Astra

–Shae, quer sair da sacada? Você está me deixando nervosa.

Ela olhou para mim e me dirigiu aquele sorriso selvagem que dizia que ela ia subir na árvore mais alta, pular do balanço ou partir para cima do garoto bonito.

–Vem cá, Astra.

–Você vai me empurrar da sacada? O que quer que eu tenha feito, tenho certeza que não foi minha culpa.

Shae pareceu confusa, colocando a mão no peito, falsamente magoada.

–Como pode pensar uma coisa dessas de mim?

–Você está com aquela expressão.

Shae visivelmente se controlou e acenou, impaciente, para que eu fosse até ali. Levantei-me da sua cama e fui até o lado de fora.

–O que foi que...

–Sh... Escuta.

–Porque eu sei que você a ama?

Lá embaixo, eu podia ouvir duas vozes masculinas indistintas. Precisei me concentrar muito parar perceber que eram Tristan e Charlie, conversando, quatro andares abaixo.

–Às vezes acho que confundi mesmo as coisas. Que eu e Astra fomos feitos para sermos só amigos, parceiros no ar. E outras... Outras eu me lembro daquela noite e dói não poder... Não poder tocá-la porque foi tão... Tão bom.

Senti minha sobrancelha se franzir e troquei um olhar com Shae, que parecia se segurar para não dar um gritinho.

–Você devia dizer isso a ela. – Respondeu Tristan. – Em algumas semanas ela vai para a Nova Ásia.

–Deixe-a ir. Nós fomos feitos para voar, Trist. E eu não cortaria as asas dela.

Caí para trás, sentada no chão. Shae, que antes tinha aquele brilho travesso nos olhos, percebeu minha surpresa e se aproximou, se ajoelhando ao meu lado e suavizando a expressão.

–Você precisa de um tempo, Ás?

Balancei a cabeça, atordoada.

–Ele disse... Ele mesmo disse que foi só uma noite.

–Ele não queria te perder, querida. – Shae sentou-se ao meu lado. – Ele mesmo disse que não estragaria a amizade de vocês por isso.

Olhei para ela, desconfiada.

–Como sabia que ele diria aquilo?

–Tristan disse que ele diria.

–Vocês planejaram isso?!

Ela mordeu o lábio inferior, vendo que eu estava furiosa.

–Vocês dizem as mesmas coisas nas cartas, Às. Vocês gostam um do outro, mas não acreditam em vocês. Não têm coragem de ir em frente. Nós somos seus melhores amigos. Nós precisávamos fazer alguma coisa.

Soltei o ar, nervosa, esfregando o rosto.

–Mas não isso, Shae! Eu não... Eu não posso. Acabei de começar minha carreira e...

–Ás... – Shae disse, com suavidade. – Uma coisa não precisa excluir a outra.

Encarava o broche da academia enquanto andava. Eu devia ir logo para casa ou minha mãe ficaria preocupada. Suspirei, voltando a pendurar o broche e todas as dúvidas que ele carregava.

Parei, vendo alguém no fim do corredor. Charlie, parado também. Ele respirou fundo e eu faço o mesmo, torcendo para que eu não possa ver atrás de mim. Continuei andando.

–Oi, C.

–Oi.

As palavras morreram. Parei à sua frente.

–Astra...

–Hum?

Ele limpou a garganta.

–Você está indo para casa?

–Minha mãe vai ficar preocupada.

Ele assentiu também.

–Quer companhia?

–Claro.

Começamos a caminhar pelos corredores quase vazios. Charlie de repente parou, segurando meu braço.

–C?

Respirando fundo, ele se inclinou para frente e me beijou. Ergui as sobrancelhas, surpresa, deixando todas as dúvidas me escaparem quando meus joelhos amoleceram.

–Eu sei que você vai para a Nova Ásia. – Ele sussurrou. – E eu nunca ia querer te manter aqui. Eu só...

–Eu vou voltar. Em novembro. – Disse, ainda atordoada demais para pensar no que estava dizendo. – Vou estar livre.

–Eu estou livre agora.

–Eu também.

Foi quando eu soube que, naquela noite, mamãe ficaria muito, muito preocupada. Mas a verdade era que ela não precisava ficar.

Meu avião me levava às nuvens e isso era o que eu mais amava sobre ele, mas isso não era o suficiente. Porque só o meu piloto conseguia me levar às estrelas.