Paz Temporária - Olhos Amaldiçoados escrita por HellFromHeaven


Capítulo 7
Outro ponto de vista




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A semana foi puxada e a ideia de que viver apenas de bicos não seria o suficiente por muito tempo martelava cada vez mais meus pensamentos. Aluguel não era um problema e o dinheiro era o suficiente para comprar comida e itens de necessidade básica, mas eu não pretendia morar na casa do Sr. Hakkido para sempre. Sou muito grata por ele ter me ajudado depois de... Uns momentos ruins... Enfim, por mais que eu tivesse cumprido todos os meus deveres semanais ainda restava uma coisa a fazer e Jessy impedia que eu me esquecesse de tal compromisso.

– Jackie! Você não tem nenhum compromisso hoje, certo?

– Deixe-me ver... Acho que não.

– Então que tal começar a pensar em como cumprirá sua parte do acordo?

– Oh... Tinha isso não é...

– Você... Tinha esquecido?

– Não... Não... Eu... Sim...

– Bem... Fazer o quê... Eu te perdoo, mas você vai ter que pelo menos começar a pensar em algo. A situação está ficando cada vez mais crítica.

– Os conflitos entre as famílias tem se intensificado, não é?

– Sim. O maior problema é o líder dos Harrisons. Aquele pirralho tem muito ódio no coração.

– Então o jeito mais rápido de acabar com isso seria se livrando dele, certo?

– Sim, mas eu prefiro que tudo seja resolvido pacificamente. Não se esqueça de que a verdadeira paz nunca será alcançada se meios violentos forem usados para obtê-la.

– Eu sei, só estava brincando.

Na verdade eu não estava e eu sabia que era uma péssima mentirosa, mas mesmo assim arrisquei.

– Você sabe que nem se fosse a melhor mentirosa do mundo poderia me enganar.

– Eu sei... Desculpe-me...

– Não precisa ficar para baixo só por causa disso. Só não minta mais para mim e ficará tudo bem.

– Às vezes eu me esqueço de que não estou falando com uma pessoa normal.

– A essa altura eu nem posso mais ser considerada uma pessoa...

– Não se preocupe quanto sua forma física. Desde que eu saiba que é você a aparência não importa.

– Heh. É por isso que estou aqui contigo. Você é uma boa garota, Jackie.

– Se você diz...

Minha autoestima já foi melhor do que aquilo, mas depois do... Incidente, ou melhor, dos incidentes eu nunca mais consegui me olhar no espelho e gostar do que vejo. Mesmo um elogio vindo de um ser como Jessy não me afetava e, muito menos, me fazia sorrir. Sorriso... Uma expressão tão comum e há muito esquecido por mim... Bem, o meu estado emocional podia esperar.

Não consegui pensar em nada enquanto estava em casa e resolvi sair para ter algumas ideias. Andei sem rumo pela cidade esbarrando em algumas pessoas e, quando me dei conta, estava na praça. Resolvi sentar em um dos bancos e fiquei observando o céu na esperança de que alguma ideia boa caísse do mesmo pronta para ser realizada. Devo ter ficado vegetando ali por uns dez minutos quando fui cutucada por algo e virei tomei um susto. Olhei para os lados e não vi ninguém, mas notei uma movimentação suspeita: Lucas Harrison, o filho da puta que comandava os Harrisons, estava falando com um garoto alto com curtos e levemente cacheados cabelos loiros e olhos tão azuis quanto o céu num dia de verão. Ele aparentava ser uma boa pessoa e parecia estar nervoso. Fiquei observando aquela cena com a mente totalmente vazia quando, de repente, uma ideia surgiu do nada.

– Isso deve servir por agora...

Disse aquilo em voz baixa para que ninguém pudesse ouvir e olhei para o lado: havia uma caixa de madeira que, provavelmente, era usada para transportar frutas jogada perto de uma lata de lixo. Peguei a caixinha, fui até o meio da praça e comecei a gritar palavras de protesto. Como o esperado, isso chamou a atenção do filho da puta. Ele estava com alguns homens e ordenou para que me silenciassem. Usei o elemento surpresa como vantagem e derrubei todos acertando golpes precisos em seus pontos vitais. Eu errei alguns, mas rapidamente repeti os movimentos para corrigir o erro. Decidi investir contra o líder deles. Uma decisão sábia, pois meu pé encontrou seu rosto no momento em que ele tentava sacar uma arma do paletó. Depois de deixa-lo inconsciente, virei, voltei para cima da caixa e, depois de falar mais algumas coisinhas, saí dali o mais rápido possível. Eu não sabia quanto tempo eles ficariam deitados ali e a sorte poderia não estar mais ao meu lado quando eles acordassem. Fui impedida pelo garoto, o que me surpreendeu:

– Olá!

Ele parecia aliviado e eu apenas o encarei até que ele continuasse:

– Bem... Eu gostaria de agradecer. Esses caras poderiam me causar alguns problemas.

– Não foi nada. Aliás, foi apenas uma coincidência.

– Obrigado mesmo assim. Eu gostaria de saber o nome de vocês.

– Vocês?

Olhei para o lado e notei que uma garota me acompanhava. Pelo olhar deduzi que fosse a Jessy. Até aquele momento eu não havia percebido que ela estava materializada. Mas era estranho que mais alguém pudesse vê-la além de mim. Então, mesmo estando confusa, respondi sem pensar:

– Você não deveria poder vê-la, mas meu nome é Jackie e ela é a Jessy.

– Como assim não deveria poder vê-la?

– Não importa. Eu tenho que ir.

Tratei de sair dali mais rápido ainda. Por algum motivo, o fato de aquele garoto desconhecido poder ver a Jessy me deu uma incrível vontade de me afastar do mesmo. Andei sem nem ao menos olhar para trás e só parei quando cheguei em casa. Sentei na varanda e fiquei olhando para o céu. Estava nublado. O frio estava intenso e trazia consigo um sentimento de saudade. Saudade de minha terra natal, onde os invernos eram agradáveis e os verões tão intensos quanto o frio que estava sentindo. Comecei a pensar em como as coisas eram quando morava lá e aquela pessoa me veio à cabeça novamente... Estava completamente imersa em meus pensamentos nostálgicos quando fui cutucada:

– Por que você fugiu tão depressa? É meio complicado te acompanhar na minha atual situação.

Jessy me encarava com um brilho de curiosidade em seus olhos.

– Oh... Desculpe-me... Eu só... Só fiquei um pouco assustada...

– Isso é por causa do garoto?

–... Bem...

– Não se preocupe! Você mesma viu que ele é uma boa pessoa.

– Eu sei, mas... Como... Como ele...

– Ele só consegue me ver porque é como você.

– Como assim?

– Na verdade... Ele é quase como você. No momento, eu poderia compará-lo com o seu “eu” de antes do nosso acordo.

– Entendo... Eu acho...

– Ele tem uma visão interessante. Tudo está se encaixando lentamente. Acho que conseguiremos alcançar o nosso objetivo.

– Isso é bom.

– Aliás, gostei do lance de garota revolucionária lá atrás. Sabia que você era a pessoa certa para o serviço.

– A ideia apenas surgiu na minha cabeça e eu resolvi por em prática, já que eu precisava fazer alguma coisa mesmo.

– Você foi ótima! Mas... Está ciente de que não há mais volta certo?

– Pois é... Depois disso eu não serei mais vista como uma simples cidadã pelos Harrisons...

– Saiba que o caminho que te espera está cheio de momentos desagradáveis, mas se você fizer as escolhas certas tudo valerá a pena no final.

– Eu sei disso... Mas se eu recuasse agora, minha irmã jamais teria orgulho de mim.

– Te desejo sorte em sua caminhada, Jackie. Espero que você faça as escolhas certas...

– Eu... Eu também...

Fiquei sentada na varanda por algumas horas enquanto pensava no meu próximo movimento. Várias vezes me peguei perguntando para o vento se bater nos filhos da puta havia sido uma boa ideia. Aquilo poderia apenas ter irritado eles. A imagem daquele garoto me veio novamente à cabeça e comecei a me perguntar sobre o que ele estava conversando com Lucas, mas logo convenci-me de que não era da minha conta. O Sr. Hakkido chegou, então rapidamente comecei a preparar a janta. Certa vez ele disse que aquilo não era necessário, mas eu não conseguia suportar o fato de estar morando ali sem ajudar em nada. Logo me nomeei encarregada de todas as tarefas domésticas. Jatamos e voltei à varanda enquanto o Sr. Hokkido assistia televisão. Observar o céu era um dos meus passatempos preferidos, por mais tedioso que possa parecer. Fazer aquilo sempre me deu calma e paz interior. De onde estava, era possível ouvir o som da televisão. Ele sempre gostou de assistir ao noticiário depois de jantar, então eu ouvi uma notícia em particular que me chamou a atenção. Estiquei minha cabeça para poder ver a tela e prestar melhor atenção. Uma casa havia sido incendiada com suspeita de que a causa seria criminosa. Não seria nada demais se o local fosse na área dos Harrisons, afinal, eles costumavam fazer esse tipo de coisa com quem os desafiava. Mas a casa estava localizada no que chamávamos de zona neutra da cidade, onde não havia o controle de nenhuma das duas famílias. Passei de intrigada a espantada em questão de segundos quando vi as imagens dos supostos moradores da casa. “Shad e Harry Stavic eram os únicos moradores...”. O tal do Harry definitivamente era o garoto da praça. E o pior era que seu pai foi encontrado amarrado em uma cadeira dentro da casa. Uma pergunta veio à minha cabeça e não saiu de lá por um bom tempo: “Teria sido minha culpa?”. Não consegui encontrar a resposta, mas aquilo que Jessy falou mais cedo era agora uma verdade absoluta: não havia mais volta. E, pelo jeito, não só para mim.


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Notas finais do capítulo

Olá novamente~ Aqui está mais um capítulo fresquinho!
Pode ser que quem está lendo esteja um pouco confuso, então vou esclarecer um pouco as coisas. A partir de agora vai ser assim: um capítulo do ponto de vista do Harry e um capítulo do ponto de vista da Jackie, mas nem sempre serão dos mesmos acontecimentos (já que se fosse ficaria bem maçante), pois cada um representa um "foco" diferente da história. Tenho alguns motivos para fazer a bagaça desse jeito, mas como seria spoiler eu não contarei~ Apenas tenham noção de que será assim mesmo =D
Agradeço a quem leu até aqui, espero que estejam gostando e até o próximo capítulo!



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