Inominável escrita por Sir Andie


Capítulo 7
Como um vírus




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E ali tão perto, no outro banco do carro a convidada parecia ser a presa mais doce da face da terra. Com movimentos leves virou a palma das mãos para o teto e deu de ombros com uma careta engraçada de tédio misturado com riso, voltando a sua posição mais comportada.

– Oh meu Deus... Eu não acredito que foi justamente esses dois idiotas que enfiaram no meu caminho – o olhar foi de um para o outro e depois de volta ao teto, encarando entediada o nada - Dois idiotas – reforçou outra vez – Dois idiotas prendendo uma garota só por... – ela teria continuado com sua voz dramático e olhar perdido, mas apertou as sobrancelhas trocando-os para uma expressão de curiosidade exagerada - Por que mesmo que vocês estão me prendendo? Toda a porra dessa cidade está louca e você prendem a vítima?

– Você não é dessa porra de cidade louca – acusou a voz de Sam. Suas palavras saindo por entre dentes cerrados e lábios comprimidos, o tom sarcástico dela não caia bem aos ouvidos dele.

– Bela constatação gatinho. – a garota piscou com um sorriso sapeca - Mas vocês também não. – os encarou nos olhos, segura de si – O que você quer? O premio de Sherlock Holmes?

– Oh, damn it! Dean se colocou entre os dois, controlando o interrogatório antes que Sam fosse mais longe com as ameaças desmedidas – Você que está livre dessa, gatinha. A gente entendeu essa parte, okay?

Seus olhos procuraram primeiro pelo irmão, e depois pelos dela. Olhos azuis profundos, que apesar de escuros como um azul marinho brilhavam em pontos quase brancos. Ela sorriu de volta com os olhos, devolvendo a intensidade o desafiando. Tentou não se afogar ali.

Concentrado com o que devia fazer ele piscou e fugiu. No tom mais grave que sua garganta emitia despachou para ela sua ordem.

– Vou te dizer o que acontecer. Eu levantar aqui do meu lugar e vou até aí abrir a porta. Em seguida irei abrir apenas uma das algemas. A parte seguinte é bem simples. Se você tentar me atacar, o grandão ali vai te atacar de volta. Já sabemos que você é rápida, mas você também já sabe que nós dois juntos somos problema. E então, se até aí você tiver sido uma boa menina, eu vou prender a outra parte da sua algema em mim. Não vai conseguir fugir comigo na sua cola, acredite eu sou um bom corredor. E aí vem a parte mais divertida. Vamos esconder nossas mãos dadas romanticamente por uma algema dentro do meu casaco. Você até pode fazer um carinho se quiser – apesar da piada, ele não estava brincando, ainda a olhava nos olhos com o tom de ameaça – Ele vai na frente e vai ser assim que vamos entrar na pensão. No quarto conversamos direito.

Ela ouviu tudo em silêncio, sem tirar os olhos dos dele por um segundo. Uma fixação tão intensa que Dean se perguntou porque não sentia incomodo, porque não conseguia fugir dali. A garota não reagia a nada, muito menos as piadas e cantadas baratas.

E foi justamente daquele jeito que aconteceu. Ou quase assim.

Era importante que os três não chamassem a atenção, se a garota resolvesse gritar que estava sendo presa seria difícil explicar porque a estavam levando para o quarto e não para a delegacia. Se algum dos clientes visse as algemas a coisa poderia ficar feia.

Precisavam atravessar o bar para pegar o corredor que levaria as escadas que por sua vez levaria aos quartos. A velha gorda dona do lugar não estava no balcão. Apenas sua filha magricela. Sem dar um pio a jovem garçonete os encarou entrando com os olhos arregalados. Obviamente estava perdida sobre parar a eminente suruba em seus recintos ou não. Ou talvez cobrar a mais pelo novo uso. Ou talvez...

Em um ataque de criatividade a garota algemada deitou a cabeça no ombro de Dean. Surpreso, em resposta ele puxou mais o braço preso para perto do seu corpo. O tranco que o corpo da sua acompanhante deu foi apenas o toque especial para o que ela faria a seguir. Ainda andando, mas agora de olhos fechados ela colocou a língua para fora e passou a beijar e lamber o pescoço do seu sequestrador. Como um beijo de língua sem pudor a garota atrás do balcão levou a mão até a gola do uniforme chocada.

Sam, alguns passos a frente, demorou até entender o que se passava. E quando percebeu a garçonete literalmente lambia a própria boca olhando para ele virou para trás deixando por alguns segundos a expressão de raiva e a trocando pela de desconcerto.

No fim da cena, exatamente quando já estavam escondidos da visão da garçonete graças às paredes do corredor das escadas, Dean percebeu que ainda podia sentir seu sangue pulsar por todo o corpo e não era mais por aquela raiva.

No corredor do quarto, enquanto a porta aberta, o olhar que os três trocavam entre si decidia que por hora ninguém comentaria mais a cena.

– E então – começou Sam tentando voltar ao clima de acusação. Felizmente todo o envolvimento não planejado para passarem pela garçonete tinha feito com que os três ficassem mais calmos uns com os outros. O tom de urgência e ódio em sua voz tinha sumido, dando lugar apenas a desconfiança.

– Achei que você tinha dito que já sabia – ela respondeu enquanto Dean prendia suas mãos na cadeira. O olhar dele procurava o dela de maneira não racional e incessante, já sentia falta do que tinha encontrado no carro.

Mas dessa vez ela não o olhava, nem ao menos parecia se importar em estar mais uma vez sendo presa, prestar atenção nos comandos vazios de Sam era seu foco naquele momento.

Enquanto ele falava ela levantou, as mãos presas para trás do corpo contra o ferro da poltrona, um dos pés encontrou o acento e depois o outro. Sem esforços ela ficou de cócoras na poltrona mesmo estando presa. E assim com uma delicadeza incrível e bela escorregou, sentando-se na posição de lótus.

– Não me teste. – respondeu Sam em pé, com as mãos cruzadas no peito e as costas apoiadas no batente da porta do banheiro - O que você está fazendo com a cidade?

Dean tomou acento na beirada da cama, os cotovelos apoiados na perna e o olhar caminhando de um para o outro sem ser preciso mover a cabeça.

– Eu não estou fazendo... Nada com a cidade. – ela falou mais alto e depois torcendo o pescoço se forçou a voltar a falar com calma. Era realmente um esforço, pois pela primeira vez seu rosto se deformou.

– Então quem está? – acusou um Sam que de novo começava a falar em um tom mais alto. Por hora apenas um.

– Ninguém está. As pessoas estão iradas. – seu tom era óbvio, quase como chama-los de burros, frisava sílaba por sílaba.

– Isso nós percebemos. O que estamos perguntando é o que está fazendo com que as pessoas estejam iradas. – tentou explicar Dean também perdendo a paciência. Soltou a cabeça sobre o pescoço e em um ato de companheirismo também cruzou os braços sobre o peito.

– A ira. Idiota. – e desde que entraram no quarto ela olhou para Dean pela primeira vez. Seu olhar o fuzilou pelas próximas palavras - O pecado da ira.

– Ira? Um dos sete pecados. Desde quando Ira é mais do que uma ação humana? Desde quando ira existe. – as respostas chegavam a Sam conforme ele precisava, rápidas e amargas, porém, se não estivesse tão preocupado em desafiá-la poderia admitir que a curiosidade sobre a nova afirmação procurava espaço entre os sentimentos bravios.

– Provavelmente desde que Deus inventou essa porra dessa bola azul - uma lufada de ar escapou de sua boca fazendo pouco caso, os Winchester não pareciam ter caído na dela – Pelo amor de Deus! – ela encarou um e depois o outro - Tudo existe! Ainda não aprenderam isso?

– A ira existe. – começou Dean tornando a conversa um pouco mais didática para que todas as informações estivessem sendo mastigadas pelo seu cérebro - O pecado ira existe. Como a morte, o cavaleiro do apocalipse morte?

– Não. – a morena respondeu efusiva - O cavaleiro do apocalipse... – ela titubeou ao tentar explicar o resto, como se estivesse procurando palavras em um acervo pequeno - Pelo o que eu sei ele é... Como explicar... Ele... Ele é uma personificação. É visível em corpo, tem raciocínio, personalidade. Assemelhasse a uma pessoa. Deus tem dessas manias. Imagem e semelhança, mas não importa nesse caso. A ira... Bem. Eu gosto de pensar nos pescados como uma doença, a maneira que eles agem, funciona como um vírus.

– Pelo o que você disse as pessoas de Saint Andrea estão sofrendo de uma epidemia. Estão realmente doentes. – Sam sussurrou sua conclusão para o chão. Mas é claro que ela tinha ouvido.

– Pelo jeito que você me olha gatinho... – ela jogou o cabelo para trás do rosto antes de continuar sua frase - Com certeza estão.

– Porque Saint Andrea? De onde veio essa porra toda? – perguntou Dean se esforçando ao máximo para não seguir a linha que a única mexa que tinha ficado para frente seguida, encostada na pele do colo dela, esgueirava-se por dentro do tecido da blusa.

– Eu já disse! – impaciente em ainda ser acusada a garota sacudiu as algemas - Nada disso é minha culpa! – gritou e então continuou com seu costumeiro tom baixo e debochado - Eu não tenho todas as respostas, bonitão. – e inesperadamente ela sorriu - Mas tenho um palpite.

– Desembucha. – a ordem vinda de Sam veio antes que ela terminasse a última sílaba da palavra palpite.

– Ele é o esquentadinho não é? – perguntou a garota olhando para Dean. Dessa vez ela o olhou nos olhos e sorriu. Os dois estavam se entendendo.

– Não abuse. – Sam tomou mais proximidade. Ela e Dean podiam ver que a mão do outro apontava para o chão a ponta de uma adaga - Se você sangra, você morre.

– Tente. – ela levantou uma das sobrancelhas, tinha literalmente sorrido ao vez a lâmina ameaça-la.

Foi então que o grandão se deu conta que o olho dela não estava mais vermelho e não devia estar desde a hora em que saíram do carro. O que antes parecia um ferimento químico no mínimo feio tinha desaparecido em minutos. Ele não se lembrava dela reclamando do olho depois que a conversa em si começou.

A maneira como ele a olhou naqueles segundos o entregou, ela o estava olhando de volta. Enquanto Sam tentava se convencer que Detox não devia ser assim um caso tão sério quando caia nos olhos ela aproveitou para controlar o próximo rumo do assunto.

– Você é o sensato. Da para perceber facinho. Cinco minutos com você e as maiores obviedades do mundo. Você é quem pensa – ela continuava focando em Sam - e ele é quem faz. – Dean tentou não imaginar conotações sexuais com essa parte da frase. - Logo ele é o esquentadinho. É por isso que agora você está me olhando desse jeito sexy e sadomasoquista. – ela mordeu a boca imitando a garçonete de minutos atrás, o loiro teve vontade de rir - Você é o alvo suscetível.

– Então a ira está atacando a cidade porque as pessoas são... Boas pessoas? – Dean revelou seu óbvio raciocínio em voz alta.

– Parabéns menino esperto! Você acaba de ficar mais sexy. – ela deixou uma das pernas escorregar e o pé tocar outra vez o chão. – Como eu disse, é como um vírus. As vacinas funcionam porque no fim das contas são os próprios vírus anulados, logo um vírus de verdade não atacará um corpo que pensa que está doente. É simples. Nessa cidade a Ira conseguiu chegar a esse ponto porque encontrou um terreno ainda intocado pela raiva.

– E como você sabe disso... – Dean sorriu entrando no jogo da convidada, ainda pensando na mordida na boca - Espertona.

– Há alguns meses atrás eu vi algo parecido. – e então a outra perna também pousou no chão – Eu acho que era luxuria. Não posso dizer ao certo, mas os casos de lá e os casos daqui... Eles tem essa energia descontrolada, sabe.

– Então você é uma caçadora? – Dean perguntou arregalando os belos olhos verde em tom de excitação.

– E como a gente para essa coisa? – coube a Sam fazer a única pergunta que importava naquela história toda.

– Por que você continua me fazendo perguntas como se eu soubesse de tudo? – ela deu mais um chacalhão na cadeira. A julgar pelo movimento do quadril estava tentando encontrar uma posição mais confortável.

– Você acabou de dizer que combateu luxuria. – mesmo que a própria cabeça dissesse que não Dean ainda estava concentrado no assunto. Mesmo que ver a bunda da garota deslizando na cadeira tirasse seu foco visual o mental continuava no que interessava.

– Eu disse que eu vi a luxuria agindo. – ela corrigiu pacientemente.

– Então você não é uma caçadora? – agora ele parecia desapontado, a julgar pela maneira que sua boca se abriu e seu nariz dilatou.

– E só por isso eu devia combater pecados? – o tom dela não parecia encontrar a ligação de um ponto e outro apresentado pelos irmãos.

– Ah claro. – começou Sam de maneira sarcástica - Então o que você fez foi deixar que uma cidade inteira se matasse.

– Na verdade era um acampamento para retiro espiritual de jovens antes deles entrarem para faculdade. – respondeu de maneira calma - Não vi motivos para combater algo que os fazia trepar. Trepar é bom não é? – ela olhou para Dean esperando que ele a ajudasse com sua tese. Quando percebeu que não receberia a resposta que queria continuou. – É claro que na hora que começaram a envolver cachorros e cabras a parada ficou estranha até para mim. Mas se querem mesmo saber, adolescentes, grupal, bissexualidade espontânea, látex, maquinas de estocar, cadeiras de vibratórias, bondage, bukake, voyeurismo, dominação, submissão e é claro um pouco violência, são completamente saudáveis. Saudáveis é claro se levarmos em conta a teoria de que a luxuria age como uma doença. Vocês entenderam.

Com uma careta desconfortável Dean levantou da cama e foi olhar pela janela. Fazendo questão de ficar de costas para os dois. Cortando assim contato visual com a garota.

– Dessa vez as pessoas estão morrendo. – retomou Sam ignorando as declarações sexualmente abertas dela.

– Eu estou do lado de vocês garotos. – por cima dos ombros ela tentou olhar a algema e quando o rosto voltou para frente ela já estava massageando o pulso vermelho e solto com uma careta bem na frente do corpo. – Talvez sexo de privação não seja para mim. Ou eu sou boa com algemas. Vai saber.

Primeiro os dois se assustaram com a cena. Ela tinha simplesmente espremido a mão para fora das argolas e Dean tinha se certificado em apertá-las para o tamanho do pulso fino de uma garota. Por alguns segundos, enquanto ela massageava as laterais vermelhas da mão Sam se perguntou se o que ela estava esfregando e fazendo sumir na calça preta era realmente sangue.

Dean, que agora ria de ter encontrado uma garota tão abusada, voltou a se virar para a janela com certa pressa.

– Eu disse que ela era uma caçadora, cara. – por cima do ombro tentando virar a cabeça para trás o máximo que conseguia ele sussurrou pelo canto da boca como um segredo para Sam.

– Espera. – o quase grito de Sam a manteve sentada na cadeira – O que estava fazendo ontem rondando a cidade de madrugada – ele olhou para o irmão buscando ajuda no interrogatório. Dean ainda olhava para os dois virando a cabeça por cima do ombro sem querer deixar de ficar de costas.

– Vocês estavam me seguindo? – ela parecia sinceramente surpresa.

– Para uma caçadora você é um tanto desatenta. – finalmente Dean se virou para o grupo novamente. Para Sam, por cima dela, ele soltou um sorriso envergonhado e confidente sobre a situação anterior.

– Não faço o estilo clássico... Eu acho. – ela virou o corpo inteiro sobre a cadeira, apenas para encarar Dean novamente.


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