As Crônicas das Lágrimas escrita por H M Stark, Daniel Grimoni


Capítulo 1
S01E01 O Gênese da Extinção


Notas iniciais do capítulo

Espero que goste, meu caro leitor! Capítulo escrito por H.M. Stark.

Sinopse do episódio: Shara Cabelos de Prata é uma feroz líder dos Lordes; uma seita de selvagens rivais dos temidos Noturnos. Após longos combates - anos e anos de sangue, morte e caos - os dois grupos se vêem reduzidos a menos de uma centena de guerreiros. Temendo a extinção, ambos vão a luta, visando o domínio da lendária Floresta dos Lamentos. Mal sabe Shara que tudo estava para mudar impiedosamente.



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Fios prateados bailavam ao ritmo da brisa noturna. Olhos róseos fitavam o acampamento logo adiante, além das rochas que circundavam as barracas de pele como uma espessa muralha, mas não tão alta que não pudesse ser escalada. Aquelas profundas íris pareciam vislumbrar o futuro... Não... O futuro não... O que ela desejava que o futuro fosse: as barracas envoltas em chamas, aqueles bárbaros suplicando por clemência e ela com a tocha nas mãos, com um largo sorriso costurado em seu rosto pelas frias agulhas da vida, manuseadas por dedos frágeis, porém, desprovidos de misericórdia; dedos de um ser oculto e poderoso, sádico e cruel, divertido – a seu modo –, porém, furioso.

Porém, a mente retornara à frieza de sempre.

Eles não podem estar contando apenas com isso para nos retardar, discorreu em pensamento a líder dos Lordes, referindo-se às vultosas rochas. Nenhum vigia à vista; apenas uma festa com vinho e comida em abundância sob as peles das barracas. Era o momento perfeito para atacar.

Lorde era o nome do grupo de Shara Cabelos de Prata; uma corja de selvagens corajosos e sanguinários, rivais dos Noturnos.

Outrora, no chamado Tempo do Pó, havia muitas e muitas corjas selvagens pela Floresta dos Lamentos. Batalhas e mais batalhas gloriosas foram travadas entre os altos pinheiros daquele lugar sombrio. Árvores que um dia foram tão negras quanto o manto que cobria o mundo quando os Noturnos atacam; no entanto, com as antigas pelejas, o vermelho tomou conta dos pinheiros antigos, e, consequentemente, dos novos, pois o solo bebera sofregamente o líquido da vida de guerreiros lendários, contaminando assim a vida das herdeiras daquela floresta. E não só elas, como também a densa bruma, que erradicava todo e qualquer sorriso por ali, era avermelhada e carregada de misteriosas criaturas que a seguiam para cima e para baixo, à espreita, no aguardo de desavisados que achassem a névoa bela como uma nebulosa. Essa era uma herança de tempos esquecidos, quando espadas e lanças eram coisas raras, de tecnologia extremamente avançada, e machados rústicos derramavam sangue como bocas bebiam água. O tempo passara, avassalador, sem uma gota de misericórdia, transformando tudo em pó. Os bandos de heróis selvagens se extinguiram, resumindo-se nos dois remanescentes, herdeiros de gigantes guerreiros: Lordes e Noturnos. E poucos homens ainda restavam em ambas as corjas. A batalha que estava por vir antevia sangue e extinção de uma tradição tão rica, apesar de contrariada pelos chamados Homens de Castelo – contrariada a ponto dos selvagens serem caçados ferozmente, como descumpridores da Lei dos Homens.

Imersa nas memórias do Tempo do Pó, Shara não percebeu Ptaro se aproximar. Era um guerreiro jovem, entretanto, mortal com um machado. Porém, ou por isso, com a pele marcada por cicatrizes - era deveras cheio de si. Ele era aquele tipo de lutador alvo de zombarias: um Caçador de Glória; sempre preocupado em matar tantos inimigos quando pudesse, em ter parte nos grandes feitos de seu tempo, sem saber que tais só eram alcançados por aqueles que se esquecem da própria glória e lutam por suas vidas ou pelas vidas dos seus.

– O Tordo Carmesim já se pôs a cantar, minha líder – o rapaz lembrou-lhe. O Tordo Carmim era conhecido por seus cânticos após o pôr do sol. Tal qual o Tordo Pérola, anunciando o nascer do astro fumegante. - Hain avistou um grupo saindo pelo lado oeste do acampamento. - Tatuagens complexas lhe cobriam o tronco inteiro até o pescoço, invadindo seu rosto em alguns pontos – tatuagens indicavam o quão habilidoso o guerreiro era com seu Instrumento de Guerra.

– Agiremos com cautela - anunciou a líder, fechando os punhos, enrolados com couro de castelo – roubado. - Reúna quinze guerreiros e parta para o sul; para a Sede. Pegue aqueles bastardos pelo traseiro e arranquem suas peles. Vão rápido! Eles encontrarão o acampamento vazio, mas irão queimar tudo.

– Mas... Minha líder... Onde estão os que estavam na Sede?

– Não se preocupe com eles, nobre soldado. A vitória é nossa – ela disse, com um sorriso brotando entre seus lábios.

Foram precisos cinco minutos para que os quinze guerreiros partissem para o sul, sumindo no meio dos rubros pinheiros.

Shara relembrava o plano aos cinco guerreiros que ali permaneceram para o ataque ao acampamento dos bárbaros da noite.

Mais da metade dos Noturnos haviam saído para caçar os Lordes - cerca de cinquenta guerreiros. Em torno de vinte ficaram para defender o acampamento; quatro para cada Lorde.

Empunhando um longo facão de prata – quase uma espada –, Shara avançava por entre as últimas árvores sangrentas, com cautela, em direção ao acampamento inimigo. Seus companheiros haviam se espalhado.

Eram cinco grandes tendas abrigando os guerreiros e uma dezena de barracas menores guardando os suprimentos e as armas – essas que eram roubadas dos grandes castelos ou contrabandeadas.

Shara alcançou, de repente, o Limiar da floresta. Adiante, uma vasta esplanada cingida por grandes rochas negras. O luar banhava a relva vivaz, fazendo cintilar as ínfimas pedrinhas da lua que se escondiam sob os braços dos tufos de grama. Silenciosa como uma pantera, a Lorde venceu o espaço entre o fim da Floresta dos Lamentos e a muralha natural; seus pés descalços sem embrenhando na grama a cada célere passo, amassando as pequeninas pedras pálidas contra a terra molhada. Seus olhos cor de rosa fitavam as rochas à frente, pronta para saltar e escalá-las; com seus amigos não era muito diferente.

A líder pôs a faca na bainha e saltou com maestria. O pé esquerdo pisou numa rocha e o direito em outra. À frente: uma fenda estreita demais para um humano adulto passar.
Shara ali ficou, estudando o lugar, quais seus guerreiros, mais para oeste. Por fim, ergueu sua perna direita e, escorada numa só perna, agiu rápido, flexionando o joelho esquerdo e saltando para o topo da grande rocha, girando o corpo num movimento que agitou seus cabelos numa miríade de tons prateados.

Porém, antes que seu corpo volvesse totalmente, uma serpente surgiu da lúgubre fenda, sibilando enquanto projetava suas presas num bote ligeiro, mas não certeiro, pois Shara movera o braço direito, sacando sua faca e decepando a criatura com uma presteza felina. Então a mulher aterrissou, silenciosa. Ela se pôs a ouvir os sibilos de centenas de serpentes; todas vindas de baixo das rochas e do meio das fendas, sedentas de uma maneira muito estranha a Shara, que tinha certa experiência com tais animais.

A mulher de cabelos prateados decepou outra serpente e se esquivou do bote de outras com movimentos dançantes – era incrível como, mesmo em situações extremamente adversas, a líder dos Lordes mantinha a postura de mulher-felina, ágil de uma maneira inumana. Ao longe, distinguiu os brados de seus companheiros, agonizando no topo das rochas, pegos pelas vis criaturas.

Ela sentiu profundamente a morte de seus guerreiros; eram os melhores de que ela dispunha. Mas eles ainda podiam contribuir para o grupo. Os Noturnos saíram de suas barracas, esbravejando e proferindo palavras obcenas. Entretanto, ao ver os Lordes mortos nas rochas abriram largos sorrisos e chamaram os outros, que haviam corrido para proteger as armas e os suprimentos, para ver os corpos.

Foi então que Shara agiu: ela correu para a primeira tenda de suprimentos e pegou uma tocha que estava fincada na terra ao lado. A mulher mergulhou a tocha na barraca e o fogo se espalhou lentamente.

Assim se repetiu com a primeira grande barraca e a segunda.

Os Noturnos ficaram loucos, correndo de um lado para o outro, à procura de quem fizera aquilo. E, um por um, quando se afastavam demais dos companheiros, eles foram degolados entre as tendas, ou perto das rochas.

Por fim tudo que sobrou foi uma grande fogueira.

De certo a fumaça atrairia a guarda dos Thieves - uma família cujos membros eram ensinados desde pequenos a montarem enormes tigres brancos. O castelo da família não ficava muito longe dali e era provável que já estivessem a caminho.

O restante dos Lordes chegou correndo, preocupados com seus novos aliados. Eram os que estavam na Sede, aguardando os reforços para defender o local – e que haviam traído Shara, trocando-a pelos Noturnos, com promessas de ouro e altos comandos na corja inimiga.

O plano de Shara dera certo e isso fez brotar um sorriso insano em seus lábios bem delineados.

Os reforços que a líder enviara para o acampamento ao sul combateriam os Noturnos que se encaminharam para lá; e os Noturnos contavam com os que já estavam no acampamento para trair os Lordes e então reinarem naquela região; pelo menos o tanto quanto podiam com os Thieves sempre atentos.

Provavelmente, àquela altura, os reforços dos Lordes já tinham dizimado os Noturnos num ataque surpresa.

Shara fugiu para o topo dos lendários pinheiros, antes que os traidores avistassem-na.

Os Thieves chegaram à clareira onde estava o acampamento dos Noturnos. Os traidores seriam estraçalhados pelos tigres monstruosos, enquanto Shara se dirigia para o coração da floresta, indo ao encontro dos quinze guerreiros Lordes.

Matara dois coelhos com apenas uma tacada; ou pelo menos assim pensava.

Ao alcançar o topo de uma alta colina que tinha vista para a Sede dos Lordes – apenas para quem soubesse onde procurar com os olhos –, Shara ouviu um zumbido; uma flecha cortando o ar! Ela só teve tempo de evitar que a ponta perfurasse seu coração, virando o corpo. A seta atravessou seu braço esquerdo, arrancando-lhe um urro de dor.

Então, da proteção dos pinheiros surgiram silhuetas: cerca de cinquenta; todos os Noturnos!

Pelas contas de Shara Cabelos de Prata, seus guerreiros foram derrotados sem dificuldade alguma. E ela seria... O que fariam com ela? Estremeceu só de imaginar.

Foi quando distinguiu a figura de Ptaro, surgindo ao sopé da colina, iluminado pelo luar. Atrás de si: os quinze guerreiros Lordes.


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Notas finais do capítulo

Quando não estamos mais aptos a mudar uma situação, nós somos desafiados a mudar nós mesmos - Vítor Franklin.

Espero que tenha gostado, não deixe de comentar e compartilhar com os seus amigos!

Até a próxima. Oremos ao Deus das Estrelas por uma semana maravilhosa!
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