A História dos Selvagens - Parte 1 - Medo escrita por ShiroMachine


Capítulo 10
Fernando: Uma cidade nem tão abandonada


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem desse capítulo!



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Felipe pegou o folheto da minha mão.

_Como assim?_ Os olhos dele estavam estudando cada milímetro do papel.

Letícia se aproximou para ver o folheto. Balançava a cabeça, como se querendo que aquilo não fosse verdade. Ela esfregou a mão na testa.

_Faz sentido._ Ela disse. _Quer dizer, as nossas camisas são da mesma cor.

Assenti. Todos nós estávamos usando camisas azuis escuras. Desde que nasci, só usava camisas azuis, e, sempre que pedia para usar algo diferente, meu pai adotivo dizia que eu não podia fazer isso por uma questão de organização. Agora eu entendia o porquê.

Eu e meus amigos nos entreolhamos. Eles pareciam preocupados, mas eu não entendia o motivo. Esse fato não parecia ser grande coisa.

_O que foi?_ Perguntei.

Letícia me olhou como se eu fosse um total estranho (o que não era totalmente mentira).

_O que foi?_ Repetiu ela. _Isso não te assusta nem um pouco. Saber que você foi controlado desde o nascimento?

Balancei a cabeça negativamente. Felipe suspirou e disse:

_Isso não importa agora. Temos que conti...

Sua frase foi interrompida por um barulho de metal caindo no chão. Institntivamente, virei a cabeça pra onde o barulho pareceu ter vindo. Na janela de um prédio, pude ver um vulto se movendo. Meus amigos pareceram notar também. Felipe me encarou, fazendo uma pergunta silenciosa. Assenti. E começamos a andar em direção ao prédio.

Tive que forçar um pouco a porta para entrarmos. Como o restaurante, esse prédio parecia em perfeitas condições, só um pouco empoeirado. Havia uma porta que levava às escadas na esquerda. No centro, havia dois elevadores que pareciam não funcionar faz tempo. E na direita, outra porta que levava às escadas.

Olhei por cima do ombro. Felipe estava com a lança na mão direita, um olhar de selvageria nos olhos. Letícia estava segurando sua faca tão forte, que os nós dos seus dedos estavam brancos.

Andei em direção a porta da esquerda. Abri-a e comecei a subir silenciosamente, sendo seguido por meus amigos. Subimos quatro andares até achar um que realmente parecia ser habitado.

Havia portas no lado direito e esquerdo em um corredor. Nas portas da esquerda, havia um número par, e na da direita, um número impar. Estava totalmente escuro. A temperatura parecia ter caído em uns cinco graus.

_Acha que realmente tem gente aqui dentro?_ Sussurrou Letícia.

_Bem, só tem um jeito de descobrir._ Sussurrei de volta. Adentrei um pouco mais no corredor e gritei: _Se estiver alguém aqui, é melhor aparecer agora, pois nós vamos procurar, nem que leve muito tempo.

Esperei. Tentei prestar atenção em qualquer ruído. Então ouvi barulhos de várias fechaduras sendo abertas ao mesmo tempo. Pessoas começaram a sair das portas. Em um canto, vi uma mulher de cabelo loiro e alguns fios brancos e dois meninos, de mais ou menos seis anos, agarrados na saia dela, com uma expressão de medo. Em outra, um homem magro, com o cabelo preto um tanto sujo de poeira, me lançou um olhar de raiva.

Segurei minha espada um pouco mais forte. Felipe se colocou em posição de luta. Letícia olhava para todos os lados, procurando por sequer um movimento brusco. Quando pensei que alguém atacaria, um homem forte, com um colete militar, olhos verdes que pareciam ter visto coisas de um milhão de anos atrás e cabelo ruivo, se colocou na minha frente.

Esse deve ser o líder deles, pensei. Ele disse:

_Apresentem-se.

Felipe bufou:

_Nós estamos com as armas aqui. Nós temos a vantagem.

_Meu nome é Fernando._ Disse, ignorando o comentário de Felipe. Aquele homem não parecia querer problemas mas aparentava conseguir resolvê-los facilmente. _Esses são Felipe e Letícia. Somos eco sobreviventes.

Ele franziu a testa.

_E o que estão fazendo longe da floresta?

_Estamos indo ao Governo._ Respondi.

Ele nos estudou um pouco. Não parecia achar que estávamos mentindo. Só estava decidindo se estávamos contando toda a verdade. Por fim ele suspirou e disse:

_Meu nome é Mário. Sou o "síndico" desse prédio.

Mário nos convidou para entrarmos na casa dele. Nos ofereceu biscoitos recheados e café. Nós aceitamos. Mário sentou na beirada de uma poltrona, as mãos entrelaçadas. Ele apontou o sofá com a cabeça para nós. Nos sentamos.

_Então..._ Começou ele. _vocês estão indo pro Governo?

Assenti.

_Por que?_ Perguntou.

Suspirei. Eu e Felipe nos alternamos em contar a história toda. Quando terminamos, Mário olhou para nós, impressionado.

_E vocês decidiram simplesmente ir para lá, achando que eles irão resolver o problema todo?

_Bem, não foi ideia minha._ Disse Felipe. Dei uma cotovelada nas suas costelas.

Mário olhou para mim, claramente pedindo mais detalhes. Infelizmente, eu não tinha. Ele indagou:

_E quanto à seus pais? Eles deixaram?

Letícia respondeu que sim. Felipe acrescentou que tinha sido obrigado. Então ele ergueu a sobrancelha, dirigindo seu olhar a mim.

_Eu sou órfão._ Falei. Nunca havia dito essas palavras antes. Normalmente falava que nunca tinha conhecido meus pais, ou que eles haviam me abandonado, mas nunca dizia que era órfão.

Mário abaixou a cabeça, meio que envergonhado.

_Sinto muito._ Disse baixinho.

Dei de ombros.

_Sinceramente, isso não me entristece.

Ele assentiu. Felipe pigarreou e mudou de assunto.

_Por que vocês estavam se escondendo?

_Por causa dos Revolucionários._ Respondeu Mário. Então, acrescentou, antes de fazer qualquer pergunta. _São os opositores ao Governo. Tentam mudar o sistema atual. Por isso se vestem de preto._ Fez uma pausa para absorvermos a informação. _Agora eles estão sequestrando as pessoas por algum motivo. No mesmo dia, na mesma hora. Por isso nos escondemos. Todos acham que essa cidade está abandonada há anos._ Ele sorriu.

Eu e meus amigos nos entreolhamos. Era impressionante, eu tinha de admitir. Provavelmente, tinham alguém que buscava comida e água na floresta. Pelo fato de Mário ser um soldado (ou pelo menos eu presumia que ele era), provavelmente tinham armas para se defender contra animais como lobos ou algo parecido.

_Acho que devemos ir._ Disse Felipe, se levantando rapidamente. _Acho que já está ficando de noite e quanto mais cedo chegarmos lá, melhor.

Franzi a testa. Mas percebi que ele devia ter razão. Quando entramos no prédio, o Sol já estava se pondo. Me levantei também, e Letícia fez o mesmo, embora não estivesse tão disposta assim.

_Não querem ficar para dormir aqui?_ Perguntou Mário.

_Não, obrigado._ Respondi.

Agradecemos pela ajuda dele e descemos as escadas de novo.

_Isso foi muito impulsivo, Felipe!_ Disse Letícia, com raiva. _Eu nunca tenho o direito de tomar uma decisão nesse grupo.

Ele parou bruscamente, olhando pra irmã com um olhar de indignação.

_Você é a causa de eu estar nessa missão!_ Falou. _E se quer falar de coisas impulsivas, fale sobre o que o Fernando fez!

Eu fiz uma careta.

_Como assim?_ Indaguei.

_Anunciar a nossa chegada!_ Respondeu ele. _E se eles fossem agressivos?

Revirei os olhos.

_Se eles fossem agressivos..._ Comecei. _não estariam se escondendo. Estavam em maior número. Não tinha motivo para se esconder.

Ele bufou. Depois começou a andar na frente, pisando duro.

_Pode ser._ Disse depois de um tempo.

Letícia se aproximou.

_Sabe que não precisa depender de nós, certo?_ Perguntei.

Ela assentiu.

_Não estava falando realmente sério, sabe? Acho que é até melhor eu não tomar as decisões.

Eu não sei exatamente o porquê, mas aquilo me fez rir.

_Por que?_ Indaguei.

_Não tenho a experiência em viagens do meu irmão, nem a sua inteligência._ Respondeu ela, com certa vergonha no olhar.

Andei um pouco em silêncio, pensando no que dizer.

_Isso é besteira._ Falei, finalmente. _Você tem um pensamento rápido.

Ela corou um pouco.

_Você acha?

Assenti.

Finalmente, chegamos na saída. Como Felipe dissera, já estava de noite.

_Não vamos dormir nessa noite, não é?

_É._ Respondi. _Perdemos algum tempo nessa cidade. Temos que evitar parar agora. Quero sair daqui antes do amanhecer.

Ele assentiu concordando. Então abriu a porta. Um vulto pulou sobre ele. Era forte o suficiente para derrubá-lo. Letícia gritou. Corremos lá fora para ajudá-lo. Não era necessário. Felipe havia cravado sua lança no lobo que o havia atacado.

Letícia se precipitou na direção dele. Ela foi interrompida pelo olhar assustado com que ele olhava para algo atrás de mim.

Virei-me rapidamente, com a espada já na mão. Meu coração deu um salto gigantesco quando eu vi o que assustava (com razão) Felipe.

Uma matilha de lobos olhava faminta para nós.


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