O Teste da Deusa escrita por Risurn


Capítulo 26
Capítulo Vinte e Cinco – Enlouqueço também


Notas iniciais do capítulo

Explico tudo nas notas finais, aproveitem!
[ATUALIZADO 01/02/2017]



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Tentei beijá-lo mais uma vez e outra. E outra. E outra.

Tem que dar certo. Tem que dar certo. Por favor. Por favor. Por favor.

As últimas palavras de Afrodite ainda estavam grudadas na minha mente.

" — Digamos... digamos que isso seja verdade. Digamos que eu realmente esteja amaldiçoada. Como eu quebro o encanto?

Afrodite sorriu enquanto tudo o mais começava a sumir.

— Como se resolvem as grandes histórias? Com um bom beijo do amor verdadeiro. Faça ser digno de cinema, não me decepcione”.

Nico segurou minha cabeça entre seus dedos e beijou levemente o topo da minha cabeça.

— Ei, calma. Vai ficar tudo bem. – Apenas assenti e permaneci de olhos fechados. Eu não podia acreditar. Tem que ser um pesadelo. Tem que ser. – Annabeth, olha pra mim. Por favor.

Com certa dificuldade, obriguei meu corpo a entrar em um estado de dormência. Não era hora de surtar. Preciso ser forte. Preciso ser confiante. Preciso ser corajosa. Preciso ser inteligente.

Encarei o teto da caverna antes de voltar meus olhos aos de Nico.

Preciso ser uma filha de Atena.

Assim que nossos olhos se encontraram, pude ver Nico sorrir, de tão próximos que estávamos. Ainda não conseguia enxergar muito além de nossos próprios corpos no meio da escuridão.

— Assim é bem melhor. Quer me contar o que aconteceu lá?

Apertei meus lábios com força. Preciso pensar rápido.

— Afrodite está ficando maluca. Pelo menos ela confirmou que isso é obra de um deus.

— Quem?

Abri a boca para falar, mas mudei de ideia.

Nico é confiável. Nico é confiável.

— Ela não podia me dizer. Disse que se eu realmente tentar, em pouco tempo terei minha memória de volta e tudo irá ser como antes.

Menti. Menti pra única pessoa em que eu confio no mundo. Menti para a única pessoa que me apoia e me segue para onde quer que eu vá.

Conseguia ouvir do fundo da minha mente o único aviso que o deus dos mares havia me dado sobre Nico: ele nunca lhe faria mal.

E eu menti. Menti. Menti. Menti.

— Então essa viagem foi uma perca de tempo?

Falsa. Mentirosa. Traidora. Medrosa.

As vozes na minha cabeça gritavam contra mim e o mundo todo oscilava.

— Eu não tenho certeza. A gente ainda vai descobrir. Podemos ir? Esse lugar me dá arrepios.

Lembrei de todas as passagens que eu havia visto mais cedo. Não estou curiosa em saber para onde levam.

— Tudo bem. A saída é logo ali. Precisamos voltar para onde entramos.

Deixei Nico pegar minha mão e nos guiar até a parede com o delta. Seus dedos faziam um carinho agradável sobre a minha mão. Aquilo parecia o certo e o errado.

Completamente errado.

Estranho. Estranho de uma forma que nunca deveria ser possível.

Movi meu polegar para acariciar às costas de suas mãos e aí aconteceu.

Em um segundo eu estava dentro da caverna e no outro havia um céu azul acima de mim. A água batia nos meus pés descalços que não paravam de correr um segundo.

Eu podia ouvir o som da minha própria risada, e a de outra pessoa. A risada dele.

Diminui o ritmo dos meus pés e virei para trás, dando de cara com olhos verdes divertidos.

— Eu disse que ia ganhar. – Meus lábios se moveram contra a minha vontade proferindo as palavras. Meu rosto estava congelado num sorriso. Eu não conseguia controlar meu próprio corpo, logo minha mão se moveu até encontrar a de Percy, meu polegar fazendo um carinho leve às costas de suas mãos.

— Amo você.

De repente o sorriso contagiante sumiu, a areia foi substituída por pedras e o céu azul deu lugar à uma caverna sufocante. A cortina de ilusão havia se levantado e eu estava no mundo real outra vez.

Nico me sacudia pelos ombros.

— Annabeth! Annabeth! Está me ouvindo? Você está bem?

Senti minhas pernas moles e apoiei meus braços em seu ombro. Minha cabeça girava.

— O que... O que houve?

— Eu não sei. Em um segundo você estava andando e aí você se segurou em mim e caiu. Ficou completamente fora de ar por quase um minuto. Está tudo bem? As dores de cabeça voltaram?

Neguei.

Minha cabeça não doía como antes, e tudo pareceu muito real. A areia, o calor, o mar, o céu azul, o cheiro da praia, o som de nossas vozes e as mãos se tocando.

Não pode ser.

— Está... tudo bem. Acho que só fiquei um pouco cansada por ficar falando com Afrodite.

Ele trouxe as mãos até minha testa e checou se eu estava com febre.

— Pode ser. Você ficou muito tempo exposta em um local sagrado. Você e Afrodite pareceram levar... Horas.

— Não pode ser.

— Pode ser impressão minha, porque fiquei muito tempo sozinho no escuro. Anda, vamos.

Nico levou os dedos até a parede e apertou o símbolo.

Logo, uma lufada de ar gelado entrou, juntamente com o barulho da passagem abrindo. Nico foi à frente e assim que sai, a passagem se fechou.

Respirei fundo.

— Parecia que eu nunca mais respiraria ar fresco.

Nico olhou em volta e encarou o céu.

— Não falta muito tempo para o sol nascer.

Encarei o céu e vi as estrelas. Milhares delas, olhando do céu para mim.

— Acho que você tinha razão. Fiquei mais tempo com Afrodite do que o esperado.

— Pode ser, de qualquer forma, precisamos ir. Estou com fome. Você tem algo pra comer ai?

Lembrei que tinha uma barrinha de cereal no bolso e estendi pra Nico.

— Eu não posso simplesmente comer isso Annabeth.

Encarei a barrinha na minha mão e olhei para Nico.

— Por que não? É nutritiva, gostosa e mata sua fome.

— Não quero.

— Nico. Pega isso.

— Deméter vai me encher o saco pra sempre.

— Come logo.

— Eu odeio cereal, você sabe. – Ele pegou a barrinha a contragosto. – Mas estou morrendo de fome. – Nico encarou os céus e gritou: Deméter, que fique claro que isso não significa nada!

Comecei a rir e Nico me encarou enquanto sorria.

Ele me trazia paz. Não podia ser falso. Não podia ser.

— Sabe, eu acho que a gente devia acampar um dia desses. – Sugeri sem pensar.

— Acampar?

Nico parecia feliz enquanto se esticava.

— É. Você sabe. Passar um tempo olhando as estrelas, fazer uma fogueira, assar...

O semblante de Nico endureceu de repente e ele pediu silêncio com os dedos.

Não entendi o que estava acontecendo, mas ele parecia decidido. Seu rosto me dizia para não perguntar nada ainda.

Por alguns segundos, eu só consegui escutar o som dos grilos, a água dos córregos, a neve escorregando vez ou outra e o vento balançando os pinheiros. Nada fora do normal.

Mas Nico ainda ouvia algo mais.

Era quase muito tarde quando Nico levantou os olhos para algo atrás de mim e gritou.

— Abaixe!

Mal tive tempo para pensar quando meu corpo foi pressionado contra as pedras do chão.

— Mas o que...

— Quimera! Mate primeiro, pergunte depois! – Nico gritou, enquanto nos levantava, já com a espada em punho.

Ainda não sei explicar como ele pode fazer isso com tanta rapidez.

O monstro havia se arrastado por vários metros com a força do pulo, e tentava se levantar. Má ideia. Má ideia.

Puxei minha adaga e olhei em volta, procurando pela mãe do monstro.

— Como nós vamos matar uma quimera? Não conseguimos da última vez!

— Podemos tentar, não é?

— Onde está a mãe?

— Vou repetir só mais uma vez: mate primeiro, pergunte depois!

Nico se afastou um pouco de mim e enfiou a espada entre as pedras. O chão se partiu aos nossos pés, revelando cinco novos amigos.

Eles não precisaram de muitas instruções, e partiram ao ataque.

Nico e eu fomos logo em seguida, aproveitando-nos da distração breve do animal.

De alguma forma consegui chegar até a parte de trás e cortar suas patas, mas isso parecia apenas deixar a quimera mais furiosa. A cauda de serpente estava sendo entretida por três esqueletos, mas duvido que eles aguentem muito mais. O primeiro jato de fogo e dois esqueletos foram consumidos na parte frontal.

Nico estava montado no monstro, tentando atingir seu pescoço ou a cabeça, mas a couraça parecia impossível de atravessar. A serpentei parecia notar que Nico estava focado no objetivo e desviou seus ataques.

— Nico!

Senti a realidade ao nosso redor perder a forma, ao invés do céu, teto de uma caverna. Escuridão. Escuridão.

— Annabeth! – A voz de Nico parecia longe, longe, enquanto o novo cenário ganhava vida ao meu redor.

Está acontecendo de novo. Não posso deixar, não posso.

Forcei minha mente ao máximo para me libertar do que quer que seja esse encanto e o chão voltou a ficar firme sobre meus pés. Conseguia sentir o ar gelado nos meus pulmões e ver o céu noturno.

Também consegui sentir quando os cacos de bode da quimera me atingiram, jogando-me contra as rochas.

Não consigo ver Nico em lugar algum. Não consigo ver nada em lugar algum. Será que ele...

Tudo ao meu redor começou a perder o foco e senti que ia perder a consciência em breve. A quimera iria me matar e esse seria meu fim. Tentei me manter de pé, mas mal conseguia segurar minha adaga.

Mas aí eu vi.

Duas flechas voaram diretamente até os olhos do monstro, transformando-o em cinzas.

Olhei ao redor, procurando quem havia lançado as flechas.

— Quem... quem está aí?

Levei a mão à minha testa, que sangrava. Não vou aguentar muito tempo.

— Se você quiser matar uma quimera, precisa mirar nos olhos. – Virei minha cabeça em direção à voz, enquanto meu corpo escorregava em direção ao chão. A garota segurava um arco e tinha o corpo coberto com um capuz.

— Quem é você?

— Ora essa, não é óbvio? – A garota abaixou o capuz e seus olhos azuis elétricos me encaravam sérios. Uma tiara prateada do topo de sua cabeça me dizia que ela era importante. – Sou Thalia. Tenente das caçadoras de Ártemis.

E aí eu apaguei.

 

Quando acordei, havia uma fogueira ao meu lado e sussurros ao redor. O chão era frio contra meu corpo e levei a mão até a cabeça.

Senti um pequeno machucado e me encolhi.

Quimera. Nico. Duas flechas. Caçadoras.

Abri meus olhos lentamente e pude ver, um pouco a frente, Nico e a garota conversando sentados em um tronco. Ele sorria e gesticulava enquanto ela se mantinha calma.

Amigos. Minha amiga.

— Thalia.

Nico deu um salto para longe dela e olhou ao redor, tossindo. Mas Thalia me encarava fixamente.

— Que bom que acordou.

Eu conseguia ver a garota de quinze anos. O cabelo curto e picado, a tiara prateada acima da cabeça.

Eu lembrava de Thalia. Nossas batalhas. Nossa amizade. Mas também lembrava que eu não a via há muito, muito tempo.

Sentei e esfreguei meus braços olhando ao redor.

— A Quimera se foi? – Nico assentiu. – E a mãe?

— Nós a matamos a algum tempo. – Thalia pigarreou. – Elas estavam caçando alguma coisa, mas a quimera conseguiu escapar, seguimos seu rastro até aqui, e aí...

— Vocês nos encontraram. – Ela assentiu. – Isso não pode ser coincidência. – Forcei um pouco mais minha mente antes que meu rosto assumisse uma expressão de compreensão. – A visita. Vocês são a visita.

Thalia encarou Nico, como se perguntando com os olhos do que eu falava.

Analisei o acampamento improvisado. Algumas garotas com idade que pareciam variar entre os doze até no máximo vinte faziam rondas, riam, comiam e conversavam.

Todas elas, pude observar, mantinham uma distância segura de nós. Mantinham as conversas baixas o suficiente para que não ouvíssemos. Mantinham sempre a guarda alta. Mãos próximas às armas, como se estivessem com medo.

Voltando a observar Nico e Thalia percebi que elas não estavam com medo. Estavam enojadas. Por Nico. Um homem em seu meio. Não que Thalia parecesse se importar.

— O que quer dizer? – Foi Thalia quem perguntou.

Procurei os olhos de Nico buscando por uma confirmação, se podia confiar nossa missão a ela. O aceno que ele deu com a cabeça foi quase imperceptível, mas tenho quase certeza que Thalia notou.

— Não confia mais em mim? Annabeth... Só se passaram alguns anos. Nada mudou.

Quando olhava para mim e para ela, percebi que nada havia realmente mudado. A imortalidade a deixava exatamente igual. Thalia não passava de uma criança, de certo modo. Quinze anos.

Respire fundo, instrui a mim mesma, você está ficando paranoica.

Olhei para os dois tão próximos que me perguntei se algum dia eles já tiveram algum romance.

Sacudi a cabeça para espantar os pensamentos. É impossível, ela virou caçadora assim que eles se conheceram. Era isso que Afrodite queria. Te encher de dúvidas.

— Desculpe. Eu só estou cansada. – Observei ao longe enquanto o dia parecia nascer e o céu clarear. – E um tanto quanto paranoica. Afrodite me disse que minha visita assim que saísse iria providenciar minha carona para casa. Acho que são vocês.

Thalia trocou outra vez um olhar de mim para Nico antes de perguntar.

— Lady Afrodite? Ela está desaparecia há muito tempo. Devemos ajudá-la a...

— Impossível. – Murmurei, me levantando. – Ela só poderá ser liberta quando meu prazo acabar.

Nico franziu o cenho em minha direção.

— Que prazo?

Arregalei um pouco meus olhos ante o que acabara de dizer. Eles não podiam saber. Não ainda.

— Afrodite estará em breve livre, não se preocupem.

Thalia fez menção de encarar Nico outra vez e aí tudo tremeluziu.

Eu via e não via.

Era como se o mundo todo estivesse coberto por uma névoa. Uma cortina. Tudo era e ao mesmo tempo não era. Existia e não existia.

Percebi que aquilo era muito mais do que eu podia imaginar. Algo dentro de mim se agitou e eu soube. Aquela cortina era o agora, o passado, o futuro, o que era e o que poderia ser.

Foquei na realidade que Afrodite me dissera que existia e apenas duas cortinas tremeluziam à minha frente.

Em uma, Thalia encarava Nico, buscando resposta.

Mas era a outra camada que me assustava.

Uma garota alguns poucos centímetros mais alta estava ali. Seu cabelo negro estava mais comprido, e tinha corpo de uma mulher, não podia ser muito mais nova que eu. Seus olhos azuis elétricos estavam focados no garoto ao lado dela. Ele havia passado um braço pela cintura dela e disse algo que a fez gargalhar.

Nico e Thalia. Thalia mais velha. Thalia irremediavelmente mais bonita. Thalia fora da caçada. Thalia com Nico.

Um se afastou do outro quando alguém surgiu atrás de mim e fingiram não estar juntos.

O véu tremeluziu e eu vi a pequena garota de capuz a minha frente. A caçadora. A Thalia de quinze anos. Ao lado de Nico. Meu Nico, encarando tudo aquilo sem entender.

Ela esfregou uma mão na outra antes de falar.

— Certo. Acho que precisamos conversar. Isso aí acontece muito?

Encarei Nico um pouco assustada pelo que vira antes de respirar fundo para falar.

Thalia não fazia ideia.


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Notas finais do capítulo

Primeiro, me perdoem por demorar. Vou responder todos os comentários antes de postar o próximo capítulo.
Eu tinha planejado algo completamente diferente para isso, mas percebi que precisava ir mais lentamente.
Se eu não postasse agora, só Deus sabe quanto tempo mais eu ia demorar. Estou passando por uma fase bem ruim, então não tenho gostado muito do que escrevo.
Espero que tenham gostado, agora muitas coisas vão acontecer, beijos!



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