Já estava bem tarde quando saí de casa, por isso a floresta estava bastante sinistra e ventava muito, mas eu não me importei. Eu simplesmente não podia deixar que aquele pesadelo se tornasse realidade. Na bolsa, eu carregava a rosa, o livro e um casaco, que sinceramente não era muito útil no meio daquela neve toda. Mas eu ia chegar. Eu precisava chegar.

Além disso, não seria tão difícil, já estávamos quase encontrando a entrada daquele caminho secreto que levava ao castelo.

De repente o cavalo parou.

– Vamos! Estamos quase lá!- encorajei-o, mas ele não se mexeu. Desci do cavalo. Provavelmente ele tinha farejado ou escutado alguma coisa. Depois, também escutei. E me escondi de novo atrás de uma árvore, e é claro, fiquei espiando por entre as folhas.

Depois de um tempo, passou por mim um homem que não me era estranho e um grupo de soldados. Devia ser o exército daquele rei idiota. E eles estavam com Anna.

Eu quis abraça-la, mas me contive, porque isso poderia causar uma encrenca gigantesca para as duas.

– Ô menina, já estamos chegando? - perguntou um deles para Anna. Ela respondeu calmamente:

– Ainda não.

– Mas você diz isso há dois dias. - retrucou outro e não pude deixar de rir. Essa Anna... O silêncio reinou por mais alguns instantes, até que de repente, outro começou a falar:

– Sabe o que eu acho? Que você está é nos enganando...

Anna arregalou os olhos. E eu também. Não podiam descobrir, não podiam descobrir!

– Eu também. E acho que o trato era: ou você nos diz onde Belle está, ou pagará um preço alto por isso...

Ele já sabia até meu nome?

– Eu não estou enganando ninguém. - exclamou Anna, desesperada.

– Acho que está sim. E sinto muito, mas acho que você agora nos deve algo... - um deles disse, ameaçadoramente e desembainhando a espada. - Talvez eu deva te matar...

– SÓ POR CIMA DO MEU CADÁVER! - gritei, siando de trás da árvore. Eu iria me entregar. Perderia Nicholas para sempre, mas pelo menos acabaria com tudo aquilo e salvaria a vida de Anna. E pelo menos, eles também nunca encontrariam o caminho para o castelo.

Todos ao meu redor ficaram pasmos.

– Garota, quem você pensa que é?

– Belle. Eu sou Belle. Eu sou a Bela. Estou me entregando. - respondi firme, embora tivesse deixado uma lágrima escorrer.

– Bela não! - gritou Anna, mas eu a calei.

– Você faria o mesmo por mim. - sussurrei.

Levaram-me até o rei. Ele me reconheceu instantaneamente.

– É ela mesmo! Nos casaremos amanhã! - ele exclamou.

– Casaremos?

– Mas é claro!

– Eu não quero.

– Mas vai! Pare com isso, todo mundo me quer.

– Mas eu não. - disse por fim. Ele me encarou.

– Levem-na para o castelo. Um dia ela há de parar com essa besteira. - ele ordenou, e no mesmo instante, alguns soldados me agarraram por trás~. Eu sabia que isso ia acontecer mas eu não podia parar de lutar.

– Eu NÃO vou. Nunca vou me casar com você!

Ele me encarou. Pensei que fosse me dar um tapa. Mas não deu. Apenas ficou me encarando, irritado com a minha resistência. E antes que pudesse me dizer qualquer coisa, alguém gritou um pouco mais à frente:

– Majestade, encontramos a entrada para um castelo.

Como?

– Já a encontramos seu palerma. Ela está aqui, bem na minha frente.

– Eu sei, mas, raciocine Majestade. Se ela não estava na aldeia, com certeza, pois vasculhamos tudo, ela deve ter se escondido na floresta. Mas uma moça como ela não sobreviveria sozinha na floresta. Alguém deve ter a ajudado...

Entrei em pânico.

– Tem razão... Vamos descobrir quem foi... - respondeu o rei , indo em direção à passagem.

– NÃO! - eu gritei. - Por favor, não o machuque.

– Não o machuque?- ele se virou. - Sabia! Sabia que era outro homem. E você deve ter se apaixonado por ele e é por isso que não quer se casar!

O que??? Acho que qualquer garota se apaixonaria por alguém que é gentil com ela e que a ajuda a fugir de um maníaco que declara guerra por ter levado um simples fora...

– Ah, pode deixar, ele vai ter o que merece. - ele bradou por fim.

– Não! Não! - comecei a gritar, entre lágrimas. Nicholas e todos os outros morreriam e a culpa era toda minha. - Por favor. Eu me caso com você. Faço o que quiser. Mas por favor, não os mate !

Mas ele não deu ouvidos. Continuou andando, enquanto me levavam forçadamente pelo caminho que levaria até o outro castelo. Anna observou a cena, chocada e foi levada embora também, para o castelo de Nicholas.

Queria ter dito algo à ela. Mas não consegui. Então trocamos apenas um olhar. E fomos arrastadas para estradas diferentes.

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POV fera

Quando estava quase passando pelo portão, vi algumas pessoas em frente. Me escondi e escutei a conversa. Eu sei que é errado escutar as conversas alheias, mas invasão de propriedade também é.

Mas eu não consegui escutar muita coisa. Só alguém desembainhando uma espada e alguém gritando. Não demorei muito a perceber o que ia acontecer. E eu não podia deixar.

– NÃO! - gritei, passando pelo portão. Havia um homem, ainda com a espada na mão, provavelmente o rei inimigo, pronto para decaptar a... ANNA? A amiga de Bela! Que sorte eu ter impedido. Bela jamais se perdoaria se algo acontecesse à ela.

No exato momento em que eu passei por aquele portão, um silêncio tomou conta do local. E todos passaram a olhar chocados para... mim? Provavelmente eu tinha esquecido a capa!

Fiquei totalmente sem ação, sem ter a mínima ideia do que fazer, esperando o que todos fariam em seguida.

– É um monstro horrível! - ouvi alguém gritar. Eu sei o que eu sou, não precisa reforçar...

– Deve ter matado o dono do castelo! - disse outro. Mas eu retruquei, como um idiota:

– Não. O dono do castelo sou eu.

– Isso fala? - escutei o rei falar. Foi meio cruel, mas eu fingi não me importar. Me concentrei no que era importante.

– Sim, isso fala. - continuei. - E isso vai pedir para que vocês saiam daqui.

– E se eu não quiser?- desafiou ele.

– Vai ser pior.

– O que vai fazer? Nos estraçalhar? Acha que consegue me vencer? - ele disse, apontando a espada para mim. Ah não, eu não queria brigar.

– Majestade, a moça pediu para não machuca-lo. - alertou um soldado. Ela pediu? me perguntei. Então ela ao menos se preocupou!

– Você acha que eu vou fazer o que ela pediu? Bela está louca. Isso é uma fera! - Disse ele, e investiu contra mim. Eu apenas desviei. Então ele ordenou que atacassem o castelo. Eu queria impedir, mas se me distraísse, com certeza seria ferido por aquela espada.

Então segui apenas desviando e quando chegamos na porta, o máximo que consegui fazer foi mandar os criados se esconderem, enquanto o rei tentava mais uma vez me acertar. Mas meu Deus, esse homem devia ser muito ruim de mira.

Até que chegou um momento em que entramos em um salão. Não consegui reconhecer qual. Ele gritou:

– Fera, se se apaixonou e for atrás dela...– ele ameaçou, em um certo ponto. -Acabo com você!

– Ah sim, é bem provável mesmo. - não pude deixar de provocar.

Isso o irritou ainda mais e dessa vez, ele realmente quase me acertou. Quase. Mas foi o suficiente para que eu conseguisse pegar a espada e coloca-lo contra a parede. Ele me encarou perplexo e seus olhos pareceram implorar por piedade por um instante. Eu poderia ter o matado bem naquele momento. Mas não o fiz. Por causa do que ele disse em seguida:

– Vá em frente monstro! Mate-me. Mas e depois? O que vai acontecer com Bela? Nesse momento, ela deve estar em meu castelo, esperando para nos casarmos. Se eu morrer isso não acontecerá. E Bela, você acha mesmo que alguém como ela ficaria com você? Eu posso dar o mundo à ela. Você não é nem bonito ou poderoso para isso. Ela nunca vai te amar. Compreenda isso e deixe-a ser feliz ao meu lado.

Paralisei. O que ele dizia era verdade. Por que alguém como Bela ficaria comigo? Eu era feio demais para isso. E mesmo que ela me amasse, o que eu poderia oferecer à ela? Nada além de meu amor. Eu era um príncipe sim. Mas um princípe falido e abandonado. E eu não a merecia, com certeza. E ele? Era um rei poderoso, louco, mas poderoso, o tipo de conquistador que tinha tudo o que queria e podia dar a ela tudo o que ela quisesse. Quem ela certamente a escolheria? Embora eu soubesse que ela não era muito comum, eu sabia que ela era inteligente. E alguém inteligente jamais ficaria comigo.

Depois de refletir sobre tudo isso, enquanto ele me encarava com um sorriso vitorioso como se soubesse que tinha ganhado, tomei a decisão mais difícil da minha vida. Eu o soltei e disse:

– Fique com ela. Dê a ela o mundo. Faça de tudo para vê-la feliz.. E acima de tudo, ame-a mais do que eu a amo, se assim possível for.

Ele sorriu, ainda mais satisfeito, e falou, enquanto andava à minha volta:

– É. Então pelo menos o monstro é inteligente. Sabe, eu gostei de sua atitude. Gostei tanto que eu poderia até convida-lo para o nosso casamento. - Aí já é demais,´pensei eu, que estava tão triste que não tinha sequer forças para responder. - Mas... pena que você não poderia comparecer. - finalizou ele, antes de me apunhalar pelas costas e sair pela porta do salão.

Caí no chão e fiquei ali, sofrendo e pensando que nunca mais a veria outra vez.