Depois que pegou suas coisas e se despediu rápido de sua mãe, entrou no carro e não disse uma palavra para seu pai, apenas abaixou a cabeça e fingiu estar dormindo. Mas Ricardo insistiu em conversar o caminho todo. Ficou falando sozinho por muitos minutos até que desistiu dizendo:

–Você vai ter que falar. Uma hora ou outra vai ter que conversar com seu pai. Lembre - se que você e sua mãe me devem multo, mas muito mesmo.

Sol fingiu estar prestando atenção, porém só conseguia pensar em como sua mãe deveria estar arrasada e em tudo o que já havia dito para ela, principalmente sobre nunca abandona - la, chegou então a conclusão que deveria ter lutado mais, chamado a polícia ou algo assim, mas agora não iria adiantar, já estavam bem longe de Ubatuba. Se arrependeu até o último fio de cabelo por tudo o que fez de errado ou por tudo que pensou estar fazendo certo. Tinha avisado Tavi que talvez seu pai iria vir buscá - la, mas não acreditou que realmente iria acontecer, não conseguiu se despedir de seu melhor amigo e isso a deixou muito furiosa, tentou se controlar ao máximo até que olhando pela janela avistou a lua, linda e brilhante, era pouco mais de oito horas da noite e o céu estava lindo, então lembrou de Luana, seus olhos encheram de lágrimas só de imaginar que talvez nunca mais voltaria a vê - la. "Por que será que ela não voltou mais essa semana? Será que ela não gostou de mim? Será que ela desistiu de me conhecer melhor? Será que ela ficou com medo de mim? ". A cabeça de Sol estava cheia de pensamentos soltos, tanta coisa para assimilar e nada fazia sentido. Seu primeiro amor estava destruído, sua família estava destruída, por alguns momentos desistiu de sonhar, mas antes de entender tudo o que aconteceu, chegou na capital, São Paulo.

Seu pai morava em um apartamento grande no bairro nobre dos Jardins, cerca de uns 300 km de distância de sua cidade natal. Tudo parecia ser incrível, mas nada que chamasse atenção de Sol. Quando entrou no apartamento, percebeu que seu pai era mais rico do que se lembrava, entrou em seu quarto e ele estava cheio de presentes, coisas que nunca poderia ter de tão caras; seu pai estava tentando a comprar e ela sabia disso, por isso não tocou em nada e foi apenas deitar. Havia uma janela do lado de sua cama e mesmo deitada conseguia olhar para fora, era muito diferente do que estava acostumada, mal conseguia ver as estrelas. Tudo aquilo parecia vazio para Sol. Até achar na prateleira de livros, um livro de capa amarela, que era na verdade um diário de sua mãe, então decidiu ler, afinal parecia ser bem velho, com certeza a mãe não se importaria, acabou pegando no sono e sonhando com tudo o que havia lido.

Seus pais se conheceram em um feriado em Ubatuba, Ricardo um homem bem arrumado e Augusta uma mulher linda com um corpo de deixar qualquer um com desejo. Foi então que num momento de descuido que o prazer se transformou em desespero, pelo menos para Ricardo, ele já era um empresário bem sucedido na época, ter um bebê era a última coisa que ele queria. Dessa maneira pediu que Augusta abortasse a criança - "será melhor para todo mundo" - ele disse; mas a mãe de Sol achou melhor decidir isso sozinha excluindo ele de toda a responsabilidade. Como já era de se esperar ele não quis saber de acordo e disse que pagaria para ela não ter o bebê. Foi ai que ele começou a beber e mostrar que não era tão bom assim.

Numa manhã nos anos 90, o sol brilhava tanto que era difícil olhar para o céu, o dia estava muito lindo, Augusta foi até sua avó pedir um conselho:

– Minha menina, essa criança é sua força agora, não há nada que você possa fazer para apagar isso. Se este rapaz não quiser assumir a paternidade, nós ajudamos com as despesas. Mas não se preocupe tudo vai dar certo. - disse sua avó enquanto acariciava sua barriga.

– Vovó...- disse Augusta sussurrando - você acha que é menino ou menina?

– Sinto que o sol poderá te responder isso melhor minha linda. Fico feliz que tenha decidido ficar com a criança! Olha serei bisa! - Então as duas se abraçaram rindo e chorando ao mesmo tempo.

Elas acreditavam no poder da natureza, acreditavam mais ainda no poder da maior das estrelas e foi por este motivo que Augusta deu a sua filha o nome de Solange, que de todas as traduções, "majestosa" era a que mais gostava, pois Sol seria majestosa como o rei sol, como assim o chamavam!!

Meses depois quando estava quase para dar a luz, Ricardo apareceu, desceu de um táxi e foi atrás de Augusta que estava na praia vendendo seus artesanatos. Ele exigiu que ela se casasse com ele já que teriam a criança; ela recusou, disse que preferia ficar sozinha com Sol do que morar junto com alguém tão egoísta feito ele! Os dois brigaram por semanas, até que por necessidade Augusta foi morar com ele em São Paulo.

–Solange Salles, estou te chamando há horas!! - Gritou o pai de Sol a acordando no dia seguinte - se arrume e venha tomar café da manhã.

Sol leu metade do diário, descobriu como seus pais haviam se conhecido e percebeu que havia feito a pior coisa quando entrou no carro de seu pai. Tudo estava errado e ela precisava voltar para casa, para sua mãe e para Lua.

– Ricardo, me leve embora, quero ir para minha casa!! -Disse Sol segurando sua mochila, pronta para fugir se precisasse.

–Filha, eu decidi que está na hora de te dar uma vida melhor... Sente - se e coma, saco vazio não para em pé!

–Eu não quero ficar com você, tudo aqui me deixa mal, eu preciso da mamãe!!

–Se comporte e eu deixo você ir visitar ela ! - Falou com deboche o que deixou Sol irritada.

– Eu não vou comer!! - Sol voltou para o quarto e bateu a porta, sentiu algo correndo por todo seu corpo, talvez fosse a raiva de tudo o que estava acontecendo com ela. Sentou na cama, respirou bem fundo, achou melhor não fazer nada ainda, então pegou o diário e continuou lendo até descobrir o por que de tanto ódio entre seus pais:

O desespero de Augusta começou quando voltou para Ubatuba e seu marido não a ajudava em nada, então teve que "roubar" dinheiro dele para comprar seus materiais, para fazer as peças e vendê - las na praia, depois que conseguisse repor o dinheiro, iria devolvê - lo.

Alguns dias depois conseguiu vender todas as peças e com isso resolveu devolver o dinheiro, mas ao entrar em casa ouviu uns barulhos estranhos vindo do seu quarto, pensou ser a bebê chorando então foi correndo em direção a porta do quarto... Acabou vendo a cena que a deixou traumatizada por muito tempo. Seu marido estava tentando abusar de sua filhinha, antes dele conseguir fazer algo ela começou a gritar e tirou a criança dali.

Sol era uma criança calma e encantava todos que a vissem, seu pai depois que a viu a primeira vez ficou fascinado, seu ódio se transformou em um amor podre e doentio que o fez tentar muitas vezes abusar de Sol, e quando sua mãe viu isso tentou de todas as formas o afastar da bebê, mas só quando Sol estava com 6 anos que o divórcio foi liberado e Augusta acabou ganhando uma grande quantia em dinheiro para não denunciar Ricardo. Ela não queria que um homem louco, viciado ficasse perto de sua filha, mas diversas vezes ele conseguiu se aproximar e quando não conseguia nada, ameaçava as duas e prometia vingança pelo dinheiro que ela havia "tirado" dele.

Ele acabou perdendo muitos bens e até seu principal negócio por conta de alguns boatos, mas recuperou tudo em pouco tempo. Já Augusta, não se rendeu ao luxo. Pegou o dinheiro e comprou sua casinha perto de sua praia preferida e o restante do dinheiro guardou para necessidades maiores.

Solange ao ler todas as coisas que sua mãe escreveu, sentiu muito medo por estar ali sozinha com o homem que tentou abusar dela, ela sabia se proteger, mas pensar que seu pai podia sentir aquilo por ela ainda a deixou muito assustada. Agora entendia porque se sentia tão mal quando estava perto dele. Ela precisava sair dali o mais rápido possível, então deixou que seu pai dormisse e foi na sala ligar para sua mãe, como ela não atendeu, deixou uma mensagem de voz, na esperança que sua mãe escutasse:

–Mãe, preciso falar rápido antes que ele acorde. Eu li seu diário, sei tudo o que aconteceu com você e comigo!!Preciso sair daqui, nunca senti medo assim, por favor peça pra alguém me buscar!! Por favor! Eu te amo muitooo me desculpe por deixar você!

Sua mãe escutou a mensagem logo de manhã, então entrou em desespero porque pensou que Sol nunca saberia de seu passado, e agora que ela sabia, temia por achar que sua bebê fosse se transformar em algo que ela não queria.

Porém não conseguiu fazer nada, não conhecia ninguém que pudesse ajudar, ninguém que a levasse para tirar de uma vez esse doente da vida delas...

Mas a raiva e o ódio são de longe os piores sentimentos que alguém pode sentir; eles cegam e transformam todo sentimento bom em sede de vingança. E a última coisa que Augusta queria, era ver seu lindo dia de Sol, virar uma grande tempestade.

Até que a ajuda chegou e o céu se abriu novamente.