— Thalia, sua louca, não se atrase para a festa de noivado! – Rosa gritava do outro lado do quarto.
Exatamente três anos atrás, Marcelo e eu nos encontramos por um acaso no casamento da Rosa. Parecia coisa do destino. Apesar de algumas coisas favorecerem essa união, a mais correta foi o sentimento ainda envolvido.
— Que espetáculo de vestido verde – Olívia dizia me vislumbrando detalhadamente. – Se Pietro estivesse aqui, com certeza ia querer deixar seu corte de cabelo ainda mais curto para combinar com o vestido.
— Nem brinca! A última vez que ele cortou meu cabelo foi sem minha autorização! – falei relembrando daquele dia em que meu longo cabelo se transformou em curto.
Entrei novamente no quarto e me olhei no espelho. Como eu havia me tornado adulta tão rápido? Em breve estarei formada e... casada.
Senti-me tonta por alguns segundos só de pensar no quanto eu gostaria de voltar à minha adolescência e deixar meus planos para mais tarde. Bem, não posso dizer que está ruim. Veja, tenho um noivo carinhoso, estudo matérias que gosto, tenho amigos adoráveis. Reclamar do que já está bom é pisar no esforço de cada pessoa envolvida, e isso inclui a mim própria.
Sai do quarto e em seguida vi duas criancinhas correndo de sua mãe.
— Já falei para essas pestes que eles têm que usar a droga da blusa de frio. Não estou a fim de levar ninguém para o hospital – Rosa dizia com dois casaquinhos na mão. – Fernando e Isis, voltem aqui! Cumprimentaram as madrinhas de vocês?
— Deixa eles, Rosa! Estão agitados hoje – falei expondo uma risadinha.
— É, menina, Rafael está de olho neles também! – Olívia completou.
— Meninas, vocês não sabem o quanto eles são terríveis! Meus dias de LOL estão quase no fim. Não posso mais jogar ranqueada com meus amigos que eles ficam chorando querendo leite e o caramba. Rafael quem o diga!
— Calma, eles vão se cansar logo e depois vão dormir – Olívia falou.
Ao longe eu escutei um choro de criança.
— Olha lá, um deles caiu! – disse Rosa desesperada.
— Pode deixar que eu vou lá – falei.
Caminhei em passos rápidos e encontrei e pequena Isis no chão. A peguei o no colo e tentei acalma-la, balançando ela suavemente. Fernando olhava sem entender. Entreguei a garotinha para Rosa e abracei Fernando.
— Cadê o beijo da tia?
Ele me deu um beijo molhado e foi atrás da sua mãe.
Desci as escadas e encontrei minha mãe conversando com Marcelo na cozinha. Ela parecia contente, ajudou bastante em nossa comemoração de noivado. Meu irmão não demonstrava muitos sentimentos, mas sei que no fundo estava feliz também, assim como meu pai.
— E ai, Thalia? – cumprimentou Thomas. – Meus parabéns! É tão bom ver nossos amigos juntos e felizes.
— Ah, muito obrigada! Digo o mesmo.
Olhei de relance e avistei Olívia brincando com os filhos de Rosa junto com Lucas, irmão de Thomas.
— Seu irmão está grande e bem parecido com você!
Thomas passou a mão no cabelo, como de costume, e voltou seu olhar para o irmão.
— Ele já é um adolescente de dezesseis anos. Está numa fase daquelas.
— Ainda deve continuar um doce.
Observei alguém entrando e me licenciei de Thomas. Era Pietro, o cabelereiro que arrumou meu cabelo e da Olívia no casamento da Rosa. Havia trazido o namorado dele e um presente embrulhado. Aconcheguei eles na sala e disse que logo serviríamos algumas comidas e bebidas.
Voltei ao quarto para guardar o presente.
— Amor...? – A voz de Marcelo ecoou na minha mente.
Me envergonhei por um momento e dei foco para o presente.
— Olha o que Pietro trouxe. Muito gentil da parte dele – falei.
Era um jogo de cama lilás, muito fofo e delicado.
— Imagina esse cobre-leito em cima da nossa cama, no nosso quarto, da nossa casa... – ele sorriu para mim.
Me senti novamente tonta. Aquela ideia de me casar ainda me dava arrepios.
— Marcelo, senta aqui.
— O que houve, Thalia?
Respirei fundo e soltei o ar devagar. Eu buscava por palavras que fosse me ajudar naquele momento.
— Meu bem, você sabe que somos novos e temos a vida toda pela frente. Acho que não deveríamos antecipar o casamento.
Ele parecia confuso.
— Thalia, eu não estou entendendo. Não vamos antecipar o casamento, será tudo de acordo com a nossa vontade e disponibilidade.
— Me desculpe por parecer intransigente... É que passaram algumas coisas na minha mente, apenas bobagens.
Marcelo pegou minhas mãos e olhou fixo em meus olhos.
— Meu amor, pode desabafar comigo.
Captei sua segurança e tomei-a para mim.
— Sabe, eu quero casar com você, caso contrário, nada disso hoje seria possível. Só que... me sinto despreparada e como se tivesse abandonando minha vida atual. Apenas peço, novamente, que não apresse as coisas.
Marcelo se levantou, passou a mão nos cabelos e suspirou.
— Eu já volto – ele disse por fim.
Meu coração despedaçou no momento. Me senti sozinha naquele quarto e pensei se fui rude ou insensível. Marcelo era um amor, nunca me deu trabalho algum, me acompanha com passos da frequência dos meus. Mas por que o ato de raiva?
Alguns toques na porta chegaram aos meus ouvidos.
— Thalia, está tudo bem? – Olívia dizia enquanto entrava.
Na maioria dos momentos, eu me mantinha forte. Minhas lágrimas estavam no meu interior.
— Eu vi Marcelo saindo desse quarto com uma expressão bem abatida, e agora eu entro e você está com a mesma expressão. O que está acontecendo?
Expliquei o que havia ocorrido e tentei mostrar meus sentimentos para ela. Tudo parecia tão nebuloso.
— Você está insegura sobre algo mais? – Olívia perguntou.
Coloquei-me a pensar.
— Thalia, pelo amor de Deus, pega esse menino no colo porque ele só quer saber de você – disse Rosa entrando com Fernando.
Peguei meu afilhado e o deitei no meu colo. Já era um pouco tarde, é normal crianças ficarem inquietas quando estão com sono. Aos poucos ele ia se acalmando e dormiu num sopro.
— Parece um anjinho dormindo – Rosa falou sorrindo com os olhos.
Após desviarmos nossa atenção do Fernando, minhas amigas logo me alfinetaram.
— Sabe, eu não queria que as coisas tomassem esse rumo – eu disse desapontada. – Eu gosto muito do Marcelo, talvez eu deva ter pegado pesado.
— Mulher, se quiser nós vamos agora tirar satisfação com ele!
— Deixa disso, Rosa! Vamos deixar a Thalia mais preocupada se fizermos isso!– Olívia dizia. – Thalia, acho melhor vocês não discutirem isso aqui e nem agora. Estamos todos contentes por vocês dois, esse clima ia pesar sobre nós. Sei que é difícil, mas tente agir normal, quem sabe vocês voltem a ficar de bem?
— Fala com ele que depois vocês conversam sobre, aproveitem a festa!! Eu nem bebi ainda.
Minhas amigas tinham razão. Devo esfriar minha mente e focar em medidas que diminua essa tensão.
Procurei meu noivo pela casa inteira e nada. O desespero batia na minha porta instante a instante. Precisava sair daquele local para ficar a sós com meus pensamentos.
Sem que eu percebesse, estava na rua da minha casa. Andei um pouco sem direção. Deixei aquelas lágrimas descerem apenas para me acalmar. Quando cheguei no início de um morro, avistei Marcelo subindo com seu carro. Limpei rapidamente as lágrimas e me virei para voltar. Ele me alcançou e parou o veículo.
— Entre, por favor – ele disse ainda dentro do carro.
Arqueei uma sobrancelha. O que ele queria? Por que está aqui agora?
— Quero falar com você – eu disse.
Marcelo abriu a porta do carro para que eu entrasse. Ficamos alguns segundos em silêncio.
— Sei que hoje tivemos um pequeno desentendimento, só quero deixar claro que eu respeito suas preferências – ele tirou um papel do porta-luvas. – Tem uma coisa que levo comigo desde o dia que voltamos a namorar. Talvez você não lembre, mas fizemos isso na aula de artes no primeiro ano – Marcelo limpou a garganta. - “Thalia é uma menina bonita, inteligente pelo que entendi, curte eventos e coisas calmas, é curta mas não grossa. Não gosta de chamar muita atenção e nem ficar se gabando, mas gosta quando os outros reconhecem seu empenho. Ela tem olhos claros de tom mel misturado com uma folha verde seca, cabelos longos, lisos e castanhos, pele clara”.
Sorri tentando me recordar daquele dia.
— Quando leio isso fico tão feliz por ter noivado com a garota descrita. Você mudou desde seus quinze anos, não nego, porém, a sua essência continua ai. Eu seria um homem tolo em fazer mais pirraça e ficar chateado...
— Marcelo...
— Viver um dia de cada vez, essa é sua frase. Acho que ela define o que quero tentar passar.
Fechei meus olhos. Como ele me conhecia e me entendia tão perfeitamente?
— Vamos voltar. Nossos convidados devem estar preocupados – ele sorriu por fim e ligou o carro.
∞
Após o final da festa e da arrumação, expliquei para meus pais que ia passar a noite na casa do Marcelo. Eles entenderam e aceitaram, afinal, eles sabem o quanto é importante para nós.
Quando cheguei lá, a primeira coisa que veio na minha cabeça era descansar. Havia sido um dia cheio. Me acomodei no sofá e respondi algumas mensagens que recebi no celular. Respirei fundo e senti um enorme alívio, uma vez que as coisas estavam voltando em ordem.
— Thalia? - Marcelo me chamou.
Desculpa atrapalhar, mas queria que viesse comigo.
Meus olhos estavam pesados, queria falar que gostaria de dormir um pouco, porém, conhecendo Marcelo, ele ficaria chateado. Me esforcei um pouco para levantar do sofá e descalço mesmo acompanhei meu noivo até o jardim.
— Bom, não sei se é o suficiente mas... Não tivemos muito tempo juntos hoje, quer dizer, apenas nós.
Olhei em volta e um brilho ofuscante saiu dos meus olhos. Havia um lençol verde claro esticado na grama, duas almofadas em cima dele e duas taças de vinho. Além disso, em cima das árvores, haviam pisca-pisca, daqueles da época de natal, cada um com sua própria cor refletindo no jardim.
— Está tudo lindo... - eu não conseguia me expressar.
Antes que meu noivo fosse pegar outros itens, me aproximei dele e dei um abraço apertado.
— Saiba que mesmo estando nervosa quanto ao casamento, eu não o deixarei de lado. Eu amo você e quero que momentos como esse aconteceçam milhares de vezes se for possível.
E assim, sob o luar e diversas luzes coloridas, eu entendi o verdadeiro significado de noivar...
Não é de "novo" no sentido de ser jovem, mas sim de ser jovem para tentar algo novo.