A História dos Selvagens - Parte 1 - Medo escrita por ShiroMachine


Capítulo 16
Fernando: Despedidas, sacrifícios e fuga




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Puxei a espada, esperando ter que lutar para libertar meus amigos dos sequestradores do Governo. Porém, eles apenas estavam parados olhando para nós. E, atrás deles, estava o meu cavalo.

_Vocês cuidaram dele._ Foi a primeira coisa que eu disse.

O mais alto deles olhou para trás, abriu um sorriso, e falou:

_Você esperava que nós deixássemos ele por aí? Nós não somos monstros. No dia em que atacamos você, estávamos apenas fazendo nosso trabalho. Pelo menos, você não nos matou.

Só então percebi que haviam apenas três dos caras que me atacaram ali, sendo que eram quatro.

_Vocês não eram quatro?_ Perguntou Felipe.

_O quarto não resistiu aos ferimentos que sofreu._ Eles lançaram um olhar acusador a Letícia.

Lembrei-me de que um dos caras havia levado uma facada na barriga. O ferimento não parecia tão grave quando eu olhei, mas ele pode ter perdido muito sangue.

_A culpa não é dela._ Disse Felipe. _Vocês nos atacaram, nós nos defendemos.

_Nós atacamos ele._ Retrucou o mais alto, apontando para mim. _Vocês se intrometeram no meio da briga, e ela acabou matando o nosso amigo.

_Então vocês são capazes de ter sentimentos?

Uma discussão quase começou entre os dois, mas eu consegui contê-los.

_Só conseguiremos duas coisas com essa discussão._ Falei. _Fazer com que os Revolucionários nos encontrem e desperdiçar tempo das nossas vidas. Vocês me atacaram, eu me defendi, eles dois ajudaram e um cara morreu. Uma fatalidade, mas temos coisas mais importantes a fazer nesse momento. Vocês disseram que podiam nos ajudar a sair daqui. Como?

Eles se acalmaram, mas faísca ainda saltava dos olhos dos dois. O cara do Governo suspirou e disse:

_Vocês vão montar no cavalo e vão seguir naquela direção._ Ele apontou por cima do ombro com o polegar. _Vão chegar numa estrada e seguir na direção que estavam seguindo. A estrada muito provavelmente vai estar deserta, então não vai haver perigo. Vamos distrair os sequestradores enquanto vocês adentram o beco.

Era um bom plano. Me perguntei a quanto tempo eles estavam naquela cidade. Será que o meu cavalo havia os trazido até aqui? Ou será que eles estavam voltando ao Governo usando ele como meio de transporte? Decidi que não havia tempo para me perguntar sobre aquilo agora. Fiz um sinal para Felipe e Letícia me seguirem até a carroça. Felipe subiu nela primeiro e ajudou Letícia a subir. Antes de eu montar no cavalo, o sequestrador do Governo segurou meu ombro e me deu uma pistola e duas munições.

_Por via das dúvidas._ Disse ele. _Ela já está carregada, mas munição nunca é demais.

Eu olhei para a arma e indaguei:

_Por que vocês estão tão obcecados em nós?

Ele me olhou muito sério e disse:

_Vocês não são como nós. Nós somos egoístas. Nos preocupamos só com nós mesmos e esquecemos de cuidar do nosso lar. Precisamos de vocês para nos ensinar a cuidar mais das coisas que amamos e menos de nós.

Suspirei. Eu tinha a impressão de que não ouviria isso apenas uma vez. Eu montei no cavalo, e virei ele para o beco. Dei uma última olhada para trás, para dar uma última olhada para os três sequestradores do Governo. Eles estavam com três pistolas, e olhavam um pros outros como se estivessem se despedindo. E tinha a impressão de que eles realmente estavam.

Dei dois tapinha no pescoço do cavalo e ele começou a correr. Não havíamos ido muito longe quando o tiroteio começou. Fiquei tentado a voltar, mas sabia que se fizesse aquilo, o sacrifício deles teria sido em vão.

Seguimos o caminho até que chegamos à estrada. Eu fiz com que o cavalo diminuísse a marcha.

_Felipe, você sabe usar uma pistola?_ Perguntei.

_Sim. Por quê?

Joguei a pistola e as munições para ele.

_Caso essa estrada não esteja deserta. Vai ser muito difícil usá-la montado num cavalo.

Ele concordou. Pegou a arma e segurou-a com a mão direita.

Felipe olhou para a irmã, com a testa franzida, e disse:

_Por que você não se defendeu quando aqueles caras acusaram você?

Ela abaixou a cabeça, um tanto envergonhada.

_Porque eu realmente matei aquele homem._ Respondeu ela. _Eu não tive a intenção, mas fiz. Fui tentar me defender e acertei a faca na barriga dele. Ele não ia morrer se eu tivesse feito alguma coisa para ajudá-lo, mas eu entrei em pânico.

O silêncio pairou sobre nós. Felipe parecia não conseguir consolar a irmã. Eu suspirei e disse:

_Não foi culpa sua. Acho que estamos num tempo que é matar ou morrer.

E depois desse belo comentário, andamos em silêncio.

Não havíamos andado muito quando Felipe avistou algo.

_O que é aquilo?_ Ele apontou para o que estava vendo.

Dois homens estavam parados um tanto distante de nós. Não consegui distinguir as fisionomias deles, mas consegui ver o que mais importava. As cores das camisas. Ambos estavam de preto.

_Eles sabiam que alguém ia tentar fugir por aqui._ Falou Felipe, e eu assenti.

_O que vamos fazer?

Eu tentei distinguir algo mais. Eles estavam segurando pistolas.

_Estamos em desvantagem._ Falei. _Vamos acelerar e tentar sair ilesos.

_Em outras palavras, vamos fugir._ Simplificou Felipe.

Falei para ele se preparar caso precisasse atirar. Depois, dei dois tapinhas no cavalo e ele começou a correr. Não demorou muito para que os sequestradores nos notassem. Gritaram para que nós parássemos, e como não o fizemos, começaram a atirar. Meu cavalo começou a ir um pouco para o lado esquerdo, o que eu reconheceria como uma tentativa de "alongar" a distância. Por sorte, os caras pareciam não ter uma mira muito boa. Em compensação, Felipe não conseguia acertar os tiros, pois a carroça estava balançando muito.

Estávamos cada vez mais perto. Estávamos levando sorte, mas eu sabia que eles iam acertar um de nós quando chegássemos mais perto. Mas, quando chegamos a ficar na frente deles, meu cavalo fez uma coisa que provavelmente salvou as nossas vidas. Se levantou nas patas traseiras e jogou eu e meus amigos longe. Logo depois, ele perdeu o equilíbrio e caiu no chão.

Felipe pensou rápido e acertou um dos caras com um tiro. Mas não tinha como ele acertar o segundo a tempo. Ele estava com o dedo no gatilho, apontando a arma para a minha cabeça. Não tinha como eu me defender. Mas, antes dele atirar. Algo voou na direção dele, acertando ele no braço.A faca de Letícia ficou pendurada no braço do cara. Ele soltou a arma, dando um grito estridente de dor. Me levantei rapidamente, avancei em direção a ele, e perfurei ele com a espada. Ele caiu morto no chão na hora.

Nós três ficamos arfando por um tempo. Felipe, que quase não se aguentava em pé, disse:

_Irmã, o que você acaba de fazer é incrível!

Ela deu um sorriso, um tanto envergonhado.

_Vocês acham?

_Claro que sim._ Respondi. _Você salvou minha vida, conseguiu mirar no meio daquela confusão e acertou o braço dele com uma arma relativamente pesada.

Seu sorriso se alargou ainda mais. Tirei a faca dela do braço do cara, entreguei a ela e disse:

_Vamos, temos que continuar a nossa...

Eu me calei assim que eu me virei para o cavalo. Ele sangrava e se contorcia. Haviam acertado ele. Cheguei mais perto para poder ver melhor. Tentei achar alguma maneira de salvá-lo, mas não tinha como. Eu teria que sacrificá-lo, se não ele iria sofrer até a morte. Mas eu não sabia como faria aquilo, pois eu conhecia esse cavalo desde os seis anos, e seria muito difícil ter que matar ele, mesmo que fosse para que ele não sofresse.

Eu fiquei numa guerra comigo mesmo por alguns segundos, até que decidi fazer o certo. E foi com uma pesar no coração que eu peguei minha espada e esfaqueei meu cavalo.


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