Assim que abri os olhos o flash do celular da Joan me cegou, por um breve momento que durou menos de um segundo eu não sabia onde estava, quem eu era... Mas então me lembrei, estava em casa, no meu quarto, na minha cama e Joan estava lá como sempre. E por algum motivo ela estava me fotografando.

– O que diabos vem a ser isso? – Disse com a voz meio sonolenta e um pouco rouca.

– Bom dia, flor do dia – Ela riu, e logo após me mostrou uma foto minha tirada momentos antes de eu acordar, com a cabeça afundada no travesseiro, a boca aberta e uma poça de baba.

– Apaga isso...como? como você entrou aqui? – Perguntei, tinha acabado de me lembrar ter trancado a porta do quarto com a chave – Eu tranquei a porta.

– Com isso – Ela me mostrou a pinça que usa pra fazer as sobrancelhas – Eu sou do Brooklyn, esqueceu?

Joan Rivera é a criatura mais irritante que existe, nós nos conhecemos desde os meus oito anos quando minha mãe e eu nos mudamos pro Brooklyn, ela arrumou um emprego como enfermeira, então a avó dela, Mercedes, foi minha babá. Naquela época Joan era gordinha e tinha os cabelos mais volumosos e massarocados que eu já tinha visto. Hoje em dia ela não é mais assim, tem o corpo cheio de curvas de uma verdadeira latina, a boca grande, os quadris largos, o cabelo também mudou, agora ela usa os fios no estilo rastafari, cheio de trancinhas.

– Meu Deus – Me sentei na cama e esfreguei os olhos após um longo suspiro – Eu pus uma assaltante dentro da minha própria casa...

– Você sabe que me ama, e ''assaltante’’ é um termo nada afetivo... Talvez eu devesse postar isso no facebook e marcar você.

– Você não se atreveria.

– Me observe...

– Apaga a foto, quer acabar com a minha dignidade?

– Tudo bem...- Ela pegou o celular e começou a mexer na tela, aparentemente estava fazendo o que eu pedi –Você ronca demais, e é um ronco agonizante... Eu quase te acordei antes, parecia que você estava sufocando.

– Já são 7: 25, não acredito - Eu ainda estava morrendo de sono, eu não dormi quase nada depois daquele sonho, me levantei da cama e corri pro banheiro deixando a Joan no meu quarto. Abri o armário e peguei pasta e escova de dentes, escovei os dentes correndo e lavei o rosto, não penteei os cabelos, pois estava pensando em por uma toca pra disfarçar, não que eu esteja com preguiça ou atrasado demais, apenas estou afim de usar a toca. Assim que entrei no quarto de novo, vi que Joan estava sentada em frente a minha escrivaninha mexendo no meu computador.

– O que esta fazendo? – Perguntei já abrindo a porta do guarda roupa, joguei na cama a minha calça jeans surrada, minha jaqueta de moletom vermelha, vou usar a minha camiseta preta dos beatles, a mesma que usei pra dormir, não porque estou atrasado, ou porque estou com preguiça, mas porque eu quero usá-la.

Eu realmente sou muito fã dos Beatles, assim como minha mãe. Uma vez ela disse que meu avô deu a ela o nome de Prudence, por causa da música ''Dear Prudence’’. Ela por sua vez seguiu a tradição, e me deu o nome de Jude, graças a ''Hey, Jude’’. Também me disse que se eu fosse uma menina meu nome seria Lucy, de ''Lucy in the sky with diamonts’’.Vesti a calça jeans rapidamente de forma desajeitada, e em pé mesmo comecei a vestir as meias.

– Você se masturbou vendo isso? – Perguntou ela.

– O que? - Na mesma hora eu me desequilibrei, tentei me segurar na cabeceira da cama, mas era tarde demais, cai de bunda no chão fazendo ela começar a gargalhar.

– Isso o que? – Me levantei e fui em direção à tela, era a foto de Chad Wayland e de seu irmão Bruce, ambos de sunga e segurando pranchas. – Isso por um acaso é o meu histórico de navegação?

– É sim, então é por isso que você esta com essa cara de derrotada, você ficou até tarde Stalkeando o menino novo.

– Você é muito folgada sabia? Levanta já dai – Me sentei na cama e comecei a calçar meu all star vermelho – A gente precisa sair antes que minha mãe chegue do plantão.

– Tarde demais – Ela se levantou – Ela já esta em casa... Quem você acha que abriu a porta do apartamento pra mim?

– Não sei...você é praticamente uma ladra de bancos – Vesti a toca e peguei a mochila ao lado do criado mudo, peguei também meu celular embaixo do travesseiro – Vamos logo.

Abri a porta do quarto entrando no corredor, caminhamos apressados e chegamos a cozinha, lá estava minha mãe, encostada na pia e tomando café em sua caneca ''I LOVE NY'', ainda estava com o uniforme azul claro do hospital, com aquela plaquinha de metal escrito ‘’Prudence Miller, enfermeira padrão’’ assim que me viu arqueou suas sobrancelhas, o que era um bom sinal, se ela estivesse irritada ou fosse me dar uma bronca por dormir mais que a cama, ela ia semicerrar os olhos e ficaria com a boca em formato de linha.

– Bom dia, flor do dia – Disse ela, pondo a caneca de lado – Perdeu a hora? ou o despertador chegou tarde? – Ela lançou um sorriso em direção a Joan quando disse despertador.

– Dormi mal essa noite, sonhei que estava me afogando, de novo – Peguei um dos sanduíches naturais de patê e tomate que minha mãe faz e mordi um pedaço.

– Eu li em algum lugar que se você sonha que esta morrendo você acorda – Comentou Joan, pegando o outro sanduíche no prato.

– Sempre que eu estou me afogando alguém me puxa pelos cabelos me salvando, parece tão real, eu sinto o frio da água, as bolhas saindo pelo meu nariz...

– Que estranho... Você deveria ter acordado assim que percebeu estar se afogando. – Joan me olhou curiosa, se existe alguém mais nerd que eu, esse alguém é a Joan.

– Eu também já ouvi isso em algum lugar, é por isso que eu acho que não é um sonho mas uma lembrança.

– Se você quase morreu afogado na infância Jude Miller, eu realmente sou uma péssima mãe e não lembro – Resmungou minha mãe. Eu sei que ela odeia quando digo que é uma lembrança.

– Eu não disse isso – Falei calmamente, tentando não aborrece-la ainda mais – Só estou citando os fatos.

– Ele também ficou Stalkeando Chad Wayland durante a madrugada – Disse Joan, me despertando o desejo súbito de beliscá-la, mas ela estava longe demais.

– Quem é Chad Wayland, e o que é Stalkear?

– Chad Wayland é um menino novo na nossa escola – Respondeu Joan, bufei em silêncio, aquilo ia levar a muitas perguntas quando eu chegasse da escola. – E Stalkear, é tipo, seguir os passos de alguém online, pra descobrir os gostos, e coisas em comum.

– Parece meio doentio.

– Totalmente – Joan deu risos.

– E esse Chad Wayland é bonitinho? – Perguntou minha mãe sorrindo, ao perceber meu rosto em chamas ela veio em minha direção com os braços abertos – Ai que lindinho...ele está com vergonha Joan.

– Mãe eu estou atrasado – Tentei me esquivar, mas ela me pegou e deu um beijo estalado na bochecha, e ficou amassando meu rosto entre suas mãos. Uma coisa eu tenho que confessar, minha mãe lida com muita naturalidade com o fato de eu ser gay. – Ai responde pra mim, ele é bonito? É gay também? - Naturalidade até demais, às vezes ela fica querendo saber coisas. Coisas do tipo, se eu estou ficando com alguém, se eu já fiz sexo com alguém, é legal, mas é muito constrangedor pra mim, porque eu sou muito tímido.

Quase enfartei uma vez que ela chegou em casa e me entregou uma embalagem com algumas camisinhas. – Faça sexo seguro – Disse ela, piscando logo em seguida. Quem ela acha que eu sou? Ela não podia agir como uma mãe normal e ficar vigiando meus horários? Às vezes eu não sei o que fazer com tanta liberdade. Terminei meu sanduíche enquanto Joan estava perguntando pra minha mãe sobre coisas femininas, e logo após descemos as escadas do nosso prédio, a fim de esperar o ônibus.