Done For You escrita por Aida


Capítulo 2
Capítulo 1




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O dia que veio a seguir era como todos os outros em minha vida, o escritório era o que me esperava exatamente às oito da manhã todos os dias, exceto fins de semanas. Estar engravatado tão cedo é extremamente sufocante e desconfortável, mas se hoje a empresa não estivesse tão cheia e com pessoas andando para lá e para cá, teria vindo de moletom dos pés a cabeça. Posso ouvir burburinhos e ver pelas portas de vidro jateadas, borrões de pessoas passando com pressa e sem nunca parar.

Suspirei encarando as folhas assinadas do compromisso de hoje, batidas ecoaram pela sala.

–Pode entrar - Respondi deixando a caneta na mesa, pela figura negra e pouco cabeluda que estava prestes a entrar, já sabia que era CC.

Ele estava acompanhado com o senhor da noite anterior, sorri internamente.

–Bom dia - O mais velho balbuciou baixo e tirou o chapéu que jazia em sua cabeça grisalha, se o senhor tentara se vestir de forma melhor para o nosso encontro matinal, havia errado feio, sua blusa branca estava encardida e amassada mesmo estando dobrada na altura dos cotovelos, sua calça tinha remendos, os sapatos gastos e a gravata amarrada de maneira errada.

–Um ótimo dia - Forcei um sorriso amigável - O senhor sabe o porque de estar aqui?

Ele negou com olhos curiosos.

–Hoje é seu dia de sorte. Vou te tirar da miséria que o senhor tanto falou ontem, vamos fazer um acordo - Disse estendendo a folha a sua frente - O senhor irá trabalhar para minha companhia como faxineiro e vigia noturno, você poderá dormir nas instalações do subsolo, ganhará comida e dinheiro. Afinal, era tudo do que reclamava certo? Estamos resolvidos?

O senhor de olhos cor de amêndoa encarou a folha e parecia que via uma luz no fim do túnel, eu estava quase lá.

–E minha filha, senhor? Ela não pode trabalhar, é muito nova e dedicada aos estudos, está no último ano da escola - Ele disse empurrando a folha - Não posso deixá-la.

Franzi o cenho.

–Não irá - Tentei relaxar o rosto e tentar um tom mais amigável - Como eu sou uma pessoa muito caridosa, sua filha poderá se hospedar temporariamente na minha casa.

Vi o rosto de CC ir de um descontraído sério, para total surpresa e indignação.

–Andrew, o que está fazendo?! - Ele protestou alto, me encarando apático.

–Christian - Repreendendo-o com o olhar, fiz sinal para que se cala-se - Não quero que ache que sou algum maníaco, na verdade vai ser tudo extremamente profissional. Como o senhor deve saber, eu sou o dono dessa empresa e tenho uma imagem a zelar, e minha cara vice-presidente e meu fiel companheiro - Indiquei CC - tem uma ideia muito chata de que eu devo ter um companhia, para mostrar que eu tenho algum tipo de sentimento afetivo ou pelo menos fingir isso por algo ou alguém. Sua filha irá comigo em eventos, festas, bailes e reuniões que eu achar que ela deva ir, em troca terá um moradia fixa enquanto o senhor se refaz socialmente. Ela irá para escola nos horários devidos, terá a melhor comida, os melhores aposentos, as melhores roupas e a melhor companhia.

Sorri milimétricamente.

–Sr. Six, porque você faria isso por mim? - O grisalho disse pasmo.

Gargalhei alto, ele realmente estava insinuando o que eu acho que ele estava? Ah, plebeus.

–Não faço isso por você velhaco, e se acha que estou te beneficiando - Reviro os olhos e me debruço na mesa grande de madeira o encarando - Está terrivelmente enganado, eu só quero beneficiar a mim mesmo, só existe eu.

Pude sentir a tensão aderir rapidamente o espaço entre nós, chega de ser bonzinho.

–Se você não irá aceitar, por favor se retire - Eu indiquei a porta e após ajeitei minha gravata - Eu tenho um dia muito atarefado e não tenho tempo para desperdícios.

O senhor pareceu ponderar um pouco, mas logo puxou a folha de volta.

–Não vou desperdiçar essa chance Sr. Six, sei que beneficiará minha filha também - O velho pegou a folha e uma das canetas que estavam disposta na mesa, não parecia muito feliz - Mas preciso que prometa, irá tomar conta da minha filha e protegê-la.

–Você tem a minha palavra - Sorri lhe estendendo a mão e lendo seu sobrenome - Senhor Stayne.

–Eu a trouxe hoje - Ele pigarreou se levantando e amarrotando o chapéu entre mãos, ele tinha os olhos marejados - Não sabia que sua proposta seria assim, vou levar ela para arrumar as suas coisas e me despedir...

–Nada disso - O cortei animado, peguei o contrato analisando a caligrafia desleixada - O contrato que você acabou de assinar inclui a guarda de sua filha temporariamente, num período de 3 à 6 meses. E ela não precisará de nada, mandei providenciar tudo do que uma dama necessita ontem pela noite, inclusive os materiais da escola.

–Mas eu não comentei nada com ela sobre o jogo, ou sobre nada disso - Stayne balbuciou com certo desespero transparecendo - Eu preciso me despedir, e o senhor não me disse se poderei vê-la.

CC me encarava de uma maneira assustadora, como se o que eu estivesse fazendo fosse a pior coisa do mundo, porém, ele não compreendia meu ponto de vista.

–Nós entraremos em contato, pode chamar a dama? - Disse e o mesmo se retirou contrariado.

–Você enlouqueceu?! - Christian explodiu, tentei ignorá-lo pelo bem de seu emprego, mas ele bateu os punhos em minha mesa. Ah, CC.

–Eu não estou precisando dos seus serviços agora Christian, você pode ir - Eu disse me levantando e apanhando minha pasta, pronto para sair.

–Você não pode manipular uma pessoa assim Andrew! É uma criança, não é um brinquedo seu - Christian se colocou a minha frente e percebi o quanto estávamos próximos em questão de altura - Pare com essa loucura, agora.

Inspirei fundo.

–Você vai ligar para a porra da secretária e mandar ela preparar meu carro - Falei com um sorriso debochado e tentando controlar a raiva que estava prestes a me engolir - E sabe mais o que vai fazer? Ficar fora do meu caminho, podemos ser até amigos, mas antes de tudo eu sou seu patrão sendo assim você trabalha pra mim, eu não recebo ordens de ninguém. E foram vocês mesmo que enchiam o meu saco para arranjar uma companhia, agora está feito.

Nos encarávamos em uma luta silenciosa, olhares de desprezo eram tão bem-vindos quanto os de repulsa.

A porta abriu em um rompante e foi quando coloquei meus olhos pela primeira vez naquele pedaço de furacão. Seu cabelo estava oleoso e em um coque, suas roupas consistiam em uma blusa preta que havia sido recortada para se adequar ao seu corpo, um short jeans um tanto quanto podre e um jaqueta militar bem maior que a mesma, sem falar de seus all star que um dia foram brancos.

–O que acha que está fazendo conosco? - Ela disse se colocando entre CC e eu, podia quase apalpar a sua fúria, quero dizer sua minúscula fúria, a mesma deveria bater um pouco abaixo de meus ombros. Um furacão bem pequeno, mas definitivamente não era um tornado.

Tive de abaixar minha cabeça para olhar em seus olhos, os mesmos olhos amendoados que devia ter herdado do pai.

–Você realmente acha que vai me separar do meu pai? - Ela disse em um tom de acusação - Nós não aceitamos esse acordo idiota, prefiro esfolar meus dedos trabalhando do que ser comprada Sr. Six. Suas coisas brilhantes não me impressionam.

Olhei para o Sr. Stayne perto da porta e ele segurava seu chapéu, cabisbaixo.

–O seu pai já aceitou o acordo, inclusive ele te chamou aqui para se despedirem - Pude ver a surpresa dilatar as pupilas e a atingir em cheio, cheguei perto de seu ouvido e sussurrei: sinto muito,você já foi comprada.

O que eu achava que testemunharia a seguir era um ataque de choro com frases ''como você pode?'' e ''papai faça alguma coisa'', mas a menina abaixou sua cabeça e realmente parecia surpresa.

Peguei minha pasta em cima da mesa e sinalizei para CC me esperar lá fora, guardei o contrato entre outros documentos e me posicionei perto da porta, esperando o espetáculo começar.

A filha de Stayne tinha os punhos cerrados e o rosto voltado para a parede, mas logo fez questão de se virar e mostrar que não havia derramado uma lágrima sequer, na verdade podia ver certo olhar determinado em seus caramelos, digo, olhos. Ela se jogou nos braços do pai e arfou, como se lhe faltasse ar, ou como se a falta que o velho faria seria demais para a jovem aguentar, patético.

–Sei que está fazendo isso por nós, pai - Ela disse tentando esboçar um sorriso, sem muito sucesso continuou - Só lembre-se de que somos humanos, não mercadorias, você não pode vender seus ideais.

–Vou te ver assim que puder, Moe - Stayne se desfez do abraço e acariciou sua bochecha - Você vai ter orgulho do seu velho aqui.

Tocante, não, patético.

–Podemos ir? - Fiz sinal para a porta que já estava escancarada. Com um adeus silencioso, eu e a filha de Stayne deixamos meu escritório seguindo para o elevador, enquanto eu fazia quase um monólogo sobre como ela deveria se portar quando estava comigo, contendo tópicos entre eventos à shows beneficentes, a filha de Stayne ficara calada o tempo todo. Desde o vigésimo terceiro andar, ela não concordava ou descordava, só me olhava de soslaio vez ou outra. Irritantemente quieta.

Perto das portas giratórias transparentes, das quais já podia ver o Maybach Landaulet cor creme do lado de fora, apenas nos aguardando.

Quando estava prestes a abrir a porta para a senhorita, me atrevi a falar sobre seu atual estado silencioso.

–Eu já sei que você não é muda e até onde eu sei não te proibi de falar - Segurei a porta do carro e esperando a mesma entrar - Então o que te impede de estabelecer uma conversa normal, não tem um vocabulário vasto o suficiente? Pois se for isso, não precisa se envergonhar. Estou acostumado.

Os olhos da filha de Stayne pareciam ter me atravessado naquele momento, o jeito que ela me olhava eram como se tivesse decifrado meu comentário (talvez um pouco rude) em segundos, olhos de desgosto e o mais surpreendentes, severamente magoados.

–Você já conseguiu o que queria Sr. Six - Ela disse entrando e puxando a porta da minha mão - Por que ainda precisa me machucar desse jeito?

Talvez se houvesse algum buraco onde a filha do senhor Stayne pudesse se enfiar, ela definitivamente se enfiaria. Procurava olhar para os lados, para o teto e até para as próprias mãos, tudo apenas para não ter que me olhar no resto daquela viajem até sua futura casa.

O desconforto da filha de Stayne me fez ficar apreensivo, realmente teria eu sido tão rude? Não era a minha intenção, apenas deixei o meu jeito de me dirigir a pessoas que não estavam no meu nível falar mais alto.

Mal eu sabia que minha primeira discordância com o pedaço de furacão, estaria terrivelmente próximo.

* * *

A casa que eu escolhera viver desde os meus onze anos era denominada ''Casa de Primavera'', ou seja, era uma simples casa com 13 quartos e 9 banheiros, um lago próprio e um jardim aberto para alguma floresta (das muitas) de Ohio. O que eu mais gostava em minha casa - além do aconchego - seria definitivamente a sensação de lar que ela me trazia. Memórias de meu pai ainda eram muito vivas e presentes ali, a privacidade fornecida por ser localizada a 6 quilômetros do centro, ainda era impressionante.

Uma vez que passamos pelos portões da frente, os que davam para a entrada da propriedade, pude ver pela primeira vez um sentimento bom estampado no rosto daquele pedaço de furacão. Parecia maravilhada vendo as folhas de nossas árvores em tons avermelhados e alaranjados trazidos pelo outono, em um outubro que parecia estar guardando seu frio todo para os meses de inverno, o jardim estava realmente incrível.

–Gostou do jardim? - Perguntei, mas logo que a mesma ouviu minha voz, voltou a se encostar no banco e ao seu estado apática.

Desci do carro encarando a fachada como o pedaço de furacão mudo, ela corria os olhos desde as escadas de granito até as portas duplas de madeira clara na entrada mais acima. Deveria ser algo novo, algo melhor para os olhos do que o que ela já vira em outras ocasiões.

Subimos as escadas e adentramos a espaçosa casa de Andrew Dennis Biersack, o dono da companhia de produções musicais Six. O herdeiro de um gênio, o legado que me foi passado e assumido da melhor maneira que consegui.

–Andy? - Ouvi a senhora Maddie chamar da cozinha.

–Estamos na entrada Maddie - Falei alto o suficiente para que a vovó pudesse nos escutar e trazer seus 1 metro e 50 até a entrada, o cheiro da comida estava de sequestrar o estômago.

Vovó Maddie morava conosco desde que eu fora obrigado a me mudar, mesmo ela não sendo minha avó de sangue eu não tinha o que dizer de Maddie, ela era responsável por deixar a casa sempre em ordem, ela também era a cozinheira mesmo eu querendo que ela não faça tantas coisas. Ela tem mais de 70 anos, mas ainda me puxa a orelha (tendo praticamente que subir em uma das cadeiras) sobre o termo ''velha''. Uma senhora impecável.

–Andy, que jovem bonita - Ela disse estreitando os olhos e tomando a mão da filha do senhor Stayne e dando tapinhas amigos - Finalmente esse resmungão arranjou uma namorada! Era tudo o que ele precisava.

Não me lembro da última vez que corei, mas no momento, sentia minhas bochechas fervendo.

–Maddie! Ela não é minha namorada, é uma hóspede - Eu disse entregando a minha maleta para um dos empregados que se ofereciam para guardar meu paletó - E depois irei passar as regras que envolvem a mesma.

Vovó parecia ter se interessado por aquele pedaço de furacão, realmente muito interessada a ponto de acabar por ser ignorado.

–Sou Bela Marie Jones - A filha de Stayne pronunciou de forma tímida, mas alta o suficiente pra me fazer prestar atenção. Bela.

Vovó começou a tagarelar sobre a propriedade e como Bela iria gostar de passar um tempo aqui, levou ela pela escada principal até a suíte que havia dito para ser preparada no dia anterior. Suspirei, queria desesperadamente um cigarro.

–Ainda tem tempo de desistir dessa ideia maluca, Andy - Ouvi a voz de CC, mas preferi levantar o meu dedo médio e seguir pela escada para meu quarto.

Meu quarto era o maior da casa e consequentemente o último do corredor branco e extenso onde se localizavam os 6 quartos principais, as paredes eram azuis escuras, minha cama havia sido feita sob encomenda com direito à travesseiros de penas de ganso e lençóis egípcios, meu armário era embutido na parede e de madeira escura perto da grande lareira de mármore branco e do meu piano.

Sim, o piano que pertencera ao meu pai. Afrouxei minha gravata e sentei no banco junto aquele instrumento magnífico, passei os dedos pelas teclas, mas não forte o bastante para que emitissem algum som.

Na escrivaninha perto da cama, podia ouvir o interfone tocar e a voz robótica anunciar que o brunch estava pronto.

Tomei uma ducha rápida e desci até a sala de jantar, onde a mesa já estava posta e com muitas refeições distintas, porém leves e saudáveis. Após sentar na cadeira e me servir pude notar uma figura tímida perto da entrada, totalmente diferente da pessoa de mais cedo.

Ela estava com os cabelos soltos e ainda um pouco húmidos, caíam como um riacho refletindo o entardecer, vestira uma calça de moletom e uma blusa de manga qualquer e chinelos.

–Pode se sentar - Eu disse deixando de comer e indicando onde ela devia se sentar, ao meu lado.

Bela veio em passos lentos sem me olhar nos olhos, sentou e encarou a mesa, porém, nada parecia chamar sua atenção ali.

–A partir de agora, você vai fazer todas as refeições na minha presença - Disse colocando o guardanapo de linho sobre o colo - Amanhã nós teremos nosso primeiro evento, pode falar com Maddie sobre roupas e acessórios do que você quiser e ela irá providenciá-los, ok?

–Não se compra amor Andy - Ela disse se servindo, fiquei estático por alguns momentos - Pode fazer o que quiser comigo, mas você nunca vai evoluir desse jeito.

Me levantei jogando a cadeira para trás, carreguei tudo o que estava na mesa para o chão. Bela se assustou o suficiente para que suas órbes caramelos se arregalassem e que ela cravasse suas unhas no estofado da cadeira.

–Chega! - Esbravejei, odiava pessoas que descartavam minhas boas maneiras - Eu geralmente não sou tão bonzinho como estou sendo agora, não irei levar foras de uma garota petulante como você! Então, se eu fosse você aproveitaria pois, a partir do momento que eu cansar de suas birras, você será só mais um dos meus objetos. E eu não costumo tratar meus objetos com boas maneiras.

Peguei seu braço e a fiz levantar da cadeira e me encarar, sua testa estava franzida e seus olhos desesperados. Talvez eu realmente estivesse apertando seu braço muito forte, mas estava perto o suficiente para sentir o perfume que a menina exalara e era realmente inebriante, o suficiente para eu afrouxar o aperto.

–Realmente acha que eu vou ser submissa? - Ela riu debochada, como era irritante a filha de Stayne - Você não me conhece Andy, ainda não. Eu não vou ser mais um dos seus brinquedos, escreva o que eu digo.

Ela fez questão de me empurrar e deixar a sala, mas minha vontade era traze-la de volta por aqueles cabelos que estavam cheirando a flores.


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