Segredos Fatais escrita por DJDCAL


Capítulo 13
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

oioi meu povo... contei pra vcs que to tentando ir pros States?? poise, eia a razão do meu atraso. o cap tava pronto faz tempo e só precisava do finalzinho e da revisão, mas como eu tive que vir pra SP pra tirar o visto ficou difícil escrever. tirar visto e difícil hein gente!! poise, desculpa mesmo, se divirtam com esse e torçam pra que eu consiga o meu visto amanhã e não tenha que voltar aqui pra isso de novo.
outra coisa, gente cadÊ os meus comentários?? :( to com saudades de saber o que vcs pensam dos meus personagens..
agradeço a quem comentou... de verdade! amo ler as reaçoes de vcs, especialmente pq geralmente são as reaçoes que eu quero provocar.
divirtam-se com esse cap...
bjo



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“Dizem as más línguas que a minha namorada está indo viajar com o meu melhor amigo pra um país tropical exótico e ela nem mesmo me contou...” foi a primeira frase que ouvi Matt dizer quando liguei o skype no nosso voo.

Eis aí mais uma prova da riqueza dos Monroe. Sabe quando você entra num avião e a aeromoça diz para desligar todos os aparelhos eletrônicos por razões de segurança? Pois então, isso é para que as ondas eletromagnéticas que celulares e outros eletrônicos possuem não interfiram com a comunicação entre o piloto e a torre de controle. Mas o jato particular da Monroe Enterprises faz sua comunicação por um canal fechado de ondas especiais que não são compatíveis com as que os aparelhos eletrônicos do dia-a-dia utilizam. Assim, lá dentro eu tinha acesso até a WiFi, e poderia conversar com o meu aparentemente ciumento namorado.

Detalhe: os únicos outros aviões que possuem essa tecnologia nos EUA são os da casa branca.

“Desculpe, eu não tenho namorado, tô de rolo com um gatinho aí, mas não sei se tem futuro não...” eu zombei e aquele sorriso maroto que eu tanto admiro cruzou o seu rosto. “E desde quando o Brasil é exótico?” eu perguntei divertida.

“Eu sei lá, simplesmente é! Praia, calor, água de coco, samba, comidas típicas...” ele foi enumerando já completamente entretido nessa conversa. Uma das coisas para se saber sobre Matt Johnson é que ele é impossivelmente fácil de distrair e eu precisava do tempo extra para escolher uma resposta apropriada para a sua pergunta que não desse a entender que eu tinha esquecido dele. Afinal, sair pra viajar com o melhor amigo do seu cara, mesmo que esse amigo seja seu chefe, e levá-lo pra um casamento não é exatamente a ideia mais inteligente se você quiser manter o relacionamento.

“Já vamos parando por aí...” eu disse “Primeiro: nem toda cidade brasileira tem praia sabia? Segundo: nos EUA é verão agora, mas no Brasil é inverno e nós estamos indo para uma das cidades mais frias do país. Terceiro: eu odeio água de coco. Quarto: meus amigos e eu não somos do tipo que samba, aliás, caso você não saiba, tem muito brasileiro que não samba. E quinto: o que tem de típico no arroz e feijão?” eu fui enumerando as minhas razões nos dedos e assistindo o sorriso dele crescer.

“Não importa o que você diga, o Brasil ainda é um país romântico, e você sabe.” Ele respondeu convicto.

“Se você diz...” eu retruquei vendo que precisava esclarecer isso entre nós antes que se tornasse um problema. “Qual é Matt, você honestamente está com ciúmes de Alexander?” perguntei incrédula.

“Tudo o que eu sei é que eu não fui convidado para esse casamento. E até hoje eu não conheci uma mulher que não caísse de amores pelo Alex” ele falou com um biquinho e eu tinha que admitir que era ótimo ter o meu namorado com medo que eu fosse “roubada” por outro.

“Ownt... que dózinha do Matt!” eu fiz um pouco de birra. O mínimo que eu podia fazer era me divertir com a reação dele.

Claro que não tinha escapado da minha atenção a beleza de Alexander, muito menos os seus dons de flerte (mesmo que eles nunca tenham sido completamente direcionados a mim) e eu tinha que admitir que ele me deixava desnorteada de vez em quando, mas eu não podia me imaginar apaixonada por Alexander Monroe. Ele era certamente intrigante, nós havíamos partilhado momentos importantes e intensos que certamente nos deixaram mais próximos, no entanto, toda aquela tensão entre nós, toda aquela química não era superada pelo bom humor e o carisma de Matt. Não superava as borboletas no estômago que eu sentia quando o via, nem muito menos a velocidade do meu coração quando ele sorria. Matt era leve e divertido, e estar com ele era fácil como respirar. Definitivamente o meu tipo.

“Relaxa bonitinho, se é só um convite que te falta, por favor, venha para o Brasil urgentemente e dance comigo no casamento da Stephanie.” Eu deixei o desejo que sentia de ter ele por perto colorisse o meu sorriso e esperei que mesmo através da barreira tecnológica entre nós ele pudesse ver que eu realmente desejava que ele estivesse comigo naquele evento.

“Bonitinho hein? Nós vamos ser daquele tipo de casal que tem apelidos um pro outro?” ele perguntou com aquele sorriso zombeteiro e eu soube que o tinha convencido.

“Mas é claaaaro que sim! Você já pode escolher entre bonitinho, meu bem, querido, meu ursinho Pooh...” eu fui falando e nós acabamos gargalhando muito juntos, tanto que eu me preocupei em acordar Alexander que estava deitado em um sofá cama a alguns metros de mim.

Ele tinha tomado um relaxante muito forte e capotado com terno e tudo no sofá. Era uma cena cômica de se ver para quem só o viu em perfeito estado de controle ou completamente destruído pela dor. A paz de seu rosto adormecido mudava suas feições completamente, tornando-o praticamente irreconhecível e, inevitavelmente, engraçado.Eu resisti à tentação de colorir seu rosto com pasta de dente.

“Eu não acho que possa ir Nessa, mas vou fazer o possível ok? Tenho que ir pra uma reunião agora, mas te mando uma mensagem se puder ir.” Ele respondeu em um tom mais sereno.

“Ok” foi tudo que respondi com um sorriso enorme. Era tão bom ver o carinho que ele tinha por mim naqueles olhos verdes que eu sempre ficava sem palavras.

* * *

“Acorda bela adormecida” eu chacoalhei o ombro de Alexander na hora do jantar. Ainda tínhamos algumas horas de voo, mas o avião parou para abastecer no aeroporto de Salvador e eu estava muito afim de uma tapioca.

“Hmmm” foi a resposta brilhante com a qual fui agraciada pelo meu amado chefe.

“Vamos Alexander você está dormindo faz 10 horas, no mínimo você precisa de alguma coisa pra comer.” Chacoalhei-o com mais veemência e ele abriu os olhos dando um solavanco de susto no sofá e rapidamente se sentando quando percebeu que era eu quem o acordava. Eu removi minha mão de seu braço já gargalhando da expressão de puro terror que ele tinha acabado de exibir e ainda mais da raiva que ele mostrava agora.

“Que bom que eu te divirto” ele comentou amargamente enquanto se dirigia para o banheiro para se olhar no espelho. Eu juro que tentei, mas não pude evitar explodir ainda mais em risadas quando ouvi seu grunhido quando se deparou com a bagunça de seus cabelos normalmente tão impecáveis.

“Vamos logo, temos que ir jantar e voltar para mais 3 horas de viagem daqui até Curitiba.” Eu reclamei.

“Não estou com fome” ele resmungou pela porta trancada e eu ri ainda mais da forma infantil que ele estava agindo.

“Você é revoltadinho quando acorda hein? Tá me dizendo que vai perder a oportunidade de conhecer um pedaço de Salvador com uma tradutora? Dizem por aí que o Brasil é um país ‘exótico’” eu ri ao pronunciar a ultima palavra me lembrando de Matt.

“Onde nós estamos mesmo?” sua cabeça espetou pra fora do banheiro e eu não tive forças para segurar a gargalhada que se renovou em minha garganta quando ouvi sua voz sair abafada já que o silencioso, calmo, sério, frio Alexander Monroe estava com a boca cheia de espuma e a escova de dente pendurada do lado direito de seus lábios. Rapidamente ele percebeu sua gafe e saiu do meu alcance de visão.

“Salvador” eu respondi quando finalmente consegui respirar. “Paramos para abastecer. O piloto disse que pode demorar uma hora e pouco já que tem outros aviões na fila então eu pensei de sair pra comer uma tapioca na cidade. Você tem certeza que não quer vir?” disse me levantando e indo em direção à porta do jato que estava aberta e acoplada ao túnel que nos levaria diretamente para dentro do aeroporto.

“Claro...” ele saiu do banheiro, novamente parecendo com o meu rígido chefe. O único vestígio de sua “soneca” eram as leves dobras no tecido de sua calça social e paletó do terno que, em outras circunstâncias estariam impecáveis. Ele veio em minha direção, querendo passar pela porta, mas eu o impedi estendendo minha mão espalmada a poucos centímetros de seu peito.

“Você não tem algo tipo... um jeans pra vestir?” eu perguntei irônica e ele pareceu notar que eu tinha trocado minha calça social preta, blusa azul escura e saltos por um vestido bem fresquinho de tecido branco com flores em tons de por do sol espalhas pela barra um pouco acima dos joelhos até a cintura levemente marcada, e um par de rasteirinhas amarelas nos pés.

“Eu achei que você tivesse dito que é inverno no Brasil agora.” Ele disse relembrando das minhas informações antes da viagem.

“E é, mas no nordeste inverno é igual à chuva de vez em quando e temperatura de 20ºC a maior parte do tempo. É raro que realmente faça frio nessa área.” Eu respondi com um sorriso de compreensão. Inverno em Chicago e inverno em Salvador são dois conceitos bem diferentes.

Ele me olhou levemente indignado e tirou o paletó voltando pra dentro do avião e deixando-o junto com a gravata em cima do sofá. Entrou no quarto que tinha depois do banheiro e rapidamente voltou com calças jeans, uma camisa polo vermelha e sapatos que, apesar de sociais, não brilhavam tanto quanto os que ele costumava usar pra trabalhar. Assim que me viu ele abriu os braços e fez um movimento com as mãos como se me perguntasse: tá bom assim pra você? Eu sorri abertamente e respondi ao seu gesto silencioso:

“Perfeito.”

Saímos do avião e uma funcionária mostrando a simpatia que só os ricos e famosos recebem nos ofereceu um serviço de chofer completo exibindo um inglês impecável. Alexander estava para aceitar quando eu recusei e perguntei se ela não tinha algum carro para aluguel que eu pudesse dirigir, já que eu tinha carteira de motorista brasileira. Ela mais do que prontamente me disse que sim e já foi fazer os arranjos necessários nem mesmo se importando em checar com Alexander se era isso que ele preferia. Eu era a assistente dele e ela assumiu que eu saberia o que o Sr. Monroe queria mais do que qualquer um. Existem ocasiões em que a assistente tem mais poder que o patrão. Eu ri internamente com o pensamento, sentindo os olhos fuzilantes do meu chefe sobre mim.

“O que você pensa que está fazendo? Você sequer conhece essa cidade? Eu achei que você morasse em Brasília!” ele sibilou para mim enquanto seguíamos a funcionária até o estacionamento.

“Relaxa Alexander, eu vivia passando as férias aqui, minha tia mora nessa cidade a mais de 20 anos e ela me ensinou como andar por aqui, além do mais, ninguém anda com chofer em Salvador! Talvez alguém no Rio, ou em São Paulo, mas eu acho que não aqui.” Eu retruquei na maior calma o que obviamente o irritou até a raiz do cabelo. Ah como eu estava amando essa noite.

“Eu não sou ninguém!” ele exclamou, deixando escapar um resquício do garoto mimado que eu sei que ele foi. Nesse momento chegamos até um Fusion preto do último modelo, tão limpo que chegava a brilhar em frente aos meus olhos. A moça me entregou os documentos do carro, as chaves e voltou para dentro do aeroporto. Eu acho que Alexander continuou reclamando no meu ouvido, mas eu não podia me concentrar no que ele falava porque eu e aquele carro estávamos tendo uma conversa muito mais séria.

“Quando em Roma...” eu acho que ouvi Alexander resmungar quando se juntou a mim no carro, mas eu não posso ter certeza porque esse foi o momento em que eu virei a chave na ignição e ouvi o suave murmurar do motor 2.0 sentindo a leve e gloriosa estremecida que o carro deu quando saímos da vaga.

Caso você não tenha percebido: eu amo carros!

“Você está bem?” ele perguntou enquanto eu percorria o labirinto de carros no estacionamento em direção à saída. Seus olhos expressavam uma preocupação engraçada, como se ele sentisse medo que eu estivesse drogada ou algo assim.

“Nunca estive melhor” Virei e sorri de canto para ele o que pareceu só deixá-lo ainda mais amedrontado. “Você tem noção de como eu sonhei em dirigir um carro desses alguns anos atrás?” eu gargalhei em contentamento.

“Hum... não?” havia incerteza em sua voz,não sei dizer se era por causa da minha pergunta retórica, ou se ele ainda tinha medo do meu estado mental.

“Esse é um Fusion 2014 total flex com 175 cavalos de potência, motor 2.0, teto solar, automático com suspensão dianteira e traseira independentes além de tração nas quatro rodas. Esse carro vai de 0 km à 120km/h em tão pouco tempo que tira o meu fôlego! Eu venho sonhando em dirigir um desses a muito tempo!” eu disse acariciando o volante enquanto analisava a fila de carros a minha frente.

“Um carro? Você vem sonhando em dirigir um carro?” ele perguntou incrédulo.

“Isso te surpreende por que eu sou uma garota?” eu perguntei, calmamente encarando a saída do aeroporto a minha frente. Era linda, cheia de bambus enormes de cada lado que faziam um arco sobre a rodovia, e os pequenos pontos de luz entre eles tornavam a visão mágica. Sempre amei a saída desse aeroporto.

“Não...” ele respondeu e eu já sorri em vitória por tê-lo pego em uma mentira, eu nunca cansava de fazer isso. “Quero dizer, sim, mas não tanto quanto o fato de você sonhar com um carro desses e não uma Lamburguini ou um Porsche. Não é isso que todo entusiasta por carros quer?” ele tropeçou sobre as palavras. Isso me surpreendeu.

“Eu prefiro manter meus sonhos um pouco mais próximos da realidade” eu sorri de canto para ele. Alexander pareceu um pouco confuso com a minha resposta. “Pra alguns de nós um carro que custa 40.000 dólares é sonhar alto de mais sabia?” eu dei uma gargalhada de sua ingenuidade.

“É... acho que sim” ele respondeu meio ausente e ficou em silencio pelo resto da nossa jornada em direção ao meu local favorito em Salvador. O farol da Barra.

(https://www.youtube.com/watch?v=IabWZ_wr2Kg) - escrevi ouvindo essa música.

Coloquei o rádio para tocar e fui curtindo o percurso como nunca antes. Existia algo poderoso em voltar pra casa depois de tanto tempo, mesmo que Salvador não fosse exatamente meu lar. Eu não tinha percebido, mas embora eu amasse Chicago, meu trabalho, minhas aulas e as pessoas que lá estavam, quando eu vi o mar a minha esquerda, as pessoas andando na calçada, os vendedores de água de coco reunindo suas coisas pra voltar pra casa, eu percebi o quanto me sentia mais aceita quando estava no meu país de origem.

E isso não tem nada haver com a cor da minha pele, tampouco com o meu sotaque, na verdade as pessoas da minha nova casa sempre foram muito receptivas e nunca me maltrataram por algo relacionado à minha nacionalidade (A não ser, é claro, quando elas supunham que ser brasileira era sinônimo de prostituta). Talvez eu estivesse ficando meio louca afinal, mesmo gostando da praia, eu nunca passei muito tempo em cidades praianas. Talvez fosse o português que eu podia ouvir sendo falado ao meu redor, eu não sei. Tudo o que eu sei é que há muito tempo eu não sentia um conforto tão grande.

Quando estacionei em frente ao nosso destino respirei fundo a brisa marinha que nunca abandona aquela cidade. Ao meu redor as pessoas passeavam à luz do luar e das luzes artificias da cidade, jogavam bola na areia e compravam lembrancinhas dos vendedores ambulantes que perambulavam pela calçada. Tudo isso ao som das ondas que quebravam no paredão de pedras que ficava ao redor do farol. Eu fui andando calmamente em direção a um vendedor de tapioca que estava bem ao lado de um dos muros de pedra que rodeiam o farol, e Alexander me seguiu, aparentemente tão em transe quanto eu.

“Eu vou querer duas de queijo,por favor” eu disse ao senhorzinho de chapéu em minha frente já o entregando uma nota de 10 reais, agradecendo aos céus por ter lembrado de trocar meus dólares por reais antes de embarcar. O vendedor me entregou o troco,as duas tapiocas e eu agradeci antes de estender uma tapioca para Alexander que ainda parecia completamente absorto pelo quadro a nossa frente. Com uma sobrancelha erguida em questionamento para o que eu lhe estendia ele tomou o nosso jantar de minhas mãos.

“Prove, você vai gostar.” Eu aconselhei mordendo a massa branca e sentindo o gosto da manteiga me invadir. Ai que saudade de tapioca...

Alexander também pareceu satisfeito e comendo ele foi andando em direção à borda da elevação em que ficava o forte com o faro e se sentou na grama mesclada com grãos de areia encarando o oceano. Eu o segui.

“Isso é realmente muito bom” ele disse comendo o último pedaço.

“Que bom que você gostou” eu sorri terminando a minha própria tapioca.

“Desculpe... Pelo comentário dos carros antes...” ele falou reticente e uma coisa que eu nunca imaginei ouvir de Alexander Monroe estava presente em sua voz. Vergonha. Isso me fez encara-lo na hora. Ele ainda fitava o mar.

“Tudo bem” eu disse e um pouco do humor que eu sentia por ver a vergonha nele escapou para minha voz. Isso fez com que ele se virasse para me encarar.

“Não está tudo bem, eu agi como o garoto mimado que eu deixei de ser a muito tempo atrás Vanessa. Isso foi imperdoável!” ele sussurrou em um tom de voz duro e cheio de raiva que, apesar de ter me assustado um pouco, eu sabia que não era direcionada a mim, mas para ele mesmo.

“Já é incrível que você tenha mudado” eu respondi com um sorriso que esperava ser calmo. “Só porque eu sou uma pessoa otimista não significa que eu veja o mundo como se ele tivesse sido pintado em uma tela Alexander” o nome dele ainda fazia cócegas em minha língua quando eu o pronunciava em voz alta. Tinha aquele gostinho de proibido já que, tecnicamente, eu nunca deveria chamá-lo pelo nome.

“Mas eu fui tão rude...” ele começou e eu o parei.

“Sim, mas você se corrigiu e eu sabia que se arrependeria pelo que disse.” Eu continuei a explicar. “Eu mal o conheço, mas sei que seu pai é um bom homem Alexander...” respirei fundo antes de falar o que eu precisava. “...E eu não a conheci, mas pelo que você me contou sua mãe também era uma boa pessoa” ele virou seu rosto para o mar novamente para esconder as emoções que trilhavam o seu rosto. Eu simplesmente continuei: “E é por isso que eu sei que você sempre sabe distinguir o certo do errado.”

“Como você pode ser tão otimista assim Vanessa? Aonde você enxerga tanta bondade?” ele me olhou e eu pude ver uma dose menor do grande desespero que eu tinha visto na noite do último sábado. E mesmo sabendo que a pergunta dele era na verdade uma metáfora, em vez de responder o que ele queria saber realmente, eu o acompanhei escondendo o que eu realmente gostaria de dizer nas entrelinhas de outra verdade que eu escolhi lhe contar.

“Só porque o mundo prega a igualdade entre os sexos não significa que eu não veja a clara diferença entre homens e mulheres se esgueirando sob nossas palavras. Eu ainda digo coisas que são extremamente sexistas, eu ainda vejo discrepâncias enormes que são autorizadas, aceitas e naturalmente impressas no jeito que pensamos desde sempre. Eu vejo as diferenças entre rico e pobre, eu ainda tenho acessos de raiva quando vejo um político corrupto ser absolvido por roubar milhões enquanto um pobre apodrece na prisão por roubar menos de uma centena para alimentar sua família. Eu ainda percebo quando alguém que sempre teve tudo não entende a luta de quem nunca teve nada.” Eu pus a mão em seu ombro antes de continuar. Esperando que o meu toque pudesse de alguma forma passar a tradução das minhas palavras para o seu coração perturbado.

“Mas eu também vejo a alegria de crianças brincando na areia do mar que a ganância manchou de petróleo, eu ainda vejo a felicidade nos olhos da família que não tem muito e ao mesmo tempo tem tudo, eu vejo o amor nos olhos de jovens namorados sonhando sonhos impossíveis com tanta fé que acabam por realizar, eu vejo a esperança no sorriso de pessoas que dão o seu melhor, custe o que custar” eu falei e antes de continuar dei uma pausa e apertei de leve seu ombro para que ele olhasse para mim. “Mas, mais importante que isso. Eu sinto a paz de uma noite calma entre amigos rodeados de problemas, mas que não deixam de se alegrar, eu ouço a sinceridade de uma música a beira-mar e eu sinto a bondade no rosto dos poucos que aparentam ser ótimos, mas lutam contra o que o mundo ensinou, porque querem ser melhores dando de si tudo o que podem dar...” ele sorriu na última frase, sabendo de quem eu falava. “E é por causa desses que eu me mantenho firme, porque são esses que um dia vão mudar o mundo. Um mundo que eu estou disposta a esperar.”

“Você tem certeza que não tá estudando poesia?” ele tentou brincar.

“Nah... Tem coisas que você simplesmente sabe...” eu sorri meio arrogante e ele sorriu de volta. Nisso, eu avistei um vendedor de caldo de cana e sai correndo atrás dele e, eu admito, fugindo do clima cheio de significado entre eu e o homem de olhos gelados ao meu lado.

* * *

“Prepare-se para provar o néctar dos deuses” eu disse a Alexander enquanto tentava voltar para perto dele o mais rápido possível sem derramar o líquido doce em minhas mãos. Não tive lá muito sucesso, mas consegui chegar ao seu lado sem muitos danos.

“Tem álcool nisso aí?” ele perguntou com um ceticismo claro em sua voz.

“Não! Nem tudo precisa ter álcool pra ser bom sabia?” eu me indignei levemente só pra ver o sorriso de vitória que Alexander sempre exibia quando me tirava do sério. Eu me dei por vencida sentado ao seu lado novamente.

Ele encarou o líquido em seu copo e fez uma careta de puro terror e eu não pude deixar de gargalhar.

“Relaxa colega, não é como se eu tivesse te dando sopa de sangue. É só caldo de cana, experimenta”

Ele respirou fundo e tomou um pequeno gole. A princípio sua expressão permaneceu neutra, ele engoliu e logo tomou um gole maior antes de sorrir de lado pra mim.

“Eu não diria néctar dos deuses, porque isso é Whisky, mas até que isso é bem gostoso.” Eu sorri.

Quando terminamos nossas bebidas eu me levantei e fui em direção à praia e Alexander me seguiu. Ao chegar à areia eu retirei minha rasteirinha e fui em direção ao ponto em que a maré chegava e simplesmente parei encarando o mar e sentindo as ondas envolverem meus pés.

Honestamente eu não esperava que Alexander fosse andar comigo até a água, na verdade eu já estava analisando qual seria a melhor forma de zombar dele quando estivéssemos voltando ao aeroporto. Por isso eu me permiti ir até um pouco mais fundo na água morna e aproveitar o movimento do mar que agora quase alcançava meus joelhos.

Eu já mencionei que alegria de pobre dura pouco?

Eu estava feliz

Relaxada

Calma

Aproveitando a brisa salgada que tanto amo quando fui violentamente arrancada de meu momento de paz por água me ensopando pelas costas. Virei-me ultrajada e pude ver um garotinho de no máximo 13 anos correndo até Alexander, que nem se tinha dado ao trabalho de pisar na areia, e pegando dele uma nota e correndo para fora da minha vista.

Encarei a cena embasbacada. Simplesmente sentindo a raiva borbulhar dentro de mim. Pensei em um milhão de palavrões diferentes, considerei ir embora e deixá-lo na praia e, por fim, desejei que Iemanjá, Posseidon e Percy Jackson emergissem da água e defendessem a minha honra. E como, infelizmente, nenhuma dessas opções era necessariamente viável eu decidi que o melhor era ficar por cima.

Eu ia andar até o carro, dirigir e não falar com Alexander pela maior quantidade de tempo possível.

Isso! Exatamente isso que eu ia fazer!

Ótima idéia...

Até que, no meio do meu trajeto de volta à calçada, levantei meu olhar e encontrei, não simplesmente o sorriso sarcasticamente divertido que eu já tinha nomeado como “sorriso de cafajeste”.

Não... o que eu vi foi 10 vezes pior do que isso.

Ele estava GARGALHANDO!

Exatamente! Alexander Monroe, empresário implacável, de personalidade intangível, o homem de gelo, aquele que não tinha demonstrado real felicidade na frente de ninguém em muito tempo estava se dobrando de dar risada da minha miséria!

E sim, eu estou ciente de que deveria ter ficado feliz com esse avanço. Eu deveria ter ido até ele e dar risada junto, ou quem sabe simplesmente ignorar a brincadeira, fazer um comentário sarcástico... essa seria a atitude nobre.

Bom, nobreza é um conceito difícil de alcançar quando se está ensopada de água salgada da cabeça aos pés, com o vestido molhado (vestido esse que é branco por sinal) e a chapinha meticulosamente bem feita. E é por isso que, durante o ataque de risos que Alexander dava, eu enchi um copinho descartável que estava por perto com areia e marchei em direção a ele, mantendo meu braço atrás das costas.

Concentrei-me em dar um show para distraí-lo da minha arma secreta até o momento oportuno:

“Sério mesmo? Nem tem coragem de fazer seu próprio trabalho sujo?” ele só me respondeu com o som esquisito de sua gargalhada.

Talvez ele estivesse fora de prática e não soubesse a hora certa de respirar, então quando o oxigênio se tornava absolutamente essencial ele puxava tudo de uma vez só com um som estranho. Parecia que ele estava tendo um ataque de asma e eu resisti com todas as minhas forças ao impulso de me deixar levar e rir daquela gargalhada ridícula. Felizmente o copo de areia me lembrou que a brincadeira estava muito boa pra deixar de lado.

“Aliás, como você conseguiu que o menino entendesse o que você queria? Você não fala nem espanhol!” enchi minha voz de exasperação para esconder a real curiosidade que rodeava meu cérebro.

Claro que, ele sendo ele, viu por detrás da minha fachada e resolveu me irritar. Lembra daquele sorriso cafajeste que eu estava falando? Pois então, ele apareceu pra marcar presença e quando Alexander conseguiu controlar-se, aproximou-se um pouco mais de mim e falou na voz que ele sempre usa para encantar todo e qualquer ser o sexo feminino:

“Dinheiro é o idioma universal querida...” piscou. Eu já tinha assistido essa jogada em campo incontáveis vezes quando ele mostrava seu charme barato pra cima de todas as mulheres com quem conversava. Especialmente nas malditas festas de gala que eu era obrigada a ir. 99% das vezes essas frases sarcásticas seguidas de piscadas maliciosas funcionavam perfeitamente e as pobres coitadas caiam direitinho em sua armadilha.

Era o momento perfeito.

Antes da minha cartada final, emiti a minha versão do sorriso cafajeste para que ele soubesse que algo estava por vir, só pelo prazer de ver o pânico em seus olhos. E foi aí que ergui meu braço e despejei a areia amarelada por seu glorioso cabelo negro, destruindo o pequeno copo de plástico contra sua cabeça. Era a minha vez de rir.

O que eu posso dizer? Nunca fui parte da maioria.


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