A Arte do Amor escrita por Catwoman


Capítulo 1
Exposição




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/505944/chapter/1

O problema de ser a única consultora de arte do Museu Comunitário de Gotham é ter que aguentar todos os ricaços metidos a filantropos. Principalmente quando não era um bom dia.

– Ele está vindo! – consegui ouvir alguém cochichar a minha frente.
A prefeitura consumava fazer com frequência eventos no museu e em outras instituições em ordem de recardar fundos para que pudessem continuar abertos, e já que a maioria do que era arrecadado ia para o bolso do prefeito, os eventos eram bastante necessários. E sempre que eram feitos esses eventos personalidades da cidade eram convidadas, e geralmente eram sempre os mesmos. Não nessa noite.

Depois de vários anos fora de Gotham, depois da morte de seus pais, o herdeiro bilionário das industrias Wayne havia voltado para casa. E ele era justamente a personalidade principal do evento.
Agora eu conseguia ouvir não só um ou dois cochichos, todo o salão estava eufórico com a presença dele. Exceto eu. Já estava acostumada.

Como de praxe, eu, a única consultora de arte do museu iria ter que apresentar todas as obras de arte presentes em amostra no salão a ele e explicar detalhadamente todos os projetos sociais que o Museu Comunitário havia ativado e estava exercendo, enquanto ele fingia que ouvia e entendia, olhava para meus peitos, doava uma significativa quantia para o Museu que, certamente, não faria falta para ele, e depois iria embora o mais rápido com a cara de tédio.

Olhava para uma pintura a óleo de um artista não muito conhecido do século XX, quando uma das crianças de um dos poucos projetos sociais que oferecíamos puxou minha mão, pedindo minha atenção.

–Senhorita Kyle, tem um moço a sua procura. – Ela apontou com o dedinho pequeno para o meio das multidão de pessoas. Uma se destacou. É hora de fazer seu trabalho, Selina. O sol estava se pondo, e o evento havia acabado de começar, e eu não esperava a hora de sair dali.

Dei um sorriso a pequena que havia me tirado de meus devaneios e ela partiu, com um sorriso também.

–Vamos lá – murmurei a mim mesma, em compaixão própria.

Caminhei firmemente até o homem que olhava de um lado para o outro, como se estivesse perdido. Mas eu sabia que a verdade não era essa. No meio do salão do Museu, Bruce Wayne estava impecavelmente vestido em um terno sob medida, preto, camisa branca e gravata preta. Não havia seguranças ao seu lado, o que era incomum, já que o Museu Comunitário se localizava em um bairro afastado e pobre. A elite de Gotham não dispensava seus guarda-costas nem mesmo nas regiões mais abastadas, quanto mais no subúrbio.

Quando me aproximava dele, senti sua atenção em mim, e foi quando vi seus olhos negros.

O que me fez lembrar de outro par de olhos negros que havia visto. Não igual a esse. Olhos negros intensos, tão intensos que estavam me atordoando desde o momento que os vi, na noite anterior. Tentei inutilmente tirar a lembrança de minha cabeça e me focar completamente naquele homem. O que não era tão difícil, já que ele era um homem estonteante... Voltei a proibir meus pensamentos.

Cheguei até ele e o cumprimentei tão educadamente que até eu mesma acreditei que estava sendo verdadeiramente cordial.

–Boa tarde, Sr. Wayne, Bem-vindo ao Museu Comunitário de Gotham. Eu sou Selina Kyle, a consultora de arte, e irei lhe apresentar todo o Museu, em agradecimento pela sua contribuição. Acredito que já conheceu algumas de nossas crianças... – disse, referindo a que chamou minha atenção segundos atrás.

–Oh, sim. Você tem ótimas crianças aqui. – Ri do comentário dele

–Não sou eu que tenho, Sr. Wayne, o conselho comunitário de caridade, sim. Apenas faço o meu trabalho de ensinar tudo o que sei de arte para esses pequenos.

–Ele assentiu com a cabeça, terminando essa conversa.

–Bom, se o senhor puder me acompanhar, por favor! – apontei em direção ao salão de galeria de artes regionais, por onde sempre começava o tour. Outras pessoas, claramente ricas também, me acompanharam, mas acredito que nenhuma delas estava interessada em arte... bem, pelo menos não a que se pendura na parede.

Foram 45 minutos de demonstrações, explicações e respostas a perguntas que não demonstravam nenhum interesse em obras, apenas na atenção de Bruce Wayne. Ele ficara calado durante todo o tour, não fizera nenhuma pergunta, e apenas havia escutado. Ou não.

Assim que o tour acabou, o sol já havia desaparecido, as crianças que estavam no salão já haviam ido para casa, e apenas um grande grupo de pessoas, que ainda participavam do evento se encontravam no grande salão. Estavam à espera do grande leilão que iria acontecer em minutos. Uma obra valiosíssima que estava no Museu desde que fora doada, há anos atrás, por uma grande socialite na época era a peça principal. Uma grande perda diante as obras, sim, mas necessário para que o Museu tivesse como se manter por mais alguns meses.

O grupo que me acompanhava, se dispersou, assim que o início do leilão foi anunciado.

Bruce Wayne ficou ao meu lado.

–Obrigada pelo tour – ele disse, pela primeira vez desde o início. Levei um susto, mas me mantive.

–Obrigada a você por fazer parte desse evento. O Museu agradece imensamente –

–Me acompanharia no leilão? – levei outro susto, e demonstrei em silencio. Ele desviou o olhar e disse: - Eu realmente gostaria de arrematar algumas obras, mas, honestamente, não entendo nada de arte... – o olhar dele voltou ao meu, senti um calafrio – E bem, você parece entender um bocado. Sem contar de que adoraria ajudar mais do que a contribuição que já fiz – hesitei por um momento e respondi.

–Sr. Wayne, eu não...

–Seria um prazer que você me aconselhasse nas obras – ele irrompeu, olhando fixamente para mim.

–Tudo bem – Foi o que consegui dizer.
Sentamo-nos na última fileira de cadeiras assim que o segundo item foi arrebatado.

Durante o restante do leilão fui contando sobre as obras que estavam sendo oferecidas, e ele arrebatou duas, chamando a atenção de todas as pessoas do salão nas duas vezes.

A última e principal peça estava entrando coberta quando falei:

–Essa é a última, Sr. Wayne.

Ele passou a mãos nos cabelos negros e sedosos, dando tempo de eu perceber nas abotoaduras de seu terno que tinham inscritas duas letras. B. W.

Assim que a peça foi descoberta, apresentada e aplaudida olhei para ele e disse nervosamente:

–Sei que vou soar anti-profissional e inconveniente, mas você tem que comprar essa peça, Sr. Wayne. –

Ele olhou para mim como se não esperasse que eu falasse aquilo. E na verdade, nem eu esperava dizer aquilo. Havia comprometido comigo mesma em não falar nada, mas simplesmente não podia me conter.

–Bom, já que tenho que comprá-la, gostaria ao menos de saber o porquê. – disse ele ironicamente, esboçando um sorriso vago. O primeiro que havia visto desde o que encontrei.
–Resumidamente? – Arrisquei um sorriso

–Sim, resumidamente – Ele estava definitivamente se divertindo com o meu indevido nervosismo.

Puxei o ar com força e olhei para a peça.

Uma peça magnífica, de fato. Em arames e bronze, um felino com olhos de ônix com apenas cinquenta centímetros tomava a atenção de dezenas de pessoas no salão. Inclusive eu e Wayne, agora com expressão imutável.

–Essa peça era de sua mãe - disse.

Seu sorriso se fechou em um instante. Ele se ajeitou na cadeira como se de repente houvesse ficado desconfortável, e certamente ficou. Não desviou o olhar de mim um segundo. Até quando ele se levantou e disse:

–Oito milhões de dólares! – sua voz intensa ecoou pelo salão e o leiloeiro bateu o martelo sem nem ao menos contar ou perguntar se havia algum outro interessado. Ele se levantou da cadeira no mesmo instante em que o murmúrio das pessoas em volta preencheu o silencio do ambiente.

Por um límpido reflexo puxei a mão dele enquanto me levantava. Mas soltei assim que percebi que não deveria ter feito aquilo.

–Desculpa... – tentei me desculpar

–Pelo o que? – ele respondeu firme

–Por... Por ter te falado que você deveria comprar a peça. Foi extremamente anti-profissional da minha parte e...

–Não se desculpe. Eu a agradeço. – ele falou com voz firme, mas em seu olhar havia um reflexo de gratidão.

–Foi um prazer, Sr. Wayne. – disse, ainda usando resquícios do nervosismo de ainda pouco. Dei de costas, incerta, e foi quando senti sua mão em meu ombro.

–Espere Selin... Srta. Kyle. – Virei-me em sua direção. O calafrio retornou. O que, diabos, estava acontecendo comigo?

–Você disse ''resumidamente’’. Se não se importar, eu gostaria de saber a versão completa. – disse, resoluto. Levantei uma sobrancelha em desafio e afastei gentilmente meu ombro de sua mão com um passo leve para trás.

–É algo bastante pessoal, Sr. Wayne, não acredito que seja apropriado.

–Seja inapropriada. – recuei mais um passo

–Não acredito que eu deva. Se me der licença... – sua mão me parou. Ele havia avançado os dois passos que eu tinha recuado, e agora estava segurando gentilmente a lateral de meu ombro.

–Por favor. – Não acredito que Bruce Wayne seja uma pessoa que peça muitos ‘por favores’, e mesmo assim continuei a recuar, porque não poderia me perder em um homem que sabia exatamente o que fazia, quando eu também sabia o que ele fazia e queria.

–Outro dia, talvez –

–Que tal agora? – sua insistência me derretia. Era de modo tão natural e gentil que me impressionava. E a tensão entre nós só aumentava. E por um instante me perguntei por que não poderia me aventurar na pele de Selina ao menos uma vez. Ou então, assumir meu outro papel e aproveitar um pouco da situação. Não faria nenhum mal variar de vez em quando.

–Tudo bem. – concordei, surpreendendo-o – Mas não aqui. Conheço uma ótima loja de vinhos. E não se preocupe, lá não terá plateia. – Olhei por seu ombro, e ele fez o mesmo, reparando as pessoas que o encaravam. Encaravam-nos.

–Meu motorista... –

–Não. Eu o levo. Não estou a fim de sair em nenhuma capa de revista amanhã... – olhei para ele, e ele assentiu. – Venha. – mostrei o caminho para meu escritório.

–Vamos pelo meu escritório, lá tem uma passagem direta para o estacionamento. – ele me olhou demoradamente enquanto caminhávamos. Continuei em silencio.

Quando chegamos ao estacionamento, eu havia pegado minha bolsa em meu escritório e sacado fora minhas chaves. O olhei de canto de olho e não consegui esconder um sorriso.

Ele olhou de volta e eu falei:

–Você não parece confortável.

–Não é muito comum pra mim essa situação... – ele balançou os braços em um movimento elegante e firme

–Não é nenhuma situação. – Falei, apertando o botão de destravar o carro assim que chegamos à frente dele.

–Para uma consultora de arte, você deve ganhar razoável... – disse, olhando para meu Mustang conversível. A capota estava abaixada, mas a cor vermelha o deixava, como sempre, extravagante por si todo.

–Amo o que faço Sr. Wayne, e é por isso que faço de graça. Amo o museu e amo as crianças dos projetos sociais, mas o que faço para ganhar a vida é bem diferente. – Abri a porta do motorista. – Você não vai querer que eu abra a porta para você, vai, Sr Wayne?

–Me chame de Bruce. –

–Me chame de Selina. – eu repeti

A loja de vinhos estava, assim como eu disse, vazia.

Sentamo-nos na mesa mais reservada e assim que o garçom entregou a carta de vinhos eu disse:

–Eu estava lá. No Museu. Eu estava lá quando sua mãe doou a peça. Eu era uma das crianças que participava dos projetos sociais. Eu e minha irmã. – Ele baixou a carta e fez menção de perguntar algo, mas se interrompeu. E eu continuei a falar:

–Eu era bem nova, mas mesmo assim aquele dia marcou minha vida.A bondade de sua mãe me toca até hoje. - disse, cautelosamente.

–Obrigada – ele disse, colocando a carta de vinhos na mesa. – Obrigada por ter me dito sobre a peça.

–Só fiz o que achei certo. Se aquela peça fosse embora do Museu, que ela, ao menos, voltasse para casa.

O garçom voltou e fizemos o pedido.

–Então você participou dos projetos sociais... –

–Sim, eu era pobre, se é o que quis dizer. –

–Sua história deve ser bastante interessante de saber. – O garçom voltou servindo as taças. E saiu rapidamente.

–Não acredito que seja – murmurei tomando o primeiro gole.

–Posso decidir por eu mesmo. Não acha? –

–Não. Honestamente, não acho. – disse com voz baixa. Abaixei a taça em um movimento vago, e falei – Bruce, somos adultos e não vou negar que senti uma tensão por você assim que te vi no salão. E acredito que você o mesmo por mim. – ele estava com a taça nos lábios, e assim que terminei a sentença a abaixou com calma.

–Você é bem direta. E bem diferente da mulher que estava me explicando sobre arte há duas horas.

–Então vou continuar direta. Podemos terminar nossos vinhos, você chamar seu motorista e cada um ir para seu caminho, ou talvez...

–Talvez? – ele perguntou cinicamente.

–Talvez você possa me convidar para tomar outra taça de vinho na sua casa - Ele levou o vinho aos lábios e tomou um grande gole. Fiz o mesmo.

–Gostei da idéia.

–Ótimo!

–Quando quer ir? – ele disse. Abri um sorriso e terminei meu vinho com um grande gole. Peguei minha chave e coloquei em cima da mesa.

–Você dirige. – levantei da mesa tirando o dinheiro da carteira e colocando em cima da mesa.

Ouvi ele se levantar e sair da mesa, pegando as chaves. Alcançou-me na saída do local, colocando as mãos na base da minha coluna. Esse pequeno toque reverberou em meu corpo inteiro.

Caminhei em passos largos até o carro, que estava próximo, e ele abriu a porta do passageiro para mim. E logo se sentou no do motorista e arrancou pelas ruas de Gotham, até entrar no centro da cidade.

–Minha cobertura fica próxima – ele explicou. Assenti com a cabeça sem falar nada e ciente de que ele não estava me levando para sua casa. A mansão Wayne ficava longe da cidade. Agradeci mentalmente por ele ter escolhido a cobertura, pois não ficava longe da minha cobertura.

Ele parou o carro em um prédio enorme que coincidentemente era a uma esquina do meu. Havia reconhecido a rua assim que ele a adentrou, mas fiquei em silencio.

Saímos do carro e ele entregou a chave ao manobrista, que nos cumprimentou cordialmente. Entramos no elevador, ele introduziu o código da cobertura ele irrompeu o silêncio:

–Você pode ir embora, se quiser. – olhei pra ele como se ele tivesse falado uma grande idiotice

–O que o faz pensar que quero ir embora? –

–Seu silencio.

–Meu silencio o incomoda?

–De certa forma. – ele disse firme assim que o elevador chegou ao ultimo andar. Dei um passo a frente, demonstrando minha vontade.

–Se você quiser, eu posso ir embora. – retruquei, levantando a sobrancelha.
Ele saiu do elevador privativo com uma passada firme. Deixando, também, bem clara sua posição. Nenhum de nós daria para trás.

Virei de costas para ele e olhei ao redor. A suíte era uma mistura de reservado em tons firmes. Nada extravagante. Na verdade, tudo parecia muito simples em apenas uma só olhada, mas tudo ali não era, de longe, apenas simples. Incluindo o dono.

Senti ele se aproximar devagar. Virei ao encontro dele. Seus olhos estavam em chamas.

Nenhuma palavra foi projetada. O momento de falar havia se findado.
Dei um passo à frente, indo a seu ritmo. O ar ficava mais denso a cada segundo de aproximação.

A tensão e a excitação eram palpáveis. Tremi quando ele me puxou pela cintura. Foi um toque gentil e possesso. Sua outra mão tirou uma mecha de cabelo de meu rosto. Aproximei-me mais um pouco de seu corpo para receber seu toque e seu beijo vindouro.

Consegui sentir sua respiração junto a minha por um instante, e o roçar de seus lábios, aparentemente inquietos, juntos aos meus... Foi quando o celular dele começou a tocar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado do primeiro capítulo. Se vocês quiserem mais histórias romanticas BatCat é só entrar no meu perfil e verem minhas histórias. E aos leitores de ''A Escurdão'' e ''A Gata e o Morcego'', peço desculpas pela demora de novos capítulos. Eu sei muito bem o que é essa espera.Nos vemos logo.