Laços de Sangue e Fúria escrita por BadWolf


Capítulo 27
Um Homem Sem Paz


Notas iniciais do capítulo

Olá!!!

Conforme cronograma, mais um cap sendo postado.
Espero que gostem das revelações desse cap - embora não seja nenhuma novidade, mas... Enfim, espero deixá-los chocados!!

Boa leitura.



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Holmes enfrentou um trânsito complicado de Pall Mall até Baker Street. Isso porque uma das ruas estava sendo pavimentada. Londres andava uma bagunça só, ele pensava, da janela do cabriolé. Era a bagunça de sempre, mas ainda mais complicada pelo incontável número de obras que brotavam da cidade, em virtude do dito progresso.

Seu almoço tinha dado poucos resultados. Estava claro que Mycroft sabia mais do que transparecia. O que, afinal, impedia seu irmão de lhe contar mais a respeito do passado dos Holmes com os Morgan?

Ele poderia ter chegado à sua casa estressado por suas poucas conclusões, mas não foi isso que aconteceu. Sua mente estava inquieta com perturbações de seu próprio passado. A questão sobre sua pretendente era realmente obscura, provando ser este um tipo de situação que ele jamais gostara de admitir a si mesmo. Ademais, havia Bruce Finnegan, um rapaz que se provou sem limites, propenso a tudo. Bastava encontrar um advogado adequado que a ameaça se tornaria certeza. Não. Ele não poderia se permitir ser encurralado desta forma, sem ao menos lutar.

Assim que subia as escadas, com a cabeça ainda projetando inúmeras possibilidades, ele ouviu uma voz doce, suave, enchendo os corredores.

Mas quem havia de ser? – ele pensou.

Ao abrir a porta, acabou se deparando com uma cena inusitada.

Era Diane Watson, prima de seu amigo, sentada sobre sua poltrona, cantando uma de suas partituras.

A primeira reação da moça ao vê-lo, ainda no limiar da porta, contemplando aquela inusitada cena, foi interromper imediatamente o canto e ficar ruborizada. Holmes, que trazia um olhar divertido, pigarreou.

–Desculpe interromper sua prática, Miss Watson.

–E-Eu é que peço desculpas, Mr. Holmes. Por meu atrevimento em...

Holmes continuou. – Sim, em pegar minhas partituras. Wagner, a propósito. Tem minhas congratulações, pois não é fácil de ser entoada. – disse Holmes, enquanto retirava seu chapéu, num tom de voz frio.

A moça se sentiu encorajada a continuar a conversa, tendo seu rubor começado a desaparecer.

–Fazia muito tempo que eu não praticava esta... – ela disse.

–“O Holandês Voador”... Uma das minhas preferidas.

–Minha também.

Ao tomar a partitura da moça, para examinar, o dedos de Holmes acabaram por tocar, levemente, os dedos da moça, que tornou-se ruborizada imediatamente com o mero contato, sentindo sua garganta seca e seu coração mais acelerado. Era impressionante os efeitos que ele aquele homem provocava nela.

Um silêncio perpetuou o restante da conversa.

Holmes pigarreou outra vez, claramente não satisfeito com o rumo um tanto íntimo que aquela conversa estava tomando. – Bem, se deseja cantar, sinta-se à vontade. Mas aviso-te que Mrs. Hudson não costuma ser uma boa ouvinte, muito menos se seu canto se der pela madrugada.

Diane riu dessa observação. – Bem, garanto-te que não é meu desejo incomodar sua senhoria.

Holmes deu um aceno rápido, em concordância, antes de voltar ao seu quarto. Estar diante de “O Holandês Voador” o acabou cantarolando a ópera, enquanto se trocava. Ele lembrou-se de uma vez, que fora ao Teatro acompanhado de seus pai, para assistir àquela ópera. Seus pais costumavam ir ao Royal Theater of Yorkshire para assistir óperas, que sempre foram a predileção de sua mãe. Sua mãe... Ela lhe prometera tanto que lhe levaria à uma delas, um dia... Talvez tenha sido por isso que seu pai tenha se animado a leva-lo, naquele dia, pois fazia exatamente um ano que ela partira.

Ele lembrara-se, instantaneamente, que por uma “coincidência”, os Morgan estavam no mesmo Teatro. Seu pai lhe apresentou a jovem Beatrice Morgan, a moça que Sherlock Holmes não sabia á época, mas que viria a ser sua pretendente, certamente para expandir as relações políticas e os negócios dos Holmes de Yorkshire. Até que tudo terminou de repente, sem explicação... Seu pai jamais fora homem de voltar atrás com a palavra, e era isso que o incomodava. O que houve entre os Holmes e os Morgan que culminaram no desfecho de um noivado, organizado desde a infância de duas crianças? Certamente, algo bem sério.

Em meio às divagações e incertezas de Holmes, Diane se encontrava sozinha, à sala. Ela escutava a leve cantarola vinda de seu companheiro de aposento. Ele tinha uma voz grave, de barítono, isso era claro. Se um pouco melhor trabalhada, daria um bom cantor.

Ela suspirou.

Holmes era um homem tão gentil. Tinha, é claro, um jeito um tanto reservado, mas ela sabia o porquê disso. Crescera na calorosa América escutando de seu pai a respeito da frieza e da reserva dos ingleses. Ele era apenas um típico representante deles. Havia em si um ar arrogante, sem dúvida. Uma arrogância leve, e é claro, um bom coração. Nada mais explicava seu primo, John, ter se tornado amigo dele.

E ele ainda era bonito...

Não, é claro, tão bonito quanto os homens que ela costumava suspirar, quando morava com seu pai em um rancho na fazenda. Ele não era como Harry, o vaqueiro, que tinha a pele bronzeada pelo sol, o jeito atrevido e descarado. Ou mesmo James, que ajudara seu pai a trocar o telhado, com suas brincadeiras e que vivia sempre desarrumado e rindo de tudo. Não, Mr. Holmes era diferente. Sua tez era pálida, mas havia feições bonitas em seu rosto. Mesmo seu nariz e queixo, que ela sentiu desagrado no início, agora até lhe conferiam certo charme, associado ao seu cabelo sempre bem penteado e seu rosto limpo, cuidadosamente barbeado. Ele não trazia a virilidade de um homem do campo, mas tinha boas maneiras, que faltavam a eles. Que mulher não gosta de receber um olhar gentil? De ter a porta aberta quando passava? De ser acalentada por uma doce e educada voz?

Alheia às cantorias vindas do quarto dele, Diane passava seus dedos pelo terno, que ele deixara no cabide. Como se imersa em um encantamento, a moça levou seu rosto ao tecido, tentando sentir seu cheiro.

–Diane?

A moça virou-se, consternada. Era seu primo, Watson.

–O que você está fazendo com esse terno?

–Er, nada... Acho que ele está precisando de uma reforma.

Watson sorriu. – Será isso mesmo? Porque esse terno me parece novo... Ainda mais porque o dono dele não costuma usar roupas gastas...

Diane ficara ruborizada. Ao perceber sua reação, Watson se aproximou dela.

–Oh, minha prima... Eu preciso arranjar-te um emprego, imediatamente. Embora eu estime demais sua companhia, temo que sua estadia nesta casa lhe venha a trazer ilusões a cerca de certas pessoas, e eu não posso culpá-la.

–Por quê ilusões, John?

Watson replicou. – Meu amigo Holmes não irá se envolver com ninguém, é apenas isso. Casamento está fora de cogitação para ele. Tente entender, ele é um homem que preza sua racionalidade, dá pouco espaço à sentimentos...

–Mas ainda assim, ele tem a você. Um amigo.

Watson sorriu. – De fato, ele tem por mim grande amizade. Falando francamente, Diane, eu desejaria muito que ele se casasse com alguém, e ficaria muito feliz em ter esse alguém sangue do meu sangue casada com ele. Mas eu não posso deixar que você se deixe iludir por uma possibilidade tão remota quanto à dele ceder à sentimentos, como o amor.

Diane mostrou-se resignada.

–Você não pode me impedir de me apaixonar por ele.

Watson ficou chocado com a convicção da moça. Como ele deixara que tais coisas chegassem a esse ponto de afeição? Ele deveria tê-la alertado desde o dia que ela pôs os pés de Baker Street.

–Não. Eu não posso. Mas é meu dever impedi-la de sofrer.

Deixando seu terno no cabideiro, e retirando o terno de Holmes das mãos de Diane, Watson voltou ao seu quarto. Encontrou Holmes afinando violino. Percebeu que havia uma partitura em suas mãos.

–“O Holandês Voador”... Fazia tempo que não tocava isso.

–Exatamente. – disse Holmes, alheio ao que estava acontecendo.

–Diane me disse essa manhã que gostava dessa peça de Wagner.

–Eu também gosto. É uma de minhas preferidas. – disse Holmes, enquanto guardava seu violino sobre a cama.

Parece que eles têm mais afinidades do que eu pensei...

–Ela me disse que sabe tocar piano.

–Não me espanta que saiba. Ela tem uma boa voz e uma áurea musical. Saber tocar um instrumento é mera consequência.

–Você acha que ela tem uma boa voz?

–Soprano, embora tropece tentando fazer contralto às vezes. Mas é soprano. – disse Holmes, aparentemente indiferente.

Watson estranhou o conhecimento musical de Holmes.

–Como você sabe distinguir o tipo de voz, Holmes?

Diante da pergunta curiosa de seu amigo, Holmes sorriu.

–Eu já cantei, em uma Companhia de Teatro. Eu tinha uns dezoito anos. Minha voz é tenor, isso eu sei porque foi o Maestro da Companhia quem disse, no teste. Fiz algumas aulas de canto, mas como eu tenho um bom ouvido, acabei aprendendo mais que o necessário. Porquê o espanto, meu caro?

Watson ainda estava abismado.

–Não consigo imaginá-lo cantando, Holmes... Será que você...?

–Esqueça isso, Watson... – disse Holmes, visivelmente envergonhado. – Isso foi há muito tempo atrás... Mas que barulho é esse?

Era o som de pessoas. Não o som habitual de uma rua movimentada de Londres, como era Baker Street, mas o som de um aglomerado de pessoas, reunidas em um mesmo lugar. Tanto Holmes quanto Watson se dirigiram a janela e se depararam com um grupo de cerca de dez a quinze pessoas, não mais do que isso, ao redor da porta de sua casa. Antes que pudesse se perguntar, um deles notou a janela aberta e os dois homens debruçados.

–Vejam! Aquele deve ser o Mr. Sherlock Hol...

A frase não foi terminada, ao menos não foi o que Holmes e Watson escutaram, diante do fechar da janela apressado que Holmes fizera, abafando o ruído da rua.

–O que diabos está acontecendo?

–Imprensa, meu caro Watson. – disse Holmes, calmamente. – Parece que a Scotland Yard não conseguiu abafar tanto quanto queria o Comissário... Er, eu irei explicar o porquê desse assédio sobre mim.

Passos apressados irromperam o corredor. Eram Mrs. Hudson e Esther.

–Por Deus, Mr. Holmes! Há vários jornalistas lá fora perguntando do senhor!

Diante do espanto de sua senhoria, Holmes sorriu. – Não é nada demais, Mrs. Hudson. Nada que eu não possa lidar.

–Eles estão falando coisas horríveis ao seu respeito, Mr. Holmes!

Holmes já sabia a natureza do assunto, e diante do espanto de Mrs. Hudson, ele imaginava a dramatização que os veículos da imprensa estavam fazendo.

–Mas eu tenho certeza de que é tudo mentira. – completou Mrs. Hudson, aparentando agora dignidade.

–Sem dúvida.

–Holmes, o que está acontecendo? – foi a vez de Watson se perguntar. Não era complicado entender. Holmes apenas confidenciara a Esther que Miss Morgan tinha sido sua pretendente durante a infância. Mas diante de tal cenário, Holmes sentia-se no dever de deixa-lo saber.

–Mrs. Hudson, saiba que as acusações feitas contra a minha pessoa são infundáveis. E Watson, precisamos conversar.

Holmes acenou a Watson, e os dois se deslocaram para o quarto de Watson, deixando Mrs. Hudson e Esther sozinhas.

–Apesar de saber que é tudo mentira, não posso deixar de me horrorizar com os fatos... Levar uma ex-pretendente à forca! – disse a senhoria, abismada. – Enfim, vou tratar do jantar.

–Eu vou ajuda-la, Mrs. Hudson. – pediu Esther, recebendo um olhar agradecido da senhora.



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Esther estava sentada, à mesa da cozinha de Mrs Hudson, ajudando-a a descascar e cortas alguns legumes, enquanto a senhoria terminava de temperar a carne. A única desvantagem dos aposentos de Baker Street, pensava Esther, era a ausência de uma cozinha. Ela gostava de cozinhar e sentia alta de tomar as rédeas das refeições, algo que raramente ela fazia por ali. Baker Street era mesmo um bom reduto para solteirões, despreocupados com comida e roupa lavada, quando a senhoria sempre trazia os pratos prontos e levava as roupas sujas para uma lavanderia na rua ao lado.

–E Miss Watson, está te ajudando com os afazeres domésticos? – perguntou Esther, curiosa, enquanto cortava uma cenoura.

A senhoria soltou uma única risada. – Não mesmo. Só o que sabe é ficar o dia todo fora, visitando ruas, parques, museus... Vez ou outra diz que tem uma entrevista de emprego, mas volta sempre de mãos vazias.

–Hum... – pensava Esther, despejando o conteúdo da tábua na panela.

–Eu acredito que ela tem outros planos. – pensou alto Mrs. Hudson.

–Outros planos, é? Quais? Algum pretendente?

A senhoria riu. – Creio que sim. Pena que ela não faça idéia do quão problemático é o escolhido.

Esther sentiu, por um momento, seu coração disparar. Seria Holmes?

–Uma mulher consegue perceber essas coisas, você sabe. Olhares sutis, e tudo o mais não visível. Talve seja o que chamam de sexto sentido. Enfim, eu sei que ela está interessada no Mr. Holmes.

–E ele? – perguntou Esther, fingindo indiferença no assunto.

A senhoria fez um leve sorriso. – Sequer a enxerga, como sempre.

Por dentro, Esther suspirou de alívio.

–Mas a carne dos homens é fraca, Mrs. Sigerson. E ela parece decidida a obtê-lo de qualquer modo, isso eu posso perceber pelo olhar. Diria que é uma obsessão. De todo modo, eu temo pela reação de Dr. Watson. Os dois são amigos, mas... A moça é prima dele. Ele pode ser protetor com sua prima e não desejar o envolvimento. E até que ele saiba que a única interessada é ela...

O assunto deixava Esther seriamente perturbada.

–Você acha que ela pode... Armar? Ou mesmo seduzí-lo?

Mrs. Hudson virou seu olhar da panela para Esther.

–Desde o dia que aquela moça entrou nesta casa, a impressão que tive é de que ela é capaz de tudo para obter o que deseja. Isso se chama obstinação, que não é algo ruim de se ter, mas aliado à obsessão... Só espero que Mr. Holmes seja enfático e lhe dê um ultimato. Ou melhor, que o Dr. Watson arranje logo um destino a ela.

A conversa a respeito de Diane Watson tinha chegado à seu final. Enquanto descascava as batatas, Esther se amedrontava.


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–Su-Sua pretendente?

Watson ainda estava estático, surpreso pelo conteúdo da conversa. Além de preocupado com os rumos que esse caso ainda poderia tomar, com a prisão de seu amigo.

Debruçado sobre a escrivaninha do quarto do doutor, Holmes confirmou.

–De fato. Miss Beatrice Morgan era uma moça que estava com o casamento arranjado comigo desde os oito anos, penso eu, embora eu não saiba quando o meu pai embarcou nessa loucura de já arranjar-me o casamento desde a infância, nem o porquê disso. Penso que pela influência que os Morgan exerciam no Governo na época, existência esta inexistente agora. Meu pai, que sempre fora um homem inteligente, deve ter percebido que a influência dos Morgan estava por ruir com a derrocada do Primeiro-ministro na época... Enfim, detalhes de política jamais me interessaram. O fato é que eu realmente conheci Mrs. Finnegan quando solteiro, mas a natureza de nosso rompimento não se dera por vias românticas, como a imprensa já deve estar a inventar.

Watson, que estava sentado sobre a cama, pareceu analisar.

–Mas porquê só agora isso vem à tona?

–Tneho três teorias prováveis, mas preciso de mais dados. Dados estes que só podem ser obtidos em Plymouth.

Watson não pareceu gostar da intenção de seu amigo

–Você ainda pretende ir até lá? Podem pensar que está a ir propositalmente para estragar a investigação da polícia de lá.

–Irei enganá-los. Farei que pensem que não saí da Inglaterra. Acho que posso enganá-los por três dias, pelo menos.

Isso não era o suficiente para Watson.

–Holmes...

Holmes o deteve com um aceno.

–Eu irei sair desta, meu caro. E infelizmente, não poderei contar com sua companhia, pois sua ausência iria causar estranheza nos outros. Preciso que fique aqui, driblando esses abutres.

Ainda resignado, Watson assentiu.

–Está bem. Pode contar com minha ajuda, mesmo à distância.

Holmes sorriu, satisfeito. – Sabia que poderia contar contigo, meu caro Watson.


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Notas finais do capítulo

A imprensa tá afoita em saber mais do passado do Holmes, Diane mostrando as asinhas, Esther pilhada com a situação...

Há uma leve brasa nesse palheiro, meus caros leitores!!! HAHA

E não perca no próximo cap (neste sábado): as diversas repercussões do caso envolvendo Holmes, e Esther irá finalmente lavar a alma de muita gente. #falonada

DEIXEM REVIEWS!!! Obrigada por acompanharem e pela paciência!!! Estamos caminhando!



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