Aquele Que Veio do Mar escrita por Ri Naldo


Capítulo 8
Time




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Só percebi o que tinha me acordado depois de alguns instantes. Era alguém batendo na porta. Já estava virando rotina.

Abri a porta e me deparei com a cara de Louise, ainda marcada pelo choque de ontem.

— Nós precisamos conversar... Meus deuses, Dylan — ela falou. Olhei para trás dela e vi Mirina e Julieta.

Elas estavam com as maçãs do rosto estranhamente vermelhas. O que eu tinha feito? Então lembrei que eu estava de cueca novamente. Eu sempre dormia de cueca. Droga.

— Deixe eu… hum… apenas trocar de roupa — falei, e fechei a porta.

— Vamos — disse Mirina, depois de eu já ter saído do chalé, agora completamente vestido.

Era manhã cedo, então ninguém estava de pé. E provavelmente não teriam vontade de começar as tarefas tão cedo depois do que aconteceu — principalmente o chalé de Ares, que ganhara um mês sem trabalho diário pela vitória de Louise.

Ninguém se atrevia a tocar em Rachel, todos estavam completamente atônitos. Até parece que era a primeira vez que ela fazia isso.

Paramos em algum lugar perto do lago, Louise tinha levado um mapa.

— Então, o que viemos fazer aqui tão cedo? — perguntei, sentando na grama.

— Discutir as estratégias, claro — Louise falou e abriu o mapa.

— Estratégias de quê? — perguntei.

— Da missão — as três falaram em uníssono.

— E onde diz que somos nós que temos que ir?

— Na profecia.

— Mas ela só diz o Sol, o Mar, a Guerra e a Morte.

— Você vê outro filho do Mar ou da Morte aqui? — perguntou Julieta.

— Não, mas nem você nem Louise são as únicas filhas do Sol e da Guerra, respectivamente.

— Eu me voluntariei — disse Louise, decidida.

— Naturalmente — Mirina falou.

— E você acha mesmo que eu ia deixar vocês três irem sozinhos? — falou Julieta. — Team DJML!

Julieta esticou a mão, e Mirina colocou a dela por cima. Eu fiz o mesmo. Louise revirou os olhos e murmurou "idiotas". Peguei a mão dela, que estava muito fria, e puxei para cima da minha. Julieta colocou a outra mão por cima de todas e depois nós todos falamos "Team DJML", em uníssono, Louise com voz de vômito. Bom, se íamos morrer, pelo menos morreríamos com humor.

Por fim, Louise voltou a pegar o mapa e um lápis.

— Nós vamos sair daqui na van do Acampamento, que nos deixará em Nova York — ela traçou uma linha de Long Island até Nova York.

— Quem vai dirigir essa van? — Mirina tirou as palavras da minha boca.

— Argos. Ele é o motorista do Acampamento.

— Continue — falei.

— Então, eu estava pensando… para onde nós vamos?

— Hm, o Dylan não foi atacado em Albuquerque? Deveríamos voltar para lá — Julieta sugeriu.

— Ciclopes são burros, mas nem tanto. — pensei que era a voz de Louise, mas percebi que era diferente… um voz suave, como a de…

— E o que você faz aqui? — Louise perguntou, com raiva. Olhei para trás e reconheci o cabelo loiro e os olhos cinzas profundos. Então era por isso que eu estava com a estranha sensação de estar sendo observado.

— Só fiquei curiosa — Annabeth falou. — Estava sentada no gradil do meu chalé. Não durmo há dias — de fato, ela tinha olheiras profundas destacadas na pele branca. Então vi vocês três indo em direção ao lago e a curiosidade me venceu.

— Já que está aqui… — Mirina interveio. — Vai nos ajudar?

— É o meu namorado, não é? Bom, provavelmente o esconderijo dele é em outro lugar — ela analisou o mapa. — Tenho uma ideia.

— E qual seria? — Julieta perguntou.

— Ao invés de irem até Nova York com a van, por que não vão com a Sra. O’Leary? Levem ela com vocês. A profecia fala sobre quatro semideuses, nada sobre uma cadela infernal gigante…

— E então iríamos para Albuquerque e ela farejaria o cheiro do ciclope — Louise completou.

— Creio que não temos muito tempo para ir montados em uma cadela — falei.

Todo mundo riu, exceto eu. Fiquei com cara de boia.

— Por que estão rindo?

— Novatos… Cães infernais não apenas correm. Eles podem viajar pelas sombras, literalmente — Louise disse.

— Ah, certo. Estranho. Mas por que temos que parar em Nova York? Por que não vamos direto para Albuquerque? — perguntei.

— Não é assim, Dylan — Mirina explicou. — Eles não são onipotentes, então se cansam como todo mundo. Só podem viajar uma distância razoável de cada vez. Atravessar os Estados Unidos em uma viagem só poderia custar a vida da Sra. O'Leary. E se ela morrer, não teremos como continuar nem como voltar.

— E como é viajar nas sombras?

— Completamente desagradável — Annabeth respondeu. — Mas é o único jeito, antes que… que aconteça algo a Percy — a voz dela parecia triste. Uma tristeza profunda. Perdeu o namorado, a pessoa que ama. "Vou resgatá-lo", prometi silenciosamente. Na verdade, eu precisava resgatar, ou todo o Acampamento viraria um caos. Aquele cara era como uma celebridade, e todos perderiam a esperança caso algo acontecesse com ele.

Eu me levantei.

— Quando partimos? — perguntei.

— Amanhã cedo — Louise respondeu. — Quanto menos tempo perdermos, melhor.

Estremeci. Mal tinha passado uma semana e eu já iria partir em uma missão na qual tinha chance de não sobreviver? Bem-vindo à minha vida.

— Eu… vou descansar um pouco — falei.

— Ei — Louise apertou meu ombro. Ela tinha um toque quente e forte. Quando ela me tocou, todos os meus medos evaporaram. — Não se preocupe, vai ser moleza. — ela piscou pra mim.

Típico de uma filha do deus da Guerra. Não hesitavam em uma boa luta. Mas algo me dizia que não iria ser tão moleza assim.

Nós quatro fomos caminhando até os chalés. Quando chegamos, alguns campistas já estavam em atividade, e olharam para nós fixamente enquanto passávamos. Eu não gostava de ser o centro das atenções, ainda mais por uma coisa ruim.

Annabeth saiu sem dizer nada. Pelo visto eu ainda a deixava tensa. Nós três ficamos olhando um para o outro por alguns segundos constrangedores. Por fim, eu falei.

— Louise, Julieta, vocês têm seus companheiros de chalé. Eu e a Mirina, hum… não temos ninguém nos nossos chalés. Já que a Rachel não está aqui para monitorar, Mirina poderia vir passar um tempo comigo para a gente conversar… — falei. Eu não aguentava mais ficar sozinho no meu chalé. Principalmente agora.

Louise me analisou novamente. Eu parecia mesmo um pedaço de carne? O que tinha de errado com essa menina? Ela deu de ombros e saiu andando em direção ao chalé de Ares. Julieta a seguiu, e virou para o chalé de Apolo.

Comecei a andar, e Mirina veio comigo. Depois de um tempo, ela falou:

— Má ideia você ter sugerido isso. Não que eu não queira, mas…

— Mas o quê?

— Não viu a cara dela?

— Sim, e daí?

Ela deu uma risada.

— Vocês meninos, como são ignorantes!

— Do que você está falando?

— Deixe para lá. É só uma suposição mesmo.

— Tanto faz. E aí, vai querer aproveitar seu provável último dia no Acampamento ou não?

Com esse comentário "feliz", começamos nossas típicas conversas malucas de sempre. Roubamos alguns morangos dos campos, participamos das sessões diárias de canoagem, rimos à toa contando piadas péssimas um para o outro, lutamos na arena, fomos dar comida ao Peleu, até nos juntamos a Travis e Connor e pregamos peças nos outros campistas. Foi tudo muito divertido. Mas uma sensação de tristeza me inundava quando eu pensava que esse poderia ser meu último dia de diversão, o último dia no lugar em que eu finalmente me sentia em casa depois de anos perdido. Deixei esse pensamento de lado e aproveitei ao máximo.

Por volta da hora do jantar, eu e Mirina voltamos para os chalés, exaustos.

— Eu vou tomar um belo e demorado banho — ela falou. — Vejo você no jantar?

— Claro — falei, indo abraçá-la. Ela pigarreou.

Tinha esquecido de um detalhe: Mirina odiava abraços. Acho que era consequência de ser filha da Morte.

— Oh… desculpe — apressei-me em dizer, e estendi a mão. Ela a apertou, e depois foi embora.

. Lembrei que não tinha visto Louise desde manhã. Quer dizer, não falava com ela desde manhã.

Tomei um banho, me arrumei e saí para o refeitório. Louise estava na mesa de Ares, como de costume.

Rachel anunciou a nossa missão, e foi só o que fez. Ela parecia tensa, como se estivesse envergonhada por ontem. Comi, fiz minha oferenda diária e fui para o chalé. O clima estava tenso hoje, ninguém queria conversar.

Não tive muita dificuldade para dormir, já que estava exausto pelo dia que passei com Mirina.

Sonhei que eu, Mirina, Julieta e Louise estávamos caminhando por uma estrada de terra, e dos lados, a grama crescia até a altura dos joelhos. Mas tinha uma coisa estranha, a imagem de Mirina tremeluzia, aliás, todos tremeluziam. Como sempre, acordei suando frio. Odiava aquilo.

Não foi difícil arrumar as malas, visto que eu tinha poucas coisas. Couberam todas as minhas roupas, comida, ambrosia e néctar numa mochila só. Peguei a única coisa que faltava: Meu MP3. Eu o tinha usado muito nesses dias. Eu era realmente bom em esgrima, modéstia à parte. Eu o virei e achei a entrada escondida do lado de onde se conectava os fones. Conectei o fone à essa entrada, e o aparelho ganhou forma, transformando-se em uma espada. Os fones formavam um laço que se prendia ao final do suporte da espada. Puxei esse laço e logo tudo voltou ao normal: o MP3 numa mão e os fones na outra.

Olhei ao redor. Provavelmente seria a última vez que eu olharia para o teto decorado do meu chalé. Estremeci com esse pensamento.

Saí do chalé sem pressa. Encontrei-me com Louise, Julieta e Mirina no refeitório. Fomos juntos, sem dar uma palavra, até onde a Sra. O’Leary estava — no depósito de armas de Hefesto, brincando com uma bola do meu tamanho. Campistas fizeram um círculo ao nosso redor. Eu já tinha brincado com ela antes, mas nunca viajado nas sombras. Rachel estava um passo à frente dos outros. Ela assentiu silenciosamente e nós três subimos na Sra. O’Leary.

— Prontos? — Rachel perguntou.

— Sim — nós três falamos em uníssono.

Dei uma última olhada ao longo do Acampamento. Era realmente um ótimo lugar para se chamar de casa. Imaginei se um dia voltaria a ver aquela paisagem e a coloração azul-céu da Casa Grande. Respirei fundo e olhei para frente, em direção à grande parede onde o sol fazia uma sombra muito larga. Será que iríamos bater na parede? De repente, dezenas de pensamentos negativos invadiram minha mente. Mas Louise segurou minha mão, e todos se foram com a mesma rapidez.

— Não tenha medo — ela falou.

Assenti e acenei para todos. Mirina estava muito quieta.

Por fim, Rachel assobiou. A Sra. O’Leary latiu e ficou alerta.

— Boa sorte, semideuses — Rachel falou.

— Vocês conseguem! — gritou alguém na multidão.

— Dylan! — Connor gritou. Era a primeira vez que me chamavam pelo nome.

— Mirina! — Travis gritou. Os irmãos piscaram em nossa direção e fizeram um sinal de beleza.

— Louise! — todos do chalé de Ares gritaram em uníssono.

— Julieta! — foi a vez do chalé de Apolo.

Um segundo depois todos estavam em uma confusão de Dylan’s, Louise’s, Julieta’s e Mirina’s. Pareciam uma torcida organizada, só que para quatro times. Ou melhor, um só: DJML.

Rachel sorriu e assobiou novamente.

A Sra. O’Leary ganiu e avançou para a parede. Pensei de novo que iríamos bater, mas antes da tocar a parede, nós sumimos.

Tudo ficou preto.


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