Everlong escrita por Larissa Irassochio


Capítulo 8
Capítulo 8


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura. :3



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Era o último dos meus dias, minha morte estava marcada para hoje a noite. Sendo o último dia que eu iria ter vida, por que não ir a praia? Pois bem, decidi que iria a praia aquela manhã. Acordei um pouco antes do sol nascer, desci as escadas correndo e segui até a praia. Sentei-me onde as ondas não me alcançavam e fiquei olhando a beleza das duas luas que ainda estavam lá em cima, o sol deixava seus primeiros raios da manhã escapar.
Enquanto observava o sol acordando, vi algo que me chamou mais atenção que isso. A príncipio, parecia apenas um peixe muito grande, mas não era. Me assustei quando o "peixe grande", acenou para mim, com suas mãos humanas, seu rosto humano, seus traços femininos. Uma sereia.
Ela acenou novamente, sorrindo. Fiz o mesmo, ela sorriu e fez um gesto com a mão pedindo para eu entrar na água também. Não hesitei e pulei no mar, nadando contra as ondas.
Quando eu estava apenas a um metro dela, a sereia sorriu. Tinha dentes que me lembravam a um vampiro, sua pele era tão clara que chegava a ser quase transparente, cabelos negros que caíam sobre sua cintura impecável. Ela era tão bela, quase uma ninfa.
– Minha honra a princesa de Odjin. - abriu os braços como se fosse me abraçar.
Eu apenas acenei. Nunca foi tão trabalhoso me manter no mar.
– O que traz a senhorita até as terras de Sywn? - perguntou, abrindo um largo sorriso e arqueando as sobrancelhas.
Eu sentia como se algo tivesse me puxando para baixo, tentando me afogar. Ficava cada vez mais difícil me manter boiando e ela sorria, um sorriso muito grande. A água teimava em querer entrar na minha boca e nariz, eu prendia a respiração.
Uma voz berrou ao longe... não só uma voz, eram duas... O caçador? Kyro? Eram eles. Senti uma flecha passar a centímetros de mim, quase atingiu a sereia. Olhei para trás, Richard segurava o arco com força, mirando na sereia. Kyro nadava até meu corpo. Mas por qual motivos eles estavam agindo assim?
– Madley! - ele exclamou me puxando pelo braço, levando-me até a beira da praia.
Deitei na areia, olhando para o céu que agora estava em tons de azul. Ele estava com o rosto acima do meu, parecia um tanto espantado.
– Que foi? Era uma sereia. - eu disse.
– Você não sabe nada de sereias, não é? - ironizou - Sereias não são boas, nem amigáveis. São más, gostam de carne humana, gostam de se alimentar de pessoas como você. - disse como se eu fosse uma criança.
Sentei, limpando meu cabelo que agora estava cheio de areia. Então, como se estivesse encarando o passado, eu passei a observar os dois que me olhavam como louca. Depois de alguns minutos, eles decidiram que eu não iria entrar na água novamente e voltaram para o castelo.
Virei de costas, não direção contrária ao mar. Da floresta vinha um cheiro terrível de algo morto, era incomodativo. Charlie já tinha dito que estava pronto para morrer mas ninguém tomava coragem de fazer algo.
Ele estava com uma aparência cada vez pior. Suas olheiras não podiam ficar mais fundas, estava tão magro e não conseguia comer. Tudo doía, ele dizia. Mas eu não posso culpá-lo. Ele passava horas no quarto, fazendo nada, pois tudo trazia uma dor insuportável. Ultimamente, eu tinha falado mais com ele, tentei esquecer tudo o que passou e eu até conseguia consolar a Hayley. Para ela, era algo complicado, a pessoa que ela amava estava prestes a morrer.
Então, você se pergunta: como alguém que eu tinha um certo ódio se tornou uma amiga. Ah, bom, bem simples. Encontrei ela chorando dentro de um roupeiro. Pode parecer engraçado, mas não foi. Ela chorava como criança, sentia dor por estar perdendo alguém que amava. Sentia que estava prestes a se acabar, a definhar. Mas eu não a culpava por se sentir assim, não culpava ninguém, aquilo era tão inevitável quanto a chuva. Eu a abracei, tentando fazer ela se acalmar, ela apoiou a cabeça no meu ombro e disse que estava se sentindo solitária. A partir daquele momento eu soube que devia cuidar dela, como amiga.
Kyro me elogiava, pois consegui aprender o básico sobre o ocultismo. Passava boas horas com ele, era uma boa pessoa. Ele se sentava com uma xícara de chá a minha frente, me ouvia, tudo o que eu tinha a dizer e me aconselhava. Eu devia ter agradecido eternamente a ele.

Quando chegaram as últimas horas da tarde, ninguém conseguia ficar parado. Nos reunimos no salão para uma discussão sobre o que iriamos fazer, chegamos a conclusão que cada um se esconderia em um lugar. Pode parecer idiota mas era a melhor coisa que poderíamos fazer.
Richard se escondeu em um armário na cozinha. Charlie continuou no quarto, porém, debaixo da cama. Hayley foi para um closet. Kyro se juntou comigo no meu super esconderijo, a biblioteca. Fiquei no segundo andar, no último corredor, o mais escuro e difícil de se encontrar. Kyro optou por ficar lá embaixo mesmo, atrás de um baú.
Quando a noite chegou, nós seguramos as nossas respirações e fechamos nossos olhos. Não sentia nada mais que um imenso buraco vazio dentro de mim. Eu quase adormecia quando ouvi o primeiro estrondo, gritos de homens. Silêncio. Ouvi as portas da biblioteca serem abertas, as prateleiras derrubadas. Queria sair dali, correr. Então, ouvi Kyro gritar, eles tinham o encontrado.
Não me controlei, cheguei no para-peito do segundo andar e olhei para baixo. Os guardas apontaram para mim, subindo as escadas. Tentei achar outra forma de escapar, mas não tinha jeito. Eles me puxaram, brutos. Kyro se debatia, implorando que não me machucassem.
Então todos nós estávamos reunidos lá embaixo. O caçador, Charlie, Kyro, Hayley e eu. Ajoelhados no chão, olhando para nossas mãos cruzadas. Eu ouvia os homens falar uma língua estranha, baixinho, eles apontavam de segundo em segundo para mim. Rapidamente, aconteceu algo que eu não esperava: Kyro se levantou, como um puma ele atacou, atingindo um dos guardas no rosto e o outro na barriga. Outros dois o imobilizaram, ferindo-o. Ele caiu, não levantou novamente.
Olhei para Charlie, ele tinha um olhar de tristeza. Sussurei:
– Use magia, Charlie. - pedi, quase implorando.
Ele me encarou ainda mais triste e moveu a cabeça em sinal negativo. Ele não iria usar magia, não...
– Charlie, faça! - disse em um tom mais alto.
Então, senti os brutos me puxarem. Gritei, iria morrer, certeza.
– Charlie! - senti as lágrimas vindo, mas não iria chorar.
Ele olhou para a sua direita, fechou os olhos com força e moveu os lábios. Quando olhou para mim, moveu os lábios novamente como se estivesse pedindo desculpas.
Kyro o encarou, incrédulo. Então, ele se levantou e correu, no meio do caminho um soldado o derrubou. Ele caiu, mas levantou o rosto de imediato, sua boca sangrava. Ele tinha ido atrás de mim, como se quisesse me salvar.
Senti uma forte pancada na cabeça, mas continuei acordada. Eles me arrastaram até uma carruagem puxada por cavalos. Me jogaram em uma "cela" na parte traseira e trancaram a porta. Eu conseguia ver as coisas lá fora graças a uma fenda na porta.
Sentei no fundo, abraçando meus joelhos. Eu fui a única presa, então, matariam os outros? Fechei meus olhos com força, como se fosse aliviar a dor. Senti quando os cavalos começaram a andar, depois mais rápido e mais rápido.
Acordei quando os cavalos já tinham parado, quando a luz lá fora morria aos poucos. Fiquei no meu cantinho, esperando que tudo aquilo passasse, mas não. Os guardas abriram a porta, e fizeram sinal para mim ir, mas eu não fui. Eles entraram com passos pesados, me puxaram com tanta força que meus braços ficaram vermelhos. Com relutância, eu me deixei levar. Arrastaram-me até um grande salão bem iluminado, fizeram eu ficar de joelhos.
Meus fios ruivos caíam sobre o rosto, eu sentia o gosto de ferrugem na minha boca e encarava o chão impecavelmente branco. Senti minha respiração acelerada.
– Tenha mais respeito com o seu rei, porca. - as palavras ecoaram pelo salão.
Levantei o olhar até o homem sentado na poltrona. Ele parecia entediado.
– Nojento. - sussurei.
– O que você disse? Repita o que você disse, em alto e bom som. - ele disse com aquela voz de taquara rachada.
– Eu disse que você é nojento, não merece o respeito de ninguém. - respondi quase que berrando.
Ele apenas encarou um de seus guardas. O guarda, um homem musculoso, se aproximou de mim e feriu-me com um tapa.
– Você continua esse porco medíocre que sempre foi e será. - senti a raiva crescer em mim.
O guarda segurou minhas bochechas com força e logo depois, outro tapa.
– Covarde! Idiota! - berrei, ecoou em todo o salão.
Senti uma série de tapas e socos vindo em minha direção, a dor passava por todo meu corpo. Senti os chutes atingir minha barriga e costas. Não posso negar, doía, doía muito. Quando terminaram o trabalho sujo deles, me arrastaram por um bom tempo. Fui jogada em uma cela de masmorra, fria e suja. Meus olhos se fecharam, precisava de descanso.
Acordei sentindo uma dor aguda nas minhas costelas. O sol entrava ainda fraco pela janela, mas era o bastante para eu me sentir segura. Tentei levantar, mas não consegui, senti raiva.
– Droga... - resmunguei.
– Alguém? - ouvi uma voz conhecida.
– Aqui. - respondi tateando o escuro.
– Madley? - a voz interrogou.
– Charlie! - exclamei.
Senti o toque gelado dele, era calmo mas apavorado. Me senti terrívelmente bem, segura.
– Você está vivo? - senti um tanto idiota perguntando aquilo, mas era necessário.
– É, acho que sim. - respondeu com um riso. - Como você está?
Fiz uma auto-avaliação do meu corpo. Sentia dor em todas as partes possíveis. Sentia um líquido escorrer na minha testa, possivelmente sangue.
– É, estou bem. - respondi - E os outros?
– Kyro e Hayley... eles fugiram, correram para a floresta... Os únicos que vieram para cá foram você, Richard e eu.
Gemi encostando minha cabeça na cela. Eu tinha que pensar em algo mas Charlie me interrompeu.
– Desculpe por não ter te salvado.
Movi meu olhar até ele. Seu olhar pedia perdão.
– Acho que não estou pronto para usar magia, ainda... - tampou o rosto com as mãos.
– Mas você treinou, não é? Você sabe usá-la. - disse eufórica.
– Eu sei, mas não quero acabar como meu pai. - pareceu um tanto triste.
– Charlie, você irá morrer de qualquer forma. - disse séria.
Então, ele se isolou. Não puxei assunto, acho que ele precisava pensar, ter um tempo para suas próprias idéias. Mas eu sentia pena dele, talvez eu tivesse sido um pouco fria.
– Mad... - Charlie sussurou, quase encostando os lábios na minha orelha - Descubra o ponto fraco dos guardas, você pode fazer isso...
Eu concordei. Me senti tão besta por não ter pensado naquilo.
Aquela noite quando um guarda passou a frente da minha cela, pedi que ele se aproximasse, o que ele fez sem hesitar. Tinha um sorriso maroto nos lábios e me olhava de forma maliciosa, então, encostei na mão dele.
Foi uma das piores coisas que eu já vi, mas não duvidava daquilo vindo dele. Ele tinha estuprado mulheres, não só uma, mas jovens como eu. Ele era repugnante. Desencostei minha mão rápido e me afastei.
Semanas antes de tudo isso acontecer, eu estava no castelo. Era um dia de neve, onde todos os reinos estavam reunidos. Mas agora eu era apenas uma garotinha presa, eu tinha ganho um tempo a mais para viver, mas aí você se pergunta "viver o que? Ficar presa aí?", pois é, penso a mesma coisa.
Na manhã seguinte, o sol mal tinha saído lá fora quando Charlie acordou. Ele não estava tão bem, cuspia sangue. Então, eu achei que quando o dia estivesse acabando, ele não estaria mais vivo. Eu manti todo o nervosismo preso em mim, não era momento para entrar em pânico.
Enquanto eu contava o número de arranhões na parede, tentando não enlouquecer, eu ouvi o som que vinha lá de fora. Me apoiei na janela, tentando ver algo lá fora. O som era como de um pássaro batendo as asas freneticamente. Meu plano de não ficar louca estava indo água a baixo. O som me perseguiu por alguns momentos seguintes, o que me fez querer chutar aquela parede.
Quando fui me apoiar na janela novamente, um pássaro entrou. Ele era completamente laranja e vermelho, com grandes asas que pareciam chamas de fogo. Ele ficou flutuando no ar bem a minha frente, batendo as asas e com um papel entre as unhas.
– Oi, amigo. - eu disse, como se ele fosse me responder.
Estendi o braço, e ele deixou a carta cair no chão. Vôou pela janela, desaparecendo.
Sentei no chão e puxei o pedaço de papel. Abri com cuidado, olhando para a porta, temendo que alguém visse. A letra bem desenhada, mas um garrancho.
"Dois dias, uma fuga, na floresta."
Bom, a letra era de Kyro. Tudo bem... daqui a dois dias eu teria que fugir, eles estariam na floresta... Ótimo, ótimo.
Bufei, inquieta. E se esse plano não desse certo, eu estaria destinada a morrer naquela prisão, enquanto o mundo a minha volta definhava.


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