.:Natalie:.

Acordei mais uma vez as cinco horas em ponto, devido ao toque insistente do despertador. Durante todos os dias eu seguia a mesma rotina... Acordava, relativamente cedo, na verdade mais cedo que qualquer outra pessoa que morava na mesma rua que eu, quem sabe até que toda a Londres. Então eu tomava um banho um pouco demorado, colocava um de meus inúmeros collants de treino e comia uma fruta qualquer. Hoje, por exemplo, eu comia uma maçã.

Depois de tomar o meu café da manhã, talvez da madrugada, pois ainda era escuro esse horário nessa cidade úmida e bastante chuvosa, segui em direção ao meu quarto. Subi as escadas, que tinham um destino direto para o meu refúgio, lentamente, ou seja, no mesmo ritmo que meu sono permitia. Peguei a minha bolsa e chequei mais uma vez se tudo que eu precisaria para o meu longo treino de 10 horas diárias estavam em seu interior. Sapatilhas de ponta, sapatilhas de meia ponta, breu, grampos de cabelo, barrinhas de cereal...

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Durante toda minha vida, sempre foi apenas eu e minha mãe, Emily. Hoje com 20 anos, ainda não tenho conhecimento, nem pista alguma de quem seria o meu progenitor. A verdade é que eu não estava muito preocupada com esse fato, nunca senti falta dessa figura paterna que as pessoas comuns têm. Eu sempre vivi para o ballet, desde os meus cinco anos de idade que eu vivo o ballet. Quando o mundo vê uma criança talentosa ele a segura para nunca mais largar! Foi isso que aconteceu comigo.

Quando completei meus 10 anos de vida, entrei em uma das academias de ballet mais conceituadas do mundo, para estudar, a Royal Academy of Dance. Desde então minha estrela começou a brilhar, eu nunca parei de dançar desde então. Durante todas as minhas férias do Royal e da escola, sempre era chamada para fazer cursos de dança em outras academias famosas. Durante muitas férias, eu diria que todas, eu frequentei o Bolshoi, a Ópera de Paris, o Kirov... Hoje em dia, na verdade há quatro anos, eu já estava formada na Royal Academy of Dance e trabalhava como uma das solistas do Royal Ópera House. Fui a mais nova bailarina contratada em todos os tempos, com apenas 16 anos eu fui convidada a fazer parte de um dos maiores corpos de baile de todo mundo.

Saí de casa com cuidado para não acordar minha mãe, que dormia, aos roncos sonoros, no andar de cima. Não imagino o porquê, mas saí de casa com uma sensação estranha, como se algo fosse vir a acontecer, só não sabia se era bom ou ruim. Provavelmente não era nada, apenas a sensação que a chuva me fazia ter toda vez que caía. Meio irônico, mas eu não gostava de chuva, apesar de viver em Londres, que chovia quase todo o dia.

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O dia passou rapidamente, em meio a trocas constantes de sapatilhas de ponta, preparação física, alongamentos, aulas de ponta, pas de deux, técnica, centro, interpretação, contemporâneo, moderno... Quando “acordei” já era haviam se passado 30 minutos de meu horário de almoço, pois fiquei um tempo a mais na sala me alongando. Almocei em um dos restaurantes próximos do próprio teatro, pois não daria tempo de retornar para casa e almoçar com minha mãe.

Durante a tarde, em vez de termos aulas como na manhã, ensaiávamos para as próximas apresentações do teatro. Mas durante essa tarde eu não pude ensaiar, pois fui convocada para sala do diretor do artístico do teatro. Confesso que não entendi o motivo dele me chamar em sua sala, afinal não teríamos algum repertório de ballet previsto para o futuro. Todos que já estavam acontecendo já tinham selecionados os bailarinos principais, solistas e o baile já sabia exatamente qual seria seu lugar no palco.

Cheguei à frente da porta do diretor e bati três vezes, levemente, na porta. Aguardei até ouvir a sua voz forte dele me mandando entrar em sua sala. Abri a porta a fechando assim que passei por ela e andei calmamente em direção a cadeira que ficava a frente de sua mesa. Me sentei confortavelmente e esperei o Sr. Keven O’Here começar a falar.

− Natalie Morgan! – Ouvi a voz do diretor me saudar. – Ainda bem que você pôde vir conversar comigo agora a tarde!

− Desculpa a pressa, Sr. O’Here. Mas aconteceu algo para o senhor ter me chamado com tanta urgência? – Perguntei curiosa.

− Natalie, eu tenho ótimas notícias para você! – Ele começou a falar feliz. – Confesso que no início não achei a ideia muito boa, mas você merece brilhar, mesmo que para isso o Royal tenha que lhe perder.

− Senhor, eu não estou entendendo... – Falei calma.

− Eu recebi, em nome de uma grande amiga minha, um convite para você fazer um teste para se tornar a primeira bailarina do American Ballet Theatre. – Escutei as suas palavras, atônita. Primeira bailarina? Enfim eu realizaria meu sonho de ser a estrela de um grande teatro. Era o que as palavras do homem a minha frente me diziam. – Você é uma das melhores solistas do teatro e você tem a alma que dança, desde pequena. Ela nasceu com você! São poucas as bailarinas que possuem técnica, leveza e demonstram seus sentimentos dançando. Você tem a combinação perfeita para ser uma grande primeira bailarina e você, você... – Ele falou abrindo um sorriso enorme. – Você será a bailarina mais jovem a subir no topo de um grande teatro como estrela principal, se você passar no teste do American Ballet Theatre! Eu sinceramente desejo que você se mude para Nova York, pois é naquela cidade que você se tornará uma bailarina inesquecível. A primeira bailarina mais jovem de todos os tempos!

− Sr. O’Here, eu não sei nem o que dizer! – Falei com os olhos banhados de lagrimas de alegria.

− Diga que você irá para Nova York, querida! – Ouvi o homem falar a minha frente. Eu nunca imaginei que poderia me tornar uma primeira bailarina tão cedo em minha carreira. Fazia apenas 3 anos que estava formada na Royal Academy of Dance, muito pouco tempo para já me imaginar fazendo papeis principais em grandes palcos. Mas ali estava eu, com a oportunidade de me tornar a primeira bailarina mais nova de toda história.

− Eu vou, Sr. O’Here! – Falei com uma certeza profunda, olhando nos olhos gentis do homem que me deu a maior oportunidade de minha vida.

− Vou contatar a minha amiga e então creio que você poderá ir para Nova York o mais rápido possível! – Ele completou aparentemente contente por mim.

− Obrigada mesmo, Sr. O’Here! – Agradeci a ele, afinal ele era o grande responsável pelo salto enorme de minha carreira. Neste momento eu só precisava treinar mais e conseguir meu lugar no American Ballet Theatre, afinal eu tinha certeza que minha mãe apoiaria minha decisão de ir seguir minha carreira em Nova York.

Voltei aos ensaios em silêncio, pois ainda não era o momento de falar para ninguém sobre a proposta que recebi do American Ballet Theatre. O mundo em que eu vivia era repleto de beleza, mas por trás dela horrores se escondiam. Bailarinos, com inveja do sucesso de outro, são capazes de tudo desde pressão psicológica à lesão física. Cansei de encontrar pregos, cacos de vidro dentro de minhas sapatilhas, ou quando fosse dançar com elas notasse que estavam quebradas ao ponto de virar o meu pé e assim me impossibilitar de dançar. Como passei praticamente toda minha vida tomando cuidado com esses “empecilhos” aprendi a lidar com eles com o maior cuidado possível.

Como de costume saí do Royal após as seis e trinta da noite, eu sempre passava mais alguns minutos me alongando antes de sair, isso me deixava como uma das últimas a sair da grande sala de ballet do teatro. Quando terminei meu alongamento, me despedi de alguns bailarinos e bailarinas que ainda permaneceram na sala. Se eu não estivesse tão ansiosa para contar a novidade para minha mãe, eu teria continuado treinando, mas como eu ansiosa era pouco para descrever o que eu sentia segui rapidamente para casa.

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Como costume, quando cheguei em casa minha mãe estava falando no telefone com alguma de suas amigas. Diferente de mim, Emily, minha mãe, era bastante comunicativa, gostava de falar de seus problemas para os outros e viver rodeada de pessoas que a admirassem. Eu sempre fui tímida fora dos palcos, na verdade o único momento em que eu mostrava meus sentimentos era quando eu dançava, nunca fui de ter amigos.

− Boa noite, mãe! – Anunciei minha chegada, entrando na sala onde ela falava ao telefone.

− Natalie, você chegou cedo hoje! – Minha mãe falou surpresa. Realmente eu nunca chegava esse horário em casa.

− Mãe, eu tenho uma novidade para te contar... – Comecei a falar. Não gostava de ficar enrolando para contar um assunto, eu sempre fui muito direta. – Fui chamada pelo American Ballet Theatre para fazer um teste e me tornar a primeira bailarina deles! – Conclui sorrindo e vi o rosto da minha mãe se iluminar.

− Isso é ótimo, querida! Você conseguiu! – Minha mãe me abraçou, já chorando de emoção. – Você merece, minha menina! Ninguém merece mais que você... Você já sabe quando vai? – Ela me perguntou curiosa. Eu sentiria falta dela, assim como ela sentiria a minha.

− O Sr. O’Here disse que iria contatar sua amiga que se interessou em mim ainda hoje! – Falei. – Assim que ela me ligar, vou comprar a passagem para Nova York! – Disse sorrindo, mas quando falei o nome da cidade que que eu iria o sorriso da minha mãe “murchou”.

− Nova York? – Ela me perguntou. Não entendi a mudança repentina dela, afinal ela sabia que a sede do American Ballet Theatre era em Nova York.

− Algum problema com Nova York, mãe? – Perguntei, pois a reação dela foi muito estranha.

− Não, nenhum, querida! – Ela falou abrindo um sorriso, parecia estar mais calma. – Você vai brilhar muito nos palcos dos Estados Unidos!

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Durante aquela noite eu sonhei que eu estava dançando em um palco que eu não conhecia, ele era absolutamente novo para mim, irreconhecível. Os holofotes me iluminavam, a imagem do lago bem atrás, como se fosse real. Eu dançava a variação “A morte do Cisne” como nunca havia dançado em toda minha vida. Apesar de triste era uma das minhas partes preferidas do ballet de repertório do Lago dos Cisnes. A cena do cisne agonizando, sofrendo por amor, na minha opinião era uma das mais cruas, uma das mais perfeitas, pois mostrava de forma clara os sentimentos daquele que a interpreta.

“A morte do Cisne” =>

https://www.youtube.com/watch?v=qgZVDTheSyQ