Luzes. É o que vejo esta noite. Umas mais brilhantes que outras. Ofuscam-me a vista tornando tudo à minha volta meras sombras. Sombras agrupadas, que se mexem em várias direções e que por fim desaparecem para sempre. Como se nunca tivessem existido, como se nunca tivessem tido uma relação comigo, como se nunca me tivessem visto de algum lado, agindo como se o que foi vivido tivesse realmente sido apenas um sonho, no meio de tantos outros bem melhores do que aqueles em que apareci. Como se aquelas sombras já não fossem realmente as sombras que conheci, as sombras com que brinquei, as sombras que me levantaram e que foram levantadas por mim. Como se eu própria fosse uma sombra e tivesse sido soprada como quem sopra para arrefecer a sopa. E esta é a visão, sombras e mais sombras, andando rapidamente e desaparecendo de vista, sem que as possa alcançar. Antes de as conseguir tocar, seguir, falar ou tentar respirar o mesmo ar que elas. Não há tempo para nada disso. Porém, neste momento, a visão principal são aquelas luzes. Aquelas que olham para mim e que me chamam querendo puxar não sei para onde. Têm cores tão brilhantes, chamativas. E olho para elas. E vejo-as deslocar-se de um lado para o outro. De cima para baixo. Formando formas que não fazem sentido para a minha cabeça neste momento. Formas que não consigo decifrar. Não sei se são códigos-chave, ou se relacionam com as sombras que julgo ainda ver à minha volta. Aquelas que passam por mim e não me vêm. Não têm tempo. Aquelas luzes são estranhas, não as consigo descrever melhor do que aquilo que a minha própria visão me transmite. Mas eu gosto delas, lembram-me bons momentos. Relaxam-me e exaltam-me ao mesmo tempo. É uma sensação estranha, mas é impossível deslocar o olhar delas. São como ratoeiras que me prendem, mas não magoam. Já mais me iriam magoar, assim como eu a elas.