Uma Noite no éden escrita por Armamudi


Capítulo 1
Capítulo 1




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Deserto do Saara

 

1:00 am

 

 

 

 

 

Era uma noite fria, como todas as outras, mas um vento forte insistia em levantar montantes de areia para o ar, forçando toda a companhia de mais de vinte homens se abrigarem em suas tendas. Já fazia mais de uma semana que eles haviam chegado naquele lugar esquecido por Deus e por todo o resto da criação, e a maioria não sabia do porque estavam ali. Os ajudantes, todos vindos de cidades próximas da capital Cairo, estavam acostumados com esse tipo excêntrico de pesquisadores, que apareciam de repente na soleira de suas portas oferecendo serviços secretos e bons honorários para manterem suas bocas fechadas e suas especulações encerradas somente em seus imaginários. E  novamente Abdu Sallah era o chefe dos ajudantes desse grupo de apenas três pesquisadores vindos da Europa (dois da França e um da Escócia). Abdu, um homem de expressão introspectiva, cabelos médios e pele morena, não aparentava os seus cinqüenta e cinco anos pois com seu corpo musculoso e sempre vestido de forma impecável, parecia um senhor de muitas terras, mas que tinha somente uma humilde casa no subúrbio do Cairo, juntamente com sua mulher Sarah e seus três filhos.Foi ele quem contratou os homens para levar para a região noroeste das pirâmides milenares do Egito, há mais de trezentos quilômetros delas, e ali nem mesmo os mais experientes beduínos arriscavam ficar durante muito tempo, pois os calor castigava ferozmente durante o dia, e a noite o frio era enregelante, abaixo dos 0 graus. Por isso, somente os melhores conhecedores daquela região foram contratados há honorários excelentes para uma expedição prevista para somente duas semanas, o que gerou uma grande aglomeração de homens e até mulheres, para participar da seleção. E agora estavam ali, mas Christian Schneider não prestava atenção no que Abdu estava lhe contando, sobre outras expedições que fizera no passado, junto com alguns daqueles homens que eram grandes amigos. Ele olhava concentrado para o telefone que estava sobre a mesa, esperando uma ligação urgente de seu benfeitor, que o avisara que ligaria em dois dias. Mas já estavam no terceiro dia, e ele ainda não tinha ligado. Ele nunca atrasava.

 

 - Incomodo o senhor com minhas histórias, senhor Schneider? E Abdu o olhou cabisbaixo em perceber que o jovem pesquisador não prestava atenção em seu conto empolgante que estava narrando sobre certa expedição em Abu Simbel, há mais de cinco anos atrás.- Se quiser posso contar em outra hora.

 

 - Não me incomoda de forma alguma Abdu,- e ele saiu do transe voltando sua atenção para o homenzarrão a sua frente- é que estou esperando uma ligação do chefe e ele está atrasado. Mas prometo que ouvirei suas historias em um momento oportuno.

 

 E então ele voltara os olhos para o monitor que estava a sua direita, em cima de algumas caixas de materiais, improvisado como mesa, e onde Lucien o outro pesquisador escrevia um relatório, e de vez em quando olhava para a segunda tela que sobrepunha a principal para acompanhar o noticiário francês. – Christian está mais preocupado com um telefonema do que com essa tempestade meu caro Abdu, disse se virando para os dois sentados logo atrás dele. Essa tenda pode ir pelos ares, que o vento não leva ele, enquanto nosso chefinho não ligar para acalmá-lo.

 

 - Ah não comece com suas insinuações Lucien! - e lançou um olhar de desaprovação para o jovem. Você sabe muito bem que tudo o que estamos fazendo aqui é monitorado e enviado para analise na Universidade, e a sua função é fazer com que eles fiquem informados diariamente com tudo o que coletamos aqui nessa região. E outra coisa: eu sou o chefe dessa expedição e não admito brincadeiras de espécie alguma enquanto estivermos aqui. Entendido? E suas palavras saíram baixas e diretas para o alvo. Lucien que até então estava descontraído, ficou irado, mas não deu resposta, para não provocar ainda mais o colega. Afinal de contas, ele é o senhor sabe tudo das coisas, pensou em zombaria, e não serei eu, um reles mortal que irá contrariar as ordens dele.

 

 - E qual foi o resultado da análise do solo que eu pedi pra você ? E seu tom foi mais profissional dessa vez. Ele era um homem de expressão fria, sisudo, mas em suas funções, Christian era extremamente perfeccionista, uma qualidade vista pela maioria das pessoas que conviviam com ele, um tanto exacerbada.- Bom o resultado foi o que você tinha previsto mesmo: há algo grande se movendo há alguns quilômetros abaixo da superfície, pra ser mais exato há 2148 metros. E ele virou o monitor para que pudesse mostrar as imagens. Como pode ver, essa imagem a esquerda mostra a grande massa há três dias atrás submersa há 3015 metros, e um grande bloco aparecia na tela. E essa imagem a direita, mostra o mesmo objeto, só que ele se deslocou 867 metros da posição inicial em que ele se encontrava.

 

 - Certo. Quero que mande um relatório para a Universidade de Paris, para eles fazerem uma avaliação do que está acontecendo com esse objeto. E seu tom agora era de preocupação. E se possível eu quero que você...

 

 E ele parou abruptamente, quando viu na pequena tela do lado direito, o noticiário da televisão francesa onde mostrava um jovem aparentando seus dezessete anos, cabelos negros e olhos cerrados, sendo entrevistado. Lucien ficou esperando ele terminar com os pedidos, mas, ao ver o amigo paralisado olhando para a tela, voltou-se para ver o que estava acontecendo. Sua expressão era de grande surpresa ao ver o garoto também. A repórter estava sentada de frente para o jovem de expressão simples  porem firme, a responder às perguntas formuladas por ela.

 

 - Então você quer dizer que um novo protótipo de andróides esta sendo desenvolvido por sua equipe, e que esses novos modelos terão funcionalidades que somente os seres humanos tem? Ela olhava séria para ele, e pensava como esse menino tinha coragem de afrontar a criação máxima de Deus, criando um ser oco, sem o sopro divino da vida.

 

 - É isso mesmo, estou desenvolvendo uma nova linda de andróides, mas que perderão essa alcunha, pois eu os batizei de Projeto Adão e Eva, em homenagem aos patriarcas da humanidade. Eu passei três anos desenvolvendo esse projeto, junto com especialistas em diversas áreas da ciência para criar um ser quase perfeito, que pudesse assimilar grande parte do que nós estamos acostumados a fazer cotidianamente, como respirar, cozinhar, fazer compras, praticar esportes e por aí vai.- E seu sorriso estampava o orgulho que tinha ao falar de sua criação.- Eu quero dar a famílias que tiveram perdas, e também às pessoas que vivem sozinhas mas precisam de acompanhamento de alguém, como nos casos de idosos que não tem família e que necessitam de uma pessoa de confiança para ministrar remédios, refeições, ou mesmo pra ter uma companhia, a voltarem a viver a vida como sempre fizeram.

 

 - E que novidades além dessas você pode nos adiantar acerca desse projeto?

 

 - Por enquanto não tenho mais nada para revelar, a não ser que daqui a três dias, no sábado, haverá uma importante reunião no salão de convenções da Universidade de Paris às 7 horas da noite, onde estarão grandes cientistas, lideres religiosos e políticos de diversos países participando desse que promete ser o maior evento cientifico dos últimos anos.

 

 - Muito obrigada pela sua participação, ela se voltou para a câmera que estava a sua frente. Eu conversei com estudante de Tecnologia Cientifica e Mestre em História Antiga da Universidade de Paris, Henry Lancouse. É com você Celine. E  a reportagem foi encerrada, voltando a imagem para bancada do telejornal.

 

 Ele só pode estar louco, pensou Christian. Esse menino vai atear fogo na comunidade cientifica e levantar a ira da religião em todo mundo, se o que ele está propondo fazer for verdade. – O menino tá mesmo afim de arrumar encrenca hein! Disse Lucien ao término da reportagem. Eu me lembro desse rapaz perambulando no prédio de Pesquisas Cientificas do Campus. Eu acho que ele é aluno do professor Gabriel Velásquez, do setor de biotecnologia. Lá só dá figura você tem que ver! E ele se virou para os dois homens que estavam atrás dele para fazer o comentário, mas viu preocupação nos olhos de Christian. – O que foi Christian, tem alguma coisa errada? Parece que viu um fantasma, e seu tom era de preocupação.

 

 Christian voltou-se para o amigo, ainda meio deslocado, e viu que ele estava ficando com uma expressão séria. – Não se preocupe, não foi nada.- e deu um tapinha nas costas de Lucien- é só que eu fiquei aturdido em saber que tal projeto esteja em desenvolvimento e que tem apoio da Universidade. Creio que está tendo uma grande visibilidade no cenário acadêmico, pois faz um tempo que não noticiam algo dessa grandeza. E de repente o telefone tocou sobre a mesa, tomando os três de surpresa. Eles já sabiam quem deveria ser do outro lado da linha. – Eu atendo, disse Christian, e digitando uma senha no aparelho, que tinha somente uma tela e vários ícones, falou:- atender ligação por ponto de atendimento- e dois pequenos adesivos saíram lateralmente do aparelho, e imediatamente ele os colou próximo aos ouvidos. – Aqui é Christian Schneider falando...e o que se seguiu foram somente...- Compreendo...não se preocupe, tudo está correndo tranquilamente...estamos indo para lá imediatamente...aguardo seu retorno...boa noite. E ele retirou os adesivos, descartando-os em uma lixeira próxima.

 

 - O que ele disse Christian? e Lucien estava curioso em saber o que ele tinha conversado com o homem da ligação. Ele mesmo nunca tinha falado com o homem que sempre ligava pra saber do que estava acontecendo com a expedição, e as ordens que eram passadas para prosseguir adiante. Seria algum professor importante da Universidade? ou não passava de um rico excêntrico que estava financiando um projeto para beneficio próprio? Não era muito mais do que isso, tinha algo a mais e ele precisava saber.

 

 - Bom ele disse para seguirmos há vinte quilômetros ao leste e aguardar, - disse enquanto arrumava os óculos no rosto, e virando- se para Abdu disse: - Avise aos homens que partimos daqui meia hora. Quero uma comitiva com quinze dos melhores, o resto fica aqui para proteger o acampamento. Devemos voltar amanha.

 

 - Sim senhor, assentiu Abdu. Prepararei a comitiva imediatamente. Ele se virou para os dois jovens e com uma reverencia saiu da tenda.

 

 Após a saída de Abdu, foi a vez de Lucien se levantar. – Mas o que está acontecendo Christian? O que vamos fazer a uma hora dessas no meio do deserto, e pior, nessa tempestade? A preocupação de Lucien estava estampada em seus gestos rápidos, seus lábios tremiam violentamente. O que esse homem quer tanto que não se pode esperar até amanha para ser averiguado?

 

 Christian se virou para o amigo, que jorrava as perguntas para ele, afim de receber com a mesma intensidade as respostas que esperava. Como ele ainda é inexperiente, mesmo tendo mais de cinco expedições cientificas na carreira! Pensou ao olhar para ele aturdido. Lucien tem um currículo invejável por muitos, tendo artigos feitos para várias áreas da geografia, oceanografia e arqueologia. Mas ele é extremamente compulsivo, tendo episódios instáveis de humor, indo da euforia, passando pela alegria, e caindo no desespero. – Ora Lucien, vamos ver o nada, como sempre.- e ele ficou sério- quando chegarmos lá saberemos, não se preocupe.

 

 - Me preocupar? Eu só quero saber porque esse cara que nos liga sempre,quer que enfrentemos uma tempestade de areia há uma hora da manhã pra não vermos nada? Quem esse cara pensa que é hein? E viu que ele agora estava tenso.

 

 - Acalme-se Lucien, vamos sobreviver. Confie em mim. E aproveite e deixe um recado pra Marie e fale pra ela que assim que ela chegar, que entre em contato comigo. Estou levando meu telefone. E vendo que de nada adiantaria para convencê-lo ele simplesmente abaixou a cabeça e disse. – Tudo bem eu farei isso.

 

 

 

Já havia se passado meia hora desde que eles receberam a ligação urgente, e os homens do lado de fora das tendas se apressavam em carregar o transportador com os equipamentos, comida, um pequeno receptor de satélite, e galões de água. Abdu  comandava tudo com mãos de ferro, averiguando o que estava sendo feito. Ele foi até os dois cientistas e disse-lhes que tudo estava pronto. – Excelente Abdu, disse Crhistian, vamos partir imediatamente.

 

 – Sim senhor. E com um comando, os homens entraram nos veículos e foram na direção determinada por Christian. – Chegaremos no local em vinte minutos senhor, disse o motorista que pilotava o transportador. Se o tempo não estivesse tão ruim, poderíamos chegar em apenas 7 minutos, mas não pretendo arriscar.

 

 - Não se preocupe com o tempo meu caro, disse Abdu, nossas vidas valem mais do que a pressa pode nos proporcionar em um destino trágico. E assim partiram em meio ao turbilhão de areia fina que açoitava os veículos que atravessavam o deserto.

 

 

 

 O grande deserto do Saara sempre desafiou qualquer um que ousasse enfrentá-lo, desde que os egípcios se instalaram em seus domínios há mais de cinco mil anos. Eles construíram suas cidades e fizeram riquezas às margens do rio Nilo, adorando o grande Amom-rá o Deus-Sol que abençoava o seu filho, o Faraó, com levas de escravos, poderosos conselheiros, e o protegia de inimigos das terras além do mar Morto, no norte. Disso todos tinham conhecimento. Eles conheciam as histórias que fascinaram os homens por milênios, e ainda fascinam, sobre o mistério das grandes pirâmides; de como blocos tão pesados de pedra, foram arrastados por centenas de quilômetros deserto a dentro para criar as cidades, e principalmente para construir os monumentos com a Esfinge de Gizé e as Pirâmides do Egito. Como construções tão complexas foram desenvolvidas em uma época em que a arquitetura ainda era tão arcaica? Nem mesmo com modernos computadores e técnicas avançadas de construções arquitetônicas, o homem é capaz de erguer uma pirâmide como estas, tão perfeitas e simetricamente iguais em seus quatro lados.

 

 - Fico pensando como os egípcios conseguiram fazer tudo isso em um tempo onde o que eles tinham de mais avançado era a criação de aquedutos pra irrigar as plantações no deserto, disse Lucien olhando para fora do caminhão e vendo dunas se erguendo por todos os lados na noite. – Você já ouviu falar de algo sobre elas Chris?

 

 Christian estava no banco da frente, junto com Abdu e o motorista, olhando para o monitor que indicava a rota determinada com base no que foi passado pela conversa no telefone, e virando-se para trás, e vendo que seu amigo estava bem acomodado, deitado no banco, respondera:

 

 - Bem, há estudos que foram feitos no começo do século que dizem que os egípcios eram um povo tão evoluído, que eles tinham um domínio muito aguçado da capacidade do cérebro, permitindo que eles desempenhassem grandes projetos, como no caso da construção das pirâmides. Ele interrompeu a conversa para que Lucien se sentasse para depois continuar com a explicação. Bem com base nisso, uma outra pergunta surgiu para os pesquisadores: - Se naquela época o uso do fogo era essencial para iluminar as residências e principalmente para dar luz dentro das pirâmides, como no interior das mesmas na há sinais de fumaça, sendo que eles usavam gordura animal pra queimar nas lamparinas?

 

 - E então? Lucien estava ficando impaciente de novo ao perceber que o amigo tornava a deixar no ar as perguntas, como forma de causar um clímax. Ora vamos Chris, responda logo!

 

 - Não se apresse Lucien, advertiu ele, há coisas que não devem ser apressadas. E limpando a garganta ele continuou: uma tese diz que os egípcios usavam energia do pensamento para levitar os enormes blocos de pedra.

 

 - O quê? Você só pode estar maluco! A perplexidade de Lucien ficou evidente ao saber disso. Isso é um absurdo. Como eles usavam a energia do pensamento para mover blocos que pesavam centenas de toneladas no meio do deserto? Sabe-se que os humanos, utilizam somente dez por cento da capacidade do pensamento, isso datado até o ano de 2023, e depois com novas pesquisas, chegou-se a capacidade de que estamos usando 17 por cento hoje. Analisando friamente, isso daria a eles no máximo de 5 a 7 por cento, isso sendo muito otimista no uso da capacidade cerebral, sentenciou ele.

 

 - Isso é verdade, afirmou Christian, mas se formos olhar pelo lado cientifico,as perguntas ainda ficarão sem respostas plausíveis. Essa questão do uso do poder do cérebro é relevante sobretudo no que diz respeito de compartilhar essa energia. Lucien novamente estava ficando eufórico, e ele continuou a explicação imediatamente. Estudos feitos recentemente, revelam que, o homem é capaz de compartilhar seus pensamentos com seus semelhantes, mas para isso, tem que haver uma interação comum entre si. Foi o que aconteceu com os egípcios na época. E para aumentar o poder de ligação de pensamento, as pirâmides eram usadas para esse fim: a de compartilhar pensamentos comuns.

-Compartilhar pensamentos comuns? Você só pode estar brincando Chris!


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