Abdication escrita por oakenshield


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Eu realmente espero que vocês estejam gostando. Se não houver muito retorno não haverá outra alternativa que não seja cancelar a fanfic. Então comentem, ok? Ok.



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Naquela noite Melanie ficou na sua casa. Pela primeira vez em dois anos ela dormiu em um colchão, que por mais que a mãe dissesse que era duro, para ela parecia feito de penas.

– Depois de dormir nas pedras da calçada nada mais é duro para mim - ela disse a Valentina.

Por sorte não houve batida. Caso contrário ela teria que sair correndo.

Melanie vive em Frömming, o maior país do continente Manske. Mais especificamente no norte de Frömming. Antes da Grande Guerra havia países, estados e cidades. Hoje em dia há países, cidades e setores. Cada cidade é dividida em vários setores, dependendo do tamanho dela, e cada setor é responsável por alguma coisa que contribui para a sociedade. Alguns setores produzem alimentos, outros eletrodomésticos, alguns trabalham na tecelagem, há também os setores jornalísticos, militares, o da família do Senhor de Meurer e etc. Cada setor recebe um nome, mas os setores mais pobres são organizados por números. O setor em que ela costumava viver é o 7, um dos setores de produção de armas.

Melanie se lembra de quando era menor e a sua madrinha roubava algumas armas e as trazia para casa. Ela ensinava Melanie a atirar, usando o silenciador, é claro. Se ela não roubasse também alguns silenciadores a polícia logo estaria ali. A morena aprendia rápido. Apesar de que a maioria dos roubos de Jessica Palmer fosse de armas de fogo, Melanie havia adquirido uma habilidade especial para lidar com facas. Jessica dizia que quando a morena entrasse para o PMI, se algum dia entrasse, seria uma das melhores. Melanie acreditava nisso e começou a sonhar com o dia em que completaria dezesseis anos e que poderia se inscrever para fazer a prova. Ela pensou que tudo pudesse dar certo...

Até que ela perdeu o seu identificador.

Melanie tinha quinze anos. Os soldados chegaram de repente para fazer a batida, como sempre. A batida consistia na revista pela casa em busca de objetos roubados, pessoas doentes e algumas pessoas que viviam ser identificador. O identificador de uma pessoa é tudo o que ela é. Se algum dia ela o perder não há segunda via, não há nada para ela que não seja um destino nas sombras dos becos. Com Melanie foi assim. O seu identificador simplesmente sumiu e ela teve que sair fugida. Alguns soldados procuram pessoas sem identificador nas ruas. Pessoas trabalhadores que viraram mendigas e outras que já nasceram assim e não puderam abrir mão de boa parte do seu dinheiro para pagar por um identificador.

Foi horrível. No começo ela chorava todos os dias sem parar. Ela conheceu uma garota que a ajudou a conseguir comida por um tempo. A garota disse que Melanie era bonita e que a única chance de ela conseguir comida suficiente para sobreviver era se prostituindo. As duas costumavam fazer programas durante a noite nas ruas mais movimentadas, até o dia em que a garota nunca mais voltou. Simplesmente sumiu. Ela era bem nova, devia ter uns treze ou quatorze anos. Não muito mais do que Melanie.

A vida é realmente muito cruel, mas Melanie nunca reclamou. Ela está viva e isso bastava.

Depois de passar muito tempo pensando na rotina que teria que retomar amanhã, Melanie acaba dormindo.

+++

Melanie acorda com um cheiro de pão invadindo o seu antigo quarto. Pão quentinho, novo, macio... tudo o que ela precisava.

Ela escovou os dentes no banheiro e voou para o quarto de Derek. Ele ainda estava dormindo, então ela deixou um beijo na sua bochecha pálida e partiu para a cozinha. Jessica Palmer estava lá.

– Bom dia - ela beija a madrinha.

– Melanie, querida! - a senhora de cinquenta anos sorri. - Que bom vê-la novamente.

Jessica Palmer tem cabelos loiros escuros, olhos verdes musgos, pele levemente bronzeada e poucas rugas ao redor dos olhos, lábios finos e sorriso amigável.

Melanie pega um pão e o morde com tanta vontade que parece que ela nunca havia o comido na vida. É o melhor pão que ela havia experimentado em dois anos.

– Como estão as coisas? - Jessica pergunta.

– Vou levando - Melanie dá de ombros. - Onde está minha mãe?

– Foi trabalhar. Hoje é meu dia de folga, então vim cuidar do seu irmão.

A morena abaixa o olhar.

– Ele vai mesmo morrer?

– Eu espero que não - Jessica fala -, mas não como sermos confiantes, não é mesmo? Só um milagre de Deus para curá-lo.

– Depois de tanto tempo você ainda acredita Nele?

– Você não? - a madrinha se espanta.

– É difícil para alguém como eu continuar a acreditar - ela responde, ainda mordendo o pão com ferocidade. - Pelo menos Ele me manteve viva. Com que propósito eu não sei, pois sou totalmente inútil nesse mundo.

– Não diga isso, Melanie. Todos temos um propósito.

– Você também não devia acreditar. Não dizem que Ele é quem faz tudo acontecer? Pois bem. A Praga levou o seu marido, o seu filho e o seu pai. Levou o meu também e agora está levando o meu irmão. Ele criou essa maldita praga.

– Não é assim - Jessica balança a cabeça. - A Praga não é algo natural.

– Como você pode saber?

Jessica não podia contar a verdade. Havia prometido segredo a Valentina.

– É melhor eu fazer mais café - a senhora caminha até a pia. - Esse esfriou.

– Não precisa mais. Eu estou indo embora.

– Melanie, por favor...

– Diga ao Dek que eu deixei um beijo.

Melanie pega o cobertor azul que dormiu ontem e se esgueira pela porta de tela dos fundos, rasteja até a casa ao lado e vai se escondendo em tudo que consegue. Não é muito difícil para ela encontrar esconderijo, pois é alta e magra como ninguém. Quando chega perto da floresta da fronteira, ela se encosta em uma árvore para descansar. Depois disso, ela chora.

– Que inferno...

Ela chora pela morte do seu pai, chora por não poder ajudar a família, chora por saber que Jessica esconde segredos dela e chora pela iminente perda do irmão. Está claro que Derek vai morrer e que a estimativa de cinco meses é algo muito otimista para o caso dele. Em algumas semanas, provavelmente, ele não resistirá.

Cansada de chorar, Melanie seca as lágrimas e se levanta. Ela coloca a coberta nas costas e caminha em direção ao centro da cidade. Seus pés começam a doer e ela para em frente a uma padaria só para descansar um pouco. Assim que se senta, os telões do centro de Meurer se acendem e todas as pessoas param o que estão fazendo, militares marcham para todos os lados e o símbolo da família real aparece nos telões. O leão imponente de juba avermelhada olha para o nada, seus olhos negros tão vazios quanto um buraco. Porém o hino de Frömming começa a tocar e quem não estiver de pé de postura ereta, com a mão direita sob o peito e cantando será preso. Melanie já viu muito disso nas ruas.

Mesmo com os pés doloridos, ela fica de em pé. Ela pressiona os dedos sujos por causa da calçada sob o peito e descola os lábios, fingindo que está cantando. Enquanto isso, ela olha ao redor. Todas aquelas pessoas cantando o hino de uma nação que não amam, adorando uma família que não faz nada por eles. Todas aquelas pessoas que trabalham para sustentar pessoas que não ligam se eles estão vivos ou mortos, pessoas que roubam o dinheiro do povo para fazer viagens, gastar em roupas e coisas caras enquanto os mais pobres morrem em filas nos hospitais, morrem de fome, congelados durante o inverno do norte...

Isso a indigna tanto que ela sente vontade de vomitar.

– Ei - um militar para na sua frente. - Eu conheço você.

Ele tem os cabelos loiros bagunçados e um pouco compridos para um militar, olhos azuis, pele bronzeada, nariz comprido e usa a roupa de um treinador do PMI: um conjunto azul escuro com um cinto preto e três estrelas douradas no lado direito do peito em cima do leão de juba avermelhada dos Archiberz.

– Desculpe, mas creio que nunca o tenha visto - ela responde, ainda com a mão no peito por causa do hino.

– Você não parece frequentar os mesmos lugares que eu... - ele analisa a calça jeans clara surrada dela, a blusa fina vermelha de mangas e os tênis escuros e batidos. Além disso, ela está com uma coberta azul nas costas, os olhos borrados por causa das lágrimas de mais cedo e os cabelos ainda despenteados. Ela realmente parece uma mendiga. - Porém eu sei que a conheço.

O olhando assim, finalmente o reconhece.

– Ah, você é um dos meus clientes, imagino.

Ele olha para ela e sorri.

– A do setor Fieldmann, suponho.

O setor da família do Senhor de Meurer. Sim. É ela. Poucas prostitutas se atrevem a ir até lá. Ela assente com a cabeça, concordando.

– Eu lembro de você, sim. Bom, não é fácil te esquecer.

Melanie o ignora. Apesar de bonito, ela sentia um nojo absurdo de todos os homens com quem tinha dormido. Aquele homem, em especial, era o mais nojento de todos. Ela se lembrou dele entre tantos outros porque foi com ele, dois anos atrás, com quem ela havia perdido a virgindade. Não foi nada especial como ela havia imaginado a sua primeira vez. Pelo contrário, havia doído e depois do ato ele havia deixado o dinheiro sobre o cômoda do motel, disse a ela que o local já estava pago e que ela deveria o desocupar em trinta minutos. Foi horrível.

– O que você quer? - ela pergunta, se irritando. Ele não é exatamente um militar e Melanie não entende o que ele está fazendo ali. Alguns dos verdadeiros militares parecem perceber a conversa dos dois e estão se aproximando.

– Quanto que você cobra por essa noite?

Antes que ela possa sequer raciocinar o que ele havia dito, um militar toca o ombro dele, murmura algo em seu ouvido e sai. O treinador do PMI volta a olhá-la e sorri quando o hino termina. Ele retira um cartão do bolso e entrega a ela.

– Vá até o meu apartamento essa noite.

Então ele se retira, sobe no palco que Melanie viu que havia sido montado a pouco. A imagem dele é transmitida em todos os telões da praça principal.

– Como todos vocês sabem, o PMI ocorre a cada cinco anos - ele começa a dizer e a sua voz soa tão alta que ela percebe que há vários microfones escondidos no local. - Depois de meia década, está na hora de retomarmos as nossas atividades. Qualquer jovem entre dezesseis e vinte e cinco anos pode se inscrever para a prova, porém só os vinte melhores serão selecionados.

O loiro a localiza no meio da população e sorri direto para ela.

– Está aberta a 10ª edição do PMI!

O povo bate palmas, urra de felicidade e comemora. Ela entende o porquê de tudo isso rapidamente. Esperança. Esperança dos pais de que seus filhos consigam entrar e conseguir dinheiro enquanto estão no programa, esperança de uma família inteira de que algum jovem consiga se tornar um militar e mande dinheiro para eles. Agora com A Praga, esperança de um irmão que a sua irmã saia do PMI com o futuro garantido para que seja curado.

Irmão. Praga. Cura. Militar. PMI.

Cinco palavras mágicas que despertam Melanie. Jessica sempre disse que ela tinha chances e ela realmente acreditou nisso. Não era preciso pagar uma taxa de inscrição e nem nada. Se ela passasse na prova, por três meses teria um teto para viver, quatro refeições diárias, sua família receberia dinheiro pelo tempo em que ela está lá dentro e tudo poderia ser melhor. Seu irmão poderia ser curado. Sua mãe poderia comprar uma casa em outro setor, conseguir um emprego melhor e viver uma vida digna. Melanie um dia poderia receber do governo um apartamento no condomínio dos militares, como o treinador do PMI havia recebido.

Eu consigo fazer isso, ela diz para si mesma. Eu vou fazer isso.

Esperança.


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Notas finais do capítulo

Espero que estejam gostando. Uhum, uhum. Espero que continuem a acompanhar.



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