Sagira escrita por Senjougaha


Capítulo 9
Capítulo 9 - O cupido só pode ser sadista




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Estou nesse momento praguejando todas as formas de vida terrestre. Além de me perguntando: por que diabos eu não voltei à forma humana de roupa?

Volto à forma lupina novamente e retorno à humanóide, mas não adianta. Como os humanos diriam… Estou peladinha “da silva”.

– Merda - rosno e soco uma árvore, fazendo com que o orvalho caia em mim e estremeço de frio.

– Sagira? - uma voz me chama hesitante - você está aí?

– Não chega perto, sai! - me desespero e aperto meu corpo contra a árvore socada.

Sua casca machuca minhas costas, mas não me importo. Jamais lidarei com a humilhação que seria Eros me ver pelada. Escondida como estou, ele não me encontraria se não fosse pela maldita corrente!

– Sai daqui, Eros! - grito e solto um rosnado ameaçador.

– Sagira, você está bem? - ele pergunta, preocupado.

Ouço passos se aproximarem e aflita, jogo os cabelos para esconder nem que seja um pouco do meu corpo. Amaldiçôo Perséfone, que com certeza pediu para que ele fosse me buscar.

Me agacho e abraço meus joelhos de forma infantil.

“Céus, ele é Eros! Já deve ter visto milhares de mulheres peladas”, penso, me repreendendo. Mas não consigo agir naturalmente.

Logo, um par de asas coloridas surgem na minha frente e ele me encara confuso.

– Por que está pelada? - ele pergunta e coloca as mãos nos bolsos da frente da calça social.

– Por que está de smoking? - pergunto cética encarando-o de cima a baixo.

Eros franze o cenho e sorri.

– Eu devo te deixar sozinha? - ele pergunta com um sorriso malicioso hesitante.

Abro a boca para responder, mas sou interrompida por um baque surdo e um pano é jogado na minha cara.

Tiro-o dos meus olhos e reconheço uma familiar camisa branca de botões pretos.

– Vista - uma voz conhecida manda e só o vislumbre das asas negras já me diz quem é.

O encaro, furiosa. Me recusando a vestir a camisa DELE.

Prefiro morrer. Penso em dizer isso, mas aí me lembro de que não posso morrer. E mesmo que pudesse, eu ainda encontraria Tanatos.

Bufo e estou prestes a me transformar em loba, mas Tanatos me segura rudemente pelo braço e me veste a camisa, fazendo questão de usar força bruta e me machucar as vezes. Ele se demorou enquanto fechava os botões e me fuzilava com seus olhos ainda prateados quando eu tentava me soltar e me virar sozinha.

Certo. Isso foi algumas milhares de vezes mais humilhante do que Eros me ver pelada. Um deus da morte que tem um tanquinho de morrer me ver nua e me trocar como se eu fosse criancinha má é a definição de humilhação.

– Eu posso me virar sozinha - rosno e o empurro.

Ou tento. Ele não sai do lugar.

– Eu estou vendo como pode - ele sorri ironicamente.

Bufo e tento limpar o sangue seco das minhas mãos e da minha boca.

– Você precisa de um banho, está fedendo a sangue - ele continua e puxa a corrente para que eu o siga.

Sorrio ironicamente e passo as mãos sujas na camisa branca emprestada. Seus olhos faíscam com a provocação, mas ele não faz nada, apenas continua andando.

– Sagira - Eros me chama, seu tom de voz está diferente.

Me viro e arqueio a sobrancelha para que ele continue o que ia dizer.

– Você não respondeu porque estava pelada - ele insiste, mas seu tom não é malicioso.

Sinto o cheiro de Eros e só percebo desconfiança. Um pouco de preocupação, mas a confiança se sobrepõe.

– As antigas rasgaram durante a caçada - respondo e dou de ombros, voltando a seguir Tanatos.

Eros alça vôo e vai na frente. Sinto cheiro de alívio na lufada de ar que se levanta com suas asas batendo. Só então percebo que estava prendendo a respiração e a solto devagar.

Tanatos está me esperando parado e seus olhos estão dourados de novo.

– Por que mentiu? - ele pergunta subitamente quando voltamos a andar.

– Eu não menti - respondo, fingindo estar confusa.

Ele revira os olhos e viaja nas sombras, logo estamos nos portões do castelo de novo.

– Tome um banho rápido e vá para o salão de jantar - ele diz em tom autoritário.

Torço o nariz, mas faço o que ele disse.

Tomo um banho rápido, apesar da vontade de demorar horas sob a água e escolho um vestido branco que provavelmente fora deixado por Perséfone na cama.

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– Me passe a ambrósia, por favor querida - Perséfone pede com um sorriso singelo.

Tento conter minha cara de desconfiança em relação à essa gentileza toda que Perséfone está esbanjando essa noite, mas não consigo.

Tanatos me cutuca, e quando vê que eu não vou conseguir agir naturalmente, ele mesmo pega a ambrósia para Perséfone.

Eros está me observando desde que entrei no salão. Não consigo sentir seu cheiro porque há muita comida (o que é bom).

Arqueio uma sobrancelha numa pergunta silenciosa de “está tudo bem?”, e ele sorri assentindo, para depois beber vinho.

Está todo mundo muito estranho ultimamente.

Hades pigarreia e nossos olhares vão em direção à ele. Afrodite está com as mãos juntas e parece emocionada. Os olhos de Tanatos passam de dourados à prateados novamente e aí sim eu sei que algo de ruim está por vir.

– Este banquete é em homenagem ao namoro entre minha filha Sagira e Eros, filho de Afrodite e Ares - meu pai diz e meu sangue vira gelo - que essa união tenha ótimos frutos!

Ele ergue a taça de néctar com um sorriso orgulhoso direcionado a mim.

Prendo a respiração e tenho um ataque de pânico. Não consigo soltar o oxigênio que entrou em meus pulmões.

Tanatos tira a taça de vinho de minhas mãos antes que eu a solte no chão e me fita com um sorriso nos lábios. Mas seus olhos estão prateados e gélidos e isso me incomoda.

– Parabéns, Sagie - ele diz e me dá um abraço apertado que não retribuo por ainda estar mortificada e não saber como se abraça alguém que possui asas - Eros só se casou uma vez na vida, o resto foi gandaia, certamente você é especial pra ele.

Todos na mesa soltam gargalhadas do comentário aparentemente bem humorado de Tanatos. Consigo forçar um sorriso, mas estou confusa.

Eros aparece feliz do meu lado e pega na minha mão. Não consigo ter reação nenhuma. Nem para isso, nem quando ele me puxa para um beijo apaixonado que arranca aplausos das famílias reunidas.

Consigo sorrir somente porque sinto como todos ali estão realmente felizes pelo suposto namoro surpresa. Eles pensam que nós estávamos namorando escondido por medo da desaprovação.

Mas meu pai e Tanatos cheiram diferente.

Hades está desconfiado e incomodado com algo.

Tanatos está com instintos assassinos.

– A gente vai se livrar da corrente logo - consigo dizer com a intenção de confortá-lo.

Mas ele simplesmente arregala os olhos e sai do salão.

Eros me observa com um olhar diferente. De repente, ninguém está prestando atenção em nós, e sim nas taças de vinho. Então ele não esconde mais como é de verdade e sua expressão demonstra o cafajeste e ao mesmo tempo, vulnerável que sempre foi.

– Você não sabe mesmo porque ele está assim, sabe? - ele pergunta achando divertida minha expressão confusa.

Nego com um aceno de cabeça e Eros ri, apertando minha mão.

– Bom, não importa - ele diz - eu já tenho você.

Me sinto como um animal encurralado e tento soltar minha mão da dele, mas ele aperta com força e solto um gemido de dor.

– Você é maluco - rosno.

– Sabe qual é a melhor parte? - ele diz em tom baixo.

Não respondo.

– Você sempre soube disso.


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