Depois de um longo tempo deitada na cama finalmente adormeço. Tenho um pouco de medo de adormecer sem antes ouvir a voz e sentir a proteção de Peeta ao meu lado, mas finalmente consegui uma boa noite de sono em paz. Não sonhei com Prim, nem com Rue, muito menos com Finnick ou quem quer que seja. Na verdade já faz quase sete anos que não durmo do jeito que dormi. Eu sempre soube que um dia eu me livraria desse tipo de trauma, mas eu nunca serei inocente do jeito que eu era antes disso tudo que passamos. Acho que meu subconsciente compreendeu que as perdas de nossos entes mais queridos ocorreram e nada vai mudar, não tem por que ficar presa ao passado de tal maneira que não se possa ter prazer em nada que seja.
Na manhã seguinte acordo pouco antes das nove da manhã por conta da claridade rasgando a escuridão das cortinas. Viro para o outro lado da cama e tomo a liberdade de me envolver em seus braços, não me lembro de quando ele chegou, provavelmente logo depois que adormeci, mas ele ousou deitar na minha cama e dormir. Bem, poderia até dizer "nossa cama" já que Peeta e eu voltamos a conviver do jeito que deveríamos desde os primeiros Jogos. Me arrependo cada vez mais de te-lo tratado com tanto desprezo, chegar a duvidar do amor que ele poderia me fazer sentir. Peeta nunca mais foi o mesmo, mas gosto mais desse Peeta, o que me ama do mesmo jeito que o outro e que também pode fazer qualquer coisa para me proteger, o Peeta que sabe usar belas palavras sem parecer vulgar, nem insignificante.
– Katniss. - ouço o pequeno sussurro em meu ouvido. Os poucos pelos de sua barbicha loura fazem cócegas em meu pescoço, é inevitável não rir.
– Peeta... - digo.
– Você dormiu como um anjo, nem parecia você. - diz ele. - Você me ama. Verdadeiro ou falso?
– Verdadeiro. - sussurro. - Mas não conta pra ninguém, é segredo. - ele ri.
– Prometo que só Panem toda vai ficar sabendo. - ironiza ele. Rimos juntos. O jeito que Peeta me olha nunca mudou, mas as sombras azuladas nos seus olhos agora mexem comigo e o beijo que se segue também mexe comigo. Depois de tanto tempo sentindo aquela sensação tão boa dentro de mim, aquele calor e agitação, poderia estar acostumada com tudo isso, mas cada beijo sinto que é cada vez melhor cada vez mais inovadora, como da primeira nos primeiros Jogos. Depois de vestir uma calça e a jaqueta de papai desço e vejo uma mesa cheia de guloseimas a minha espera.
Peeta como sempre trouxe meus pães de queijo quentinhos, como faz todas as manhãs, mas hoje especialmente ele está diferente, e sei que ele colocou alguma coisa nos pães. Como um, dois, três, encontro o que ele colocou dentro do quarto pãozinho, ele me olha sorrateiro esperando que eu abra o papel. Abro o cartão, a primeira coisa que me chama a atenção são aqueles olhos perfeitamente desenhados por Peeta. Dois olhos azuis, duas tranças louras, um sorriso nos lábios rosados e o vestido branco, todos os detalhes que Peeta desenhou me deixaram entre lágrimas.
– Termina de ver, Katniss. - diz ele. Como sempre, ele me abraça e lê comigo o resto do cartão.
O gato e a cabra a acompanham, depois vem algumas ondulações alaranjadas e vermelhas, que acredito ser o fogo, meus olhos e minha trança entre as chamas, os olhos de Finnick, o filho de Annie, Johanna e sua roupa de árvore, Haymitch e sua amada garrafa e finalmente um texto escrito nas mais belas letras de Peeta: "Por mais que tudo isso seja doloroso demais para se lembrar, quero que se lembre dos melhores momentos que passamos com todos, e por cima de toda dor, desejo o melhor aniversário de todos, para a mulher que merece todo o amor do mundo."
Há algo dentro mim guardado, uma mistura de dor, saudade, alegria e amor.
– Peeta, eu nem sei o que dizer... - começo. Posso dizer tantas coisas para ele, mas não sei por onde começar.
– Não diga nada, feliz 24 anos Katniss. - diz ele. Peeta se aproxima cada vez mais, chego a pensar que ele vai me beijar na boca, mas ele me da um beijo na testa e me abraça com toda força, chego até a ficar sem ar.
– 24 Já? - Peeta ri, mas eu nem me lembrava que já iria fazer vinte e quatro anos.
– Sim senhorita. Vamos, você tem muitos admiradores para te parabenizar. - diz ele. - Você não pode faltar aos parabéns do seu próprio aniversário.