Lost escrita por Beatriz


Capítulo 23
Eu jogarei


Notas iniciais do capítulo

- Quaaaaase no fim gente, quase no fim :') chega de enrolação, né? iaohsoiahq' Acho que no máximo mais uns três, quatro capítulos. Sinto falta dos comentários, dos leitores. Cadê vocês, leitores fantasmas? Isso entristece a escritora, sabe?! Eu já não tenho mais ideias de músicas... na verdade, sempre coloquei músicas aleatórias... Sei lá, acho que Resistance (MUSE) seria cool. Beijos



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Quando se lida com gente como Jane, desfechos fáceis são suspeitos. Eu tentei me convencer de que estava tudo bem, mas não caía nessa. Seria neutra. Nem creio, nem descreio. Só espero.

Estava começando a lidar melhor com aquilo. Claro, as recaídas nunca acabam – a não ser que eu sofresse outro acidente e novamente perdesse a memória. Mas eu tinha coisas a fazer... Consegui um emprego naquele lugar em que estava hospedada, assim ficava e comia lá de graça. De manhã e de tarde eu cuidava da lanchonete do pequeno hotel. Tinha pessoas que me faziam rir. Outras me irritavam. Outras lembravam coisas que queria esquecer.

Ontem um policial veio me procurar aqui. Como me achou eu não faço a menor ideia... Perguntou-me se eu não gostaria de comparecer a casa. Contar as coisas, mostrar lugares, pegar o que achasse importante. Não acho que deveria pegar algo, isso me entristeceria. Mas a dor vai me acompanhar com fotos ou sem fotos, com lembranças materiais ou não. Então achei que deveria ir.

A dona do hotel duas estrelas estava sendo bastante gentil comigo. Ela viu que eu estava para baixo e fazia de tudo para aumentar meu humor. Teve um pouco de êxito. Deu-me umas roupas da filha dela... Aquelas já estavam ficando sujas mesmo. Vestia uma blusa meia-estação listrada e umas calças meio folgadinhas. Eu tinha emagrecido um pouco com tudo o que estava acontecendo e ela me empurrava docinhos... Muitas vezes eu aceitava para não parecer mal educada. Os doces perderam seu encanto.

– Então, vamos? – perguntou o policial, com um tom impaciente. Dei uma viradinha para olhar o relógio. Eu fiquei devaneando por aproximadamente cinco minutos.

– Claro – respondi hesitante.

Entrei no carro, me sentindo estranha por estar em uma viatura. Sorri fracamente para o policial quando ele olhou para mim. Ele me encarou estranhamente por alguns segundos, depois sorriu. Como se processasse esse ato. Tentou puxar papo, mas eu não queria falar. Eu queria apenas observar a cidade enquanto o carro corria. Era divertido. Às vezes ele agia de modo estranho e isso me incomodava. Poderia ser porque somos estranhos um para o outro, mas... Estranho de outro jeito. Eu queria não ter ido.

Ao chegar na casa juntei as fotos e coloquei em uma bolsa que achei em um quarto... Pela cama de casal e por todos os objetos que haviam ali, era com certeza o quarto dos meus pais. Aspire o ar ali com esperança, mas o odor de mofo entrava por minhas narinas. Peguei algumas roupas da minha mãe, poderia ser útil... Entrei em um cômodo quase vazio, exceto por um grande piano de cauda. Sentei-me e passei os dedos pelas teclas. Não sei como aprendi a tocar, mas com os fragmentos de memória que eu tinha do passado, provavelmente não conseguiria. Mas deslizei os dedos por entre as teclas, e no impulso fui apertando algumas. Saiu uma melodia simplória e cheia de errinhos, coisa curta. O piano era grande demais para levar na bolsa. Que pena...

Já de volta ao hotel, me joguei em cima da cama. Vasculhando em minha bolsa coloquei as fotos em cima da cama para observá-las. Os cachinhos do meu cabelo eram incertos e também indecisos em sua cor. Peguei uma que não me recordava de ter pegado... Não mesmo, essa estava na caixa no porão. Novamente. Coisas aparecendo na minha bolsa. Novamente.

A mesma foto. Tinha um “X” enorme em cima do rosto da minha mãe. Eu podia sentir mais maldade ainda nos olhos de Jane. A pele extremamente pálida. Parecia doente. O cabelo numa cor vermelha que não era natural, um contraste com a pele dela. Um sorrisinho antes não reparado em seus lábios, mas não era de felicidade. Amassei a foto como pude e joguei-a na lixeira. O velho telefone que estava em cima do criado-mudo tocou com jeito de que iria pifar. Atendi-o, hesitante.

Tentei controlar a respiração e esperei que a pessoa começasse a falar.

– Alô, Emma? – disse uma voz conhecida, a voz de Luce, a dona do hotel. Suspirei aliviada. Ela me disse que eu deveria comparecer até a lanchonete para ajuda-la porque tinha mais clientes que o usual.

Quando me deitei na cama comecei a pensar sobre minhas suspeitas. Não poderia ser, né? Não há possibilidades de ela estar solta... Ela foi presa e pegou muitos anos, talvez não saísse de lá viva. Mas eu não conseguia aceitar esse protótipo de final feliz. Era irreal. Finais felizes me são estranhos depois de tudo isso. Uma vozinha no meu ombro esquerdo dizia “Ela está presa, está tudo bem. Viva sua vida”. Mas outra sibilava “Será mesmo? Será mesmo?” sem parar.

O telefone tocou novamente. Pulei da cama e quase caí no chão. Seria outra emergência? Mas a lanchonete está fechada. Será que Brian tinha me localizado e conseguido o número do meu quarto? Era um pensamento feliz e esperançoso. Claro que não. Me ajoelhei na cama e peguei o gancho. Ouvia-se uma respiração conturbada do outro lado da linha. Continuei a esperar que alguém falasse, mas demoraram uns dois minutos até que acontecesse.

– Olá, querida – sibilou a voz tão conhecida, não querida. – Tudo bem? Sentiu minha falta? – Deu uma risadinha digna das bruxas de desenho animado. Patético. – Vejo que conseguiu se arranjar. Deu um pé na bunda do garoto, fez bem. Ele merece coisa melhor, não concorda?! Vi ele no shopping com uma garota bonita e legal. Tão o contrário de você! Deseje felicidades a eles mentalmente.

– Grr – foi o máximo que conseguiu dizer.

– Tá legal. Ele foi bastante esperto, um pouco rudimentar, ao me acertar com aquela pedra. Deteve-me. Pelo menos foi o que vocês pensaram. É o que eu sempre digo: adolescentes, iludidos. Sempre no mundo da lua. Acreditando que a paixão física e passageira é realmente amor, e que vão se casar com o carinha que pegaram no colegial... – Agora gargalhou com gosto. – Mas isso é evidente, não? Melhor não ficar falando sobre isso. O fato é: um pedaço de pedra e um garoto apaixonado bancando super-herói não pode me impedir, querida. Não pode me impedir de conseguir o que quero, e o que quero é você. Junto a seus pais. Eles ficariam felizes, você também não? Não pense apenas na sua felicidade temporária, sua egoísta e mesquinha! Pense neles! Eles adorariam recebe-la ao festival debaixo da terra, com larvas querendo comer sua pele sedosa... Quando podemos nos encontrar? Noite das mulheres?

Como ela adorava isso. Me perseguir. Brincar com a minha morte. Resistir. Sempre resistindo a tudo que a impede. Eu sabia que isso estava sendo fácil demais para Jane Hill. Mas eu não iria deixar intimidar-me. Se era para haver um jogo, como uma vez ela me propunha, então eu iria joga-lo.

– Acho que na próxima sexta-feira estaria legal. E – falei antes que ela pudesse me cortar. – Eu escolho o local. Minha casa. A casa de meus pais! E como você é ninja, eu não preciso informar-lhe a hora, presumo.

– Garotinha tola está começando a ficar interessante... Parando de bancar a verme inútil e adentrando ao divertido jogo da titia. Vai ser legal, um pouco de resistência para variar. Não gosto de jogo fácil. – E para encerrar com chave de ouro, mais uma menção à minha morte: - Enquanto brincamos de pega-pega, o Brian deve estar pegando outra por aí.

Bati o telefone no gancho com tamanha força que deve tê-lo quebrado Dei um soco na parede e não me importei com o quanto minhas mãos doíam. Se Jane quer jogar, eu jogarei também.


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