Ichigo ficou parado por uns instantes, não tinha certeza do que fazer. Ou melhor, havia algo que ele pudesse fazer? Sentia que não. Sabia que não.

Lembrou-se de como as coisas costumavam ser antes da chegada de Rukia. Tudo estava tão monótono, seus dias estavam cinzentos, como uma fria manhã de inverno, pouco antes da chuva cair. E então ela chegou. E tudo havia mudado tão rapidamente.

Ouviu a porta da casa se fechar. Voltou a si. O homem havia voltado para dentro, enquanto Rukia começara a caminhar. Ele precisava falar com ela. Ela estava se afastando e não apenas metaforicamente, e ele não teve escolha senão ir logo atrás. Chamaria seu nome, se ao menos soubesse o que dizer. Ao chegar no parquinho, perto de lá, viu Rukia sentar-se num dos bancos. Não podia ver seu rosto, estava cabisbaixa.

Ichigo sentiu seu próprio coração apertar. Como podia deixá-la daquela forma? Seja lá o que estivesse acontecendo, era obvio que ela não estava bem. Precisava estar ao seu lado. Precisava lhe confortar de alguma forma.

Contudo, antes que pudesse se aproximar, algo chamou sua atenção. Estava atrás da arvore, próximo ao banco onde a morena havia se sentado. Uma silhueta humana, Ichigo não conseguia ver muito claramente, estava muito escuro, mas tudo em seu corpo apontava para perigo, e quando viu que de fato a sombra parecia que se aproximaria para lhe fazer algum mal, não teve tempo para pensar.

–Rukia! Cuidado! - Gritou em plenos pulmões assustando a morena que levantou-se rapidamente. A sombra havia sumido, mesmo que ele não tivesse visto como. Aproximou-se dela depressa.- Você tá bem? - Perguntou preocupado, tentava encontrar seus olhos, mas ela insistia em não olhar em sua face. Estava chorando? - Você está...- Ele começou fazendo menção de tocar seu rosto, ela afastou-se.

–Eu estou bem. - Ela disse enquanto rapidamente passava as mão em suas bochechas e enxugava as lagrimas. - Você não deveria estar aqui. Vá para casa. - Ela disse de forma fria. Ichigo não conseguia entender, por que ela estaria agindo daquela forma?

–Como assim? Você foi quase atacada, e sou eu quem precisa ir pra casa? - Perguntou. - E quando vai olhar em meus olhos?- Indignou-se segurando em seus ombros, forçando-a a olhar para ele. Seus olhos estavam vermelhos e vazios. - O que está acontecendo? - Perguntou cuidadosamente. Rukia suspirou.

–Você precisa sair daqui. - Ela disse mais uma vez negando seu olhar.

–Eu não vou sair daqui até que você me explique o que aconteceu com você. - Ele insistiu, falou firmemente e ela finalmente olhou em seus olhos.

–Não posso colocar sua vida em perigo também! - Ela disse finalmente, Ichigo via em seus olhos um desespero, uma tristeza e culpa tão grandes que não pôde sequer perguntar o porque. - Apenas faça o que eu digo, saia daqui o mais rápido possível! - Ela disse enquanto se libertava dele.

–Mas...- Ele tentou argumentar.

–Apenas vá! - ela gritou. - Eu não posso... Eu não quero mais que você fique perto de mim!- Rukia disse, tinha uma expressão séria em seu rosto, e as palavras que saíam de sua boca pareciam esfaqueá-lo no peito.

Foi então que aconteceu, rápido e fatal como um trovão. Ichigo mal viu o que aconteceu, agiu antes de pensar. Quando percebeu, outra vez a mesma pessoa que vinha para machucá-la. Sentia um liquido quente escorrer por seu abdômen, o que havia acontecido? Estava sangrando? Sentiu suas pernas fraquejarem e a dor ao despencar no chão. Ao menos viu seu rosto, ela estava a salvo.

Mesmo antes de perder a consciência, viu algo que talvez fosse apenas um delírio, Rukia estava armada com uma espada não muito longa. Ela parecia se preparar para atacar seu agressor que Ichigo já não mais podia dizer se era um homem ou mulher. Estava tudo tão... confuso... E então, mesmo que se esforçasse para continuar vendo-a, assim como a primeira gota fria da chuva tocou sua pele, sua visão escureceu.

***

Rukia sentiu como se seu coração tivesse parado por um instante. Tudo acontecera tão rápido, e tão de repente Ichigo estava no chão, sangrando, por sua culpa, por tentar protegê-la. Como ele podia ser tão irresponsável com a própria vida? Não podia deixar que ele morresse, não assim, não por sua causa. Mas antes tinha uma batalha para terminar.

Sacou rapidamente a espada que estava escondida sob sua jaqueta e preparou o ataque. Precisava ser rápida, precisa em cada instante. A mulher à sua frente tinha um sorriso sádico em seus lábios e era tão ágil que Rukia não podia se deixar distrair nem por um instante.

Investiu num golpe aberto. Ela desviou e se Rukia não tivesse sido igualmente veloz, não conseguiria escapar do ataque dirigido a si. Não tinha tempo para refletir, num outro segundo a mulher de unhas grandes e afiadas como laminas, tentou outro ataque, dessa vez por suas costas. Jogou seu corpo para a frente e tentou desviar. Havia saído com um arranhão não tão profundo em seu braço direito.

Concentrou-se na força. Precisava acabar com isso de uma vez por todas. A outra vinha com um ataque de repente pela frente agora, e por poucos instantes de diferença Rukia não teria sido capaz de desviar agachando-se e prontamente esfaqueando-a no coração. Estava acabado. O corpo caiu logo à sua frente com seus olhos já sem vida e pequenos espasmos ainda tentando reagir de alguma forma.

Por mais que quisesse observar cada instante de seu sofrimento em vingança pelo que havia feito, Rukia tinha algo mais importante para fazer. Finalmente podia correr em sua direção. Abaixou-se ao seu lado. Checou, imediatamente seus sinais vitais. Respirou em alivio quando soube que o ruivo ainda respirava. Sentiu as gotas quentes em seu rosto misturarem-se com as frias que vinham do céu. Mal havia notado quando as lágrimas começaram a cair. Elas agora eram incontroláveis.

–Você está bem.- Ela disse sorrindo entre soluços. - Que bom...- ainda chorava quando aproximou-se e beijou sua testa. - Que bom.