O Véu Da Bruxa escrita por Thalita Moraes


Capítulo 9
Funeral de Gente Rica


Notas iniciais do capítulo

Eu demorei um pouco, eu sei.
Eu estava com muito receio de escrever este capítulo, quanto mais postá-lo.
Só para avisar, aqui as coisas ficam um pouco mais pesadas. Eu tentei aliviá-las um pouquinho mais, mas...
É aqui que entra o aviso de incesto.



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1974




Nunca um aniversário foi tão triste.

Aniversários não deveriam ser tristes.

E, infelizmente, para Lacey, todos seus aniversários seriam tristes, por mais que os anos não fossem. Quando chegasse seu aniversário, sempre daria alguma coisa errada, alguma pequena coisinha, alguma coisa, para fazer seu aniversário ser triste.

E, dessa vez, naquele aniversário de dez anos, a tristeza era ver o rosto protetor de sua mãe a ponto de ser enterrado no caixão de vidro.

A família Zanini era pobre e não podiam arcar com um funeral, quanto mais um caixão de vidro. Mas o irmão de Jessica tinha dinheiro o suficiente para fazer o último desejo de sua irmã tornar-se realidade.

—Já que eu não posso viver com dinheiro, — Jessica disse para seu irmão, uma vez, mas as palavras ficaram eternamente gravadas na mente de Christian Andersen. — eu quero morrer bem. Quero um funeral de gente rica.

E ali estava, seu funeral de "gente rica".

Jessica tinha se tornado um pouco mais ignorante do que Christian se lembrava, mas acreditava que era por causa das besteiras que o homem que se dizia ser seu marido fazia. Christian odiava Joshua. Christian o odiava com toda sua energia.

Afinal, de certa forma, tinha sido ele quem matou sua irmãzinha.

Ah, mas o ódio, o ódio!

Fazia Christian querer tomar aquela criança dos cuidados de Joshua antes que fosse tarde demais. No entanto, foi exatamente o que fez. Mas suas ações não foram tomadas pelo ódio, e sim por amor à filha que Jessica criara com tanta devoção, ao contrário daquele palerma.

—Você quer ficar com a Lacey? — Joshua perguntou, surpreso. Sua boca levemente aberta, seu cavanhaque mal feito. Joshua falou tão alto que chamou a atenção de sua filha, que falava com sua tia, naquele dia tão triste.

—Eu acredito que ela será mais bem tratada estando comigo e com minha esposa, Catherine. — Christian disse, o queixo erguido, sua voz neutra. A mesma pose que ele usava todo dia no tribunal, como advogado.

—Vai se fuder, Christian! — Joshua praticamente cuspiu as palavras. Ele sempre as quis dizer nessa ordem. — Eu cuidei dessa criança mais do que a Jessica! Eu sou o pai dela, EU! E eu não vou deixar ela ir para tua casa, onde tu nunca tá em casa para cuidar dela! Duvido que algum juíz que se preste deixará você ficar com a custódia dela!

—Talvez você tenha se esquecido, Joshua. Eu sou um advogado. Se esse caso for parar no tribunal, o que, nesse ritmo, parece ser adequeado, eu tenho certeza de que eu ficarei com a custódia de Lacey. — Christian disse, as palavras ainda em neutralidade, mesmo depois das palavras de baixo calão que ouvira.

—Coloca uma coisa nessa sua cabeça, "advogado" — Ele ironizou a palavra o máximo que pôde — Eu sou o pai dessa criatura e você não irá encostar um dedo nela enquanto eu viver. E, se você chegar perto dela, se você disser um "oi", eu vou quebrar a sua fuça. Vou socar esse seu nariz até você não ter mais nariz para arrebitar.

Dito isso, Joshua deu as costas e, antes mesmo que Lacey pudesse se despedir, puxou-a pelo braço. A pobre menina de dez anos quase foi arrastada, mas ela logo correu para alcançar o pai. Ela acenou tchau para sua tia e tio com a mão livre.

Christian apenas suspirou. Ele imaginou aquilo indo de várias maneiras, mas ele jamais imaginou daquela forma. Não achara que Joshua, por mais violento e antissocial que fosse, fosse querer realmente ficar com Lacey. Sempre achara que ele odiava a guria tanto quanto Christian odiava ele.

A casa onde Lacey cresceu, a casa que Joshua odiava, era uma casa de madeira que não poderia ser considerada pequena. Era grande o suficiente para acomodar duas famílias inteiras.

No primeiro andar, ficava a cozinha, as salas e um quarto. No andar de cima, mais cinco quartos que não eram usados pela família Zanini.

E, para a sorte de Joshua e azar de Lacey, a casa ficava tão distante de alguma coisa, que eles poderiam gritar e espernear e ninguém os ouviria.

Ninguém.

Por isso Joshua não se importou em fazer silêncio quando chegou em sua casa, batendo as portas e xingando o nada.

—Quem ele pensa que é, aquele pedaço de merda! — E chutou uma cadeira. — Ora, essa... Lacey é minha filha e não vou deixar nenhum advogado ficar o que é meu.

Um pequeno defeito que ele tinha adquirido com o tempo era sua possessividade. Seu desejo de possuir tudo. De não querer emprestar, de não querer dar. Depois de perder tudo para as corridas de cavalo, ele se tornou pobre e egoísta.

Lacey ficou quieta em seu canto, ao lado da porta da cozinha, enquanto o observava falar consigo mesmo, chutando tudo o que via pela frente. Ele pegou uma garrafa e encheu um copo e foi até a sala.

Lacey ficou parada, observando o nada, enquanto seu pai se embebedava na sala de sua casa. Ela arrumou as cadeiras de volta ao lugar, silenciosamente, e sentou-se, deixando as lágrimas caírem em cima da mesa de madeira, lembrando-se dos carinhos de sua mãe. Jessica a xingava e gritava com ela de vez em quando, mas sempre foi carinhosa e sempre foi para seu próprio bem.

Sua mãe, embora a pessoa mais boca suja que já conheceu, era a sua melhor amiga. O que seria de Lacey sem ela?

Então, Joshua, com uma voz embargada, chamou-a. Prontamente, Lacey levantou-se, secou as lágrimas e foi até seu pai.

—Sim, papai?

—Vem aqui. — Ele a chamou e bateu em sua perna. Lacey, um pouco assustada, foi até ele e sentou em sua perna esquerda, como pedira. — Lacey, você me ama?

Lacey estranhou a pergunta de seu pai.

—Sim, papai.

—Eu quero ouvir você dizer.

—Eu te amo. — Lacey disse e Joshua abriu um sorriso. Seus olhos, no entanto, continuavam tristes.

—É tão bom poder ouvir isso de alguém. Você sabia que a vadia de sua mãe nunca me disse isso? Bom, nunca mais ouvi ela dizer isso depois de nos mudarmos para cá. — Ele disse, sua voz transtornada, atropelando palavras. Ele cheirava a alcóol.

Um cheiro muito forte que incomodava o nariz sensível de Lacey.

—Mas você, — Ele disse, apontando para o nariz dela. — Você me ama.

E então ele a beijou na bochecha. Uma sombra escureceu seus olhos castanhos. Ele a beijou de novo na bochecha, e mais uma vez, e mais uma vez. A bochecha dela ficou toda babada.

Então, ele resolveu ousar e a beijou na boca.

Ele nunca tinha feito isso com sua filha antes.

—Papai — ela tentou fugir, mas Joshua a segurou firme. As mãos enormes dele, áspera e cheia de calo, apertaram seu pequeno bracinho miúdo.

—Não ouse. — Ele disse com uma raiva tão profunda e tão forte em sua voz, que Lacey ficou com medo. Ficou com medo até mesmo de chorar. — Você é minha.

E ele apertou ainda mais o braço dela, beijando-a ainda mais forte. Agora o gosto de alcóol estava na boca dela e ela sentia vontade de vomitar.

Lágrimas escorreram por seu rosto sem que ela conseguisse evitar.

—Papai, por favor, pare. — Ela pediu.

—Ssh! — Ele a silenciou e continuou. Então, uma mão dele puxou o short da menina.

E ele a tomou aquela noite, mesmo com sua filha gritando e chorando, pedindo para que ele parasse. Ele dormira em cima dela, antes mesmo de terminar, e Lacey não teve coragem de sair, não enquanto seu corpo inteiro doía.

Em algum momento, enquanto chorava, Lacey tinha dormido.

Pois, na manhã seguinte, Lacey amanhecera com marcas roxas em seu rosto e em seu corpo, em sua cama. Não lembrava de ter ido dormir, e nem do que aconteceu depois que seu pai a violentou. Mas, quando foi para a cozinha procurá-lo, ele estava no sofá, na mesma posição de ontem, banhado em seu próprio sangue.

Quando Lacey o virou, ele caiu para fora do sofá, de barriga para cima. Ela gritou mais alto do que na noite anterior e sua garganta ardeu.

O peito dele estava aberto, os ossos e músculos aparecendo, como se tivesse sido comido. A garganta aberta. Os olhos arregalados em pavor e desespero.

Uma pena preta, provavelmente de um corvo, no lugar onde seu coração deveria estar.


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Notas finais do capítulo

Eai? :x