À Primeira Vista escrita por Sr Castiel


Capítulo 14
Capítulo XIII - Dylan - Arrastado




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Capítulo XIII

Dylan

/Arrastado/

“Para o errado, a satisfação só pode ser achada em dois lugares: perdão absoluto ou justificativa moral.”

Revenge – S01E01 – Pilot

NÃO É FÁCIL CONVIVER COM A IDEIA DE SABER QUE ALGUÉM O QUER morto.

Estou falando sério, não é.

Menos ainda quando se sabe que se não for você, vai ser outra pessoa inocente no seu lugar. Mas, nesse momento, não tenho muita escolha, não é? Preciso me submeter ao que parece ser minha sina: morrer em função de uma causa maior.

É o que penso enquanto vejo meu carro girando na estrada, quicando como uma bola de basquete. Sei que é meio mórbido, mas não tenho como evitar, na verdade. É o que acontece quando a morte quase te alcança e, se não morrer de um jeito, pode ter certeza que irá de outro.

Então um conselho: se a morte vier, deixe que venha. Deixe que pegue você. Deixe que qualquer vontade de viver vá embora enquanto ainda há tempo.

*

Dylan achou que seu dia não podia ficar pior.

E era estranho pensar daquela forma quando se tinha conseguido um novo poder... uma coisa de sua mãe. Um legado. Era a forma como ele gostava de pensar naquilo.

Dylan finalmente soube o motivo de se sentir tão bem perto do mar e agora nem isso parecia conseguir livrá-lo da culpa e da sensação de pânico quando soube das notícias do que tinha acontecido em San Diego no mínimo tempo em que ficou fora.

Quando contou a Alex sobre o que tinha descoberto, esperando que o amigo fizesse uma cara de surpresa e talvez esquecesse o pequeno desentendimento que tiveram naquela noite... bem, ele não respondeu dessa forma. Foi mais como se não se importasse.

– Vamos, Alex, anime-se! Você pode ter alguma coisa assim como eu...

– Dylan, acha que eu já não pensei nisso? – O amigo falou, baixo, mas claramente com raiva; Dylan sabia como ele ficava quando o assunto sobre a mãe dele ter perdido os poderes por causa de seu nascimento era levantado. – Minha mãe perdeu os poderes por minha causa. – Agora ele parecia mais triste do que com raiva. – Não quero pensar que eu roubei esses poderes. Só... não consigo.

– Mas, Alex, você não os roubou – insistia Dylan, pelo que pareceu a milésima vez desde que Alex tinha lhe contado o que aconteceu em seu nascimento. Ele não gostava de fazer Alex passar por aquilo, mas sentia-se extremamente responsável por acabar com aquele sentimento de culpa que Alex sentia. – Não foi nossa culpa o que aconteceu – falou ele por último, mas suas palavras não tinham muita convicção.

Alex encarou Dylan por um momento e, quando Dylan fez menção em continuar a falar, ele o interrompeu.

– Não posso, Dylan – disse – só... não consigo. – Depois daquele tom de súplica, Dylan não quis mais insistir.

Eles estavam no quarto de Alex. Dylan tinha voltado da praia eufórico com o que havia descoberto e chamou o amigo, esperando que ele não estivesse dormindo. Bem, Alex não estava, mas parecia não ter esquecido que Dylan queria apoiar vampiras em sua missão. O assunto sobre o legado de Marie parecia ter piorado a situação, percebeu Dylan. Ele foi em direção à porta, mas Alex não o deixou passar, dizendo:

– Não quer me contar sobre seus novos poderes? – Ele suspirou e sentou-se na cama com os pés no chão, inclinando-se para trás e se apoiando nas mãos abertas.

– Não precisa fazer isso, Alex – falou Dylan, reconhecendo o esforço do amigo. – É sério, não precisa.

– Dylan, acho que você deveria treiná-los – insistiu o amigo. – Não sei, talvez eles possam nos ajudar de alguma forma a derrotar a fênix. Poderia ser uma vantagem...

– É sério, Alex. Prometo não mais insis...

– NÃO! – Alex gritou. Provavelmente a expressão de Dylan ficou lívida de surpresa, pois Alex viu que suas palavras tinham feito efeito. – Sabe o quanto é difícil aprisionar qualquer lembrança dentro do meu cérebro, Dylan? – Ele não tinha gritado mais, mas Dylan notou que dizer aquilo era como subir uma montanha empurrando uma pedra para ele. – Você as trouxe de volta, agora você é responsável por me ajudar a colocá-las no lugar.

Mais uma vez, naquele mesmo dia, a culpa invadiu Dylan. Ele não pensou quando deu a notícia a Alex. Não pensou quando começou a falar sobre o assunto que seu melhor amigo mais evitava. Não pensou se isso o magoaria ou se Alex queria saber sobre sua descoberta. E esse era o problema. Dylan não pensou em nada. Tinha trazido seu amigo para ajudá-lo porque julgava-se incapaz de fazer tudo sozinho e agora estava ficando contra Alex... Tudo parecia estar saindo dos eixos, uma coisa de cada vez, como um efeito dominó, mas o resultado final, Dylan sabia, não seria apenas peças caídas, e sim um mar inconsistente de sangue e morte que se estenderia à sua frente, ou talvez não, porque ele mesmo poderia estar se afogando naquele mar.

– Alex, eu sei que não é possível evitar sentir culpa por algo, mas você deve pensar em outra maneira de ver as coisas. – Dylan não olhou diretamente para o amigo quando falou, mas esperava que ele o compreendesse. – Você escolheu vir comigo e deixou seus pais em Londres. A culpa que sente por achar ter feito sua mãe perder os poderes não é nada comparada ao fato de eu ainda estar sem a minha mãe, com ou sem os poderes. A sua perdeu os poderes, mas ganhou você no lugar e acredite em mim, eu sei que ela não se arrepende em nada das escolhas que pôde fazer. – Ele respirou fundo uma vez antes de continuar. Dylan detestava dar lições em Alex, ainda mais quando se tratava daquele assunto, mas não podia deixar seu amigo perder o foco principal. – Você ainda tem a sua família, os lobos do bando e eu estou aqui, do seu lado, para o que precisar. Alguma vez passou pela sua cabeça que eu daria tudo para ter a minha mãe comigo? Eu nunca reclamei sobre isso com o meu pai porque eu via o quanto ele se esforçava para me apoiar em tudo que eu fazia. E agora eu também o perdi e quero encontrá-lo. Mas não vou conseguir sem você. Sei que você não tem mais dez anos de idade para ganhar reprimendas, Alex, mas se você não estiver focado, nós vamos perder porque eu preciso de você para me manter firme na busca. E eu nunca ficaria contra você e ao lado de Nôah e Narscisa, não quero ter que fazer essa escolha e sei que você não vai me obrigar a fazê-la... Quero dizer, meu pai pediu para eu encontrar essas duas vampiras e nós conseguimos, estamos no caminho certo mesmo sabendo quanto perigo vamos enfrentar. – Agora Dylan olhou para o amigo e se impressionou ao ver que ele o encarava e não desviou o olhar quando seus olhos se encontraram. – Você não é meu braço direito, Alex, é mais do que isso. Me desculpe se eu não pensei antes de levantar esse assunto, mas você sabe que a minha mente não é tão brilhante quanto a sua...

– Já entendi, Dylan – falou Alex, com um meio sorriso despontando dos lábios. – Não fiquei com medo de perder sua amizade pela garota... – vendo a expressão de Dylan ele voltou atrás – por Nôah – corrigiu-se. – Só fiquei com medo de perder você para o que ela é. Eu não te falei antes, mas a agonia e a dor de ter sangue de vampiro no organismo é quase insuportável. Mas você é sensato, sei que vai fazer a coisa certa. E tenho que reconhecer, Nôah é uma aliada em potencial se precisamos mesmo derrotar uma Fênix.

A conversa foi minguando de assunto em assunto. Eles repassaram tudo o que tinham discutido sobre a Fênix na casa de Narscisa mais uma vez, esperando encontrar algo que ainda não tinham prestado atenção, como os poderes de Nôah podiam evoluir de uma forma que Alex daria tudo para ver, mas ele não esclareceu essa parte, apenas falou que ainda tinha coisas para pensar e Dylan não insistiu; começaram a especular sobre o verdadeiro plano da Fênix, frustrando-se a cada ideia, sendo que nenhum deles tinha noção do que podia acontecer se o homem com as asas sabia onde estavam e que podia derrotá-los, mas não o fazia; sobre o motivo da morte dos humanos por vampiros que a polícia tentava tanto acobertar, mas também não chegaram a lugar nenhum. E Alex acabou por propor ajudar Dylan a desenvolver seus poderes com o mar enquanto eles iam acampar por um tempo. Dylan não gostou muito da ideia de se afastar de tudo o que estava acontecendo, mas Alex o interrompeu dizendo que nada de mais estava acontecendo ainda.

Eles partiram na manhã seguinte. Eles se prepararam rapidamente e foram para uma floresta fora dos limites de San Diego, armaram a barraca, colocaram tudo no lugar e se transformaram em lobo. Dylan, por um momento, não se lembrou da última vez que tinha ficado na forma de lobo com Alex. Era totalmente diferente de se transformar sozinho ou com qualquer outro membro do bando em Londres. Os pensamentos de Alex passavam como relâmpagos na cabeça de Dylan e Dylan os devolvia da mesma forma. Eles corriam em sincronia e na mesma velocidade, como se estivessem perseguindo algum vampiro em uma patrulha qualquer para o bando.

Nos dias que ficaram treinando, Dylan descobriu, por ideia de Alex, que não podia controlar qualquer água, tinha que ser do mar. Restritamente. Ele conseguia se comunicar com as criaturas, mas não era uma conversa exatamente, apenas conseguia sentir o que elas precisavam e ele as ajudava, e vice-versa.

Dylan também descobriu que, por mais que não sentisse enquanto estava usando o mar a seu favor, tinha limites. Incontestavelmente. Isso se provou ser verdade quando descobriu que não podia respirar debaixo d’água e isso o decepcionou um pouco; também não podia usar seu poder por muito tempo e com tanta intensidade sendo que sua energia era drenada com uma velocidade surpreendente.

Na manhã do dia seguinte, quando Dylan e Alex estavam testando novas formas de aperfeiçoar seu controle sobre a água, algo deu muito errado. Dylan fez uma onda maior do que podia controlar se erguer, eram milhões de litros de água e cada vez mais se juntava fazendo a ondar ficar maior ainda. Alex quem percebeu que era demais para tentar fazer qualquer coisa; ele pegou o amigo pelo braço e correu enquanto a conexão era rompida e a onda caía, fora de controle, inundando a praia e a área ao redor. Aquele lugar não era muito frequentado por humanos e Dylan agradeceu por esse fato enquanto perdia a consciência antes mesmo de encontrar o chão.

*

Dylan acordou em seu quarto em San Diego. Aparentemente, Alex tinha resolvido que já era hora de parar o treino.

Uma luz entrava pela única janela do quarto de Dylan, passava pela cortina branca e refletia nas paredes, tornando tudo muito claro. Ele não sabia dizer que horas eram, mas o dia não tinha sido ensolarado nos últimos dias, apenas nuvens ainda compunham o céu.

– Alex! – Chamou ele, enquanto se levantava. Uma vertigem o tomou quando ficou de pé e ele voltou a se sentar colocando a mão na cabeça e tentando focar a visão em algum ponto no quarto.

Alex apareceu na porta do quarto um pouco cambaleante e com o rosto amassado de sono. Ele passou a mão pelo rosto e olhou para Dylan, se apoiando no batente da porta aberta.

– Até que enfim! – Ele disse, entre um bocejo. – Achei que tinha entrado em coma.

Dylan franziu a testa e tentou se levantar de novo, e seu estomago não pareceu gostar daquilo, como se o movimento tivesse sido rápido demais. Mais uma vez ele cambaleou e sentou-se, a visão mais uma vez borrada.

– Há quanto tempo estou dormindo, Alex? – Dylan estava começando a se preocupar agora.

– Pelos meus cálculos quase vinte e quatro horas – informou Alex, parecendo entediado. – Tempo suficiente para o seu corpo precisar se reabastecer de carboidratos e, principalmente, algum açúcar...

– Alex... – interrompeu Dylan, preocupado – eu...

– Posso assumir seu lugar hoje no café da manhã, mas acho bom você ir até a cozinha – Alex disse, saindo do quarto e aumentando o tom de voz para que Dylan o escutasse. – Mas você não vai ter o café na cama, Dylan. E acho bom você se levantar logo, senão vai se atrasar para a aula. – Alex não era muito de fazer piadas ou brincadeiras com frequência e, mesmo um pouco cansado e com sentindo muita fome, Dylan percebeu certo nervosismo na voz do amigo. Mas deixou para lá. Tinha algo com o que se preocupar no momento.

– Eu não vou...

Nós vamos ao colégio hoje, Dylan! – Gritou Alex da cozinha. – Temos uma Fênix para enfrentar e não vamos entrar para a faculdade sem passar pelo médio. Não me faça voltar aí.

– Já vou, mamãe – resmungou Dylan.

– E eu ainda posso ouvir você! – Retrucou ele.

Dylan revirou os olhos e tentou, mais uma vez, se levantar da cama, dessa vez mais devagar. Ele se viu em pé, lutando contra a vertigem e andando em direção ao banheiro apoiando-se nas paredes.

Vinte minutos depois, Dylan estava indo em direção à cozinha, devagar. Seu estômago parecia ter sido substituído por um buraco negro que quase devorava suas entranhas. O cheiro da cozinha deu-lhe forças para continuar e sentar-se na bancada de mármore. Era bacon, ovos, alguma coisa mais doce e Dylan avistou um suco de laranja.

Alex colocou uma bandeja à sua frente cheia com tudo o que ele tinha feito e um copo grande de suco. Dylan não percebeu quando tinha acabado de comer e aquilo não tinha sido suficiente para saciar toda a sua fome. Alex o olhava com os olhos arregalados, como se não acreditasse na velocidade que Dylan tinha conseguido comer tudo. Ele o serviu com mais um pouco e Dylan comeu mais devagar, aproveitando o gosto da comida.

– O quê? – Perguntou Dylan, vendo que Alex o encarava enquanto comia. – Estou com fome.

Ele pegou um guardanapo e limpou os cantos da boca. Alex só deu uma risada, não disse nada.

Quando eles terminaram, Dylan pegou suas coisas para sair para o colégio, enquanto esperava por Alex em frente à casa. Foi quando Alex apareceu no portão. Sua expressão era de total espanto e medo.

– Precisamos ir, agora! – Falou. E correu para o carro, já estacionado no meio fio.

Dylan correu atrás dele, sem entender o que tinha acontecido para ele ficar tão agitado de repente, e entrou no carro.

– O que aconteceu? – Perguntou.

– Ele passou dos limites agora – falou Alex. – Pegue o seu celular, já te enviei o link para as notícias.

Dylan conferiu o celular e, na tela, estava o site de um canal de notícias local com o nome de Alex em cima, indicando que ele o havia mandado. Ele clicou e foi direcionado para o jornal local, passando ao vivo.

No fundo, atrás do repórter, havia pessoas correndo em pânico por uma praça que Dylan conhecia situada no centro de San Diego. O local estava completamente isolado e não dava para ver o que acontecia dentro das faixas amarelas postas pela polícia. Em toda a extensão de visão da câmera, via-se viaturas policiais e muitos mais policiais e agentes federais circulando pela área. Um frio incômodo subiu pela nuca de Dylan. O repórter não parecia muito animado em dar as notícias enquanto dizia:

“... cias oficiais. Os policiais não permitem qualquer tipo de câmera na cena do crime, mas fomos informados que houve um massacre na praça ontem à noite. São muitas mortes e coisas estranhas estão envolvidas. Aparentemente, o pronunciamento do chefe de polícia de San Diego na televisão ontem, enquanto ele dizia que fariam tudo para evitar o segundo massacre, não passou despercebido por quem quer que tenha iniciado tudo isso quando incendiou aquele prédio há dois dias atrás. A segurança que os policiais estão nos dando não parece ser suficiente em vista do acontecido. Há pessoas em pânico nos assistindo e a pergunta que não quer calar: quando, como e onde acontecerá o terceiro massacre? Aqui é Frank McCurry para o jornal local.”

– Alex, o que aconteceu? – As palavras de Dylan saiu devagar enquanto ele guardava o celular no bolso com mais cuidado que o normal, como se ele fosse se transformar em uma cobra e matar os dois dentro do carro.

– Há dois dias atrás, logo que saímos da casa de Nôah, aparentemente, toda os celulares da cidade receberam uma mensagem com uma ameaça. – falou Alex, a voz saindo rápida demais, forçada demais. – Logo em seguida um prédio foi incendiado, e não se sabe quando ou como começou o incêndio. A notícia é que seriam três massacres e realmente aconteceu o segundo ontem à noite...

– E como nós não ficamos sabendo de nada, Alex? – Perguntou Dylan. – Isso é impossível. – Ele agitava as mãos enquanto falava, exasperado. O carro seguia rápido em direção ao colégio e Dylan percebia que quase não havia pessoas na rua, como normalmente deveria em um dia de semana normal. Se tinha mesmo acontecido aqueles massacres, provavelmente as pessoas não sairiam de casa até que o último ocorresse, segundo o repórter. – Uma notícias dessas deveria estar correndo em todos os...

Ele parou de falar. A compreensão fez com que ele perdesse o ar por alguns instantes.

– Isso aí, Dylan – Alex disse, percebendo que o amigo tinha chegado à resposta que ele estava tentando evitar. – Eu sabia. Eu recebi a mensagem e consegui apagar a que chegou no seu celular antes que você a visse.

– Você só pode estar brincando comigo. – Dylan ainda não conseguia acreditar no que tinha acabado de escutar. – Por que você fez isso?

– A mensagem dizia: Três massacres. Um aviso. – Alex explicou. – A Fênix não está de brincadeira, Dylan. Assim como nós discutimos na casa de Nôah, ele sabia que estávamos nos unindo, ou seja, agindo totalmente contra seus planos e suas ordens. – Alex parou de falar um pouco. Dylan conseguia perceber que suas mãos tremiam levemente. Com um suspiro alto e forte, ele continuou: – Fiquei com medo quando vi a notícia do prédio que foi incendiado. Eles reportaram cinco mortes e doze feridos, mas eu consegui entrar no sistema dos computadores centrais da cidade e descobri que eles omitiram o que realmente aconteceu. Foram vinte pessoas mortas e quinze feridos. Haviam pessoas de outras cidades dentro do prédio na ocasião, pessoas que não deveriam estar lá, mas que por acaso estavam. Eles estão fazendo de tudo para esconder isso da população. Eles não querem que fiquemos mais assustadas. E ontem o Conselho da Ordem Sobrenatural chegou na cidade e, para mim, foi como uma provocação à Fênix, apesar de eu ter certeza que eles não sabem quem estava por trás dos ataques. Vieram à cidade só para investigar...

– O Conselho da Ordem Sobrenatural estava na cidade?! – Dylan arregalou os olhos, percebendo que estava soando como uma criança querendo irritar alguém enquanto repetia tudo o que Alex falava. Ele conhecia histórias sobre o Conselho da Ordem e nem uma delas eram boas. Sabia que eles eram as criaturas sobrenaturais mais poderosas de cada espécie e, quando se reuniam ou saíam para cuidar de algum assunto envolvendo mortes, tudo acabava em mais mortes e sangue. – Eles ainda devem estar aqui – falou Dylan, por um momento esquecendo da raiva que estava sentindo por Alex naquele instante. – Quero dizer, depois do que aconteceu ontem, não há motivo para eles irem embora e se...

– Dylan... – A voz de Alex veio com um alerta, mas Dylan não estava interessado no que ele tinha a dizer.

– ... se eles estão mesmo aqui, podem lidar com a Fênix e podemos ajudar – continuou Dylan. – Precisamos encontrá-los e dar as informações que sab...

– Dylan estão todos mortos. – Falou Alex, percebendo que aquelas palavras ainda não fazia sentido aos próprios ouvidos. Era impossível eles estarem mortos.

Ele não conseguiu fazer as perguntas. Era como se tivesse esquecido como falar. As palavras não lhe vinham à boca. Ele gaguejou, mas Alex pareceu perceber o que ele queria perguntar.

– Só vieram três de todo o Conselho, Dylan. – Informou Alex. – Haael, Aléksein e Mikhael. – Dylan engoliu em seco. Não podia acreditar que o representante dos homens-lobo no Conselho estava morto... – A Fênix matou todos eles e mais algumas criaturas sobrenaturais que estavam reunidas na praça...

– Espere aí – A voz de Dylan parecia ter voltado, mas de repente sentiu sua garganta seca demais. – Algumas criaturas...

– Eu não sei se ela está bem, Dylan – falou Alex, penosamente. – Sinto muito. – E pareceu realmente sentir quando disse. – Ainda não foi reportado o nome dos mortos... Mas quando o Conselho da Ordem chegou em San Diego, todas as criaturas sobrenaturais que moram aqui até os limites da cidade foram convocadas para uma reunião. Parece que a Fênix aproveitou essa ocasião para fazer o segundo massacre...

– Alex – começou Dylan.

– Dylan, vamos dar um jeito...

– Alex, dirija mais rápido – pediu Dylan. Seu coração aprecia estar sendo apertado pela mão de um boneco de neve.

– Dylan, você pode pensar que eu cometi um erro quando não contei para você a verdade, mas eu só estava querendo te proteger. – Alex parecia estar implorando para que Dylan entendesse. Dylan queria. Realmente queria entender. Ele sabia que Alex tentaria protegê-lo sempre, mas aquilo tinha passado totalmente dos limites. – Por que ele mataria aquelas pessoas sendo que poderia vir atrás de nós de uma vez? – Continuou Alex, pensando alto. – Pouparia muito tempo e esforço, na minha opinião. Mas por que esperar? E foi então que eu pensei na possibilidade de essas mortes serem apenas distrações ou, talvez, uma forma para ele demonstrar que tem poder absoluto... ou... – ele parou de falar e Dylan sabia que o que viria a seguir, era uma das muitas demonstrações de como ele detestava quando Alex pensava demais. – ... ou de algum jeito ele estava querendo nos distrair para pegar um de cada vez até que pudesse concluir seu plano...

– Alex, você sabe como eu vou me sentir se eu descobrir que Nôah está morta agora? – Dylan perguntou, mas era mais como se estivesse falando consigo mesmo. – Sabe como eu vou me sentir quando eu descobrir que eu não estava aqui enquanto ela passava por tudo sozinha...

– Ela não está sozinha, Dylan – respondeu Alex. – Ela tem a mãe...

– Não é essa a questão...

– Claro que é! – Gritou Alex. Ele parecia tentar explicar algo difícil a uma criança teimosa. – Desde quando você tem qualquer tipo de responsabilidade com a sobrevivência dela, Dylan?

– Eu a amo, Alex! – Gritou Dylan de volta encarando o amigo.

Naquele momento, Dylan sentiu como se seu corpo estivesse explodindo de dentro para fora e se derretendo, tudo ao mesmo tempo. Suas entranhas pareciam ter sido substituídas por borboletas grandes que não paravam de voar e tentar sair, mas não era uma sensação ruim. Ele se sentiu mais leve que o normal. Como se aquelas pequenas palavras fossem um peso que sentia há muito tempo, mas simplesmente não sabia que estava ali. E todo aquele peso tinha sido substituído por algo grande que comprimia seu coração, fazendo-o expandir-se. Seu peito inflou e uma sensação única de formigamento passou por todo o seu corpo, as palmas das suas mãos estavam molhadas de suor e ele sentia um friozinho agradável na barriga. Dylan descobriu que falar que a amava, quando era puramente verdadeiro, podia se comparar a entrar em um lugar quente e frio ao mesmo tempo, era estranho porque era a primeira vez que admitia, mas também era bom porque ele não se importava se o mundo estava prestes a colidir com o sol ou com qualquer outra coisa, simplesmente não se importava. Se ela estivesse bem com esse fato, ele estaria bem de qualquer forma.

– Eu a amo – repetiu para si mesmo num sussurro. Um sorriso involuntário se abriu em seu rosto e Dylan, pela primeira vez, sentiu o que era verdadeiramente sorrir.

– Foi difícil? – Perguntou Alex. Dylan quase tinha se esquecido da presença do amigo ao seu lado.

– Difícil? – Repetiu Dylan sem entender

– Admitir a si mesmo que a ama – falou ele.

– O que você quer dizer, Alex?

– Há dias você não está raciocinando direito, Dylan – explicou ele. – Há dias que não se concentra em nada... Está explosivo e parece ter uma raiva infinita. Quando eu recebi aquela mensagem, sabia que, se você a visse também, enlouqueceria para tentar proteger aquela garota e acredite em mim, a mãe dela já é boa o suficiente em fazer isso, caso não tenha percebido quando ela tentou nos matar. Você só atrapalharia. Confesso que não sabia o que fazer, então, quando você chegou com a notícia que tinha descoberto seu poder sobre o mar, imediatamente vi que podia ser a minha chance para fazer algo a respeito. Você disse que eu tinha que fazer você ficar focado no que estávamos aqui para fazer, Dylan, e realmente estou tentando, mas estava difícil. E eu ouvi você falando enquanto dormia quando voltei para casa com você inconsciente. Era sempre o nome dela a aparecer nos seus lábios enquanto você sorria. De alguma maneira, tinha que fazer você confessar a si mesmo que a amava, por isso resolvi contar a você agora. Você se preocupou e disse. Exatamente como eu queria que fizesse. Está se sentindo melhor?

– Você tem uma maneira muito estranha de conduzir experimentos, Alex – disse Dylan, enquanto processava tudo o que o amigo tinha dito.

*

Menos de cinco minutos depois Alex parou o carro na frente do colégio. Aparentemente, para Dylan, tudo parecia exatamente igual como em seu primeiro dia – os alunos chegando normalmente e estacionando seus carros, indo em direção aos prédios de suas respectivas aulas; o céu cinzento e cheio de nuvens ameaçando derramar chuva a qualquer momento; os prédios do colégio erguendo-se pomposamente com sua arquitetura moderna e suas entradas de mármore e portões. Mas era só a aparência, pensou Dylan. Nada estava exatamente igual àquele primeiro dia. O dia parecia mais triste, como se esperasse que mais pessoas morressem por uma causa perdida; os alunos chegavam, mas não conversavam animados uns com os outros, estavam agitados, olhando para os lados, claramente com medo e desconfiados; não havia mais o barulho familiar vindo de dentro do próprio colégio.

Dylan mal esperou o carro parar para sair correndo para o pátio em frente aos prédios. Dalí ele conseguiria ver quando Nôah chegasse... mas e se ela já tivesse chegado? Alex chegou perto de Dylan e parecia preocupado com ele, então disse:

– O que te garante que ela já não chegou?

Dylan se retesou. No ar, um cheiro diferente o atingiu: algo leve e floral, não muito doce. Ele inspirou profundamente, como se fosse a melhor fragrância do mundo.

– Não está sentindo? – Falou ele, abrindo um sorriso.

– Sentindo o quê?

– Ela acabou de chegar.

Alex soltou uma gargalhada baixa e falsa, parecendo não acreditar no que Dylan tinha dito.

– Você só pode estar de brincadeira comigo – ele disse.

– Fica olhando – Dylan falou de volta.

Naquele momento, ele percebeu que não conseguia tirar o sorriso do rosto. E realmente tentou. Mas era como se tivesse sido costurado ali. Ele sabia que qualquer outra garota podia ter aquele mesmo perfume, mas em Nôah era diferente o modo como exalava. Dylan conseguia diferenciar aquele cheiro mesmo se estivessem na Times Square no ano novo, vendo a bola descer.

E Dylan a viu.

Seu coração pulou, como se tivesse ganho um campeonato de sapateado. E seu sorriso se abriu mais. Toda a tensão que Dylan carregava desde que Alex tinha lhe dito a verdade naquela manhã pareceu se esvair de uma só vez e ele percebeu o quanto aquilo o estava exaurindo. Mais uma das muitas sensações boas que Nôah provocava em Dylan. A distância entre eles parecia nunca acabar e, mesmo estando aliviado por Nôah estar bem, Dylan percebeu pela expressão no rosto dela que alguma coisa tinha acontecido.

– É a minha deixa – falou Alex, indo em direção ao prédio II. – Nos encontramos no almoço e você me conta.

Dylan apenas assentiu; não conseguia tirar os olhos de Nôah. Aparentemente, ela ainda não o tinha visto, mas quando seus olhos se encontraram, Dylan conseguiu ver a sombra de tristeza que encardia o fundo cinzento. Ele não conseguiu esperar que ela chegasse até ele, então começou a caminhar na direção dela e ficou surpreso em ver que não sabia como reagir naquele momento.

Mas pelo bem ou pelo mal, a abraçou. Não disse nada, apenas a abraçou. Ali, sentindo-a mais de perto, pareceu estar mais próximo da realidade como nunca antes esteve. Ele sentia o coração de Nôah acelerado, no mesmo ritmo que o seu. O cheiro que havia sentido antes, mais intenso agora, dançando no ar, embriagando-o.

– Ei – chamou ele, sussurrando – está tudo bem agora.

– Onde você esteve? – Perguntou ela, com a voz embargada. Dylan se amaldiçoou mil vezes por ter ido àquele acampamento idiota com Alex. Nunca deveria ter ido; nunca deveria ter se distanciado do perigo. Nôah esteve ali, passando por tudo...

– Me desculpe... eu não deveria... – sua voz quase não saía, como se alguma coisa estivesse impedindo sua passagem em sua garganta. – Eu estou aqui agora.

Ela assentiu uma vez. O sinal anunciando o início da primeira aula tocou e eles se afastaram. Felizmente, a primeira aula deles era a mesma. Então caminharam juntos até o prédio II para a aula de biologia I. O professor já estava na sala, mas não deu qualquer sinal de vê-los chegando depois do sinal em sua aula. Rapidamente eles encontraram um lugar para sentarem-se juntos e, nesse momento, o professor se levantou e começou a se apresentar.

Era um homem de mais ou menos trinta anos de idade, tinha os cabelos pretos e olhos da mesma cor, nariz afilado e um ligeiro sotaque inglês. Chamava-se Sr. Hunt e era conhecido como um dos melhores professores de biologia da costa leste dos Estados Unidos; todos o respeitavam por este título.

E acabou que, naquela aula, eles não tiveram tanto tempo para conversarem. O professor não era muito apto a conversa paralela e fez com que eles realmente tivessem com o que ficar ocupados. Nas outras aulas, não foi muito mais fácil porque nenhuma delas coincidia e só no almoço eles tiveram tempo para conversar sobre o que tinha acontecido enquanto Dylan e Alex estavam fora.

Alex e Dylan se encontraram com Nôah em uma mesa no refeitório para o almoço, e começaram a conversar apressadamente, levando em conta o pouco tempo que tinham, e quase sussurrando. Várias pessoas lançavam olhares estranhos para a mesa deles, talvez se perguntando o que Nôah estava fazendo em segredo com os dois garotos novos, pensou Dylan. Mas ele não prestou atenção. Estava muito ocupado observando Nôah enquanto ela fazia o relato do primeiro massacre. Ela falava o mais rápido que conseguia, mas Dylan percebeu que ela escondia alguma coisa. Sempre que seus olhos se encontravam, ela olhava para a mesa ou para o seu almoço na sua frente.

– Foi estranho vocês terem saído e logo em seguida a mensagem ter chegado – dizia ela. – E, imediatamente, eu cheguei à conclusão que a Fênix sabia que tínhamos nos encontrado e estávamos juntos na missão de derrotá-lo e salvar Sam. – O nome de seu pai saia com tanta facilidade que Dylan ficou tentado a perguntar se ela não vinha sonhando com ele mais vezes do que a última. Era como se se conhecessem; soldados de guerra. – Minha mãe ajudou fazendo com que uma tempestade apagasse as chamas, mas não antes de todas aquelas pessoas morrerem.

Alex olhou para Dylan, e ele soube o que o amigo estava pensando. Mal sabe ela que nem toda a verdade foi reportada aos cidadãos.

– O que vocês não estão me contando? – Perguntou Nôah.

– Muitas coisas, na verdade – falou Alex, com um tom estranho de sarcasmo. – Só você quem falou até...

– O que ele está querendo dizer, Nôah, – interrompeu Dylan, respirando fundo – é que foram mais mortes do que os noticiários disseram ter acontecido. Eles não deixariam que a população ficasse assustada com a ameaça de mais mortes à vista...

– Isso mesmo! – Falou Nôah. – Vocês não receberam a mensagem?

– Na verdade...

– Sim, recebemos – Alex interrompeu Dylan. – Mas saímos para treinar antes de tudo começar realmente. Assim que soubemos que o segundo massacre tinha acontecido, voltamos.

Nôah apenas assentiu. Não os pressionou querendo saber mais porque talvez achasse que o treinamento fosse apenas assunto dos homens-lobo.

– Você estava lá ontem à noite? – Perguntou Dylan, com a voz preocupada.

Nôah olhou em seus olhos antes de responder. Dylan conseguiu ver o quanto Nôah ainda estava assustada com o que tinha acontecido naquela noite.

– Foi horrível! – Começou ela. – Eram muitas criaturas sobrenaturais na praça e até crianças estavam presentes, criaturas sobrenaturais de diferentes espécies, mas todos nós compartilhávamos uma coisa: o medo que o Conselho da Ordem impunha sobre nós mesmo antes de aparecerem.

Ela continuou contando e Dylan ouvia, horrorizado pensando no quão rápido tudo aconteceu e quantas criaturas foram mortas por nada. Mesmo ainda sem acreditar quando Alex disse, com Nôah falando pareceu mais real. Cada descrição das mortes, a forma como ela e a mãe ajudaram a salvar algumas criaturas de serem mortas, o timing perfeito da Fênix, o feitiço das bruxas, as outras criaturas sobrenaturais matando sua própria espécie... Depois Nôah falou como os membros do Conselho foram mortos. Como a perspicácia da Fênix superou até o poder de Haael, sendo que Mikhael foi morto primeiro, pois tinha o poder, como os outros vampiros bem treinados, de se teletransportar levando outros consigo. O modo como a Fênix travou os poderes de transformação de Aléksein para que ele não ajudasse os outros fez Dylan sentir-se mal por ter experimentado do mesmo poder quando encontrou a Fênix na praia. E, enfim, Haael e Aléksein também morreram e Dylan achou que tinha parado por aí, mas Nôah não parou. As criaturas controladas pela Fênix, tanto bruxas, vampiros e os outros, tinham se matado numa chuva de sangue completa. Um verdadeiro show de horrores.

Nôah parou de falar, encarando Dylan e Alex. Dylan não sabia o que dizer sobre o que tinha escutado, e, pela primeira vez, Alex também não. A Fênix tinha controle sobre outras criaturas sobrenaturais e era muito mais forte que o próprio Conselho da Ordem Sobrenatural... Eles estavam, literalmente, perdidos naquela busca.

– Mas foi um erro não terem vindo os outros membros do Conselho – quis argumentar Alex, mas sua voz não saiu como esperava porque ele mesmo não parecia tão confiante aos olhos de Dylan. – Bem, – continuou ele – se tivessem vindo mais membros, talvez com alguns guardas, eles tivessem alguma chance.

– Alex – Nôah falou. Dylan não se lembrava de eles terem tido alguma conversa direta. – Com certeza a Fênix sabia que o Conselho da Ordem viria a San Diego. Ele arquitetou o plano perfeito para nos mostrar que ele tem poder para nos matar quando ele quiser, assim como fez com o Conselho. Eu apostaria na hipótese que nenhum dos três membros sabia da existência da Fênix e que ele está trabalhando contra as leis do Pacto Sobrenatural.

– Segundo o padrão que a Fênix está usando, – completou Dylan –, o próximo massacre será amanhã, mas ainda não temos como saber onde vai acontecer e, consequentemente, como evitar.

– E não vamos – Alex disse, decidido – não vou entrar na linha de frente contra a Fênix sem saber com o que vou lidar e você também não. – Ele lançou a Dylan um olhar significativo. – Ele é poderoso demais e, sem planejamento, vamos sucumbir um a um ou mesmo todos de uma vez, – continuou –, tenho certeza que ele tem poder para isso.

Nesse momento, o sinal anunciando o fim do almoço tocou. Os alunos começaram a se levantar e guardar suas bandejas depois saíram do refeitório para as salas de aula. Dylan e os outros fizeram o mesmo. Alex se despediu de Nôah e Dylan e foi para o prédio I, enquanto os dois iam para o prédio III, eles teriam aula em salas diferentes, para o desapontamento de Dylan. Enquanto ele acompanhava Nôah até a sala, disse, um pouco sem jeito:

– Sabe, prometi que pegaria seu número quando a visse de novo.

Ela riu. E Dylan percebeu que era a primeira vez que ela o fazia naquele dia, logo em seguida, ele se sentindo triste por isso.

– E ainda não pediu, por quê?

– Você sabe, não sou desses atirados que gostam de impressionar uma garota que estou a fim com cada coisa que faço...

– Está flertando comigo, senhor sotaque inglês?

– Ainda não, mas se me der seu número e aceitar sair comigo hoje à noite, prometo que vai valer a pena e talvez eu flerte um pouco.

Ela riu baixinho e Dylan conseguiu avistar a porta da sala que Nôah entraria para a aula uns quatro metros à frente.

– Tem certeza que é uma boa ideia? – Ela perguntou. – Com todas essas coisas que estão acontecendo...

– Bem, desde o início não foi uma boa ideia, mas não estou mais preocupado com isso. – Ele respondeu. – Se vamos mesmo morrer ou algo assim, precisamos viver antes. – Dylan franziu a testa, divagando. – Isso soou poético.

– Vou tentar convencer minha mãe a me deixar sair – ela disse, enquanto pegava uma caneta na bolsa e escrevia seu número na mão de Dylan. – Me mande uma mensagem. – E entrou na sala.

Dylan começou a andar mais rápido para a sua sala e pensou, Bem, já é alguma coisa.

*

Dylan passou o resto do dia esperando pela resposta de Nôah.

Resolveu não contar a Alex que tinha chamado Nôah para sair, ainda mais com a ameaça da Fênix pairando no ar como uma névoa de morte. Ele sabia que o amigo argumentaria contra a sua decisão e, talvez, com razão. O fato de Dylan e Nôah saírem era a mesma coisa que chutar cachorro ferido, no caso a própria Fênix. Mas Dylan sabia que não podia ficar o tempo todo deprimido e seguir as regras impostas, a vida de seu pai dependia dele e ele não o abandonaria.

Mas Dylan resolveu contar ao amigo o que planejava mesmo sabendo que seria difícil convencê-lo. E Alex reagiu de uma forma muito positiva quanto a tudo, se oferecendo para ajudá-lo e tudo mais.

De certa forma, pensou ele, não estaria desviando de seu caminho principal convidando Nôah para sair? Dylan não tinha nenhuma pista nova sobre seu pai e duvidava que conseguiria encontrá-lo se a Fênix não quisesse...

Ele afastou aqueles pensamentos. Não queria pensar que seu pai não podia ser encontrado. Sam confiava que Dylan se comprometeria na busca e na missão de encontrar Nôah, seguindo o que viesse, firme, sem hesitar e com decisões sensatas.

O sol estava quase se pondo quando Nôah respondeu a Dylan. “Teremos pouco tempo, segundo minha mãe.”

“Passo na sua casa às 7” respondeu ele.

“O que vamos fazer?” Perguntou ela de volta.

“Ainda estou pensando.”

“Devo me preocupar quanto a sequestros ou algo do tipo? rs’”

“Bem, prometo que se for preciso te sequestrar, aviso segundos antes ;D”

“Agora me sinto bem melhor.” Respondeu ela. “Vou me preparar, então. Até daqui a pouco.”

“Mal posso esperar.”

Dylan não sabia de onde vinha aquela inspiração ao conversar com ela, mas tinha ficado satisfeito com o modo que eles conversaram. Não parecia mais como quando tinham se conhecido, como dois adolescentes preocupados em se salvar de vampiras loucas, se é que isso existia de verdade. Talvez aquele encontro fosse algo bom em meio a tantas coisas ruins acontecendo. Tinha que haver algum ponto bom em tanta infelicidade e morte e Dylan esperava que fosse Nôah esse ponto. E queria alcançá-lo a qualquer custo.

*

Pouco antes das sete, Dylan parou o carro em frente à casa de Nôah, respirou fundo e saiu. Ele sentia por seu corpo passar leves tremores com um pouco de excitação e medo, sentia suas mãos frias e sua respiração acelerada. Talvez fosse bom isso acontecer, não é mesmo? Pensou ele. É o que normalmente acontece em um encontro comum. “Recomponha-se!” Disse uma voz dentro de sua cabeça. “Você não é normal, é um homem-lobo. Tem que passar por isso melhor que um ser humano seria capaz.” Ótimo, pensou de volta, agora estou ouvindo vozes. Muito normal.

Ele parou no portão e, mais uma vez, respirou fundo, tentando se acalmar. Mas não foi exatamente isso que o fez se sentir melhor. O cheiro parecia estar em todo lugar por ali, como se Nôah tivesse acabado de entrar em casa. Dylan apertou o botão do interfone e esperou, segundos depois, o portão foi destravado com um pequeno estalo e Dylan o empurrou e entrou.

Na primeira vez que estivera na casa de Nôah, Dylan não tinha percebido os detalhes da grande casa. Depois do portão, uma passarela plana de pedras brancas levava aos degraus de entrada; dos dois lados encontrava-se um jardim muito bem cuidado e, por um pequeno esforço de Nôah, Dylan imaginou, mantinha-se alegre e florido mesmo no tempo fechado que fazia no outono; a fachada da casa era totalmente pintada de branco, desde as pilastras grandes e grossas em estilo vitoriano até as molduras das janelas dos dois lados da pequena varanda com um telhado vermelho. Enquanto andava em direção à porta, Dylan se lembrou que estava com as mãos vazias e logo se lembrou do que tinha se esquecido, voltando ao carro. Era um pequeno conjunto de flores que tinha encomendado assim que Nôah confirmou o encontro; tinham cores variadas, com diferentes espécies, talvez o mais bonito que Dylan tinha visto na floricultura.

Ele parou à porta, com uma mão segurando as flores e a outra fechada bem apertada às costas para esconder o leve nervosismo que ainda o tomava. Relaxe! Disse a si mesmo. Só deixe acontecer que vai dar tudo certo.

A porta se abriu revelando a origem do cheiro que ele sentia em todos os lugares agora, mas mais intensamente quando ela estava por perto.

Nôah estava linda como sempre, mas Dylan tinha que admitir que ela sabia como impressionar um homem. Estava vestida com uma blusa branca com detalhes de pequenas e delicadas flores em um ombro e a outra manga era feita de renda; um short alto também em um tom branco, mas um pouco acima do da blusa e dois botões dourados; seu cabelo claro caía em camadas perfeitas pelas costas e algumas mechas decoravam seu ombro direito.

– Pontual – observou Nôah.

Dylan pigarreou, tentando se situar. Nôah deve ter percebido seu nervosismo, pois sorriu e olhou para baixo, também parecendo um pouco nervosa.

Sotaque inglês, lembra? – Perguntou Dylan, querendo descontrair.

Nôah o olhou, ainda sorrindo e disse:

– Entre, vou avisar à minha mãe que já estamos saindo.

Dylan assentiu e entrou, ainda com as flores nas mãos e Nôah chamou sua mãe. Narscisa logo apareceu descendo as escadas, sua expressão era a mesma de sempre: impassível, não aprecia nem uma pista do que estava pensando no momento.

– Mãe, já estamos indo – anunciou Nôah.

Narscisa aquiesceu, estreitando os olhos.

– Boa noite, senhora. – A voz de Dylan tremeu, mas sua postura era firme ao oferecer as flores a Narscisa.

– Obrigada, Dylan, são lindas – Narscisa elogiou, com o esboço de um leve sorriso em seu rosto perfeito.

– Vamos? – Perguntou Nôah.

– Sim – concordou Dylan. – Prometo trazê-la não muito tarde – ele disse, voltando-se para Narscisa.

– Assim espero – ela o respondeu.

Dylan sorriu e assentiu, indo em direção à porta. Nôah o acompanhou e eles foram para o carro.

– Posso saber agora para onde vamos exatamente? – Perguntou Nôah.

– Só preciso checar se está tudo pronto, só um minuto. – Dylan pegou o celular e discou o número de Alex, esperando que o amigo já tivesse feito tudo como assim prometeu.

Quando Dylan contou a Alex que tinha chamado Nôah para sair, achando que o amigo teria mais uma de suas crises, ele apenas assentiu e perguntou o que poderia fazer para ajudar, alegando já estar passando da hora de isso acontecer. Dylan não discutiu, se Alex concordava, não tinha motivos para achar que fora uma má ideia.

– Está tudo pronto, Dylan – respondeu o amigo. – Já estou em casa.

– Obrigado, Alex – ele falou.

– Sem essa – Alex retrucou -, sabe que eu vou cobrar por isso alguma hora.

– Já desconfiava. – O tom de Dylan foi resignado. – Depois discutimos isso.

– Boa sorte – desejou Alex. – E não estrague tudo.

– Obrigado e não vou.

Ele desligou o celular e o devolveu ao bolso.

– Já estamos prontos. – Dylan disse, com um sorriso.

– Prontos para quê? – Ela perguntou.

– Você vai ver.

Nôah não o pressionou mais e Dylan ficou silenciosamente agradecido por isso. Não queria estragar a surpresa. Estava tudo perfeito e ele faria com que tudo corresse bem.

Ele dirigiu em direção ao local do encontro.

Dylan se sentiu bem melhor quando pôde ouvir o barulho do mar e sentir o cheiro da água salgada e maresia no ar.

Ele não sabia de onde tinha vindo aquela inspiração para fazer aquele encontro funcionar daquele jeito. Tinha vindo, do nada, à sua mente e, quando contou a Alex, sem esperar que o amigo concordasse, se surpreendeu quando este o incentivou ainda mais.

Talvez Alex só precisasse de tempo para amadurecer a ideia. Seria inevitável que Dylan não se aproximasse de Nôah sendo que, desde o instante em que a viu, ele sabia que a amava.

Pensar em Nôah despertava sentimentos que ele nunca havia sentido antes. Algumas coisas que ele nem tinha como explicar, apenas acreditava que se o que fosse para acontecer, ele aceitaria tudo de bom grado. Dylan, por um momento, pensou se ele não estaria tratando seus sentimentos por Nôah como prioridade acima de seu pai, mas ele percebeu que, quando começou a gostar dela, seu coração não se dividiu em partes para confortar cada um dos que amava, e sim cresceu, para haver mais espaço, deixando com que todos coubessem perfeitamente, inclusive Nôah.

Ele parou o carro em uma das vagas do estacionamento da praia, que, naquela hora da noite, estava completamente deserto. Logo se apressou em abrir a porta do carro para que Nôah saísse, – ela sorria com o gesto e aquele sorriso despertava em Dylan lembranças sobre brisa do mar, o friozinho em frente a uma lareira acesa, cheiro de chuva... tudo o que ele mais gostava em toda a sua vida.

– Só tenho que pegar uma coisa – disse, abrindo a porta de trás do carro. Tirou de lá uma cesta de piquenique que tinha preparado mais cedo.

– Podemos? – Ele passou seu braço esquerdo em volta dos ombros dela e se sentiu bem ao ver que ela parecia confortável com o gesto.

– Claro que sim – respondeu ela, passando seu braço em torno de Dylan também.

Aquela noite estava particularmente quente, apesar de as nuvens ainda estarem carregadas no céu. Dylan ficou um pouco decepcionado; seria muito melhor com uma lua grande e linda no céu, mas resolveu que não reclamaria, quem sabe ele já não tinha gasto toda a sua cota de sorte quando Nôah convenceu sua mãe a deixá-la vir. Faria com que a noite compensasse o fato de não haver uma lua no céu.

Eles andaram até o local onde Alex tinha dito que tinha preparado tudo. Lá, tinha uma mesa de madeira clara com duas cadeiras, uma de frente para a outra, da mesma cor, presas bem firme ao chão de areia da praia. Não era grande coisa, mas só de estar ali com Nôah, ele sentia que não precisava estar em nenhum outro lugar.

Dylan foi até uma cadeira e a puxou, dizendo:

– Senhorita.

– Obrigada – agradeceu ela.

Em um instante, Dylan tirou da cesta de piquenique o que tinha preparado e pôs-se a fazer a mesa. Quando terminou, sentou-se em seu lugar, olhando para Nôah com atenção, tentando saber o que ela estava pensando naquele momento.

– Bem, eu não perguntei, mas se você quiser ir a outro lugar, desfazemos tudo em um segundo – disse ele.

– Está tudo perfeito – ela falou.

Dando ênfase às suas palavras, ela pegou um pratinho de porcelana e começou a se servir de frutas e suco. Dylan fez o mesmo, sentindo-se um pouco aliviado por ela estar gostando.

– Sei que é um pouco careta e tal, mas para a alegria de todos, eu sou assim – disse ele, sorrindo.

– Eu também não vou à festas, Dylan – explicou ela. – Fico em casa com a minha mãe ou Claire... Também não sou fã de multidões.

O mar estava bem calmo naquela noite, mas isso foi até ela aparecer. De repente, as nuvens começaram a se mover no céu, desaparecendo uma atrás da outra revelando o espetáculo que estavam escondendo por dias.

A lua parecia particularmente grande naquele dia. Era uma minguante que acabava de despontar do mar, deixando um rastro de luz na água e iluminando tudo à sua volta.

Dylan olhou, sem acreditar, para Nôah. Aparentemente, nenhum dos dois esperava ver aquilo naquele dia.

– Minha mãe, ao que parece, também é pontual. – Nôah comentou.

– Sua mãe fez isso? – Dylan ainda estava incrédulo. Ele, particularmente, amava a lua minguante quando esta despontava do mar.

– Não consigo pensar em nada que possa fazer as nuvens irem embora assim, tão rápido – Nôah o respondeu. – Talvez é um agradecimento pelas flores ou um pedido de desculpas por ter surtado no outro dia. Talvez os dois.

– Você precisa dizer a ela que estou impressionado – Dylan disse, encarando a lua. – Ela está linda.

– Há fontes confiáveis de que amanhã ela estará ainda maior – informou Nôah. – A segunda maior do ano.

– Quer voltar para vê-la amanhã? – Ele perguntou.

– Não sei se será possível – ela disse, baixando o rosto. – Amanhã é o dia do terceiro massacre, não?

– Não sabemos se vai mesmo acontecer – Dylan respondeu. – E eu não quero que pense nisso agora.

– É um pouco difícil não pensar. Foram muitas mortes, Dylan.

– Tenho uma ideia, quer ouvir uma história?

– Claro.

– Minha mãe era uma bruxa – começou Dylan. – Uma particularmente poderosa que se apaixonou por meu pai quando tinha quase a nossa idade. Mas eles não sabiam que uma bruxa e um homem-lobo não podiam ficar juntos e isso vai além de regras de instinto ou rivalidade. A prole proveniente desse tipo de casal é poderosa e perigosa. Assim como a mãe de Alex, minha mãe teve uma gravidez difícil e morreu logo depois que eu nasci. Ela só teve tempo de dizer ao meu pai o meu nome.

– Dylan! – Nôah parecia inconformada.

– O quê? – Perguntou ele, sem entender.

– Achei que fosse uma história feliz – ela respondeu. – Eu sinto muito.

– Você é esperta, Nôah – ele disse. – Eu não disse isso, você sabe. Mas não precisa sentir. Está tudo bem. – Mesmo assim ela não parecia nem um pouco mais apta a querer escutar mais. – Dylan significa aquele que veio do mar – continuou ele. – Você pode deduzir alguma coisa só sabendo o significado, mas prefiro que você veja.

Dylan andou até onde ela estava sentada e ofereceu a mão para ela se levantar.

– Venha comigo – ele disse.

– Não vai me dizer o que é?

– Não será mais um surpresa se eu contar – respondeu ele.

– Mas você também não disse que era uma surpresa – observou ela.

Dylan riu seguido por Nôah.

– Bem, estou dizendo agora – respondeu ele.

Eles caminharam até onde as ondas se arrebentavam. Ele tirou os tênis e Nôah as sandálias, a areia estava fria sob seus pés.

– Se não der certo, não ria – ele disse. – Vou te contar o que andei fazendo quando fui acampar com Alex.

– Prometo não rir – falou ela.

Dylan assentiu e se concentrou. No momento em que o fez ele sentiu o gigante acordando. Com um esforço maior, ele os chamou. As correntes fluíam em sua direção com tanta intensidade como se nada pudesse pará-las.

– É só esperar alguns minutos – ele disse. – Estão um pouco longe, mas devem chegar logo.

– Você não está querendo me dizer que... Oh! – Exclamou ela.

Peixes de espécies e cores diferentes vinham com velocidade surpreendente, como se soubessem que havia muita comida em algum lugar ali perto. Em seguida, começaram a surgir os luminescentes, dando luz e mais cor às águas. Dylan sentiu necessidade de chamá-los, mesmo sabendo que eles preferiam águas profundas, porque só com a luz da lua não daria para ver o espetáculo maior.

– É lindo! – Nôah disse, olhando para o cardume que girava em grandes círculos espaçados e em torno deles mesmos.

– Calma, ainda não acabou – falou Dylan, ansioso.

Ele apontou o dedo para um ponto no mar a uns dez metros longe deles e os peixes neon – que, naquele momento, parecia haver milhares deles –, começaram a girar numa espiral maior de luzes coloridas. As baleias apareceram, enormes mamíferos aquáticos que o faziam parecer uma formiga. Eram lindas orcas negras e algumas com manchas brancas pelo corpo. Elas davam enormes pulos alternados que eram acompanhados pelos seus filhotes que participavam também e, brincavam com alguns golfinhos que jogavam água para cima, pulavam na superfície da água como se não pesassem nada. Era uma dança perfeita e bem sincronizada, apesar de eles não serem animais treinados.

– E então, o que achou? – Dylan ficou tão absorto em mandar os peixes fazerem o que ele queria que fizessem que só agora percebeu o quanto Nôah estava maravilhada com todo o espetáculo. Seus olhos brilhavam e aquele momento compensava cada coisa ruim que tinha acontecido em sua vida.

Dylan levantou seus braços, fazendo com que a água do mar se erguesse, formando espirais enormes na água por onde os golfinhos agora pulavam.

– Você consegue fazer isso por causa de sua mãe? – Ela perguntou.

– Sim, aparentemente – Dylan lhe respondeu. – Nenhum outro homem-lobo tem mais poderes igual a mim, então é a teoria mais sensata.

– Alex também controla o mar?

– Ele ainda não sabe... – Dylan hesitou. – É complicado – falou ele. – A mãe de Alex não está morta. Ela apenas perdeu os poderes – informou ele. – Esse é um assunto complicado para Alex porque ele se sente culpado por isso.

– Hmm, me desculpe, eu não sabia – ela disse.

– Não tem problema – ele disse. – Só tome cuidado de não levantar o assunto perto de Alex.

Ela assentiu.

– Mas me conte, o que você achou? – Pediu ele.

– A noite perfeita com a pessoa prefeita – ela disse, sorrindo ele olhando para ele.

Dylan a abraçou, depois eles se beijaram por um longo momento, mas Dylan não estava preocupado com o tempo. Só queria fingir que estava tudo bem e que tudo ficaria bem.

– Dylan... – Começou Nôah, interrompendo o beijo.

– Não, não – ele a interrompeu beijando-a de novo. – Não estrague esse momento. Eu já o fiz antes e não vou dar a chance para que você também o faça.

– Você nem sabe o que eu ia dizer – disse ela, virando o rosto.

– Presumo que comece com “o que nós somos” e termine com “como enfrentaremos sua mãe”.

– Ela tem que saber – insistiu Nôah.

Dylan levantou uma sobrancelha e fez cara de impaciência.

– Eu sei que ela deve saber. – Ele se rendeu. Nôah estava certa, eles precisavam oficializar contando para Narscisa. – Apenas não sei quando ela deve saber. – E terminou com um sorriso.

– Ela sabe que há algo acontecendo entre nós e é por isso que estou sugerindo que contemos a ela que há algo realmente acontecendo entre nós.

– Não podemos curtir um dia em segredo antes de saber se ela pode estragar tudo?

– Ela não vai estragar tudo. – Prometeu Nôah. – Talvez devêssemos...

– Não, Nôah, é a nossa hora. – Ele a interrompeu de novo. – Pense em uma coisa: nunca foi certo antes e é certo agora. – Dylan encontrou os olhos dela, ela parecia estar um pouco apreensiva. – Só um dia? – Ele fez biquinho enquanto insistia. – Um dia?

– Tudo bem – ela disse –, um dia. Você não deveria poder conseguir me persuadir tanto assim, sabia?

– Isso! – Ele comemorou, abraçando-a. Ela começou a rir baixinho em seu ouvido e ele a acompanhou. Era bom demais ouvir aquele som.

Eles ficaram ali, curtindo o começo de uma imortalidade que nunca teria fim, pois nada poderia mudar o fato de que eles pertenciam um ao outro.

*

Quando deu a hora marcada, Dylan levou Nôah para casa, prometendo que a veria de novo em seus sonhos logo mais. Eles se despediram e ele voltou para casa com um sorriso no rosto, quase grande demais para conseguir escondê-lo. Mas o fato era que não queria esconder aquele sorriso. Ele queria gritar para o mundo inteiro saber que tinha encontrado o amor de sua vida, aquele era um fato real ao qual ele se apegava naquele momento e não queria se soltar nunca.

Mas, aparentemente, a Fênix não descansava para atingir seus objetivos. Uma massa grande e escura apareceu, do nada, em frente ao carro de Dylan. Tudo aconteceu rápido demais.

Em menos de um segundo ele conseguiu ver que aquela massa era, na verdade, um homem em posição ereta, de frente para ele, pairando alguns centímetros do chão, com asas enormes e abertas projetando de suas costas. Só deu tempo de Dylan virar o volante com toda a força e se ver batendo em um acostamento da rua, depois sentir cada vez que o carro virava com a força do impulso contrário dos freios. Foram, antes que Dylan perdesse a consciência, três giros no ar, todos com aterrissagem brusca e batidas destruidoras no asfalto.

*

Quando tomou consciência de si, estava sendo arrastado pelo chão que parecia ser de areia e pedras. Ele sentia suas mãos amarradas em suas costas e uma dor passar por todo o seu corpo. Sentia que ainda se recuperava de alguns ferimentos, mas não olhou para saber o quão extensos eram. Sangue escorria por sua cabeça, ele sentia o cheiro e o gosto, e sabia que uma quantidade boa ainda se alojava em seu rosto, talvez por um ferimento já cicatrizado pela sua rápida regeneração. O barulho de passos contra o superfície arenosa eram cada vez mais rápidos, como se Dylan não pesasse nada. De repente, o tipo de chão mudou para o que parecia madeira e a escuridão tomou mais uma vez a visão de Dylan, mas ele não perdeu a consciência. Tinha entrado em algum lugar sem iluminação. A pessoa que o carregava o soltou no chão para fechar a porta. Ele sentiu mais dor, mas não soltou qualquer reclamação. Não daria aquele gosto à ele.

– Podem começar. – Aquela voz. Ele a conhecia. Fria. Confirmando suas suspeitas, a Fênix estava mesmo por trás de tudo aquilo.

Incendia! – O coro de vozes que se seguiu quase foi o suficiente para fazer Dylan ficar com ainda mais medo. Bruxas.

Pela primeira vez, Dylan viu onde estava. Era, pelo que parecia, um galpão, grande de madeira, talvez de uns trinta metros quadrados. As paredes revestidas de ferro, mas estavam muito enferrujadas; o cheiro de sal e mofo indicava que estava abandonado há algum tempo. Ainda nas paredes, várias tábuas de madeiras foram pregadas e agora sustentavam velas de todos os tamanhos, que se acenderam ao comando do feitiço das bruxas, que Dylan se espantou com a quantidade. Eram quase trinta mulheres de todas as idades, postadas em filas organizadas com as mãos voltadas para ele. A fênix estava sentado em uma cadeira a uma distância boa de Dylan, suas asas estavam retraídas, quase escondidas atrás das costas, para a sua surpresa, considerando seu tamanho. Um movimento chamou a atenção de Dylan e ele viu um homem, deitado, com as costas apoiadas na parede do galpão, tinha o nariz sangrando e cortes nos pulsos fazia mais sangue escorrer pelo chão. Ele não parecia morto, mais não demoraria muito mais se não estancassem seus ferimentos e o levassem para um hospital bem rápido. Mas Dylan sabia que essa não era a intensão da Fênix. Algo não estava certo ali, o que aquele homem fazia deitado sob o poder das bruxas? O que a Fênix podia querer com ele?

Vulneras sabrien liqua extila o no gibrà senecres. – Todas começaram a entoar o segundo feitiço de uma vez, na mesma sincronia, como se estivessem conectadas. Pelo jeito, ele não demoraria muito mais para saber. Dylan não entendia de feitiços de bruxas e ficou com medo ao perceber que todas elas juntas tinham o poder de explodir uma cidade inteira. O que não fariam com ele?

Mas não demorou muito mais para acontecer. A dor por seu corpo se intensificou, cada vez mais forte, mudando seu nível a todo momento, cada vez mais alto. Todo o seu corpo parecia pegar fogo, mas o único fogo ainda presente era o das velas que agora levantava quase três metros de altura, sob o poder que as bruxas emanavam juntas.

Um minuto depois, ele não suportou mais e começou a gritar. Era um grito áspero e cortante, aumentando de volume e tomando seu fôlego cada vez mais. Lágrimas quentes saíam de seus olhos e caíam no chão. Naquele momento, cada som, cada movimento presente, parecia intensificar sua dor. Dylan tentava não se mexer, mas era impossível. Ele se contorcia, e quando pensou que não ia desmaiar de novo, a dor aumentou ainda mais. Era humanamente impensável quanta dor ele sentia naquele momento.

Mas então algo diferente aconteceu. Ele continuava ali, sentia a mesma dor, mas era como se sua alma tivesse se afastado de seu corpo porque ele via a si próprio do alto, se contorcer no chão do galpão e gritar a plenos pulmões. Seus olhos revirados nas órbitas.

Uma voz ecoou no fundo de sua mente, dizendo:

“É um feitiço de ligação, Dylan. Ele quer ligar você àquele homem para que você absorva a vulnerabilidade dele. Depois disso, é só uma questão de tempo até que você morra.”

Eu vou me tornar humano? Dylan se perguntou.

“Não” respondeu a voz. “Você vai ficar vulnerável como um, mas só o suficiente para que ele consiga te matar. Ou até aquele homem morrer. A sua vida será ligada à dele.”

E como eu impeço isso de acontecer? Ele soava desesperado agora.

“Você sabe, Dylan, você tem poder para isso.”

Mas...

E ele voltou ao seu corpo e a sensação repentina da dor quase o fez entrar em choque.

As bruxas não paravam de entoar seu feitiço. Pelo jeito, ele não era fácil de ser concluído e elas já pareciam cansadas.

Ele aproveitou aquela oportunidade e o sentiu mais uma vez naquele dia. O mar. Ele só conseguia pensar em uma comparação para aquele poder. Um gigante acordando. Quando Dylan libertou a primeira camada de poder que estava dentro de si algo explodiu. As bruxas pararam de falar, olhando para ele, incrédulas, e caíram, todas de uma vez. Uma parede intransponível de poder irrompeu de Dylan, fazendo com que o homem com asas voasse de sua cadeira e batesse com muita força na parede metalizada atrás de si, fazendo escorrer mais ferrugem para o chão. A dor parou, agora era só a proveniente do acidente de carro, mas ele conseguiu se levantar e cambalear até a porta. Com um esforço, ele conseguiu se libertar das cordas grossas que o amarravam.

A lua ia alta no céu agora. Ele não sabia quanto tempo tinha ficado desacordado depois do acidente, mas isso não o assustou. Apenas continuou correndo.

“Você pode ter escapado agora.” Disse a voz da Fênix em sua mente. “Mas o próximo ataque será em seu colégio e você não conseguirá impedir. Vai ser tarde demais. Corra, lobinho, corra! Enquanto ainda pode. Você mal perde por esperar pelo seu castigo final.”

Dylan o obedeceu. Ele correu o mais rápido que conseguiu com seu corpo daquele jeito. A areia o atrasava um pouco, enquanto seus pés afundavam no chão macio. Ele tinha que conseguir chegar em casa antes que fosse tarde demais. Precisava avisar Alex.

Ele caiu uma, duas vezes, e seus braços cederam quando tentou se levantar na terceira. Então ele ficou ali, deitado, olhando para a lua que agora cortava já mais da metade do céu, não tão grande quanto estava mais cedo quando ele estivera com Nôah.

Então teve uma ideia. Ele sentia seus olhos pesados e seus corpo cansado. Não seria capaz de dar mais um passo. Bloquear aquele feitiço o exauriu além do limite. Era como quando tinha tentado controlar o mar por tempo demais.

Ele discou o número de Alex e colocou o celular no ouvido. Alex atendeu ao quinto toque.

– O que deu erra...? – Alex já começava a perguntar, mas Dylan sabia que não duraria muito mais acordado.

– Me encontre – falou ele, a voz cansada. – Meu GPS está ligado.

E deixou o celular cair na areia assim como seu braço. Ele caiu em uma subconsciência tão profunda que duvidava que qualquer sonho pudesse alcançá-lo ali.


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