Sobrevivência do mais forte. escrita por Léo Veronezi


Capítulo 20
Capítulo 20 - O herdeiro.




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–--------------------------------(Coloquem para tocar “Animals – House of Rising Sun)------------------------------------------

O soar daquele sussurro fez Hellyster cair ajoelhado e tremendo. A aura de medo fez o mesmo com a maioria de nossos companheiros, ninguém conseguia dizer uma única palavra, apenas assistiam aquela cena que deveria ser vitoriosa, mas de alguma forma era terrível. Demorei para perceber que eu também estava resistindo ao impulso de fugir, assim como meu irmão que já estava com os olhos arregalados de medo. Se antes houvessem me dito que filhos de Hades podiam ter medo das sombras eu daria risada, mas essa situação me provará o contrário.

O elmo movido por sombras, que pareciam apostar corrida entre elas, acabava em dois chifres curtos e fechavam apenas deixando à mostra os olhos de Du e seus dentes, demonstrando um sorriso igual a de um psicopata maníaco. Uma capa o acompanhava, escura como as noites sem estrelas ou Lua, em sua mão Ultimum estava no mínimo 50cm maior e a joia escura do cabo vibrava enlouquecidamente. Ele parecia papai, ele quase parecia um deus.
Foi então que Hellyster constituiu suas forças, provavelmente em uma última explosão de adrenalina, ergueu sua Katana de gelo e partiu para o ataque.
–NÃO, VOCÊ É SÓ UM RATO DO SUBMUNDO, NÃO PODERIA ME VENCER NUNCA. – Gritou e girou sua Katana em um arco no ar, cortando o vento diversas vezes e jogando uma saraivada de cortes congelados em direção de Du. Logo em seguida, fez um movimento horizontal que elevou dois Golens de 5 metros totalmente brancos, como aqueles que Du havia enfrentado.
No mínimo 15 laminas congeladas voavam em direção de Du e os Golens já chegavam perto dele quando o filho de Hades reagiu.
–Desapareça. – Então Du girou Ultimum no ar e uma onda de sombras silenciou tudo, fez a saraivada de gelo sumir e os gigantes evaporarem. Hellyster ainda sim investiu com sua Katana mirando o peito de Du, porém o filho de Quione parou abruptamente. Consegui entender a situação apenas alguns segundos depois. Hellyster estava sendo preso por “mãos’’, mãos feitas de sombras, segurando seu corpo por inteiro. A voz de Du, que já estava totalmente diferente do mesmo, ecoou novamente pelo vale.
–Você já fala demais, filho da neve. Isso acabou agora, vai aprender a temer e respeitar as sombras da pior forma possível, sendo uma delas. –
Du levantou Ultimum e Hellyster foi erguido pelas mãos, se debatendo desesperadamente tentando escapar daquela prisão de escuridão. Quando totalmente erguido, Du baixou Ultimum e a cravou no chão uma última vez naquela noite. As sombras que saltaram do chão estavam formadas como lanças e perfuraram Hellyster Snowduck de todas as direções possíveis. Um último gemido foi solto da boca do morto e sangue explodiu entre as lanças sombrias. Ouvi ao meu lado alguns companheiros gritarem e outros vomitarem, Nick caiu de joelhos mas não desprendeu os olhos daquela cena.

O corpo morto e ensanguentado de Hellyster foi descendo de forma devagar até encontrar o chão e se fundir com o mesmo, logo Hellyster havia sumido da face da terra, deixando apenas sua Katana que aos poucos foi ficando tão transparente a ponto de sumir.

Todos olhavam para a cena totalmente espantados, alguns haviam se rendido ao chão, outros se afastavam passo a passo. Corujinha se escondia atrás de Nick, chorando muito, desesperada e com as mãos no ouvido. Jhon, Frances e Ju imitavam o gesto, com o olhar apenas refletindo medo, mas Thalia os consolava. Alguns dos campistas sobreviventes saíram correndo em direção do bosque de árvores congeladas. Os conselheiros tentavam se manter fortes, de pé para seus companheiros, mas Giu e Pietro se abraçavam ajoelhados cansados e com o rosto cheio de traços secos de lagrimas. Annabeth estava com a cabeça mergulhada no peito da armadura de Percy e o filho de Poseidon mantinha o olhar firme no outro lado do campo. Stephan Martinato continuava cuidando de Dan que jazia deitado ao lado de Anna, junto de Erick Lighfeet e Helon que ajudavam nos cuidados médicos, mas nem por isso deixavam de olhar para a figura obscura que estava ali no campo. Marylin e Alex, os filhos de Zeus, também mantinham o olhar firme naquela direção, mas não se permitiam fraquejar o mínimo diante daquela situação. Cassandra, a conselheira de Deméter caminhava calmamente até uma árvore congelada e aos poucos a mesma ia ganhando vida e descongelando.

Ao lado de Pettrick estava o filho de Deimos, fuzilando Du com os olhos fortes e raivosos, a garota sentada na cadeira de rodas mantinha a mesma expressão neutra, ela parecia uma vegetal. Parada, sem expressão, estranha. Seus olhos ainda exalavam uma aura roxa, mas parecia cada vez mais cansada. O irmão vivo de Simon permanecia ali, cheio de ferimentos, mas com a pose militar e expressão morta. Pettrick encarava aquilo tudo com nojo e ódio de tudo aquilo, não demoraria muito para ele ter que lutar, não demoraria muito para Percy acabar com a raça dele.

Foi então que algo muito ruim aconteceu.
Du saltou como um raio em direção do grupo inimigo, meus olhos apenas o encontraram quando ele já estava à 2 metros de Pettrick com Ultimum mirando sua cabeça com um corte na horizontal. Mas Pettrick já havia erguido suas duas espadas curtas e desviado por pouco do corte. Ele saltou para trás e seus olhos azuis brilharam de ódio.
Du já havia se recuperado do erro e então uma lamina cruzou seu caminho, quase arrancando-lhe o braço, por pouco uma sombra se ergueu ao seu auxilio. Era Panic, o filho de Deimos em combate.
Du girou e partiu para cima do chefe punk.
–----------------------------------------Du, é o narrador a partir de agora. ---------------------------------------
“Eu sou indestrutível, eu sou onipotente, eles não podem me vencer, ninguém pode.
Uma lâmina roxa que transmite pânico, tão inofensivo para algo como eu.
Minhas sombras irão inundar esse garoto insolente aos poucos e depois vou exterminar o filho de Zeus.’’
Minha espada foi interceptada e aonde devia estar apenas o filho de Deimos, encontrava-se também Pettrick, os dois haviam cravado suas espadas em minha lamina para segurar o impacto. Sorri de soslaio e com minha outra mão, ergui uma sombra em força de espinho que seguia em direção do filho de Zeus.
Os dois traidores executaram força e jogaram minha lamina para o lado, Pettrick desviou rápido demais do espinho e o filho de Deimos recuou.
–O QUE FOI FILHO DE ZEUS? FINALMENTE ENCONTROU ALGUÉM MAIS FORTE, NÃO É? – Gritei, mas... aquela não era minha voz. Onde eu estava? Eu... Eu sou forte demais.
–Você é muito imprudente, Edward. Sempre se achou o mais forte, sempre o mais incrível, não é? Mas nunca deixou de ser impulsivo, isso o torna burro. É uma pena, você seria um ótimo aliado. – Pettrick dizia aquilo na maior tranquilidade, mas aí eu entendi o porquê. Senti meus sentidos gritarem, mas já era tarde demais, Pettrick ergueu o braço e quando entendi, só tive tempo de erguer minha espada mas o raio explodiu em minha cabeça, fazendo tudo simplesmente sumir em um clarão.

–--------------------------------------------------Léo volta a narrar. --------------------------------------------------
O raio de Pettrick foi o último ingrediente para transformar aquele acampamento em uma cena de histórias de terror, as árvores e a grama congelada com sangue derramada por ela, corpos estirados em algumas regiões mais distantes, a Lua em seu auge, o som de choro e gritos ao fundo, o cheiro constante de morte e a movimentação agressiva das sombras ao nosso redor.
O raio atingiu Du na cabeça em cheio, transformando a noite escura em um espetáculo de cores, gerando uma guerra imaginaria entre o azul e o preto. Um som ensurdecedor tomou conta do ambiente, fazendo todos recuarem. Mas uma sensação de desespero e dor explodiu em minha cabeça, não sei o porquê, mas tapei meus ouvidos e cai de joelhos. Eu estava desesperado, o chão congelado machucava meus joelhos mas não se igualava a dor em minha cabeça. Sinto algo molhado e liquido vazar de meus ouvidos, sinto o mesmo liquido escorrer do meu nariz em direção a minha boca.
O liquido encosta em meus lábios, trazendo consigo um leve gosto de ferro. Meus membros começam a tremer e tudo começa a doer. Aqueles segundos agonizantes que pareceram horas, foram cortados quando eu senti um par de braços me agarrarem. Apesar do mundo estar mudo para mim, fui capaz de ouvir alguém me chamando, a voz familiar me fez acordar daquele transe. Nick me rodou e posou suas duas mãos em meus ombros, seus olhos que agora esbanjavam uma cor dourada foram cravados em mim com força, sua boca se movia e pude ler seus lábios... “Maninho…Maninho, acorda!’’

O mundo voltou a ter sentido, balancei minha cabeça e passei rapidamente o braço em meu nariz para limpar o sangue que escorria do mesmo. A noite voltava a tomar sua penumbra e com a ajuda de Nick, me pus de pé. Ele mantinha o mesmo olhar preocupado em mim.
–Ei, você tá bem? – Disse ele com muita tensão na voz. Chacoalhei a cabeça novamente, tentando retomar consciência por completo.
–Eu... O que houve? Parece que meus pensamentos começaram a se espancar do nada. – Eu olhei para todos, que agora, estavam ao meu redor, mas não olhando para mim. Olhando para frente. Nick baixou o olhar e dirigiu pesadamente os olhos para frente.
–Léo... um raio caiu em cima de Du... Ninguém foi ver como ele está ainda com medo...– DU! Minha cabeça organizou tudo de uma vez e disparei em direção à onde o raio havia caído, aonde só permanecia um corpo estirado dentro de um buraco, parecido com aqueles que abrem quando cai um meteorito ou coisa parecida. Pettrick e seus outros 3 companheiros já estavam no alto da colina quando a névoa os encobriu.
Do corpo estirado ainda subia uma leve fumaça que ia se fundindo com o céu alaranjado, buscando liberdade daquele campo congelado aonde daria muito trabalho a morte. Escorreguei na lateral da cratera e fui me aproximando aos poucos do corpo, todas as sombras haviam deixado seu corpo e agora só jazia partes estilhaçadas de sua armadura de ferro estígio, apesar do frio da madrugada e o ar úmido o corpo emanava calor e cheirava a queimado. Agachei ao lado de Du e reparei que havia começado a chorar.
Alguns segundos depois, na beira da cratera apareceram Stephan e Percy que iam se aproximando em silencio, quando eu os senti, sequei as lagrimas e olhei para os dois. Me receberam com um sorriso acolhedor e preocupado, Stephan sentou-se ao lado de Du e começou, com muita cautela, virar o corpo de Du e então procurei com o olhar sua espada, Ultimum. Quando Stephan virou o corpo por completo, ele olhou para baixo e Percy suspirou pesadamente, seu braço direito aonde devia estar Ultimum, acabava em seu cotovelo. O rosto de Du estava queimado quase por completo, totalmente desfigurado, Stephan colocou a mão no coração e esbanjou uma expressão de alivio.
–Ele está vivo. O coração bate normal. Creio eu que esteja em coma. Precisamos de uma maca e levar ele para tratamento urgente. – Disse Stephan ainda analisando o corpo com os olhos. Ele está vivo. Ele vai viver. Eu sei que vai. Percy levantou-se e começou a falar:
–Tudo bem, vou mover os sobreviventes e falar para Cassandra dar um jeito em todo esse gelo, daqui a alguns segundos alguém irá vir busca-lo. – Seus olhos verdes pousaram em mim com generosidade, consegui esboçar um leve sorriso. –Que tal ir comigo Leo? Todos precisam se mover. – Eu assenti e sem tirar os olhos de Du, levantei e sai da pequena cratera. Olhei para o grupo de sobreviventes, deviam ter no máximo 25 heróis, um número super reduzido de todos que haviam se dedicado a proteger o acampamento com suas vidas.

Olhei em volta e seguindo a nossa esquerda, vi diversos corpos estirados, aonde a batalha principal havia acontecido. Precisávamos dar um jeito em tudo aquilo, eles eram heróis, não podiam apenas ser ignorados como se já tivessem exercido sua função. A grama ia aos poucos derretendo e tomando a cor esverdeada, talvez a morte de Hellyster tenha ajudado com o descongelamento, o chalé de Ares e de Atena estavam em ruinas em alguns pontos do bosque era possível ver algumas chamas se extinguindo aos poucos. Apesar de toda aquela situação e das diversas experiências para uma noite, todos se mantinham de pé, posando de forte. Procurei Nick com o olhar, ele estava de pé olhando em direção uma colina ali próximo, aonde ficavam os campos de morango, que agora se tornaram campos de neve. Uma névoa leve tomava conta de tudo aquilo, estava frio mas minha armadura retinha bastante calor que chegava a me incomodar, finalmente soltei a lateral da armadura e o peitoral foi cedendo aos poucos, meu capacete havia ficado em algum lugar ali, depois eu teria tempo de procurar. Quando o peitoral de minha armadura tocou o chão, o frio convidado a me refrescar fez bem seu trabalho, meu corpo inteiro relaxou e senti meus músculos ficando menos tensos. Andei alguns metros até chegar em Nick, ele mantinha o olhar firme, mas estava mais ocupado em seus pensamentos em vez de admirar aquela linda paisagem fria.

–Nick...? – Encostei em seu ombro e ele piscou algumas vezes acordando do transe, olhou para minha mão e sorriu fracamente. –Finalmente um pouco de paz... Como você está? – Ele assentiu levemente e sentou-se na grama, sentei-me ao lado dele e ele começou a falar, primeiro para dentro e baixo, mas foi aumentando o tom e incrementando com medo as palavras.

–Léo... Eu não consigo... Eu nunca sequer matei um monstro em toda a minha vida, sempre treinei, treinei e treinei para chegar o dia de pegar minha missão e partir para o mundo enfrentando o que realmente é errado. Mas isso... Eu matei Leo, matei gente que tem o sangue de meus parentes nas veias, isso é certo?! NÃO. NÃO É CERTO. POR QUE ELES ESTÃO FAZENDO ISSO? POR QUE NÓS ESTAMOS REAGINDO? – O garoto se debruçava e chorava descontroladamente, abri meus braços e encostei sua cabeça em meu peito, onde me lembrava aos antigos tempos, quando ele chegava da escola e dizia que uns babacas mexiam com ele, chamavam ele de gordo e os caralho. Um dia eu fui confrontar esses garotos e eu apanhei dos três, foi embaraçador.
–Ei... Maninho, eu sei... Eu sei que não parece certo tudo isso que está acontecendo, na verdade não é. Mas esse é o nosso lar, não é? Temos que protege-lo a qualquer custo, de qualquer coisa que tente nos destruir. Aliás, isso é uma família, não é? Não precisamos do laço sanguíneo, gestos e palavras são o que nos conecta. E é claro, a porra divina. – Ele conseguiu sorrir.
–Você acha que o Du vai ficar bem? – disse com receio, meus pensamentos rodavam. Eu tentava não pensar nisso, mas não conseguia sentir a presença de Du na minha cabeça mais. Eu evitei o olhar dele e reuni forças para dizer.
–Não sei Nick... Ele perdeu um braço, seu rosto está todo desfigurado e ele está em coma. Mas é o Du. Precisa de mais de um simples raio para mata-lo. Ele vai ficar bem, eu sei que vai. – Eu infelizmente percebi que tentava mais me convencer disso do que explicar a situação para Nick. –Enfim... Anna, como ela tá? A batalha com a filha de Afrodite acabou com ela. Dan também tá bem? Quero que me faça um favor, fale com Percy para organizar todos os sobreviventes em um círculo na fogueira do acampamento daqui uma hora, tenho algumas palavras para compartilhar. – Ele demorou um pouco para assentir, em seguida se levantou e manteve o olhar no horizonte um pouco mais. Se virou e andou de forma firme, enquanto andava, tive a impressão de sentir as poucas sombras e o leve medo que ele emanava. Sentia uma energia um pouco diferente vindo dele, talvez fosse minha imaginação ou o dom de ser o mais velho. Eu sentia meu irmão se tornando homem.

Acendi um cigarro ali mesmo e traguei de forma lenta mas profunda. A fumaça que subia do cigarro, subia de forma uniforme, cruzando minha visão e desaparecendo segundos mais tarde. Soltei a fumaça em um suspiro longo e senti meus problemas se perdendo com o vento. Colocando na cabeça que aquela fumaça carregava meus problemas e minhas dores, levando-as para longe, para um lugar aonde todos os problemas e dores se encontravam e estraçalhavam-se decidindo qual seria a mais dolorosa. Minha barriga roncou. Quase me esqueci que sentia fome ou qualquer outra necessidade natural durante aquela madrugada, parecia que eu tinha deixado de ser humano por alguns segundos. Por alguns segundos, acreditei ser mais uma sombra domada por aquele espirito sombrio de Du.
Du... O que será que havia sido aquilo... Ele simplesmente sumiu de meus pensamentos por pouquíssimos segundos e quando voltou já não conseguia mais acessar sua mente. Tudo estava mais escuro do que minha visão enxergaria normalmente, nebuloso e amedrontador. Sentia angustia, magoa, dor, raiva e acima de tudo, força.
Ele sempre foi melhor com os talentos naturais... E eu melhor com a espada... Grande dupla somos... Grande dupla éramos...? Me perdi nos pensamentos transtornados, quando acordei do leve transe, senti a sensação de queimação atrás dos olhos e lagrimas de dor escorriam devagar por minha face. As sequei rapidamente e joguei apaguei meu cigarro na grama outrora congelado.

O pequeno grupo não passava de 25 semideuses mesmo, todos tentavam se manter animados por estarem vivos ou pelo menos, de cabeça erguida. Mas havia sido uma noite complicadíssima para todos, sem exceções. Amigos tombados nos campos de batalha, irmãos mais velhos que nunca voltariam para seus irmãozinhos, sensações de terror, desesperança, medo... Sem contar os eventos mais surpreendentes, a ira de Simon, as trevas de Du. Levantamos uma tenda para os feridos, Stephan estava dentro com mais dois filhos de Apolo cuidando de tudo, Cassandra fora ao bosque com Giuliana dar um jeito em todo aquele gelo e ver se existia algum semideus ferido. Os três filhos de Zeus, Marylin, Thalia e Alex foram para o campo de mortos com esperança de encontrar amigos feridos que precisavam de assistência, Nick havia se candidatado a ir e se deixar guiar pela presença da morte. Erick Lighfeet, o filho de Hermes montava uma fogueira ao redor de algumas pedras junto de Frances.
Frances tinha o olhar fraco, mas mantinha a boa postura. Eu havia me esquecido de como ela era forte e ao mesmo tempo tão sensível.
Na enfermaria improvisada, encontravam-se Pietro ajudando Stephan e os demais filhos de Apolo com tudo aquilo, Dan dormindo com alguns cortes de pouca importância, Anna estava sentada na maca conversando com seu primo Jhon. Ju estava deitada em outra maca, sendo atendida por conta de seu ferimento no ombro ter aberto durante a batalha. Du estava isolado no canto com a total atenção de Stephan, talvez ele se sentisse culpado por isso e estaria dando seu melhor e até mais do mesmo para se redimir.
Annabeth lá fora, cuidava dos ferimentos leves nos demais campistas, nada que algumas ataduras não resolvessem. Percy mantinha o olhar distante, desde que eu o conheci, ele havia crescido demais. Imagino para as pessoas que haviam crescido com ele. A barba preta rala e mal feita era algo que lhe dava uma aparência mais adulta, porém seus olhos e suas expressões ainda lembravam o garoto que ele nunca pode ser. Que nenhum de nós pode ser...

Fui surpreendido com uma bolinha branca cheirando a álcool apalpando minha bochecha, que só perceberá agora que estava cortada e ardia levemente, virei meus olhos e encontrei o olhar firme de Annabeth. Senti a mesma sensação que havia sentido antes, algo estava diferente nela... Diferente de forma boa. Parecia mais viva, apesar daquilo tudo.
Ficamos em silencio por alguns segundos até ela iniciar o assunto.
–Ed vai fica bem, Leo. Pode ter certeza disso. Assim como todos nós aqui, já passamos por situações piores. – Percebi que ela tentava mais se convencer, assim como eu com Nick. –Mas ei... Eu sei que sempre fui um pouco cabeça dura com você.. -
–Um pouco? Sinceramente Annie, você é um pé no saco. – Ela deu uma risadinha e continuou.
–Não me interrompa, pré-adolescente rebelde. – Ela descia o algodão por alguns cortes em meu pescoço e sobre meu peito. A situação me deixou extremamente desconfortável, eu nunca imaginaria Annabeth Chase passando suas mãos por meu corpo. É, era uma situação estranha. –Leo... Eu sei que você já sentiu... Mas eu preciso te dizer uma coisa. – Sua voz falhou e aos poucos foi tomando vida novamente.
–Annie, eu sei que não sou seu campista favorito... – Comecei e fui ligeiramente interrompido por seu sorriso e suas palavras
–Não mesmo, tenho Percy em primeiro lugar. – Quando ela disse seu nome, pousou seus olhos sobre ele de forma graciosa e apaixonada. Eles se amavam mais do que qualquer coisa e aquele amor havia crescido e ficado forte junto deles. É lindo.
–Enfim... Mas pode me falar, eu estou aqui. Somos um grande família, não é? – Ela concordou com a cabeça e depois abaixo-a. Levantou o olhar mas firme do que nunca, porém com uma pontada de fraqueza em seu fundo.
–Quer saber, isso pode esperar. Aliás, arranje uma camisa. Pensa que essa situação é boa para você se aproveitar esbanjando seu corpinho transcendendo a puberdade? – Eu sorri com a lateral do rosto. Essa garota me tira do sério.
–Você realmente é um pé no saco, cachinhos dourados. – Ela sorriu e foi embora cuidando dos demais feridos. Arranquei os band-aid’s e ataduras assim que ela se virou, percebi Percy a olhando de forma preocupada e gentil, o que será que havia acontecido entre os dois?
Sai em direção ao chalé de Hades que permanecia intacto, com algumas pontas pouco congeladas, mas intacto. Empurrei as portas de ferro e me deixei sentir o aroma metálico que aquela construção ostentava, as camas permaneciam em sua bagunça natural com peças de roupas todas largadas. As sombras mantinham seus lugares como toda a eternidade, mas pareciam estar mais excitadas, é estranho tentar dizer como elas se sentem.
–------------------------------ Coloquem para tocar – Ed Sheeran – Make It Rain. --------------------------------------------
Atravessei a porta do banheiro e retirei a parte de baixo da armadura, desembainhei Umbra e a coloquei ao lado do boxe. Deixei a agua fria percorrer meu rosto, banhando meus músculos saltados devido a adrenalina do dia e fazendo meus cortes leves arderem de forma quase prazerosa porém tortuosa. Fiquei alguns segundos ali até sentir algo, uma sensação de calafrio que só quem sabe como é estar ao lado da morte entenderia. Sai do banho e coloquei minha camisa do acampamento junto de um shorts, vasculhei o banheiro com o andar e peguei Umbra, não sei exatamente o porquê, mas eu estava com medo.
Quando sai do banheiro vi no meio do chalé uma silhueta escura e encapuzada, era corcunda, como se carregasse uma mochila grande demais em suas costas, em sua mão segurava uma foice de no mínimo 3 metros para um ser de 1,65cm. Quando se virou, esbanjava um sorriso frio e branco, seus olhos tinham rugas nas laterais e tinham a cor do mármore, sua pele era pálida e uma cachoeira de cabelos brancos caiam por seus ombros. Não consegui me mexer por alguns segundos, mas consegui levantar Umbra e deixar minha voz sair com fraqueza.
–Quem é você e por que está aqui? – Perguntei forçando-me a deixar Umbra de pé. O estranho se virou por completo e mantendo o sorriso, falou:
–Como você me vê, Leo? Sou um jovem lindo ou um velho frágil? Um demônio ou um anjo? A libertação ou a prisão eterna? O início ou o fim? Vocês mortais me dão diversos nomes, me dão diversas faces. Me diga como sou para você. – Sua voz era calma, convidativa, sedutora. A voz de um enganador.

–Você me parece um velho, mas não frágil, tem a voz encantadora. Me dá medo e ao mesmo tempo vontade de lutar. – Eu não sabia de onde tinha vindo aquilo, eu simplesmente não consegui mentir. O estranho gargalhou e seus olhos mármores foram cravados em mim novamente.
–Isso é encantador, Leo. Você tem medo de morrer, mas não tem medo de lutar contra a morte e a encara como algo que está distante de ocorrer, algo que não vai ser agora, porém tem dúvidas quanto a isso. Bem criança, esse sou eu. Eu sou Tanatos. O deus da Morte. – Aquelas palavras atravessaram meus ossos como agulhas finas, penetrando carne, musculo e osso por meu corpo inteiro. Senti Umbra fraquejar em minhas mãos, mas logo retomei o controle de minha arma. Tanatos continuou depois de examinar-me. –Bem, você me perguntou porque estou aqui e vou dizer, só abaixe essa faca gigante. – Aos poucos, fui baixando a ponta de Umbra até tocar o chão. –Ótimo mortal, bem, estou aqui por motivos óbvios. Você viu como está lá fora. Tem mais cadáveres meio-deuses do que a uns bons tempos. A última vez que tive um pouco de diversão foi há alguns anos, naquela batalha de Cronos. Tenho de fazer uma boa varredura, aliás, se eu não ficar de olhos atentos, alguém pode escapar do mundo inferior e voltar a vida. Imagina que maluquice seria? Pois é. – Olhei nos olhos mármores com um pouco de receio, eu suava frio, sentia meus músculos gritando por auxilio, em busca de alguma rota de fuga ou meio de batalha.
–Mas o que você quer comigo? Essa visita é mesmo necessária? – Ele me olhou com uma pontada de divertimento.
–Meu caro mortal, sei que lhe dou medo por conta daquele verso. “E nos braços da Morte, cairá.’’ – Recitar aquele verso fez um calafrio tomar conta de meu corpo. Eu lembrava daquelas palavras como me lembro de quando acendi meu primeiro cigarro. –Mas não se preocupe, sua hora não é agora. E venho apenas lhe dar um aviso. Não tenha medo da Morte, meu querido mortal. Muito menos por ser um herdeiro da mesma. – Eu me perdi em pensamentos.
–Herdeiro? Como assim? Meu pai é Hades e minha mãe é mortal. Não entendo o que quis dizer. – Novamente o deus da Morte caiu em gargalhada. Aquilo estava me deixando irritado e fiz a única coisa que parecia prudente. Erguer minha espada e ir em buscas de respostas.
Assim que ergui Umbra e saltei em sua direção, ele não fez um sequer movimento. Sabia que não podia mata-lo, mas pelo menos feri-lo a ponto de me contar algo. Ele é um velho frágil, não deve estar forte. Mirei minha espada em sua costela e quando o ataque iria se concluir, recebi uma pancada amaciada, porém com muita força em meu rosto, atingi a parede de ferro estígio e minha visão desfocou por alguns segundos.
Quando retomei minha consciência, o manto já não estava mais cobrindo o velho e de suas costas, um par de asas negras com uma envergadura imensa brotavam de lá. Presumi que tivesse sido aquilo que havia me acertado.
–Não devia atacar um deus, principalmente quando o mesmo está tentando ajuda-lo. – Ele agora mantinha o olhar sério e a fala rigorosa. –Bem, vou esclarecer algumas coisas para você, pequeno mortal. Por que você acha que consegue falar tão bem com os mortos e até mesmo toca-los? Por que você sente a morte? Como você sente o estado da vida nas pessoas? Você nunca entendeu que é o único filho de Hades com esses poderes? Quer dizer, você e seu irmão. – Aquilo soava quase compreensível. Mas não deveria fazer sentido.
–Du também sente a morte, também sente a vida nas pessoas e tudo isso que você me disse. Como pode me explicar? – Questionei, aquilo fazia sentido.
–Vocês dois tem um elo empático, tudo o que você sente psicologicamente, e quando intensamente, fisicamente, ele também sente. Logo, ele só pode sentir tudo isso, pois você sente. – Minha mente rodava em um turbilhão. –Você, pequeno mortal, tem poderes incríveis dormindo ai dentro, poderes que nunca imaginaria despertar. Claro, não como meu único filho e seu parente, mas a um bom nível. Falando nisso, você irá entender. Como eu disse, não tenha medo da Morte, quando ela chegar, aceite-a de bom grado. E ela não está distante, Leo. – Com essa frase, meu corpo fraquejou por completo. Lutei para me manter de pé e fiz uma última pergunta.
–Senhor... Du está vivo? – Fraquejei e quase algumas lagrimas escaparam. Tanatos não demonstrou nem um resquício de compaixão ou dó.
–Ele está no fio. Isso não vai depender estritamente de mim. - E então Tanatos sorriu uma última vez. –Essa é minha deixa, seu pai odiaria saber que conversei sobre isso com você, aliás, seria quase uma desonra para o mesmo. O fato de você ser um herdeiro meu é estritamente secreto, aliás, até mesmo para alguns olimpianos. Cuidado garoto, você tem um futuro gigante pela frente. Você e seu irmão. Adeus. – Suas asas encolheram para suas costas e com um último bater daquela majestosidade, ele rodou e uma espécie de portão no vácuo se abriu, dando o passagem para sumir do mundo material deixando me naquele chalé mais escuro e frio do que nunca.


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