Não Sou Quem Você Imagina! escrita por Gilraen Ancalímon


Capítulo 44
Capítulo 44


Notas iniciais do capítulo

Olá meninas, como vão? Desculpa da demora, mas aqui estou eu, felizmente a minha semana de prova terminou, mas espero que eu tenha ido bem nelas, obrigada por todos os recados deixados para a minha pessoa, e peço que os fantasmas deixem o que estão achando da fic, ficaria muito feliz com eles.

Ps: Quem tiver interesse em participar do grupo de whats por favor deixem recado com o número do tel e ddd que vamos adicionar, bjs att



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[RECAPITULANDO]

— Mas que diabo...

— E modere seu vocabulário quando estiver diante de minha mãe.

Ela abriu a boca como se pretendesse protestar, mas Charles a interrompeu com um gesto.

— Se quiser comer, estará lá. Não pago empre­gados para servirem alguém perfeitamente capaz de locomover-se até a sala de jantar.

Balançando a cabeça, saiu e fechou a porta, deixando-a sozinha com seus impropérios. Muito obrigado, meu caro Fitzwilliam, pensou. Tudo que precisava era passar o resto da vida cuidando de uma alcoólatra mal-humorada e hostil. Mas se esse era seu destino, faria algumas mudan­ças. Cuidaria pessoalmente para que novos há­bitos fossem implantados.

*****

— Newcastle

Jane olhou para a escuridão. Não imaginava que tivesse coragem de entrar novamente em um trem, mas embarcara em Hampshire. E mantivera a bagagem e a filha com ela durante os cinco dias de viagem.

Abraçada a Helena, agradeceu à sorte pela hospedaria lotada, porque se deitaria para dormir pela primeira vez em dias e porque não teria mais de ouvir o som das rodas sobre os trilhos e sentir o balanço monótono do vagão de passageiros.

A conversa em torno dela concentrava-se em empregos em fábricas e trabalho em restaurantes, e ela ouvia sem interferir. Recebera caretas de desaprovação de diversas mulheres. A proprietá­ria a prevenira de que, caso Helena chorasse mui­to à noite, ela teria de partir.

Apressara-se a garantir que a filha nunca cho­rava. E passaria a noite toda com o bebê ao seio, se fosse preciso. Precisava dormir. A perna doía por não ter conseguido esticá-la nos últimos dias, por ter andado demais, por ter corrido para re­cuperar o lugar depois de cada parada para as refeições. As costas doíam de carregar o peso das malas e do bebê.

Mas a dor na alma era a que mais a incomodava. As mentiras e o sofrimento que causara aos Bingley a atormentavam mais que tudo.

A solidão e a fadiga criavam uma sensação pior que a da fome, da fadiga ou de ossos fraturados.

— Esse bebê tem um pai? — perguntou uma voz suave ao lado dela.

— Não — Jane respondeu.

— Que pena. Todas as crianças precisam de um pai.

A escuridão escondia as lágrimas que corriam de seu rosto.

— Ele morreu.

— Que pena.

— Sim, é uma pena. — Em que se transformara. Seria capaz de voltar a falar sem mentir ou tentar defender-se?

— Precisa de um emprego?

— Sim.

— Não vai poder levar a menina à fábrica.

— Eu sei.

— O dinheiro não é muito, mas conheço alguém que precisa de ajuda.

— Conhece?

— Silêncio! — O grito assustou-a e acordou Helena, que abriu os olhos sobressaltada. Jane acal­mou-a com carinhos suaves.

— Conversaremos ao amanhecer. — A voz mis­teriosa não passava de um sussurro.

— Obrigada. — Era bom saber que ainda exis­tiam pessoas bondosas no mundo.

A manhã chegou depressa. As outras mulheres ves­tiram-se e saíram para seus variados trabalhos. A mulher que falara com ela na escuridão mantinha-se em pé perto da cama estreita, esperando enquanto Jane trocava as roupas de Helena e pensava onde lavaria as flanelas usadas ao longo da noite.

— Sobre o trabalho que mencionei...

Ela levantou a cabeça. A dona da voz era pouco mais que uma menina com grandes olhos cor de violeta e cabelos dourados presos numa trança.

— Sim?

— É para a sra. Hollister no Hotel Silver.

Alguém atrás dela riu.

— E acha que ela vai permitir uma empregada com um bebê?

— Uma das outras garotas também tem um filho.

— O que terei de fazer? — Jane perguntou.

— Criadas de hotel fazem um pouco de tudo. Arrumam camas, aquecem água e coisas desse tipo. O problema é que ninguém aceita trabalhar para Hollister, porque a fábrica paga melhor.

— Pois bem, eu aceitarei o emprego. Aceitarei o que for preciso. — Não tinha escolha. — Hotel Silver, você disse?

— Fica longe daqui, na parte mais bela da ci­dade. Eu mostrarei o caminho.
— Obrigada pela ajuda.

Às sete, Jane esperava pela sra. Hollister na cozinha do hotel. As cozinheiras e outras empre­gadas moviam-se apressadas como se nem notas­sem sua presença.

Às sete e meia a mulher apareceu, e Jane cons­tatou que ela não era nada parecida com a tirana que imaginara. Tinha cabelos castanhos com mechas grisalhas e um corpo alto e esguio. Tudo em sua aparência sugeria sobriedade, da expressão branda ao vestido preto com gola branca.

— Quer um emprego? — ela perguntou com tom seco diante das outras.

— Sim.

— O que sabe fazer?

— Tudo que for necessário.

— Esse bebê é seu?

— Sim. O nome dela é...

— O que pretende fazer com ela?

— Preciso de um emprego onde possa mantê-la comigo. Ela nunca chora. Não causa incômodo algum.

— Qual é seu nome?

— Jane Bennet.

— É viúva?

— Sim, senhora — mentiu.

— Há quanto tempo?

— Há quatro meses.

— Nesse caso, creio que não vou precisar me preocupar com a possibilidade de envolver-se com os hóspedes.

Jane sentiu o rosto queimar.

— Não, senhora.

— Vamos fazer uma experiência até o final do dia. Se não atender às expectativas, não vai re­ceber e terá de ir embora. Se trabalhar bem, re­ceberá dois uniformes que terá de lavar e passar, uma refeição por dia e o salário inicial. Aceita?

Não tinha escolha.

— Sim.

— Há uma planilha sobre a mesa. A partir dela saberá quais quartos estão ocupados, e à que horas os hóspedes desejam que seus aposen­tos sejam limpos.

— Sim, senhora.

— Vou inspecionar os quartos que arrumar. Não quero encontrar pregas nas roupas de cama nem poeira nos móveis. Os penicos devem ser esvazia­dos e lavados, as lamparinas devem ser limpas e as toalhas, trocadas.

— Sim, senhora.

— Venha comigo. Se não souber ler a planilha, terá de...

— Eu sei ler.

A mulher levantou as sobrancelhas.

— Nesse caso, pode vir comigo.

Ao virar-se para segui-la, Jane viu que uma das garotas sorria para ela com ar encorajador.

A sra. Hollister explicou a planilha rapidamen­te e deixou-a sozinha.

Jane improvisou uma tipóia com um cobertor de Helena e prendeu-a junto ao peito. A uma da tarde já havia limpado dezessete quartos. O Silver era um estabelecimento renomado e de grande prestígio. Hospedara-se em excelentes hotéis nas poucas oportunidades em que o pai permitira que o acompanhasse em suas viagens de negócios, e estivera em locais tão amplos e elegantes quanto aquele onde agora trabalhava.

Sara, a jovem criada que sorrira para ela na cozinha, demonstrou como a sra. Hollister gosta­va das camas, e Jane não precisou de uma se­gunda explicação.

Jamais havia varrido, limpado ou executado qual­quer uma das tarefas cumpridas naquele dia, mas o trabalho conferia um sentimento de satisfação. Estava lutando pela sobrevivência com honestidade, e era bom sentir-se verdadeira outra vez.

Na hora do jantar, quando a sra. Hollister apa­receu na cozinha, dirigiu-se a Sara, em vez de falar com Jane.

— A moça fez um bom trabalho, Sara. Pro­videncie uniformes para ela.

E deixou o aposento tão repentinamente quanto chegara.

— Você passou no teste — outra criada comentou. O nome dela era Elizabeth. — Como pode ver os uniformes são pretos. Uso roupas escuras há tanto tempo que já nem me lembro das outras cores. Meu marido morreu em um acidente numa mina antes do nosso bebê nascer.

Elizabeth parecia tão jovem, que era difícil acre­ditar que já fosse viúva.

— Sinto muito — Jane falou, imaginando onde estaria a criança.

— É difícil. Meus pais morreram, e só tenho uma irmã. Às vezes sinto vontade de pegar meu bebê e desaparecer deste lugar, mas não sei para onde ir, e não conheço nenhum outro lugar onde possa trabalhar e ganhar um pouco mais.

— Os primeiros dias são os mais difíceis — Sara opinou. — Depois disso vai se acostumar.

— Tenho certeza que sim — Jane respondeu. Qualquer coisa era melhor que passar dias e noi­tes sentada num trem, sem poder se deitar nem mesmo para dormir.

— Onde trabalhava antes? — Sara perguntou.

— Bem, eu... — Pensou em dizer a verdade, mas sabia que não seria aceita se confessasse ja­mais ter trabalhado. — Trabalhei para uma fa­mília em Hertfordshire. Cuidava da casa. — Pelo menos não era uma completa mentira. Administrara a casa dos Bingley nos últimos meses. A ideia le­vou-a a imaginar como Mary estaria se saindo sem sua ajuda. Charles havia dito que a mãe preci­sava de auxílio para descansar mais e encontrar os amigos.

Talvez tivessem de receber com menos freqüência. Ou Charles encontraria uma governanta... ou uma esposa...

— Se carregar o bebê amarrado às costas, o cansaço será menor — Elizabeth explicou.

Jane sentiu-se grata pela distração.

— É mesmo?

— Sim. É o que faço com meu menino.

— E onde ele está?

— Deixei-a com minha irmã. Odeio deixá-lo, mas ele está ficando grande demais para ser car­regado o tempo todo. Minha irmã mora numa fa­zenda, e vou visitá-la nos dias de folga.

Jane sentiu vontade de chorar. O que faria quando Helena ficasse grande demais para ser carregada? Não queria pensar nisso. Recusava-se a pensar.

— A sra. Hollister está sempre precisando de empregadas — Elizabeth explicou. — As garotas desistem do trabalho para se casarem, ou trocam ou hotel pela fábrica. E as da fábrica também abandonam seus empregos sem a menor hesita­ção. Eu, por exemplo, abandonaria este hotel sem olhar para trás se um fazendeiro ou rancheiro me pedisse em casamento.

— Eu também — Sara concordou rindo.

— Também vai acabar se casando outra vez, Jane. É a moça mais bonita que vi desde que vim trabalhar aqui.

— Oh, eu não sei — Jane protestou. Mas não abriria mão de Helena. Se tivesse de aceitar um casamento a fim de cuidar dela, aceitaria sem hesitar.

A mente invocou a imagem de Charles. Seria capaz de casar-se com um homem que não amasse pelo bem da filha? Baniu a lembrança da mente e terminou de jantar. Ainda precisava aquecer muitos litros de água e levar aos quartos dos hós­pedes que se preparavam para deitar.

— Podemos deixar o trabalho às nove e qua­renta e cinco. E temos a noite de sábado ou do­mingo de folga — Sara explicou. — Nós nos revelamos para que todas possam passar algum tempo com seus namorados e maridos.

— Meu tempo livre é todo dedicado à meu filho — Elizabeth suspirou.

— Para mim não importa. Tirarei folga aos do­mingos para que as outras possam ter a noite de sábado livre.

Sara e Elizabeth agradeceram sorridentes.

Quando Jane deitou Helena a seu lado na cama estreita, o corpo doía mais que na noite an­terior. Mas fora até ali e encontrara um trabalho. Mais uma vez imaginou por quanto tempo poderia manter a filha com ela enquanto trabalhava.

E mais uma vez a imagem de Charles invadiu sua mente.

A lembrança dos beijos ardentes e das carícias excitantes estariam sempre com ela. Jamais esque­ceria o rosto sorridente e relaxado que conhecera no dia do piquenique. Se já não o amasse, teria se apaixonado naquele dia. Charles era incomparável.

Sabia que o mundo estava repleto de homens bonitos e atraentes. Alguns eram bondosos e tal­vez até encontrasse um capaz de amá-la e prote­gê-la. Mas não haveria outro Charles. E por isso não poderia se casar. Não poderia passar o resto de seus dias vivendo com outro homem, dormindo em sua cama e tendo seus filhos, enquanto o coração sangrava por Charles. Era ele que amava. Era ele que desejava. E era ele que jamais poderia ter.

Se fosse preciso, voltaria ao trem e iria procurar trabalho ainda mais longe, a oeste dali.

Jane mergulhou num sono pesado. Sonhou com um homem de cabelos e olhos claros. E acor­dou uma hora mais tarde com o som dos gritos estridentes e o cheiro sufocante de fumaça.


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