O Pássaro do Gelo escrita por MaNa


Capítulo 12
Capítulo 11


Notas iniciais do capítulo

Oi, oi, capítulo mais longo ! E nesse eu quero muuuiiitttoo a opinião de vocês.

Aproveitem.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/539097/chapter/12

Capítulo 11

Camila estava prestes a ir dormir quando notou algumas folhas que haviam passado despercebidas no fundo da pasta. Pegou-as ansiosamente e quase pulou de alegria ao perceber qual era o conteúdo. A mãe resolvera fazer uma surpresa. A menina estava diante do próximo capítulo!

O relógio já marcava meia noite. O certo seria ir dormir, amanhã teria aula e o encontro tão sonhado com Bruno. Sim, ela deveria ir dormir, precisaria estar bonita, sem olheiras e completamente ligada, não podia se dar ao luxo de permanecer acordada para ler algo que no outro dia estaria igualmente disponível aos seus olhos e mente. Não, não tinha necessidade disso.

E Camila iniciou a leitura.

O dia 31 de outubro chegou. Para alguns esse é o período em que os espíritos podem entrar e sair do mundo dos mortos para os dos vivos com facilidade, pois o véu entre eles está mais tênue. Um dia repleto de magia, lendas e ritos... Para outros é apenas uma data festiva.

Recebeu vários nomes ao longo dos tempos, por diversos povos, e foi comemorado de formas diferentes. Para os celtas, por exemplo, simbolizava a passagem de ano.

Futuramente viraria uma data comemorativa: o famoso “dia das bruxas”.

Porém, para as fênix, o dia 31 de outubro, ou mais especificamente a sua noite, é o mais terrível e assustador do ano. Não por causa de bruxas ou espíritos, (com esses os pássaros do fogo sabiam lidar). Não... A razão para o desespero começar a assolar os corações daquelas belas criaturas, desde cedo, durante a chegada da data, é que essa é a noite em que as dimensões se abrem. A noite em que a lua está linda: extremamente brilhante e com uma aura misteriosamente vermelha. É o momento em que destinos de famílias são decididos em poucas, contudo, longas horas.

A lua ilumina a floresta. Os humanos conseguem enxerga-la. O pique esconde, a caçada e, por vezes, a guerra inicia-se. A maldição continua.

Sim, definitivamente é a pior noite do ano para os pássaros do fogo.

Naquela manhã, o povo já se movimentava atarantado em direção às cavernas. Cada uma das Vilas escondia-se em seus refúgios, a maioria cavernas subterrâneas, onde permaneciam até “a noite da praga” acabar. A Vila de Almira levara os mantimentos no dia anterior para os esconderijos com a intenção de não esquecer nada importante. As armas foram distribuídas igualmente entre todos, apenas os soldados carregavam algo a mais (pois, em um conflito direto, eles é quem iriam se pôr a lutar e morrer pelo povo antes que qualquer outro inocente tivesse a necessidade de defender-se). Todos, exceto Mayta. A garota, mesmo com dezoito anos, não podia portar nada, nem sequer uma faca. As pessoas tinham medo dela e não existiam argumentos, nem mesmo se Almira ordenasse, o povo aceitaria. Então a menina permanecia indefesa.

Pelo menos em teoria.

–Tome.

–O que é isso, Vougan?

–Um tipo de lâmina.- Era uma pequena faca com um cabo fino de madeira.

–Mas...

–Não discuta. Prenda seus cabelos com isso, de forma que a lâmina fique escondida. Vai parecer que o cabo é apenas um desses palitos que vocês, garotas, usam de vez em quando.

–Por que faz essas coisas por mim, Vougan? Você deve ser o homem mais incrível (e que meu pai jamais me escute dizendo isso) que já conheci!

Vougan deu seu melhor sorriso convencido e beijou carinhosamente a testa da prima.

–Eu te amo, Mayta. Deixe disso. Vamos, temos muito a fazer antes da noite cair.

Perto dali uma senhora de cabelos brancos avermelhados tinha vestido seu único vestido, guardado para um disfarce caso sentisse necessidade, e saído da floresta. O grupo de caçadores para quem ela tinha enviado a carta já estava a sua espera.

–Olá, jovens.

O mais velho, um cara branco de olhos odiosos e cabelos castanhos bem lavados, aproximou-se se separando dos demais. Ao todo deviam ser uns cinquenta homens, haviam armado seu acampamento ali mesmo, bem próximo onde deveria ser a floresta que, no momento, ainda estava oculta, invisível, como se fosse uma grande planície aos olhos humanos, mas onde, durante a noite, seria revelada uma imensa mata. Os ali presentes buscavam aventuras, dinheiro, diversão e, alguns até, vingança.

Era o caso de um rapaz moreno de cabelos curtos, em um corte militar, alto, com olhos muito pretos. Ele fingia não prestar atenção no líder que discutia com a velha.

–O que quer comigo, senhora?

–Lhe entregar a espécie mais rara de fênix.

–E qual seria? Só conheço uma e elas por si só já valem muito.

–O senhor já ouviu falar da fênix negra?

– É uma lenda...

–É a razão do senhor conseguir entrar nesta floresta.

O homem ponderou.

– Mesmo que essa criatura exista, você é uma fênix. Posso ver em seus olhos, são vermelhos, um vestido não esconde isso, por que trairia seu povo?

–Motivos pessoais. Não o interessa, meu caro, não o interessa...

O caçador irritou-se com a resposta evasiva da mulher, porém nunca fora bom com palavras, estão decidiu colocar de lado sua curiosidade.

– O que quer, mulher? Vá direto ao ponto, tenho mais o que fazer...

–E se eu lhe entregasse essa fênix? E se eu lhe disser que você pode ser o dono da fênix mais exótica que já existiu? O que me dirá?

–Direi que estou disposto a negociar... O que você quer como pagamento, velha?

Os olhos da senhora pareceram queimar. Tudo iria ocorrer como planejara.

–Nada demais, um preço pequeno para um caçador como você...

–Diga logo!

Ela sorriu. Um riso amarelo e perverso.

–Quero a morte de uma rainha.

O rapaz, que escutava tudo do lado discretamente, se arrepiou.

Mayta estava na caverna encostada em uma das paredes afastada dos outros. Era tardezinha. Quase todos já estavam lá. Almira e Breno discutiam algo em uma das fendas privadas. Vougan se encontrava junto aos guerreiros, pois agora era também um deles. Alana e Marlon arrumavam as pessoas na caverna, tentando deixa-las confortáveis e Elvira consolava umas crianças que tinham medo.

“Que conveniente”, pensou o pequeno espião. Tinha treze anos e trabalhava para Chad há uns cinco. Aquela, no entanto, era a operação que menos tivera vontade de fazer. Apenas topou por também temer a garota dos cabelos de ébano. A ancestral dela jogara a praga que tirou a vida de seus pais, ora bolas! Ele os estaria vingando.

O que o menino não sabia é que sua próxima frase não apenas lhe daria sua vingança. Teria consequências muito maiores. Muito maiores.

–Mayta, me ajude, por favor!- aproximou-se da mulher com cuidado, porém tendo a certeza de que expunha sua melhor cara de assustado.

– Calma. O que houve?- Apesar de nunca ter visto o rapaz, ela não estranhou que soubesse seu nome. Todos sabiam. Todos o odiavam.

– É uma senhora... Eles a envenenaram, sei lá, não consigo trazê-la sozinho até a caverna e minhas lágrimas não a estão curando.

–Acalme-se, vamos procurar a rainha ela saberá o que fazer...

–Não dá tempo! A rainha está muito ocupada. Para quê perturba-la com isso? Vamos, vamos só nós dois, tenho certeza que juntos a traremos em segurança e aqui poderemos ajuda-la.

–Não sei...

–Seria um ato corajoso, talvez as pessoas a respeitassem por isso. Principalmente se fizer sozinha...- Sim, o garoto jogara sua isca. Ele sabia da história que Alana tinha contado a filha, ele estivera na janela observando as duas tontas. Era um bom espião no fim das contas... Agora a informação estava lhe sendo extremamente útil.

Mayta pensou por um instante. As palavras de sua mãe saltavam em sua cabeça como se gritassem.

“Acho sinceramente que sua tia espera um ato como o dela vindo de você.”

–Ok, vamos.

Saíram da caverna bastante desconfiados.

–Por que resolveu me chamar e não aos guardas, garoto? Acaso não tem medo de mim ou me odeia?

–Não. Na verdade, tenho pena de você.

“Ótimo, uma criança tem pena de mim, eu mereço! ” Pensou.

–Pena?

–Sim, você é sozinha, todos a odeiam. A chamei para tentar ajudá-la a ser mais amada. Um ato heroico pode mudar tudo, sabe?

Mayta suspirou lembrando da tia.

–Sei sim...

Por um instante olhou bem para o pirralho. Será que ele estava falando a verdade? Pela primeira vez, desde que saíram da caverna, desconfiou da expressão defensiva do menino.

Percebendo o desconforto da fênix do gelo o garoto apressou o passo.

–Vamos, estamos chegando.

A velha estava deitada em uma clareira.

–Senhora, senhora, você está bem?- perguntou Mayta, assustada.

A noite já tinha caído há uma hora.

–Não, minha filha, eu... N-não... Consigo respirar direito...

–O que fizeram a senhora? Por que as lágrimas do garoto não a estão curaram?

–E-e-eu... Não sei...

–Venha, vamos andando, eu a ajudo...

Os três caminharam lentamente de volta a caverna. Quando já estavam bem perto da entrada o menino gritou:

–Ajudem, ajudem por favor!

–Quieto garoto! Está maluco? Pode atrair caçadores e...

Porém Mayta não teve tempo de terminar. Uma onda de homens armados apareceu descendo das árvores, saindo das moitas ou de qualquer lugar em que um ser humano pudesse se esconder.

Todos tinham um único objetivo: Atacar a caverna.

As fênix foram pegas de surpresa, mas lutaram! Muitas correram para fora do esconderijo desesperadas e foram capturadas por armadilhas montadas ali previamente.

Aquilo não estava certo. Mayta tentava entender o que estava acontecendo, mas nada fazia sentido...

Em meio ao alvoroço, Almira encontrou os olhos da sobrinha e seus próprios olhos dourados pareceram perguntar cheios de decepção: Por que fez isso?

Foi então que viu Chad. A velha que não mais se segurava nos braços de Mayta, a velha que parecia estar muito bem obrigada.

Chad não devia estar ali. Devia estar protegendo sua própria Vila, Almira sabia disso, então por que estava ao lado de Mayta? A garota parecia tão assustada...

A rainha finalmente entendeu. Viu o garoto também amedrontado e o reconheceu. Era um pivete que a andava seguindo de tempos em tempos. Ela o notara há uma semana, porém andava tão atarantada com os preparativos para aquela noite que decidira deixar para investiga-lo depois. Como foi burra. Chad provavelmente tinha enganado Mayta e levaria a morte metade da sua Vila.

O ódio tomou conta da rainha.

A velha por sua vez transformou-se em pássaro e saiu voando para longe. Almira a seguiu.

Mayta, vendo que sua tia perseguia a idosa, foi atrás. Sentia-se confusa e culpada por tudo aquilo. Suas asas negras nunca bateram tão rápido.

Quando assumiram a forma humana, em uma parte da floresta afastada de todas, as três encararam-se.

–Senhora.- Cumprimentou Chad de forma sarcástica.

–Como pôde...? - Perguntou Almira- Você nos traiu! Essa noite metade de minha Vila vai morrer, Chad, e você vai pagar caro por isso!

A rainha andava e seu poder era tanto que as plantas no chão morriam com o calor que emanava.

–Posso até morrer, minha senhora, mas vou levar aquela a quem você se esforçou tanto para proteger... – Dito isso, Chad tirou de seus próprios cabelos uma faca, parecida com a de Mayta, a atirando na direção da jovem, inesperadamente, e com uma precisão incrível. Mayta estava mais próxima da tia que da velha, contudo tão distraída com as ameaças que por um triz quase não se desviava da faca. Porém conseguiu.

A rainha tinha perdido o folego por um instante, mas vendo que a sobrinha estava bem, recuperou-se e gritou.

–Saia daqui Mayta, esconda-se, esse assunto é me...- Uma flecha atingiu-a no peito. Perfurou de uma forma infalível, não direto em seu coração, mas em um ponto onde a morte seria irreversível.

O que aconteceu em seguida foi assustador.

A lua parecia estar completamente vermelha, da mesma cor do sangue da rainha que escorria em uma velocidade aterrorizante.

Mayta gritou, um grito de dor, não no corpo, mas na alma e correu em direção a Almira que estava jogada no chão tremendo.

O caçador que atirara a flecha fitou a velha e, em silêncio, foi embora. A recompensa dele ficaria para depois, tudo estava combinado.

Chad sorriu vitoriosa. Foi melhor do que tinha imaginado. Transformou-se em pássaro e se foi.

–Senhora, não, por favor... Aguente eu vou chamar alguém eles vão lhe curar, eles...

–Mayta, pare. – Falou com dificuldade a rainha- Não vai adiantar. Eu vou morrer... Não há... Tempo. Só... Fique aqui...Não quero ficar sozinha...

–Então transforme-se em pássaro! Ai renascerá e...

–Sem... Forças... para... uma transformação.

–Mas Senhora...

–Tia.

–O quê?

–Sou sua tia.- A voz da rainha saiu fraca, mas séria e terna ao mesmo tempo.

Mayta chorou, chorou muito. Suas lágrimas caíram na boca de Almira e esta sorriu. Sim, as lágrimas da garota curavam mazelas da alma. A rainha sentiu-se em paz. Não tinha dor alguma.

–Desculpa tia, isso é tudo minha culpa...

–Tudo não... Talvez... Metade.- a rainha cuspiu sangue- Mas eu a perdoarei, se você me prometer que vai ser boa, Mayta. Que honrará o nome de sua avó.

–E-e-eu prometo.

–Bom, que bom. Pois eu disse a Breno que você será a nova rainha.

–O quê?

–Ele irá lhe explicar querida... Ele... – Mas a rainha cuspiu mais sangue e seus olhos se fecharam pela última vez.

O que aconteceu em seguida virou lenda entre os pássaros do fogo.

Primeiro Mayta gritou. Um grito de revolta e ódio.

Depois um canto leve começou a sair de seus lábios. Um canto melancólico, profundo e afogado em tristeza. A voz percorreu cada coração presente na floresta. Desde seres humanos e pássaros até as menores plantas. Alguns que a escutaram choraram, outros se encolheram apavorados, cheios de pesar.

Muitos humanos fugiram com medo daquela música que parecia espremer seus corações. Alguns animais e plantas mais próximas morreram ao escutar a melodia.

Quando a mulher parou de cantar, fechou os olhos.

A floresta fez silêncio total. Um fenômeno nunca visto antes.

O sol lançou seu primeiro raio. A lua ainda permanecia à mostra no céu.

Breno chegou ao local. Seu coração pareceu parar ao ver a cena que se desenrolava. Ele já sabia. No fundo já sabia, porém não queria admitir. Agachou-se ao lado da esposa a abraçando pela última vez.

Assistiram ao corpo queimar e virar cinzas.

A alegria de sua vida se fora. Breno caiu de joelhos e gritou. Um último grito, o último lamento, antes do sol aparecer completamente e a lua sumir.

Ele a amaria para sempre.

Ver as cinzas serem levadas pelo vento foi a pior parte, pois Breno sentiu que com o vento e as cinzas ia-se também sua alma.

Em uma viagem da qual talvez não voltasse jamais.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E ai? Eu estou de luto... Nunca foi tão ruim matar uma personagem...

Bjs