Os Cinco Filhos da Aflição : Nerlinir nas 8 Terras escrita por Raffs


Capítulo 14
Capítulo 14


Notas iniciais do capítulo

Boa notícia, gente(esqueci de falar no capítulo anterior)! Agora meu computador voltou a funcionar(comprei um HD novo) e já estou no final do ano letivo, então espero conseguir uma sequência de capítulos(sei que da última vez que disse isso fiquei quase 2 meses sem postar, mas agora é sério :v ). Preparem-se para o que vem por aí e comentem se gostaram ou não do capítulo e tal



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– Por que continua conosco, Lonpak?

– Tenho meus motivos; infelizmente, não posso revelá-los.

Não adiantava muito insistir na questão.

Três dias haviam se passado desde o retorno de Frislee Yvisput ao acampamento, e não muito fiquei sabendo sobre ele desde então. O acampamento mudara de lugar, e agora armara suas tendas numa clareira, mais próxima do litoral. A comitiva que escoltava os westesi Mljet e Hvar ainda não havia voltado, o que gerou uma certa tensão entre os plebeus de Vahlam.

Mas eles tinham outros motivos para ficarem preocupados.

Segundo o que alguns escravos libertos(principalmente Tayder Aj'lum) haviam me dito, o Daggar Ysolves vinha vingar a morte de uma de suas princesas-fadas, com o nome de Nuala. Além disso, eu tinha certeza de ter ouvido o nome Primrule, que não me trazia boas lembranças, e ao que parecia, ele vinha matar o Príncipe Vahlam.

– O que o traz aqui? – perguntou um dos guardas na entrada da grande tenda cinza, agora fechada. Era o neto de Quaentin Fernimo, Heldad.

– Gostaria de falar com Sua Alteza. – respondi. Lonpak me acompanhava.

– Não sei o que o faz pensar que pode falar com Sua Alteza quando bem entender, mas dou um conselho dos bons: você não pode. – disse rispidamente Nulos Zeter, o jovem de cabelos negros que me salvara dos tyaguares. – Principalmente agora. Ele está tendo uma conversação com Yvisput e Fernimo.

– Fernimo? Por que ele? – questionou Lonpak, claramente incomodado com a falta de modos de Zeter.

– Sendo um veterano, ele é o quarto no comando; na ausência de Taasun e Gælius, meu avô ajuda Sua Alteza Vahlam a tomar decisões estratégicas.

– E que tipo de decisões eles poderiam estar tomando nesse momento?

– Acredito que… acredito que isso não é negócio para um forasteiro que juntou-se a nós a quatro dias. – Nulos nos olhou, como que analisando aqueles dois viajantes suspeitos que subitamente estavam querendo saber de tudo sobre uma guerra que não era de seu interesse – Agora é melhor saírem daqui. Afinal, desejam falar com Sua Alteza, e ele está ocupado.

E foi o que fizemos. Não por acatarmos a ordens de um jovem franzino e sem experiência de guerra, mas por não temos como sequer chegar perto do príncipe Markreej. Porém, antes de sair, não pude deixar de ouvir algumas frases em tom enervado, vindas de Quaentin.

– Isso tudo é culpa daquele desgraçado do Kax! Bem que poderíamos ter contratado um mercenário com menos má fama.

– O valor de um mercenário é definido pela sua má fama. – respondeu secamente Vahlam.

Ele tinha toda a razão.

Caminhei até alguns soldados que sequer falavam a mesma língua que eu, mas entenderam que eu queria uma boa bebida. Discutiam de maneira acalorada sobre algo que nem tentei entender.

Apesar da tensão, o dia estava agradável. Caí no sono observando as frondosas árvores que se estendiam até a faixa de areia da praia, centenas de metros abaixo do acampamento. A brisa do mar, embora distante, ainda chegava ali e soprava em meu rosto.

E acordei com um chute no rosto.

– Sua Alteza mandou buscar você – falou calmamente Nulos, oferecendo-me uma espada com lâmina encurvada, provavelmente feita em Arkhang – Temos uma batalha para ganhar.

Pensei em perguntar pelo Machado do Amanhecer, mas desisti da ideia quando o vi nas mãos de Vahlam.

– Espero que não se importe se eu praticar um pouco com isto aqui. Não se preocupe, estou apenas pegando emprestado – disse, provavelmente sabendo do valor sentimental que aquela arma tinha para mim – Se voltar vivo de Haulair, eu devolvo seu querido machado.

Eu não estava entendendo absolutamente nada, mas estava cansado de apenas fazer perguntas, por isso me limitei a umas poucas e corajosas, embora estúpidas, palavras.

– Considere como dever cumprido – Corremos como se não houvesse amanhã até os cavalos, e rapidamente montamos neles. Em pouco tempo já estávamos a caminho de Haulair, um lugar que eu sequer sabia do que se tratava.

Só na metade do caminho me dei conta que sequer estava de armadura. Apenas uma placa de peito e nada mais, tamanha a pressa com que fui cumprir a missão subitamente incumbida a mim. Deuses, eu realmente não participava de uma grande batalha há tempos.

– Você não faz ideia do que está fazendo, não é? – disse Heldad Fernimo, um jovem um pouco mais velho que o Zeter, de cabelos desgrenhados castanhos e olhos vermelhos. Tinha uma cicatriz na bochecha, como que as garras de um animal – Quero dizer, nos seguindo por ordem de um homem que você mal conhece, mas que parece saber de tudo sobre você, talvez mais do que você mesmo.

– Tenho a impressão de que foi assim que Vahlam conquistou a fidelidade de todos vocês.

Ele olhou para Nulos.

– Na verdade, não.

De fato. Julgando que seu sobrenome era Zeter, o mesmo que fora dito de Maryanne, a prometida de Markreej, Nulos devia estar ali para proteger sua…irmã(?), e não por ser fiel a Vahlam. Ou era o inverso?

Fiquei olhando para o jovem, esperando uma resposta.

– O que está olhando? Eu não tenho motivos para lhe contar nada.

Ele estava mesmo determinado a me odiar.

– Nem se preocupa, ele só tá num mau dia. Amanhã ele vai estar fazendo piadinhas contigo, você vai ver. – disse Heldad com um sorriso que distorceu a sua cicatriz. O sorriso dele era um pouco grotesco – Voltando ao assunto, você imagina o que estamos prestes a fazer?

– Não. Eu deveria imaginar?

– Faria bem. Se quer saber, estamos indo salvar uma cidade de piratas que atracaram por aqui faz alguns dias.

Quando eu achava que estava livre de piratas…

– E por que motivo eu vim com vocês?

– Doze dos nossos melhores homens estão sabe-se lá onde, então precisamos de toda a ajuda possível. Se não notou, aqueles seus dois amigos, o elfo e o espadachim bêbado, também estão aqui.

Era verdade.

Gustaf havia mudado nos últimos três dias. Cortara seu cabelo, que agora estava semelhante ao da maioria dos soldados. Estava sempre com uma garrafa de bebida na mão, mas ao contrário do que Heldad dissera, estava sóbrio, como sempre. Aquele homem era páreo duro em brigas de bar, pois geralmente era o único que não estava bêbado. Seu metabolismo era extremamente alto.

– Estamos chegando.

Quando me virei para a frente, vi uma cidade mergulhada no caos. Casas e edifícios de pedra sendo engolidos por labaredas que dançavam entre as ruas da pequena cidade, quase que um vilarejo. Pessoas corriam sem saber para onde. Era fácil distinguir os piratas dos civis: os criminosos estavam ateando fogo na cidade enquanto gritavam gargalhadas, e os cidadãos estavam fugindo enquanto gritavam desesperadamente.

– Boa sorte. Fique com o lado esquerdo e tente não atingir civis; o governador dessa cidade é nosso aliado se os mantermos a salvo. – exclamou Heldad enquanto cavalgava em direção ao perigo. Logo seu corcel foi cercado por seis homens de aparência rústica, com vestimentas e armas grosseiras.

Surpreendentemente, aquilo não pareceu um problema para Fernimo. Ele usou uma grande e pesada espada de duas mãos(provavelmente uma claymore) com apenas uma para cortar a cabeça dos piratas num piscar de olhos.

Nulos não ficava para trás. Ao contrário do colega, ele avançou após descer do cavalo e se utilizando de um sabre com lâmina e cabo negros(e detalhes em escarlate) iniciou um verdadeiro massacre.

Tentei não pensar muito e usando a cimitarra que me foi dada(creio que o exército usava armas saqueadas, pois havia uma grande variedade de espadas e machados com meus “colegas”) ataquei alguns piratas.

Não foi difícil derrotá-los. Mas eles eram muitos, cerca de três centenas, e nós éramos quinze.

Corri até um beco, de onde ouvi um grito de socorro em meio ao fogo e à fumaça. Uma pequena garotinha estava lá.

– Você vai ficar bem! Apenas não se mexa! – tentei avisá-la, mas ela correu em minha direção, tropeçando num dos escombros. Mais pedras caíram de cima, no caminho até a garota. – Eu mereço.

A solução era retirar as pedras o mais rápido possível, mas elas eram pesadas demais. Para a minha sorte, um soldado notou a situação e me ajudou a retirar a criança dali. Pedi, com gestos, para que ele a levasse até os limites da cidade, para junto de algum adulto.

– Gajen baluf kae! – respondeu, e eu concordei com a cabeça para evitar qualquer mal-entendido. O idioma sextante é ainda mais complicado que o telmarino.

Saí do beco e fui em direção ao que antes deveria ter sido a praça da cidade, onde estava concentrada a maioria dos inimigos. Com Heldad distante e os outros soldados imobilizados, Nulos lutava sozinho contra os piratas.

– Ora, se não é o irmão da princesinha! Como vai ela? Ainda abrindo as pernas? – gritou um pirata com um gancho no lugar da mão direita. Eles deviam visitar as Oito Terras regularmente, para já ter conhecimento da prometida de Vahlam.

Zeter não pareceu muito disposto a responder. Não com palavras. Talvez com a lâmina da sua espada.

– Fale essas palavras de novo e eu juro que lhe deixarei para os tyaguares. – disse, cerrando os dentes e os punhos.

– É mesmo? Então por que não prova que é capaz disso? – os outros homens gargalharam profundamente, e o tom de voz do Capitão Gancho estava irritando até a mim. – Repito: não existe homem nessas terras que não conheça os segredos entre as pernas da Zeter! – ele riu ainda mais – A não ser, é claro, pelo superprotetor irmão dela.

Nulos partiu para cima do corsário, abrindo caminho com sua espada através dos marujos. A cada passo que dava, sua feição era mais assustadora, e sua pele começava a ficar negra. Mas não negra como a cor dos nativos da Ilha Marfim.

Negra como um céu sem estrelas, como o vazio completo, escura como a morte.

Seus olhos brilhavam em escarlate.

Ele avançou com tudo até o agora aterrorizado capitão, e sua presença trazia a morte consigo. E fúria. Muita fúria. Era como se todos os sentimentos ruins de todos ali estivessem concentrados nele, em forma de poder.

– Não vai dizer nada agora, seu filho de uma... – Nulos parou de falar quando uma barreira mágica ficou entre ele e o pirata.

Um homem de porte atlético, vestindo uma túnica roxa por cima da armadura de bronze, apontava as mãos para Nulos.

– Liberte-me agora mesmo, Ambar! – exclamou furiosamente o jovem agora transfigurado em uma besta negra.

– Não vejo nenhum bom motivo para fazer isso. Agora, volte ao normal.

– Eu disse para me…

– Soltar. Eu entendi – disse o misterioso mago, que logo depois estalou os dedos. Imediatamente todos os piratas restantes caíram mortos, à exceção do capitão. – Se eu fosse você, correria para o mais longe possível daqui. Que tal seguir este conselho? – o capitão não pensou duas vezes e fez o que lhe foi ordenado, ainda rindo(talvez da sua sorte em ter sobrevivido àquilo). – Alguém pare os incêndios.

– Quem é aquele? – perguntou discretamente Lonpak, depois de ter atirado uma flecha no coração do Capitão Gancho, que agora tentava inutilmente escapar de seu destino com a flecha em mãos.

– Eremurus Ambar, o governador regente de Haulair. Ele possui um acordo com Sua Alteza para apoiá-lo na guerra. Isto é, ele odeia batalhas, então não participará diretamente, mas é uma aliança e tanto. – respondeu Heldad, ainda sussurrando – E pelo que vocês acabam de ver, acho que não preciso explicar o motivo.

– Por acaso a guerra está lhe tirando os miolos? – questionou o dito cujo para Nulos, agora um pouco mais calmo e também mais humano – Todos sabemos da sua história, Nulos. Sabemos pelo que você passou e pelo que está passando agora, mas isso não é motivo para pôr em risco milhares de vidas inocentes. Por Jorugan, você poderia ter matado seus companheiros!

Nulos olhou para nós com um certo desprezo.

– Nada é mais importante para mim do que o nome da minha família. – o crepitar das chamas ao seu redor deu um tom ainda mais tenebroso à frase.

– Pois bem. Então por que segue ao jovem Markreej?

– Por que ele é o caminho mais fácil para chegar até minha irmã. E sei que ele irá protegê-la.

– Graças aos deuses Wrland não está aqui para ouvir isso. – comentou Heldad.

Eremurus, o regente de Haulair, analisou a cena por mais alguns segundos. Em seguida, assentiu com a cabeça, dando um suspiro.

– Que seja, Zeter. Só pense antes de agir. Não são palavras de terceiros que mancharão a honra de sua irmã, sua família ou seja lá o que for que você insiste tanto em proteger de maneira abstrata. – dito isso, Ambar o libertou da barreira com outro estalar de dedos. Em seguida, apontou seu cajado de carvalho para os soldados e civis, que rapidamente se curaram de qualquer ferimento. Aquele encantamento causou uma sensação de alívio enorme em meu corpo, como se toda a tensão em meus músculos e ossos de repente sumisse. – Vocês podem ir depois de apagarem o fogo. Podem pegar mantimentos, se sobrou algum nesse desastre. – ele falava com tamanha autoridade que imediatamente todos fizeram o que foi ordenado. Baldes de água iam e vinham de um lado para o outro o tempo todo.

Não foi tão trabalhoso apagar o incêndio, mesmo que eu sequer entendesse o que os cidadãos de Haulair me falavam. Em cerca de duas horas, o trabalho estava feito.

Quando partimos, Nulos, que antes estava no centro da cavalaria, ficou afastado do resto do grupo, e era possível ver que ele estava caindo aos prantos. Evitei tocar no assunto, mas após uma hora cavalgando em silêncio, não resisti e perguntei:

– Qual é a grande história por trás de Nulos?

Heldad olhou-me, e depois se virou para o cavaleiro de cabelos negros.

– Achei que tivesse percebido que era melhor não falar disso.

– E de fato percebi. Mas esse mistério vem me atormentando desde o início da viagem. Existe algum segredo realmente tão absurdo assim que eu não possa saber?

– Não é um grande segredo, é apenas uma história triste. O problema é que ninguém confia em você e seus amigos. – ele olhou de maneira suspeita para Lonpak e Gustaf, que riam de alguma coisa atrás de nós.

– Acabo de lutar ao lado de vocês sem motivo para isso. Existe prova maior de confiança?

– Você tem um motivo. O machado vermelho.

Heldad estava certo. Mas eu não podia desistir tão fácil naquela argumentação.

– Certo. Mas acho que não existe prova maior do que ter passado três dias a mercê de um grupo de guerreiros que não se conhece, convivendo com a desconfiança de todos, e mesmo assim lutar junto com eles.

Ele calou-se por um momento.

– Você ganhou. Quer a versão curta e prática ou a versão longa e emocionante da história?

Olhei para a nossa frente. Mais alguns minutos e chegaríamos no acampamento. Optei pela praticidade.

– A curta, por favor.

– Tudo bem. Como começar numa história tão cheia de detalhes e melancolia? – ele fechou os olhos e levou a mão ao queixo – Já sei! Começarei pelo momento em que toda a família dele foi assassinada por saqueadores.

– Ótimo ponto de partida.

Ele riu.

– Nulos é o filho mais novo dos Zeter, uma família rica até anos atrás, detentora de muitas terras. Mas depois que seus pais e irmãos foram mortos, ele fugiu com sua irmã. Os dois foram dados como mortos, assim perdendo suas posses. Mas eles foram encontrados por Eremurus e Viktor Ambar, dois magos irmãos que cuidaram deles até a adolescência. Quando Viktor morreu em batalha para criminosos contratados por Elthan Markreej, tio de Vahlam, ele desenvolveu um certo ódio pela família de Sua Alteza. – ele parou para ouvir o chiado da água batendo nas árvores.

Começara a chover.

– Posso continuar?

– Com toda a certeza.

– Está bem. Onde eu estava?

– Nulos odeia os Markreej. Viktor morre.

– Ah, certo. Continuando, – ele falava mais alto para não ser silenciado pela forte chuva que caía – os anos se passaram, e ele mostrou ao mundo que está vivo, em carne e osso. O rei, pai de Sua Alteza, resolve o devolver todas as suas terras, mas para sua surpresa, elas foram tomadas por nativos e pelos servos de Elthan. A partir desse momento, ele passa a odiar não aos Markreej, mas especificamente a Elthan. Após isso, ele consegue uma ou outra parte dos seus antigos domínios e passa a viver na nobreza, coisa a que não estava acostumado. Com seus constantes encontros com os nobres do reino, Maryanne, sua irmã, acabou desenvolvendo um romance com o príncipe Vahlam, que logo pediu a mão dela, e oferece em troca vastos territórios a Nulos, que obviamente não foi feito para ser um lorde. Cansado de tanta pressão, ele abdicou do posto de dono daquelas terras e pediu a Vahlam para se tornar um de seus cavaleiros, para que ele continuasse próximo a Maryanne, a única pessoa que lhe dava alguma ideia do que era família. Porém, quando Vahlam se rebelou contra seu tio após a morte do rei, ele teve que fugir de Meltumbr, junto com todos os seus guerreiros mais valorosos. Maryanne, porém, ficou presa na cidade. Quando Elthan descobriu, deixou-a em cativeiro.

Fernimo finalmente parou de falar.

– Então essa é a versão curta?

– Nem queira saber o quanto eu falaria se resolvesse entrar em detalhes.

– Não quero. – parei para pensar – Pensando bem, isso não explica o porquê desse súbito mau humor dele. Ou ele é sempre assim e eu não notei?

– Fez bem em prestar atenção nisso. Cerca de uma vez a cada dois meses, enviamos um espião para invadir em segredo Meltumbr e saber o que se passa por lá. O príncipe conhece muitos atalhos e esconderijos naquela cidade. A pedido do próprio Nulos e com o apoio de Vahlam, esse espia sempre consegue contatar Maryanne, que escreve duas cartas: uma para seu “amado Vahlam” e outra para o “querido irmão Nulos”. Acontece que o último espião que mandamos foi Frislee, e ele chegou com as cartas. Nulos sempre fica sentimental e de pavio curto quando se lembra da irmã, afinal essas cartas são seu único meio de contato com ela. Mas não se preocupa, daqui alguns dias ele volta ao… – Heldad viu as tendas à frente – Opa, chegamos. Fica pra depois o resto da história sobre a vida alheia… Qual o seu nome mesmo?

– Me chame de Nerlinir. – caso eu fosse questionado sobre isso dois meses antes, criaria um nome falso suficientemente convincente, mas por algum motivo aquele jovem cavaleiro transpirava confiança, então contei-lhe o meu “verdadeiro” nome.

– Certo, Nerlinir. Até logo.

Quando chegamos já foi possível perceber a tensão no ar. Uma discussão se desenrolava, e a julgar pelas vozes, era entre Frislee Yvisput e Auberon Kax, o mercenário das facas.

– Se você tivesse chegado cinco minutos mais cedo, não estaríamos com sete cavaleiros a menos, seu desgraçado!

– E como eu iria imaginar que vocês encontraram forasteiros e resolveram escoltá-los? São eles crianças por acaso, para que tenhamos que apontar para onde devem ir?

Quando virei na grande tenda cinza, Kax segurava Frislee pela gola da sua camisa, embora ele estivesse de armadura e espada na mão. Vahlam apenas observava, silenciosamente.

Frislee virou em nossa direção, aparentemente fazendo algum cálculo.

– Olha só, temos quinze guerreiros de volta da outra missão! E adivinhe, nós mandamos quinze também! Tem certeza que suas baixas foram minha culpa? Pois para mim parece incompetência dos seus pobres soldados mortos.

Kax soltou Yvisput, e apenas grunhiu.

– O que houve? Está sem resposta? Se temos um culpado por quase todas as nossas baixas ultimamente, este seria você! Ao menos, não fui eu que resolvi meter o nariz nos negócios de um daggar e raptar uma de suas princesas!

Elrigh, ao lado de Vahlam, fez cara feia para Frislee, que sequer notou. Afinal, a tal princesa-fada da história era Nuala, que aparentemente tinha algum tipo de relação com Taasun.

– Não ouse mudar de assunto! Sabe bem do que eu falo, do que Wrland e Taasun falam, do que os DOIS outros soldados sobreviventes falam! Primrule foi quem nos atacou, e dessa vez ele não mandou um de seus vampiros afeminados para nos assustar com ameaças. Ele apareceu em pessoa, e disse que vinha atrás de todos nós!

– Espere, Demite apareceu em pessoa? – perguntou Vahlam, com uma expressão de surpresa.

– Exato. Por acaso para o seu mensageiro ele mandou mensagens via corvo?

– Você não entende. Primrule não aparece em pessoa desde que meu pai o exilou. Após ser banido, ele passou a se esconder nas sombras. Tem certeza que era realmente ele?

– Se não era, avise-o de que ele possui um doppelganger à solta. Nunca vi ninguém tão parecido com o próprio – respondeu Elrigh, calmamente. Mas estava claro que ele suava frio só de lembrar da imagem de Demite Primrule.

– Eu conheço este homem. Ou o conheci, quando ele ainda era humano. – falei. Deveria ser discretamente, mas por algum motivo todos prestaram atenção quando eu abri a boca.

Vahlam sorriu nervosamente.

– Olá, Nerlinir. – era possível que ele tivesse me ouvido falar com Heldad anteriormente? – Acredito que cumpriu bem seu trabalho na missão em que o enviei. Como prometido, tome seu Machado de volta. – jogou-me o Machado do Amanhecer e em seguida, virou-se para Gustaf – E você, tome sua espada amaldiçoada. Não a daria nem para o meu pior inimigo, mas parece ser importante para você. – lançou a velha espada Aesyris na direção de Gustaf – Continuando com nossa conversa, Nerlinir, acredito ter ouvido que você conhece Demite Primrule. Se isto é verdade, gostaria que contasse-me tudo que sabe sobre ele.

Todos olhavam para mim. Até mesmo Frislee e Auberon haviam parado de discutir apenas para me ouvir.

Mas o olhar que mais me deixou nervoso foi o de Nulos. Seus olhos estavam vermelhos, não por causa de nenhuma transformação maligna ou algo do tipo, e sim por causa do seu incessante choro, que parara apenas alguns minutos antes. Ele tinha um pedaço de papel com escrita feminina em mãos.

Lonpak, Heldad, Quaentin, Tayder, até mesmo os escravos que nem entendiam minhas palavras. Todos me observavam, prontos para ouvir tudo que eu tinha a dizer.

Assenti.

–Está bem.


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Notas finais do capítulo

(existem algumas coisas que não parecem fazer sentido no capítulo, que geralmente eu explico em capítulos posteriores, mas tem algo que eu preciso dizer pra vocês não se confundirem aqui mesmo nas notas:

"Os cinco soldados sobreviventes que escoltavam Mljet e Hvar conseguiram achar o acampamento como, se ele mudou de lugar depois que eles partiram?"

Calma, caro leitor. É mais do que óbvio que Vahlam não cometeria o erro de abandonar seus subordinados e deixá-los perdidos no meio da floresta, por isso ele deixou alguns servos-guias no lugar onde antes estava o acampamento, e uma trilha até a nova localização da comitiva.

Espero que tenham entendido agora, caso tenha batido essa dúvida :D )



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