas melhores opções? Eram as perguntas que se passavam na mente do jovem, enquanto a única coisa que tinha coragem de realmente fazer era encarar. Talvez elas viessem conversar com ele, não é mesmo?

— Contemplando a beleza das futuras princesas? — questionou uma voz feminina aguda vinda de trás do herdeiro, que se assustou.

Lentamente, o par de olhos castanhos direcionou seu foque para a garota — praticamente uma mulher — cuja cabeleira extremamente loura entregou sua identidade. Alicia Larsen. A antiga menininha da longínqua época, 12 anos antes, em que se conheceram, agora era uma adulta bem sucedida. Com certeza, ela não o chamaria para uma brincadeira como daquela primeira vez, mas o sorriso que tinha no rosto era o mesmo. E o corpo, mesmo tendo crescido muito, ainda chamava a atenção do nobre, ainda mais com o vestido azul florido que marcava suas curvas.

— Henrik está tendo mais problemas que você, não se preocupe. — disse ela, olhando para o irmão mais novo, que tinha em sua volta a Princesa Luísa do Império Latino Americano e a Princesa Lara do Império Soviético. — Tão novo…

— Pelo menos ele não terá uma Seleção — afirmou ele, olhando para os sapatos perfeitamente engraxados e tentando esconder a risada que insistia em se formar em sua garganta, já que soltá-la naquele momento seria uma tremenda falta de amor próprio — Nenhum dos meus irmãos terá, na verdade,

— Sorte sua e azar das meninas! — exclamou ela, com uma expressão maliciosa acompanhada de uma gargalhada suave. — Imagine 35 rapazes lindos e maravilhosos rondando esses corredores competindo pelo coração delas! Você iria enfartar!

— Não iria não! — ele se defendeu, empurrando-a de leve, já totalmente solto na primeira conversa totalmente informal que tinha desde o começo da competição. — Elas fazem o que querem da vida delas!

            A jovem embaixatriz direcionou seus belos olhos verdes para ele, erguendo as sobrancelhas. Não existia maneira de esconder qualquer coisa dela. Ela o conhecia desde muito pequeno, desde as primeiras palavras escritas, as primeiras decepções escolares e amorosas e, enfim, desde sempre. Eles eram quase membros da família um do outro.

— Eu conheço você, Alexei. Vi-o no dia que em que Saphira nasceu. Chorou mais que ela. E no dia que viu as gêmeas com o uniforme da Academia pela primeira vez, só faltava matar as duas de asfixia, de tanto que as abraçou. Suas pequenas joias — lembrou a moça, com um sorriso repleto de nostalgia — Admita, você já está pirando pelo simples fato do pretendente de Ingrid estar aqui.

Ele balançou a cabeça levemente, relutando em aceitar que estava exatamente como a ex-colega descrevera. Mesmo sem admitir e tendo tantas garotas para tirar a sua atenção, ele ainda se preocupava com as irmãs. A pequena Phinny com sua fragilidade; a extrovertida, porém, um tanto ingênua Bella; e a inteligente e pura Ingrid. Alicia sabia daquilo de maneira que ele não gostaria que alguém soubesse. Na verdade, ele esperava que todos pensassem que ele fosse um futuro Rei centrado e completamente focado no governo, mas a verdadeira alma de alguém não poderia ser escondida.

— Falando na pequena… — disse a garota sorrindo para a miúda figura loira vestida de maneira simples com uma blusa azul de bolhinhas e uma bermuda marrom. — Ela cresceu muito em pouco tempo, não é mesmo?

Antes que ele pudesse responder, porém, a princesinha viu a dupla de amigos. Seus olhinhos cor de céu brilharam ao rever a tão amada Alicia. Dentro do possível, então, ela correu até onde eles estavam — a alguns metros do local onde as crianças brincavam. Seus sapatinhos azuis escuros se fundiam à grama verde, já que se recusavam a pisar nas pedras novas estrategicamente colocadas pelo caminho. Assim que chegou, pulou no colo da loira mais velha, envolvendo as pernas finas em sua cintura.

— Liz! Senti tanta a sua falta! — admitiu Saphira, com o olhar carregado de alegria.

— Até parece que não nos vimos hoje na recepção — respondeu a mais velha, beijando a bochecha da pequena amiga, com um amor quase que de uma irmã.

— Aquilo era muito formal, não contou — explicou a menina, rindo. — Não podia conversar direito com você no meio da cerimônia...

— Verdade… Temos tantos assuntos para colocar em dia. Todas essas fofocas sobre a Seleção — disse ela, sorrindo malevolamente para a criança, que retribuiu com uma imitação fofa. — Para isso, Alexei, precisamos que você vá embora.

— As Selecionadas estão esperando por você — afirmou a caçula, apontando com seus dedos finos para um canto perto da mesa amarela de bebidas.

Indignado com a audácia delas, porém ainda sim rindo da situação, ele levantou as sobrancelhas. Mais uma vez, elas o incentivaram a continuar o caminho. Sem ter outra opção, — já que ainda estava totalmente perdido na festa — ele se virou na direção apontada, agora podendo ver seu novo desafio claramente. Tratava-se de um grupo de três garotas, duas morenas e uma ruiva, que conversavam animadamente, porém com discrição. A cada passo que o príncipe dava, os belos desenhos de seus vestidos e seus graciosos traços ficavam mais nítidos, já podendo ele reconhecê-las. Layla, Mabelle e Laryssa. Ao perceber isso, ele deu um suspiro aliviado, pois ao menos já havia tido contato com todas elas. Entretanto as pergunta ainda rodeavam sua mente:

Como ele as abordaria? Simplesmente cumprimentando-as? Ou seria melhor algo mais formal?

Antes que pudesse pensar mais um pouco, seu corpo se curvou em uma reverência sem nenhum comando consciente, já acostumado com os tantos membros da realeza que encontrava quase que diariamente. Da mesma forma que o corpo, seus olhos também se moveram sozinhos para a cabeleira cor de fogo mais à esquerda. Antes que pudesse se queimar com todo o calor proveniente daqueles fios, entretanto, ele recobrou sua lucidez, voltando a atenção para todas de forma uniforme novamente.

—Bom dia, senhoritas — ele arriscou, retribuindo os sorrisos que elas lhe dirigiam. —Apreciando a festa?

— É muito difícil dizer que não, Alteza — respondeu Mabelle, passando os dedos nervosamente por seu vestido leve cor de pérola, que tinha brilhantes incrustados delicadamente no corpete. — O grupo que organizou essa parte do evento realmente foi ótimo.

— Fizemos nosso trabalho com muito carinho, tenho certeza que o de vocês também está estupendo — tranquilizou Laryssa, a ruiva, passando a mão pelo braço da concorrente. —O mais importante mesmo é que Henrik goste e aproveite, já que, apesar de tudo, ainda é o aniversário dele.

Simultaneamente, os quatro olharam para o outro lado do jardim, onde três adolescentes de aproximadamente a mesma idade — 14 ou 15 anos — conversavam.  Entre eles, duas figuras femininas que chamavam mais a atenção, uma loira muito branca e uma morena de traços latinos, ambas muito formosas.  O vestido branco, azul escuro e salmão da nortista praticamente se fundia ao tradicional verde com muitos detalhes da sulista, tanta era a proximidade do pequeno grupo. O único garoto, trajando um terno cor de terra que antes pertencera ao irmão quando tinha a mesma idade, sorria para as duas, porém para uma em especial. E, apesar de nunca ter conversado sobre isso com o mais novo, Alexei sabia o porquê, o que o fez rir por dentro antes de lembrar que aquela era a única parte feliz do aniversário para o aniversariante.

— É um tanto triste dizer isso, mas ele já está acostumado com a falta de atenção. Sendo o quarto filho e tendo uma frágil garotinha como irmã mais nova, o carinho de nossos pais nunca sobrou para ele... — contou ele, voltando novamente o olhar para as pretendentes, que fizeram o mesmo. — Mas sei que ele já está feliz pelo simples fato da melhor amiga dele, a Princesa Lara, estar aqui.

— Não sei se essa pergunta não é um tanto indelicada, mas a farei de qualquer maneira — questionou Belle, com um olhar curioso. — Ele é apaixonado por ela?

— Ah...  — respondeu ele com uma risada fraca e pensando em como o irmão era óbvio. — Henrik não é muito de se abrir sobre esse tipo de assunto. Ainda mais quando se trata de uma possível inimiga de nosso país...

— Vou ter de ser inconveniente mais uma vez, vice não me deixa opção — dessa vez, os dois riram juntos. — O Império Soviético é nosso inimigo?

Sinceramente, não sei. O Imperador tem se mostrado muito confuso, está demorando a dar a palavra final sobre que lado ficará — admitiu o Príncipe, dando de ombros. — Mas, enquanto isso, temos de ter o máximo de cautela possível, para evitar maiores problemas.

— Falando nisso, ouvi dizer que a Arábia Saudita declarou a junção de suas forças armadas com a Turquia e a Germânia — disse Layla, arregalando seus belos olhos verdes. — E Alba está aqui, então... Significa algo?

— Esse assunto é um pouco mais delicado... Mas não há nada com que se preocupar, nenhuma bomba ou coisa do tipo irá cair sobre nós — o garoto assegurou. — Alba sabe o que está fazendo.

— Eu sei que esse é o tópico do momento e que tem muita relevância, mas... —a ruiva disse, soltando um leve suspiro. — Desculpem-me. É horrível conversar sobre ele num evento tão festivo...

— Concordo, Senhorita Laryssa — ele assentiu, sorrindo para a dama. — Temos de aproveitar os últimos momentos de paz em nossa competição, os últimos momentos em que poderei realmente conhecê-las antes que a verdadeira confusão comece.

— Então porque não aproveita? — perguntou Mabelle, quase que em uma afirmação. — Você está aqui, nós estamos aqui, todos sem outros afazeres urgentes. É a hora certa.

Todas as frases que seguiram as palavras da morena foram agradáveis. De uma forma suave, as três Selecionadas conduziram o Herdeiro ao Trono pelos mais diferentes assuntos, o levando a conhecê-las cada vez melhor. Uma alegria que nunca pensara que teria na competição, uma aproximação que realmente o fazia ser feliz. Ele sabia que, mesmo se nenhuma delas ganhasse a competição, ele ao menos tinha encontrado amigas.  Amigas que, um dia, poderiam se tornar tão boas para ele quanto Alicia era, pessoas com as quais poderia contar sempre.

E, o melhor de tudo, era que, depois de toda aquela conversa, o jardim parecia menos lotado. A intimidade que Alexei tinha com os vários ambientes do Palácio, a qual estava sumida desde que a competição começara, finalmente voltara, trazendo à tona mais uma vez todo o calor que o envolvia desde a infância.