Meu nome não é Kyle escrita por Garoto de All Star


Capítulo 13
Capítulo 12: Life's a mess!


Notas iniciais do capítulo

Em decorrência de um imprevisto, os capítulos não puderam ir ao ar na segunda feira, então resolvi postá-los hoje.



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– Canapé? - Perguntou a moça com um sorriso cortês. Seus cabelos ruivos estavam presos em um coque, mantendo-os longe da camisa social branca com gravata borboleta preta. Ela circulava pela grande sala da casa dos Forbes, indo de grupo em grupo de pessoas, pra servir os aperitivos.

– Sim, obrigado - Respondi pegando o pequeno pedaço de pão da bandeja, onde em cima havia algum tipo de pasta verde, muito boa por sinal, mas eu não sabia o que era.

A moça continuou andando pela sala servindo as pessoas, o sincronismo dos outros garçons também era perfeito, eram todos tão jovens, mas muito focados no trabalho. Sinto que se eu começar a observá-los demais ficarei tonto. Ouço as conversas paralelas, gente estranha falando sobre coisas que eu não conheço, e quando conheço, são coisas com as quais não me importo. Olho pros cantos tentando entender como eu vim parar aqui nessa casa, que parece de revista. A princípio o jantar formal de Nicole seria em casa, mas a imprensa não estava dando folga desde ontem, toda hora tinham pessoas ligando e querendo saber sobre a história, perguntando se iriamos nos pronunciar e se haveria uma coletiva.

Nicole já estava enlouquecida com a possibilidade dos repórteres arruinarem o jantar, mas então sua amiga Violet ligou, cedendo sua humilde residência para o evento. A casa era tão bonita quanto a casa onde eu moro, mas ao invés de cerca viva e calçada de tijolos, há muros e portão eletrônico. Fica afastada da nossa rua, eu contei umas oito quadras, mas deve ser mais pois quando eu comecei a contar o carro já estava andando. O blazer preto e camisa branca estavam me pinicando, e os sapatos, já como esperado, estavam me fazendo calos. Faz uma hora que chegamos, o jantar nem foi servido e já quero ir embora, não suporto toda essa atenção, todas essas pessoas analisando cada uma das minhas atitudes.

Confesso que quando Nicole me disse que seria um jantar formal, eu imaginei uma coisa formal, mas minha ideia de "formal" era bem menos fabulosa. Todos os convidados estavam impecavelmente arrumados e perfumados, mesmo usando as roupas que Nicole me deu, tenho essa sensação, a mesma de quando a gente está por fora de algum assunto.

– Jude meu filho, algumas pessoas querem conhece-lo - "Novidade", acrescentei mentalmente, Nicole pôs sua mão sobre o meu ombro. Daniel e outras três pessoas estavam se aproximando em minha direção. Uma delas é uma mulher de meia idade, com os cabelos castanhos na altura dos ombros, olhos azuis e vestido cor de vinho. Ao lado dela está uma garota, aparentemente da minha idade, ela tem os cabelos loiros e compridos, jogados sobre o ombro direito, ela usa um vestido preto com detalhes em renda. O último é um homem, ele é grisalho e calvo, além de ter uma barriga saliente que sai pra fora do paletó. Imagino que sejam uma família.

– Filho estes são Violet e Mark, donos dessa casa e amigos da família - Disse Daniel segurando um taça de champanhe. Mark apertou minha mão, em seguida Violet encostou o canto do rosto em cada lado do meu, simulando um beijo. Sabe, eu nunca vou entender esse lance de encostar bochecha com bochecha e fazer barulho de beijo, não tem sentido, é um beijo de mentira, pra que fazer biquinho?

– Muito prazer Kyle, nós ouvimos muito falar de você esses anos todos, fico emocionada em finalmente te conhecer - Violet segura minha mão enquanto fala.

– Obrigado - Minha voz sai um tanto tediosa quando agradeço, desde quando chegamos já ouvi a mesma coisa inúmeras vezes, e pasmem, muitas das pessoas usaram essas mesmas palavras.

– Essa é minha filha Amanda - Violet indica a menina a seu lado, Amanda aperta minha mão como o pai fez, enquanto a mãe continua a falar - Ela estuda na mesma escola que você, vocês deviam conversar, eu aposto que tem muito em comum, formariam um casal belíssimo.

– Mãe... O que você está fazendo? - Pela forma que Amanda falou com a mãe e a olhou, vejo que ela ficou chocada e constrangida pelo comentário. Eu também fiquei, a mulher está viajando, ela precisa suspender o consumo do champanhe.

– O que foi filha? Que mal há em conversarem? Ele passou por uma experiência traumática, faz bem conversar com pessoas, sem contar que esses olhos verdes misturados com os seus olhos azuis resultariam em bebês lindos.

– Isso eu concordo, mais bonitos que qualquer um que Kate Middletton venha a ter - Disse Nicole, rindo com a amiga. Daniel e Mark já tinham engatado outro assunto e estavam bem empolgados.

– Com licença - Disse Amanda me saudando e saindo. Mesmo constrangida sua atitude foi a mais natural e verdadeira desse lugar até agora.

Enquanto ela se afasta eu vejo que Cleare e Stephen estão vindo em nossa direção. E eles não estão sozinhos, há um rapaz com eles. Foi só por meus olhos sobre ele que na mesma hora eu mudei de opinião em relação a atitude de Amanda ter sido a mais verdadeira da noite. Diferente de todo mundo nesse recinto, o rapaz veste uma roupa comum e ao mesmo tempo estilosa. Um gorro cinza, camiseta justa da mesma cor, jeans escuro e botas marrons estilo coturno. Pode haver alguma coisa mais verdadeira que isso?

– Kyle! - Disse Cleare ao se aproximar de mim, eu quis revirar os olhos só de pensar em sentir os seios de pedra dela me esmagarem de novo. Mas o que mais me incomodou foi ela me chamar de Kyle, ela não tem desculpa pra isso, ela ouviu perfeitamente Nicole dizer que meu nome agora é Jude. Ela me abraça e me esmaga como o esperado, Stephen me cumprimentou com um aperto de mão tão forte que os meus dedos estalaram, qual o problema dessas pessoas? O rapaz também aperta minha mão, só que de maneira mais sutil.

– Prazer, Adam - Disse ele, sua voz era um pouco rouca.

De perto eu pude ver o quanto o rapaz era bonito. Seus olhos eram castanhos, quase negros, e tinham um ar preguiçoso, o nariz era arrebitado e harmônico com todo o resto. O rosto era anguloso e sua boca formava um desenho muito bonito. Confesso que ir com aquela roupa em um lugar onde todos faziam questão de parecer perfeitos era uma grande manifestação de individualidade. Sinto que eu poderia ficar aqui olhando pra ela durante horas.

– Tudo bem? - Disse ele, me arrancando dos meus pensamentos e me tirando do transe. Percebo que ainda estou segurando a mão dele como um tolo.

– Ah, claro... Eu sou Jude, Jude Miller, e também sou Kyle Marshall, enfim... - Sinto que olhei pra ele mais tempo do que deveria, visto que agora é ele quem me analisa. Dei bandeira eu sei. Queria estar morto.

– Adam! - Charlotte o abraçou com euforia e felicidade, ela surgiu de repente entre nós, desde que ela chegara tinha ido conversar com outras meninas e nos ignorado - Você voltou! Ai que legal!

– Cuidado pra não me derrubar Char, eu também estava com saudade de você.

– Vocês me dão licença um minutinho...

Deixo-os conversando seus assuntos, atravesso a sala em direção a grande porta de vidro de acesso a piscina. Ela está aberta e eu sigo pra lá. Me aproximo da borda e fito as luzes verdes e azuis refletidas na água. Começo então a pensar, pensar em algo que eu já deveria ter pensado. Como será que os pais de Kyle Marshall vão reagir ao descobrir que o filho é gay? A resposta pra essa pergunta me assombra. Minha mãe sempre soube de alguma forma, quando eu contei a ela, ela agiu de forma natural. Mas como será que Daniel e Nicole irão reagir? Eles vão ter de saber um dia, eles vão aceitar numa boa? Eu me importo com a aprovação deles? Quero muito dizer a mim mesmo que não, mas só de pensar nisso meu coração aperta.

Outra coisa que me incomoda é o fato desses sapatos estarem me matando. No começo da noite até deu pra aguentar, mas agora o atrito esta me machucando de verdade, como se um isqueiro fosse aceso contra minha pele. Sento em frente ao deck e desamarro os cadarços. Retiro-os com cuidado e vejo que tem duas bolhas enormes em cada um dos meus calcanhares, eles não pareciam tão desconfortáveis quando eu os experimentei. Sinto um alivio imediato, mas tenho uma grande surpresa ao olhar a numeração interna. Meu número é 7,5, Nicole acertou quando os comprou eu tenho certeza, mas esse calçado em minha mão é número 7, é outro sapato, mesmo sendo do mesmo modelo.

– Problemas? - A voz que soa atrás de mim é inconfundível. É a Charlotte. Ela está bonita de uma forma cruel essa noite. Usando um vestido tubinho cinza com detalhes em lantejoulas rosa, meia calça preta com renda e sapatos altos cheios de tachas. Ela segura uma taça de champanhe em frente aos lábios enquanto me lança seu olhar mais sarcástico.

– Você... - Digo em um tom de descrença - Foi você quem fez isso...

– Isso o que?

– Trocou meus sapatos por um número menor, como se tudo isso já não estivesse sendo insuportável o bastante, você tinha que piorar tudo.

– Eu não sei do que você esta falando - Disse ela, erguendo as mãos em sinal de rendição. Mas eu sei que por dentro ela está gargalhando.

– Porque fazer isso Charlotte? Eu nem te conheço, o que foi que eu te fiz?

– Que tal, existir? - Ela disse bem direta e categórica.

– Seus pais sabem que você está bebendo champanhe?

– Acha mesmo que eles reparam em mim quando estão muito ocupados, sendo o centro das atenções? - Ela solta um riso debochado - Prove... Prove que fui eu.

– Foi um golpe baixo, mas eu acho essa sua birra totalmente descabida, você deveria me agradecer, se eu não tivesse sumido talvez você nem tivesse nascido. Se não fosse por isso, quem precisaria da filha substituta? - Disse eu, queria atingi-la. E acho que consegui pela forma que sua expressão muda de triunfante pra irritada.

– Como se alguma vez a sua ausência tivesse me favorecido... Você sempre foi um fantasma, uma presença invisível que eu nunca pude combater. Mas agora as coisas mudaram irmãozinho.

– Combater? Agora eu sou um inimigo a ser combatido? Acha mesmo que eu queria estar aqui? Não. Eu não queria. Eu preferia mil vezes estar em Nova Iorque vivendo a minha vida, mas as coisas não são como a gente quer, então acho bom você ir se acostumando com a minha presença, porque eu não vou a lugar algum.

– Porque você não tem pra onde ir? A vida é uma merda não é mesmo? Você vai mesmo ter que ficar aqui, então eu posso fazer disso um problema, ou uma fonte de diversão, você não faz ideia do que te aguarda...

– Ah é? Vem com tudo pirralha.

Charlotte me lança um sorriso venenoso e sai, estou com muita raiva dela. Mas não é apenas raiva dela, e sim de todo esse circo montado onde eu sou a atração principal. Eu não posso voltar lá pra dentro descalço, eu seria julgado e condenado por todo o tribunal da perfeição, iria chamar ainda mais a atenção pra mim. Também não posso calçar esses sapatos, não tenho a menor vocação pra autoflagelo. Olho mais uma vez pra dentro da sala, Daniel e Nicole continuam conversando com seus amigos, sei que eles ficaram decepcionados. Mas que se foda esse jantar, que se foda a Charlotte e todo o resto. Eu vou pra casa colocar um curativo nos meus pés e dormir até amanhã de manhã. Caminho descalço em roda da piscina e indo até o jardim, mais a frente eu avisto o portão. Eu tinha esquecido o maldito portão, pelo visto se eu quiser fugir daqui eu terei de pular o muro.


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