The 69th: For What I Believe In escrita por Luísa Carvalho


Capítulo 27
Sob os Holofotes


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem! Para relembrar a personagem de The 68th que volta nesse capítulo (apesar dela já ter sido mencionada no começo dessa), recomendo a leitura do começo do capítulo 5 da primeira fic. Para relembrar um acontecimento específico que vai ser mencionado, recomendo a leitura do final do capítulo 5 da nova fic. Essas são só sugestões que passaram pela minha cabeça, reler não vai fazer falta!



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(POV June)

Eu e Burton estamos bem. Não que isso signifique que sabemos exatamente o que fazer com o status de nossa relação, mas estamos bem. Porém, é durante uma manhã calma em que estamos ambos em minha casa que isso se mostra não ser o bastante.

Ele tem o braço sobre meus ombros e nossos corpos estão tão perto um do outro que poderiam estar grudados. Faz alguns segundos que estamos em silêncio, apenas usufruindo da companhia um do outro, mas essa tranquilidade logo é interrompida por algumas batidas pausadas na porta principal.

– Você está esperando alguém? - ele me pergunta enquanto desmanchamos nossa pose, e eu o faço com certo pesar porque estava realmente confortável.

Nego com a cabeça e caminho até a porta sem ter a menor ideia de quem poderia estar ali atrás. Me aproximo da pequena lente redonda que é o olho mágico e vejo uma imagem ampliada e levemente distorcida de um grupo com no mínimo sete pessoas. A princípio, estranho a situação; o que aquelas pessoas poderiam querer comigo?

Contudo, logo percebo que não são apenas indivíduos aleatórios parados em frente à minha porta; conheço algumas dessas pessoas. Ok, conheço só uma delas, mas a conheço muito bem.

– Fennie! - não hesito em gritar assim que enxergo o cabelo azul com mechas e os olhos delineados que reconheceria em meio a qualquer multidão. Percebo que ainda há uma porta de madeira entre nós, portanto direciono uma de minhas mãos para a chave pendurada na fechadura de ouro. Assim que tenho Fennie realmente em frente a mim, jogo-me em seus braços e sinto meu abraço sendo correspondido com a mesma intensidade.

– June, minha estrela! - exclama enquanto temos nossos braços entrelaçados. Ela então se desvencilha de mim e coloca as duas mãos em volta de minhas bochechas, quase como se estivesse tentando sentir o formato de meu rosto. - Eu estava com tantas saudades de você, querida!

Estou com um sorriso no rosto que vai de orelha a orelha.

– Eu não achava que nos veríamos tão cedo assim - eu digo, e ela assente com a cabeça para indicar que pensava a mesma coisa. - Afinal, por que você está aqui?

Fennie começa a olhar em direções aleatórias atrás de mim, e percebo que procura algo dentro de minha casa. Sempre inconveniente, é claro.

– Você… Quer entrar? - pergunto a ela um tanto sem graça quando vejo que já tem a cabeça dentro da porta. Ela não me responde, mas não demora muito até que volte a olhar para mim.

– É, vocês são tão previsíveis - Fennie comenta de forma totalmente aleatória, sem que eu nem mesmo saiba a quem além de mim ela está se dirigindo. - Estou aqui com um objetivo que envolve ambos os pombinhos.

Fica claro para mim que ela procurava por Burton e que agora fala com nós dois. Penso que é melhor se ele ao menos souber que ela está aqui.

– Burton! - grito, chamando por ele com apenas a cabeça no hall de entrada exatamente na posição de Fennie momentos antes. - Acho que você vai querer ver quem está aqui.

Ele vai se aproximando de nós de forma desleixada, passando pela porta principal enquanto coça o topo da cabeça. Assim que vê o grupo de pessoas parado em frente à fachada, para onde está. Mas há uma leve chance de que ele o tenha feito só depois de reconhecer a mulher de cabelo azul ao meu lado.

– Fennie? - pergunta, parecendo ainda confuso. - Uau, por essa eu não esperava.

Não acho que já tenha visto os dois conversando entre si. Porém, não é surpresa que se conheçam, pois inúmeras foram as vezes em que Burton e Fennie jantaram ou tomaram café da manhã na mesma mesa. Ainda que não sejam os mais íntimos dos amigos, ambos eram parte da mesma equipe durante os Jogos. A minha equipe.

– Burton! Bom te ver também! - ela se aproxima dele e o cumprimenta com um abraço e um beijo na bochecha. Ainda próximos um do outro, Fennie parece querer sussurrar algo em seu ouvido. - Acho que no fim eu estava certa sobre você e June, não é?

É, Fennie não sabe sussurrar.

Cai a ficha de que Burton e Fennie tiveram seus momentos e que os assuntos de que trataram obviamente me envolveram. Teria ela ajudado Burton enquanto ele mantinha seus sentimentos em segredo? Teria Burton pedido conselhos? Pedido ajuda? Fennie é realmente uma boa ouvinte, paciente como se deve ser. Eu não me surpreenderia se Burton tivesse recorrido a ela para desabafar.

– Posso saber sobre o que você estava certa, Fennie? - pergunto, sem conseguir evitar a curiosidade.

– Ah, não, certamente temos assuntos mais importantes agora. - Fennie dá uma piscadela para Burton que, ainda que sem graça, retribui com um sorriso. - Você não queria saber por que estou aqui?

Assinto com a cabeça. Estou realmente querendo saber o porquê de sua vinda; o que seria tão importante a ponto de trazer uma estilista da Capital a um simples distrito após a Turnê da Vitória?

Fennie faz um gesto que indica o grupo de pessoas atrás de si que se entretém em conversas animadas. Noto-os pela primeira vez, e o mesmo parece acontecer com eles quanto a mim. Sem saber muito bem o que fazer, aceno de forma envergonhada, recebendo sorrisos e outros acenos em resposta.

– June e Burton, apresento-lhes suas equipes de preparação e filmagem! - Fennie anuncia, entusiasmada. Porém, eu e Burton nos entreolhamos de maneira confusa. O que raios essas pessoas vieram fazer aqui?! - Ah, não está claro ainda? Vocês vão dar uma entrevista exclusiva para a Capital! Mas não se preocupem, pois não vai precisar ser ao vivo. Vocês têm quantas chances quiserem.

Não consigo entender. Não tenho nada a dizer para a Capital, ou melhor, nada que possa interessar ninguém lá fora meus pais - e para eles eu liguei não faz muito tempo. Além do mais, já tive tempo demais sob os holofotes para querer isso mais uma vez; não sinto a mínima falta dessa vida.

Porém, nesse caso não sou só eu que eles querem; trata-se de nós dois: tanto eu como Burton. Dois Vitoriosos. Duas estrelas para a televisão. Não, não pode ser o que estou pensando.

E é como se Burton lesse minha mente.

– Por favor, Fennie, não me diga que vamos ter que falar sobre nós dois - ele diz, e vejo o sorriso no rosto dela se desmanchar.

– Vocês não estão animados? - Ela soa ao mesmo tempo desapontada e indignada. Não sei se é porque nós duas convivemos somente durante os Jogos, mas Fennie parece pensar que eu gosto de expor minha vida pessoal. - Vocês dois como um casal é a notícia mais quente em toda Capital! Foi divulgada faz pouco tempo, e desde então a mídia vem sendo pressionada para conseguir alguma coisa vinda diretamente de vocês. Decidiram fazer uma entrevista e eu fiz tudo o que pude para conseguir vir como sua estilista, apesar de não conseguir trazer todos da sua equipe dos Jogos comigo…

Preciso interrompê-la.

– Não me leve a mal, Fennie - começo de forma calma para não magoá-la apesar de ver que já está verdadeiramente sentida -, adorei ter você aqui e tudo mais, mas nem eu nem Burton queremos nos expor desse jeito. Espero que você entenda.

Porém, ela não ameaça chorar ou faz cara de coitada. Fennie apenas suspira e coloca uma mão sobre meu ombro, fazendo o mesmo com Burton ao meu lado.

– Ah, querida, eu acho que você não me entendeu direito. Se há ordens para que a mídia consiga alguma coisa, isso vai ser divulgado, sem mais. Vocês não têm como opinar, por mais que eu odeie dizer uma coisa dessas.

Não me surpreendo com sua resposta apesar de obviamente não ser o que eu queria ouvir. É claro que não podemos opinar. Quando é que ordens vindas da Capital são escolhas? Nunca foram, até onde eu sei. Só não sei por que pensei que nesse caso pudesse ser diferente.

Viro-me para Burton, que parece ainda um pouco atordoado com a ideia. Percebo que não sei quanto tempo faz desde que ele teve que se expor dessa maneira. A ideia está mais recente em minha mente devido aos Jogos e à Turnê, portanto assumo que deve ser mais fácil para mim aceitá-la do que é para ele.

– Você está bem com isso? - pergunto, segurando sua mão para dar-lhe um pouco de segurança, se é que isso realmente ajudaria em alguma coisa.

Burton olha em meus olhos e assente com a cabeça.

– Vai ser suportável - responde, e sem pensar muito dou um beijo em sua bochecha.

– Agora! - Fennie grita um pouco mais à frente. - Pegaram isso? Por favor, digam que sim!

Eu rio sozinha.

– Sério, Fennie? Agora? - indago ao ver que ela tenta movimentar toda a equipe de filmagem para captar um simples beijo na bochecha, apesar de não ter nenhuma autoridade em meio àquelas pessoas sendo uma estilista. Porém, noto que estou sendo ingênua demais; não há como argumentar com Fennie quanto à sua espontaneidade. A não ser que meu argumento envolva algo ainda mais importante. - Como você, como a séria profissional que é, pode deixar que algo que nos exponha enquanto vestimos esses trapos vá ao ar?

Aponto para nossas roupas que de fato não são nem de longe glamurosas: tanto eu quanto Burton não fugimos de tons de marrom, branco e preto, com ênfase nas peças furadas como o colete de couro que uso por cima de uma camisa branca com um botão faltando. Não é surpresa que moda não seja meu forte.

– June, você tem razão! - Fennie tem agora as duas mãos esticadas sobre as bochechas, perplexa. “Mas que crime da moda!”, “Como minha estrela ousa vestir algo assim?” ou “Será que ela está contaminando Burton?” são frases que, imagino, facilmente estariam passando por sua cabeça nesse momento. - Venham, preciso mostrar a vocês os modelitos que preparei! São divinos!

Nós a seguimos para dentro de minha própria casa e depois de quase uma hora me vejo arrumada dos pés a cabeça ao lado de Burton. É claro que estou usando azul; depois da noite da entrevista em que Fennie me vestiu como uma princesa, essa parece ser sua cor preferida quanto à escolha de tecidos para minhas roupas. Dessa vez, porém, o tom de azul escolhido por ela é apagado, quase desbotado. Talvez o motivo disso seja a atmosfera do Distrito 6, diferente da “capitalesca” presente até mesmo na Turnê dos Vitoriosos, ainda que essa tenha se passado nos distritos. Uso um vestido de mangas longas e soltas, uma faixa azul escura para marcar minha cintura e uma de mesma cor para prender meus cabelos no topo da cabeça como na Colheita. Quanto a Burton, ele veste uma camisa simples e séria enfiada para dentro de uma calça escura perfeitamente ajustada a seu corpo.

– Eu sei, eu sei - Fennie começa a falar enquanto nós dois nos olhamos no espelho -, essas coisas simples não são meu estilo. Ainda assim, eu quis fazer com que vocês se mostrassem como meros moradores Distrito 6, não é lindo?

O jeito dela de dizer aquilo tende a nos aproximar de atrações como em um zoológico. E aqui ficam os habitantes do Distrito 6 em seu habitat natural. Não levo nada disso como uma ofensa, porém; tive tempo suficiente de convivência com Fennie para aprender que nada do que diz é propositadamente ruim, que ela só não pensa duas vezes antes de falar. Exatamente como eu, ainda que essa característica minha venha se mostrando menos acentuada.

– É, Fennie, é lindo. - Burton dá nela um abraço e não consigo conter um sorriso. Ele sabe exatamente como tratar as pessoas, sabe o que dizer e quando dizê-lo.

Saímos finalmente de casa e nos dirigimos ao centro da Aldeia dos Vitoriosos. Vejo que câmeras grandes, microfones pendurados em cabos compridos e pequenas mesas de edição de som foram montadas em frente a uma fonte redonda.

– Quando quiserem - Fennie nos diz enquanto aponta para um espaço artificialmente iluminado, ainda que a luz natural do dia vigore firme e forte.

Posiciono-me ao lado de Burton e ele segura minha mão, provavelmente tanto porque sente necessidade de fazê-lo quanto porque alguém pediria que o fizéssemos cedo ou tarde.

– Eu vou perguntar algumas coisas a vocês - informa-nos um homem que está em pé atrás da mesa de som e em frente a um microfone. - O momento das perguntas vai ficar gravado e podemos fazer alguns cortes depois, então podem responder quantas vezes quiserem e vamos selecionar a melhor resposta que conseguirmos.

Faço que sim com a cabeça, preparada. Ao ver meu gesto, o homem do microfone levanta o polegar para o resto da equipe, que se movimenta de forma a ligar a câmera, o microfone comprido e algumas outras coisas acionadas por diferentes botões da mesa. Antes de que tudo possa começar, faço questão de virar-me para Burton.

– Ei, você lembra como fazer isso. Vai dar tudo certo - eu o asseguro em uma tentativa de deixá-lo menos acanhado.

– June, não que eu não esteja nervoso, mas agora estou por você do que por mim. Você tem uma habilidade impressionante de dizer o que não deve em frente às câmeras, lembra? - Memórias das entrevistas antes e após os Jogos voltam à mente. É, talvez eu tenha esse problema, mas sei que posso me controlar se quiser.

Pelo menos tentarei me controlar.

– Ação! - o homem do som grita, e sorrio quase que automaticamente para o nada. Para minha surpresa, ele tira seu microfone do pedestal e ele mesmo vai para frente das câmeras. É, eu deveria ter imaginado que seu visual tão extravagante não foi feito para os bastidores. - Estou aqui hoje com June Haylon e Burton Robertsen, ambos Vitoriosos dos Jogos Vorazes. Como todos nós sabemos, June venceu a edição desse ano tendo Burton como seu mentor. Agora que é oficial o romance entre os dois, viemos ao Distrito 6 para que June e Burton possam dar a vocês notícias quentinhas a respeito de suas vidas.

Eu tinha esquecido o quanto as entrevistas da TV Capital eram ridículas. Respiro fundo, tentando me concentrar no que realmente importa. Sorria, June.

– Burton, vamos começar com você. Pode dizer como é namorar uma garota da Capital?

Não consigo entender o porquê da pergunta pensando como alguém da Capital. Eles querem saber como é para ele namorar alguém “civilizado”? Se é difícil atender às minhas expectativas? Surpreendo-me quando ouço uma resposta perfeita na primeira tomada da entrevista.

– Bom, digamos que desde o início June já não quis se mostrar uma garota da Capital - Burton diz, e tanto o apresentador como eu rimos porque sabemos que o que ele disse é pura verdade. - Não é muito diferente na nossa relação. Desde o começo eu percebi como somos parecidos, então o lugar de onde ela vem só faz com que a gente se atraia das duas maneiras: tanto como opostos quanto semelhantes.

É extremamente natural; as palavras saem de sua boca como ar de sua respiração. Imagino como isso deve tê-lo ajudado nas entrevistas de seus Jogos, quantos paraquedas ele deve ter ganho por ter conquistado os Patrocinadores. Porém, apesar de minha surpresa quanto à sua habilidade com as palavras, a única coisa com que realmente me importo naquele momento é a vontade de que suas palavras tenham sido verdadeiras.

Tempo vai, tempo vem, passamos quase meia hora gravando respostas espontâneas - bom, nem sempre - às perguntas, às vezes tendo de responder três ou quatro vezes a mesma coisa de maneiras diferentes.

– Ótimo - comenta uma mulher no meio da equipe de filmagem. Ela encara um monitor que provavelmente reproduz as imagens captadas pela câmera. - Acho que ficou tudo ótimo até agora. Vamos gravar a última pergunta, pode ser?

Assinto, já cansada de toda aquela enrolação. Burton parece pensar o mesmo.

– Ainda bem - ele diz, passando a mão pela testa como se limpasse suor do rosto -, não estou aguentando mais.

– Está brincando? - comento, jogando os braços para o alto, exagerada. - Você nasceu para as câmeras!

Ele ri.

– As câmeras me amam, mas isso não significa que o contrário também aconteça.

A equipe de filmagem prepara todos os equipamentos uma última vez e faço questão de pegar bastante ar na respiração em uma tentativa de manter-me tranquila. Só mais uma, June; não vai doer, vai?

– Para encerrar nossa entrevista, vou dar a palavra a June - o apresentador anuncia, sorrindo para mim. - June, sabemos que você perdeu seu irmão, Cameron, na Arena…

Ah, não. Não pode ser.


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Notas finais do capítulo

Pois é, gente, tava bom demais pra ser verdade. Alguém tinha que voltar a atormentar a June uma hora ou outra...
Espero que tenham gostado! Me ajudem nos comentários (:



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