Espere por Mim escrita por Laurent


Capítulo 1
Capítulo Único




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Os olhos dele, aqueles olhos castanhos e tristes, me vêm à mente todos os dias. Os anos vêm e vão e eu não me esqueço daquele olhar, do brilho que o contaminava, um brilho que já dizia muita coisa por si só e que me causa calafrios até hoje.

Eu podia tê-lo ajudado. Eu devia tê-lo ajudado. Mas não o fiz.

Nós morávamos em uma casa pequena demais para três pessoas, que ficava em algum lugar de São Paulo, perto de uma favela localizada nas imediações. Gabriel e eu vivíamos junto com a nossa mãe naquela época, e, sinceramente, eu não sabia dizer se a nossa casa fazia parte da favela ou não. Só sei que, todos os dias, quando nós saíamos para ir à escola, a paisagem era a mesma: barracos por todo lado, gente nos olhando. Era assim mesmo.

— Nunca encare um desses homens nos olhos — dizia eu para o meu irmão, quando nós passávamos em frente a uma roda de rapazes suspeitos. — Eles não são boa gente.

Não adiantava. Fomos roubados inúmeras vezes. Levavam nossa mochila, e por isso, com o tempo, nós adquirimos o hábito de carregar todos os materiais dentro de uma pequena sacola. Mas também não adiantava; roubavam a sacola também. E eu já não sabia mais o que fazer.

Sempre que voltávamos, nossa mãe não estava lá. A casa estava completamente sozinha e eu tinha que fazer almoço pra nós, mas muitas vezes dava errado e mamãe me batia por causa disso (em Gabriel também, mesmo sem ter motivo). Quando ela chegava à noite, sempre trazia alguma caixa misteriosa ou qualquer outra coisa.

— O que tem aí, mamãe? — indagava Gabriel, aproximando-se das caixas. Eu desconfiava que havia drogas lá dentro, mas não me atrevia a dizer aquilo a ele.

Ela o encarava com olhos pesados e tediosos, como se estivesse em outro mundo.

— Não mexe — falava ela, a voz elevada, e dava um tapa na bochecha frágil do Gabriel quando ele chegava muito perto.

— Não bate nele! — defendia eu, mas daí ela me pegava pelo pulso, me levava pro quartinho, trancava a porta e fazia um monte de coisas comigo: às vezes, apertava as mãos em volta do meu pescoço até eu ficar roxo; em outras, levava o facão e cortava a pele do meu braço, e eu gritava de dor enquanto Gabriel chorava no outro cômodo.

Mas, em umas raríssimas ocasiões, ela quase parecia uma mãe de verdade. Como em uma noite em que eu não conseguira dormir e percebi que ela adentrou no nosso quarto, lentamente, e ficou parada na porta. Fingi que estava ferrado no sono, mas mantive os olhos um pouco abertos e pude ver a sombra gigante dela estampada no chão. Eu imaginei que ela estivesse preocupada — só imaginei — e por um momento, eu quase gostei dela.

Logo que ela saiu da porta, o sentimento passou. No lugar dele me veio uma raiva enorme.

***

Tudo começou num dia em que chovia muito, e a casa fazia tantos barulhos que eu achei que tudo fosse desmoronar em um instante. Pela janela da sala, dava para ver que relampejava a cada cinco segundos, e os estrondos dos trovões eram tão altos que faziam o chão tremer às vezes. Não tínhamos nada para comer, e eu até iria ao mercado tentar fazer o dono me vender fiado, mas nem guarda-chuva havia na nossa casa.

Era sempre esquisito quando eu, mamãe e Gabriel ficávamos juntos na sala. Era como se estivéssemos convivendo à força, como se um ímã nos atraísse até aquele lugar e nos obrigasse a ficar perto um do outro. Eu odiava ficar próximo à mamãe, mas meu irmão ainda achava que ela era alguém ligeiramente confiável e pacífica, mesmo depois de tudo o que ela fizera. Por causa disso, em meio a todo aquele barulho de tempestade e aos estômagos roncando, ele pareceu achar um assunto para compartilhar conosco. Bem que eu queria que ele tivesse ficado quieto.

— Mamãe, mamãe, eu já sei o quê que eu quero sê quando crescê! — falou Gabriel, sentado no sofá furado, os olhinhos castanhos brilhando. Ele era muito pequeno e magrinho, e tinha uns braços macios que viviam arranhados por conta das agressões da mamãe.

Ela encarou-o como se ele tivesse vomitado aos pés dela, mas não disse nada. Continuou a tragar seu cigarro, soltando fumaça para todos os cantos.

— Quero sê médico! — prosseguiu ele, mesmo assim, não ligando para a ignorância dela. — Quero sê dotor, ficá vestido de branco o dia inteirinho! Mamãe! Mamãe, tá me ouvindo...

E tudo aconteceu num estante só. Mamãe se levantou, foi até Gabriel e aplicou-lhe um tapa tão forte que até eu pude sentir a dor. Ele gritou muito alto, chorando, as lágrimas escorregando dos olhos castanhos dele e caindo no sofá furado. Mamãe pôs um dedo na frente da cara dele e começou a gritar, a falar um monte de coisas ao mesmo tempo, e eu não entendia nada. As veias dela estavam saltadas de ódio, e a sua cara estava toda contraída. Só pude entender o final da fala dela, mas eu devia ter tapado os ouvidos — do Gabriel.

— ...tá achando que vai conseguir ser uma porra dum médico? Tu já viu aonde cê mora, hein, menino? Hein? Agora eu te pergunto uma coisa: tu já viu algum médico aqui perto? Hein? Hein?!

Ela pegou-o pelos ombros e o sacudiu até que Gabriel balançou a cabeça lenta e negativamente. Os olhos da mamãe estavam tão alucinados e distantes... ela parecia doida naquelas circunstâncias.

Eu assisti a tudo, impotente, grudado na parede. Senti que minha boca se abria e fechava, conforme eu tentava impedi-la de dizer aquelas coisas ao Gabriel. Mas eu estava completamente mudo: minha voz desaparecera, assim como a minha coragem. Não me atrevia a mover um músculo.

Assim que ela o segurou pelo pulso e o levou até o quartinho, eu soube o que aconteceria. Uma coisa gelada se espalhou pelo meu corpo, uma sensação urgente e temerosa. Quando mamãe fechou a porta atrás de si e os gritos de Gabriel começaram a preencher o pequeno ambiente da casa, eu simplesmente corri até lá e comecei a dar socos na madeira seca.

— Abre! Não faz isso! Não faz isso com ele! — bati com a maior força que pude juntar. Foi tudo à toa, pois mamãe não abriu a porta, e eu tive que esperar do lado de fora, ouvindo a chuva pisotear nosso telhado velho.

Mais tarde, quando tudo tinha acabado, mamãe foi se deitar e trancou a gente no quarto. Eu estava até com medo de olhar para Gabriel, tamanho foi o estrago causado. Ele estava muito pálido, e os dois olhos — castanhos, tão bonitos — exibiam uma coloração roxa e um recente inchamento. A trajetória das lágrimas ainda era identificável nas suas bochechas, mas ele não parecia querer chorar mais. Mesmo assim, sua expressão era dolorosa e ao mesmo tempo impassível, deixando toda a tristeza se transformar em estupor.

Eu sabia que ele estava triste demais, e sabia que tinha que fazer alguma coisa para animá-lo.

— Ei, Gabriel — chamei, quando nós já estávamos deitados, cada um em um colchão. Apesar da chuva, uma batida abafada de música entrava pela janela, vinda de algum barraco próximo. O cantor dizia coisas que eu não sabia se Gabriel podia escutar.

Ele olhou pra mim assustado, como se não tivesse percebido que eu estava lá.

— Que foi? — quis saber ele, apoiando-se sobre os cotovelos.

Eu andei até o colchão dele, me agachei até que nós ficássemos à mesma altura e mostrei meu braço.

— Vê esse arranhão aqui? — perguntei, tentando fazer a minha voz ficar mais alta que a música e a chuva. Indiquei pra ele o ferimento cicatrizado que eu tinha no antebraço, causado pelo facão havia umas duas semanas.

Ele fez que sim com a cabeça, um pouco confuso.

— Está doendo — eu disse, encarando-o. Ele me olhava de um jeito diferente agora, o susto substituído por curiosidade. — Bem... você quer ser médico, não quer...?

Ele olhou pra baixo, aparentemente desanimado, mas não falou nada.

— Você quer sim, eu sei que quer — falei, fazendo-o voltar seus olhos pra mim de novo.

— Acho que não. Mamãe falô que não — teimou Gabriel.

— Mamãe se enganou — disse eu, sentindo raiva ao me lembrar dela. — Olha... eu ouvi falar, não tenho certeza... que você pode fazer os cortes sararem se esfregá-los um pouquinho com as mãos. Mas tem que esfregar bem de leve mesmo, muito de levinho. Só os bons médicos conseguem fazer isso. Eu já tentei, mas não funciona de jeito nenhum... é por isso que eu queria saber se você consegue. Daí a gente já sabe se você tem talento pra ser médico ou não. O que você acha?

Rezei para que ele acreditasse naquela mentira idiota. Gabriel pensou por um momento, e um sorriso brincou nos seus lábios pequenos e inchados. Ele concordou com a cabeça, parecendo subitamente alegre, e estendeu as mãos para frente, tocando no meu braço.

— Tem que ser bem de leve — eu repeti, mas ele já parecia ter entendido. Passou as mãos pequenas pelo meu machucado e esfregou-as em círculo, com a maior suavidade que conseguiu.

Ele retirou as mãos.

— Incrível — falei, olhando pra ele, mesmo que a dor do machucado ainda estivesse me incomodando. Gabriel arregalou os olhos. — A dor passou. Gabriel, você fez a minha dor sumir!

O sorriso dele se abriu ainda mais, e um brilho contente passou por seus olhos. Logo depois, uma ideia nova pareceu entrar na sua cabeça, e a expressão dele tornou-se curiosa novamente.

Pedo — chamou ele. Meu nome é Pedro, mas ele nunca soube pronunciá-lo corretamente. — E você? Quê que cê qué sê quando crescê?

Fiquei mudo, mas Gabriel continuou a me encarar com aqueles olhos interrogativos e eu finalmente encontrei uma resposta.

— Quero ser escritor — disse eu. A música tinha parado, mesmo que a chuva ainda prosseguisse.

Esquitor? — ele franziu o cenho com o termo desconhecido. — Que é isso?

Pensei em uma explicação que ele pudesse compreender.

— É alguém que faz livros, cria histórias, cria mundos.

— Ah! — surpreendeu-se Gabriel. Ficou um instante sem dizer nada, mas pareceu encontrar algo para falar. — Por que você não cria outro mundo pra gente? Aí a gente vai morá nele?!

Respirei fundo, sem saber direito o que dizer a ele. Não são mundos reais, Gabriel.

— Eu vou criar — falei, ao invés disso, tentando sorrir e parecer empolgado. — Vou criar um mundo só pra gente, e vai ser muito diferente daqui. Não vai ter surra, nem olho roxo, nem tristeza nenhuma, ouviu? Eu prometo pra você.

Gabriel arregalou os olhos, mas dessa vez foi de felicidade. Os cantos da boca dele se curvaram, e então eu voltei para o meu colchão, dando duas palmadinhas na cabeça dele antes disso.

Era a última vez que eu o via feliz.

***

As coisas não melhoraram. Eu sabia que não melhorariam, afinal, levando-se em conta o histórico da nossa família, mas é que foi muito difícil confirmar isso. Às vezes, você fica se preparando para o pior, mas sabe que ainda há uma pequena centelha de esperança dentro de você, achando que talvez as coisas deem certo e tudo fique bem. Mas não é o que acontece.

Nós estávamos apanhando como nunca. Agora, as caixas que mamãe trazia à noite eram cada vez maiores, e ela estava muito diferente. Parecia pálida demais, e os olhos ficavam cada vez mais alucinados. Começou a fumar o dobro do que fumava antes, e ficava tossindo de cinco em cinco minutos, ora gritando com a gente, ora ficando tão quieta como uma serpente antes do bote.

E uma raiva descomunal crescia dentro de mim. Eu comecei a cogitar a ideia de fugir daquela casa, de tudo, mas eu sentia medo. Pelo menos lá eu tinha onde dormir, onde ficar, mas e lá fora? Como eu cuidaria de Gabriel daquele jeito? Não, dizia eu a mim mesmo, é equivocado demais.

Mas a possibilidade de continuar vivendo lá me dava repulsa, e eu não sabia o que fazer a respeito. Só tinha certeza de uma coisa: eu tinha que fazer algo.

— Ei, menino — disse mamãe, em um dia em que nós estávamos saindo pra ir à escola.

— Que foi? — eu quis saber.

— Não você, o pequeno — falou ela, segurando Gabriel pelos ombros e me dispensando. Eu olhei com nojo pras mãos dela em contato com ele. — Tu vai ficar aqui hoje — disse ela, dirigindo-se a ele.

Na mesma hora, as feições de Gabriel tornaram-se assombradas e ansiosas. Ele olhou pra mim, buscando alguma ajuda.

— Por que quer ficar com ele? — eu indaguei, com medo.

Mamãe me lançou um olhar enviesado.

— Não é da tua conta — falou ela, me empurrando pra fora da casa e trancando a porta por dentro.

Bati na madeira, assim que ela fechou, dando socos com as mãos em punho. Eu não podia nem considerar a hipótese de deixá-lo lá com aquela megera. Depois de um minuto gritando e batendo na porta, mamãe abriu-a, aparentemente raivosa.

— Para de escândalo, moleque — falou ela com uma voz grossa e o cenho franzido.

— Você não vai fazer nada com ele — eu disse, tentando soltar uma voz corajosa, mas tudo que saía era um fio de som. — Não vou deixar ele aí com você.

— Ah — ela soltou uma risada e eu pude sentir o bafo de cigarro que vinha da boca dela. — Quê que tu tá achando que eu vou fazer com o menino?

— Ora, por que você quer ficar com ele então?

Mamãe pareceu resignada. Respirou fundo e agachou-se.

— Olha — disse ela, me olhando nos olhos e falando com uma voz diferente, como se eu fosse realmente uma criança e não um delinquente. — Eu preciso do teu irmão um pouquinho aqui comigo. Não vai acontecer nada com ele, eu te garanto. Prometo pra você, na hora que tu voltar da escola, ele vai tar do mesmo jeito. Prometo de verdade.

Eu fiquei meio chocado com aquele comportamento. Lembrou-me daquelas vezes em que ela quase parecia uma mãe de verdade, como quando ela veio até o nosso quarto e ficou parada olhando pra nós. E pelo menos uma vez na vida, me passou pela cabeça que, talvez, confiar nela não fosse algo tão absurdo quando eu pensava.

— Você promete mesmo? — perguntei, tentando reforçar o argumento dela.

— A-ham — devolveu ela, e o olhar em seu rosto parecia sincero demais para esconder algum tipo de blefe.

Gabriel apareceu atrás de mamãe, e estranhamente, ele não parecia mais tão assombrado assim, embora aparentasse uma tristeza incomum para a sua pouca idade. Eu respirei fundo, sem saber o que fazer por um momento, mas finalmente tomei uma decisão.

— Tudo bem — disse eu. Em seguida, encarei Gabriel, e ele me olhou com aqueles olhos castanhos brilhantes. — Espere por mim.

Ele assentiu, roendo as unhas.

— Tchau — despedi-me, andando pela calçada irregular e pegando o caminho da escola em meio aos barracos da favela.

Gabriel acenou pra mim da porta. Eu retribui o gesto.

***

Aquele dia na escola foi até mais ou menos. A diretora convocou todo mundo pra cantar o Hino Nacional, mas ela não prestou tanta atenção em mim, já que alguns dos outros alunos estavam fazendo bagunça. Normalmente, ela sempre ficava de olho em mim, e eu achava que isso acontecia porque eu morava em uma favela — ou perto dela. Talvez a diretora esperasse alguma travessura da minha parte. Mas eu era um aluno quieto, e finalmente ela teve a prova viva disso.

A professora não implicou comigo por eu não fazer os deveres de casa, até porque, dessa vez, eu tinha feito, e os outros meninos não caçoaram tanto do meu uniforme esfarrapado quanto faziam normalmente. Eles haviam sido duramente repreendidos pela diretora por atrapalharem o hino, e estavam um pouco mais educados, mesmo que temporariamente.

Ela prometeu, disse eu a mim mesmo, quando, após todos os horários, o sinal bateu. Ela prometeu, prometeu, prometeu, vai dar tudo certo.

Percorri o caminho até a casa lentamente, talvez com medo do que eu encontraria por lá. Felizmente, quando cheguei, não havia indício nenhum de que algo de ruim havia acontecido. Estava tudo quieto, e, ao contrário de todos os dias, mamãe estava lá dessa vez.

Mas alguma coisa estava errada.

— Cadê o Gabriel? — perguntei, chegando mais perto dela. Mamãe estava sentada no sofá, fumando, e parecia alucinada e distante. Ao ouvir as minhas palavras, ela me encarou, mas pareceu não me enxergar mesmo assim. — Cadê o Gabriel?!

Ela não me respondeu.

— Gabriel! — chamei, olhando pelos cantos da casa, mas sem encontrar nada. — Gabriel?

Nenhuma resposta.

Prometo pra você, na hora que tu voltar da escola, ele vai tar do mesmo jeito. Prometo de verdade.

Prometo de verdade.

E nesse dia eu percebi que promessas de adulto não valiam absolutamente nada.

— Sua... sua... — eu corri até a sala, encarando mamãe de novo, mas não me atrevi a dizer o palavrão que eu tinha aprendido na escola. — Você prometeu! Você prometeu! — ela não me escutou mesmo assim. — Ei! Fala comigo!

Com os gritos, ela finalmente me olhou de verdade, segurando o cigarro entre os dedos e soltando fumaça pela boca.

— Eu cumpri minha promessa — disse ela, com um pouco de dificuldade. Quem sabe já estivesse com os pulmões pretos, como nas fotos das embalagens de cigarro. — Tinha dito que o garoto ia tar do mesmo jeito, não disse? Então, ele tá do mesmo jeito. Só que ele não tá aqui, só isso.

— E onde é que ele tá?! — indaguei, as lágrimas começando a encher meus olhos.

Mamãe não respondeu. Pareceu se inclinar um pouco no sofá, como se estivesse tentando esconder alguma coisa. Foi então que eu lembrei das caixas. Eu virei a cabeça para trás, encarando-as, percebendo-as melhor agora, e reparei que havia um monte delas dessa vez.

Associei uma coisa a outra. Gabriel desaparecido. Mais caixas. Mamãe fumando. Com que dinheiro ela tinha comprado mais caixas.

Não consegui aguentar todas aquelas coisas acontecendo de uma vez só. Pensei em Gabriel, em ir atrás dele, mas eu nem sabia por onde começar. Pensei no quanto ele sofreria, em como fui besta deixando-o sozinho com mamãe. Pensei nele querendo ser médico, em como a vida dele era difícil, e em como ele nunca mais seria um médico. Pensei que eu queria me vingar de mamãe, queria matá-la, queria vendê-la em troca de alguma coisa, do mesmo modo como ela fizera com Gabriel. Pensei no que eu faria, que não sabia o que fazer, que eu estava começando a chorar. Pensei que agora eu estava correndo sem rumo, que as pessoas estavam olhando pra mim conforme eu corria e que eu não sabia pra onde estava indo. Pensei que Gabriel deveria estar me chamando em algum lugar, que aquilo tudo fora culpa minha.

Depois disso, nunca mais voltei ou sequer soube de alguma coisa sobre meu irmão e mamãe. Hoje, ela é pra mim apenas uma sombra indefinida. Não me importo com o que aconteceu àquela mulher, se está viva ou morta, feliz ou triste. Não faz a menor diferença, afinal. Encarar o frio e a fome era muito melhor que continuar com ela.

Mas eu penso em Gabriel até agora.

Os olhos dele, aqueles olhos castanhos e tristes, me vêm à mente todos os dias. Os anos vêm e vão e eu não me esqueço daquele olhar, do brilho que o contaminava, um brilho que já dizia muita coisa por si só e que me causa calafrios até hoje.


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