The Blue River Camp escrita por Gaby Molina


Capítulo 5
Acho Que Chamam de Liberdade


Notas iniciais do capítulo

E aí? :D
/Gaby



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Jade

That's right, he won't let her out his sight

Now the shaggers perform

And the daggers are drawn

Who's the crooks in this crime?

— Balaclava, Arctic Monkeys

— Eu não acredito que você perdeu no joquempô — murmurei pela vigésima vez.

— É um jogo de sorte, não tem tanto cálculo assim.

— Mano, se o cara pôs pedra duas vezes, na terceira ele troca, é assim que funciona.

Miles revirou os olhos.

— Não é uma ciência exata.

— Sabe o que é uma ciência exata? Você disse que era mestre de joquempô.

— É uma forma de dizer, ninguém consegue ser realmente m…

Bufei.

— Se você não tivesse perdido no joquempô, poderia subir numa árvore e ficar lá o jogo todo, mas nããão, agora a gente tem que achar as bandeiras dos outros.

— Sabe que não vamos achar nada se você continuar falando, não sabe?

— Eu acabei de deixar um bando de inúteis cheios de feromônios e adrenalina à flor da pele cuidando de umas bandeiras e de um cara aleatório que entende que todo mundo muda na terceira partida de joquempô.

— A Monarquia Parlamentar escondeu o Senado todo? — Miles perguntou, como se isso realmente fosse relevante.

— Sei lá, Hampton. Foco.

— Mas é importante. Porque, digo, deve ser bem mais difícil esconder umas cinco pessoas do que uma só.

— Depende. Se for a Anarquia escondendo, até um bolinha de gude seria difícil.

— Ei.

— O quê?

— À direita. Acho que vi um pessoal da Monarquia indo em direção à tirolesa.

— Vai lá, Romeu. Vou procurar mais pela floresta.

Ele abriu a boca para retrucar, mas então decidiu que não valia a pena e se afastou correndo.

Saí andando para a esquerda, passando por uma trilha. Chutei o chão de terra conforme andava, sem muito rumo, até que meu pé se prendeu em algo. Não pude acreditar. Era um bandeira verde com uma ágora desenhada. Fiquei surpresa comigo mesma por saber que era uma ágora, símbolo da democracia ateniense. Aparentemente, prestava mais atenção na aula de História do que achava. Ali estava, enterrada. Peguei-a e a enfiei no bolso do shorts jeans, pensando que talvez — apenas talvez — a Anarquia não estivesse tão ferrada assim.

Comecei a andar mais rápido, mais motivada. Achei que tivesse ouvido um barulho de folhas estalando, mas provavelmente fora o vento. Adentrei mais na floresta, chegando perto de um riacho. Vi uma garota parada ali na beira. Devia ser uns dois ou três centímetros mais baixa do que eu. Possuía cabelos bem escuros ondulados presos em um coque alto e olhos azulados. A pele era bem clara, quase pálida, e as feições eram delicadas. Tinha algumas espinhas, principalmente na testa, e mantinha o cenho franzido como se algo a incomodasse. Escondi-me atrás de uma árvore, tentando ver se ela estava protegendo alguma coisa.

E então um troglodita caiu do céu em cima de mim.

Bem, não exatamente do céu, mas da árvore acima.

O que importa é que eu estava estatelada no chão e havia um cara maromba enorme e desconhecido nas minhas costas. Eu gritei.

— Ei, calma lá — ele tinha uma voz meio monga. — Ei! Lucy! Tem uma invasora aqui!

Lucy — a garota perto do riacho — bufou, se aproximando.

— Dominic! Eu não falei para você ficar com o Presidente?

— Mas da árvore dava para ver invasores... Tipo ela — ele apontou para mim.

Lucy franziu o cenho, finalmente notando meu broche.

— Anarquia — disse ela. — Bem, eu não achei que diria isso, mas... Bom trabalho, Dominic.

Dominic abriu um sorriso mongol.

— Valeu, cara.

— Não me chame de "cara".

— Desculpe... Moça. O que fazemos com a invasora?

Lucy franziu o cenho como se não tivesse pensado no assunto.

— Hmmm... Cuida dela aí um pouco. Vou ver com Vossa Excelência — seu tom debochado fez com que eu gostasse mais dela.

— Ei, senti uma aversão à autoridade aí — comentei. — Talvez seja feita para a Anarquia.

Ela suspirou.

— Você não faz ideia — e se afastou.

Dominic me segurava com força pelo meu braço direito.

— Ei! Frank!

Frank — o mongol maromba número dois — pulou de outra árvore.

— O que foi, cara?

— Lembra daquela corda lá que a gente tinha?

— Não! — gritei, puta. — Vocês não estão seriamente considerando…

* * *

Cinco minutos depois, eu estava amarrada a uma cadeira que Tyler — o mongol maromba número três — roubara do refeitório. Os três me fitavam, sem dizer nada, com cara de paisagem. Lucy voltou logo depois.

— Dominic! — ela arregalou os olhos, horrorizada. — O que diabos vocês...? Pelo amor de Deus! Soltem essa menina!

— O Presidente mandou soltar? — Frank perguntou, como se fosse um robô e Nathan possuísse o controle remoto.

— Ele quer vê-la.

— Vamos levá-la até o esconderijo?

Lucy suspirou.

— Ele quer mesmo vê-la. E, além do mais, que mal pode fazer? Nós a... capturamos, ou o que seja.

— Nathan quer me ver? — soltei um riso debochado. — Perdoem a indulgência, mas prefiro ficar amarrada aqui, mesmo.

Ela franziu o cenho.

— Você conhece Nathan?

Torci o nariz.

— É, acho que se pode dizer isso.

Seus olhos tentavam esconder, mas continuava estampado neles que aquela fora a resposta errada. Então ela fez aquela coisa que garotas fazem, mas fingem que não fazem: ela me analisou. Dos pés à cabeça. Cabelo, corpo, peso, roupas, modo de falar... Tudo. Em questão de milésimos, é claro.

— Vocês três — seu tom se tornou um pouco menos simpático. — Ajudem-me a levar a invasora para o Presidente.

Eles me levaram na cadeira, mesmo, erguendo-a. Lucy não parecia mais ligar que eu estava amarrada a uma cadeira. Ela não parecia ligar mais para muita coisa.

Chegamos a um vão numa pedra, como uma mini caverna, não muito longe do riacho. Nathan estava ali, em pé, chapéu e tudo. Seu sorriso satisfeito se alargou ao me ver.

— Bem quem eu esperava. Gostou do passeio?

— Como não gostar? — sorri. — Por acaso seus súditos te carregam assim também? Sinto-me muito bem recebida.

Como que para estragar meu momento, os três mongóis maromba puseram minha cadeira no chão sem muita delicadeza.

— Então, Fedora — encarei-o. — Podemos acabar logo com isso?

— Sério? Já chegamos na intimidade de apelidos especiais? — ele provocou, mas tirou o chapéu fedora e começou a torcê-lo de leve com as mãos. — Então, o que a traz ao meu país?

Uma ideia me ocorreu. Se eu ficasse ali, não poderia procurar mais nada, mas a bandeira que eu encontrara continuava sendo minha. E talvez eu pudesse até me livrar dos outros e roubar o Presidente.

Certo... A última parte era improvável. Mas a primeira parecia certeira.

— Quis ver como é do outro lado da cerca — zombei, me contorcendo discretamente na cadeira. Meus braços já estavam ficando dormentes, e meus pulsos, doloridos.

Nathan se aproximou de mim, cravando os olhos azuis por um longo minuto.

— Vocês podem ir — fez um sinal de "xô" para os outros. — Menos Jake, porque ele já estava por aqui, mesmo.

Lucy relutou, mas por fim saiu com os outros três.

— Você parece relaxada demais — notou Nathan.

— Por que não estaria? É um belo dia. Além do mais, por que não dispensa seu coleguinha? — apontei com a cabeça com Jake. — Não dá conta de segurar uma garota amarrada a uma cadeira?

— Você, moça, não faz ideia do que eu dou conta — ele não sorriu, só cravou os olhos verdes em mim e baixou um pouco o chapéu. Nathan estava sempre na corda bamba do humor, tentando me forçar a adivinhar se ele estava falando sério ou não.

— Então me solte.

Um sorriso de deboche apareceu em seu rosto, como se eu fosse um macaquinho fazendo graça no zoológico.

— Sério? É assim que pretende sair daqui?

— Ah, perdão, só nunca tinha imaginado você como um covarde.

Ele estreitou os olhos, me encarando, e não disse nada por um minuto.

— Chefe... — Jake começou a adverti-lo.

— Shhh. Tenho tudo sob controle — prometeu Nathan.

— Claro que tem — tentei imitá-lo, soando séria, mas não era boa nisso.

— Mas realmente, suas tentativas de sair daqui são tão patéticas que é quase como se você não quisesse sair — ele se aproximou um pouco. — O que está escondendo?

Soltei um riso debochado.

— Vossa Excelência é paranoico.

— Não seria "paranoica"? — Nathan indagou. — Porque é um pronome feminino e tals.

— Na verdade, "paranoico" também é correto; é uma silepse — comentou Jake.

Nathan lançou-lhe seu melhor olhar de cale a boca, porra e se voltou para mim novamente:

— Vamos lá, vou te dar uma chance para me dizer. Qual é o plano secreto? Seus colegas vão invadir aqui? Você tem um walkie-talkie escondido?

Dei de ombros.

— Talvez eu apenas aprecie sua companhia.

Rá! Agora eu fizera certo a coisa de "corda bamba do humor" e o diabo. Ele estreitou os olhos e se aproximou mais.

— Não vai falar?

— Falar o quê?

Ele suspirou.

— Você não me deixa escolha — ele estava a centímetros de mim agora. — Não vai me dizer o que tem nos bolsos?

Meu coração palpitava forte.

— Embalagem de Halls preto, eu acho.

Nathan revirou os olhos e enfiou a mão direita no bolso da frente do meu shorts, de onde tirou uma embalagem de Halls.

—... Estou aceitando desculpas a qualquer momento agora.

Ele debruçou o corpo, quase encostando no meu, e eu sentia seu hálito no meu ombro.

— O que tem no outro bolso?

— Nem pensar, não vai chegar nem perto da minha bunda.

— Você sabe que não vou encostar realmente na sua bunda.

— Eu vou gritar.

Ele deixou o rosto a centímetros do meu, se divertindo com o fato de que eu não conseguia empurrá-lo.

— Então por que ainda não gritou?

— Nathan. Eu vou matar você e toda a sua família.

— Oh, isso parece divertido — ele puxou meu corpo para frente, apenas o suficiente para desgrudá-lo da parede. — Última chance.

— Não ia ser uma chance só? Tipo, meia hora atrás?

Ele bufou e grudou meu corpo no dele. Jake apareceu na mesma hora, seguido de Lucy e os marombas. Eu nem percebera que ele havia saído.

Senti Nathan afrouxar um pouco o toque.

— Só vim avisar que a Caça já vai terminar — murmurou Lucy, olhando para baixo. Uma buzina estrondosa soou no mesmo instante. — É, aí está.

Nathan puxou a bandeira para fora do meu bolso no mesmo instante e me soltou.

— Tinha uma ponta para fora — disse ele.

— Há quanto tempo sabia que ela estava aí? — franzi o cenho.

Ele sorriu.

— Ah, mas responder isso tiraria toda a graça, não é mesmo?

— E a bandeira estava comigo quando a buzina soou, não valeu.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— É mesmo? Pois o que me parece é que eu estou com a bandeira e você foi capturada. — ele olhou em volta. — Alguém aqui tem outra versão da história?

Cerrei os dentes.

— Eu odeio você.

— Até parece, já estava até entrando no clima — ele tirou as amarras das minhas mãos, mas me segurou pelo braço. — Agora vamos lá, quero saber se você vale pontos ou se vai servir só como troféu de guerra.

* * *

— Você conseguiu alguma coisa? — indagou Miles, correndo até mim.

Ergui uma sobrancelha.

— Consegui, Hampton. Capturei o presidente, por isso que ele está me segurando sem nenhuma gentileza pelo braço e seus súditos estão me cercando. Como foi com a Monarquia?

— Ah... — ele apertou os lábios. — Não rolou. E acharam Peter.

— Quem é Peter?

— O anarquista que a gente escondeu.

— Quer dizer, o cara que ganhou de você no joquempô? — zombei. — Que equipe capturou-o?

A expressão de Miles subitamente tornou-se fúnebre, como se estivesse prestes a me contar que meu irmão tinha morrido.

— Sobre isso...

E então ele apenas apontou para alguns democratas trazendo Peter até o Presidente. Nathan explodiu em risos.

— Mentira. Ah, puta merda, como eu amo a minha vida — ele me fitou. — Cara, eu estou tão emocionado que a gente ganhou tão de lavada que eu não vou nem pedir pontos por ter capturado você — ele me soltou.

Ergui uma sobrancelha.

— Sério? Qual a pegadinha?

Ele sorriu, dando de ombros.

— Nenhuma. Só que... — ele se aproximou do meu ouvido. — Você me deve uma, Jade Bannister.

Afastei-me.

— Como sabe meu nome?

— Eu sou o Presidente dessa porra, não sou?

— Só porque não decidiram no joquempô. — argumentei. — Desculpe-me se nosso sistema de governo é mais justo.

— Pena que não funciona — ele deu de ombros e me deu as costas.

Eu observei-o se afastar, enquanto Miles parecia tentar decidir se deveria falar alguma coisa ou não.


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