Sagira escrita por Senjougaha


Capítulo 12
Capítulo 12 - O faraó papagaio me sequestra




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Resmungo e me xingo enquanto me reviro nas cobertas tentando dormir. Estou com hematomas pelo corpo todo ainda, que já deveriam estar curados por sinal.

Alguém abre a porta do meu quarto, que já estava entreaberta devido ao costume de deixá-la assim por causa da corrente que agora nem se encontra em meu pescoço.

Me levanto bruscamente e sem pensar, já estou com os olhos negros varrendo o escuro à procura de algo ou alguém.

Tento acalmar minha respiração e suspiro. Deve ter sido o vento.

Relaxo, e estou prestes a me deitar novamente quando alguém tapa minha boca com um pano úmido, me impedindo de rosnar ou gritar. Minha visão fica embaçada e a ultima coisa que eu consigo enxergar são um par de olhos castanhos e amedrontados.

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Arfo e pisco rapidamente, tentando me situar.

– Onde diabos eu estou? - rosno para mim mesma.

Uma mecha de cabelo cai na frente do meu rosto, me impedindo de avaliar o local. Tento erguer as mãos para retirá-la dali, mas aí então eu percebo que estou algemada.

Fortemente algemada.

Tento quebrar as algemas, mas elas são feitas de um material que nunca vi antes, e estranhamente, sei o que é apesar de não fazer ideia de como se chama.

É um metal encantado por algum egípcio. O brilho dourado que ele emite no escuro do lugar onde estou é encantador e me dá saudades de Anúbis.

Não tinha percebido que há uma porta até alguém a abrir com um rangido de metal velho e enferrujado. Uma cadeira surge na minha frente e um homem de cerca de 30 anos se senta nela.

Seus olhos são verdes, mas sei que são lentes. Ele mostra covinhas ao sorrir sarcasticamente para minha expressão de confusão.

– Ah, pequena Sagira - ele diz como se me conhecesse - não sabe como é bom ver suas caras e bocas enquanto dorme.

Me aperto contra a cadeira e ignoro a dor que sinto nas costas. Esse cara é louco. Só um louco gostaria de ver uma desconhecida “dormindo”.

– Não vai perguntar quem eu sou? - ele pergunta franzindo o cenho, curioso.

Não respondo. Ele aproxima sua cadeira da minha, ainda mais e retira a mecha que caiu nos meus olhos.

Reparo na tatuagem em seu braço. É um Udyat. Um sinal de poder e proteção, relacionado à Hórus, o deus egípcio dos céus.

Ele percebe o que estou olhando e sorri. Toca a tatuagem e volta a mexer no meu cabelo.

– Tira a mão de mim - rosno e tento me afastar.

Ele segura meu cabelo com força e me puxa mais para perto.

– Seja boazinha - ele diz em tom autoritário.

– O que você quer comigo? - pergunto irritada e louca para dar um soco nele.

– Eu estava esperando por uma oportunidade para tirar você daquele corvo - ele diz como se aquilo fosse resposta.

Tento raciocinar o que ele queria dizer e deduzo que se trata de Tanatos.

– Tanatos? - pergunto.

Ele solta meu cabelo e me lança um olhar irritado.

– Tudo o que permanece ao lado dele, perece - ele continua - minha mãe pediu para que eu evitasse que isso acontecesse com você.

– Ísis pediu isso? - pergunto sem acreditar.

Hórus assente.

Eu sei que Ísis e minha “mãe” são amigas. E é exatamente por isso que não entendo o porquê de ela estar querendo me salvar.

Hórus encara o anel em meu dedo e franze o cenho. Arranca de mim e joga bem longe.

– Está noiva de quem? - ele pergunta parecendo irritado.

Arqueio a sobrancelha.

– Sua mãe pediu pra perguntar isso também? - pergunto sarcástica.

Ele estala os dedos e as algemas em meus pulsos se soltam.

Penso em correr porta à fora e fugir do deus gavião, mas sinto que os hematomas ainda estão se curando e que minhas costas estão acabadas. Provavelmente, passei tempo demais naquela odiosa cadeira.

– Eu nem conheço você e ainda quer satisfação da minha vida - resmungo.

– Eu protegi você a sua vida inteira - ele diz num tom afetado e magoado.

– E agora me sequestrou? - pergunto desconfiada.

Ele assume um semblante culpado e se aproxima de mim. Me encolho onde estou e de repente eu gostaria muito de estar presa num buraco, não numa sala com somente uma cadeira e o faraó dos deuses egípcios supostamente protetor.

Ele nota minha linha de raciocínio e se recompõe. Agora seus olhos com lentes baratas me encaram com uma serenidade sem fim.

– Eu sou Hórus - se apresenta, finalmente.

Me remexo, desconfortável na cadeira. Será que devo me apresentar também? Ele me sequestrou, sabe quem eu sou, dãaa!

– E posso perguntar por que estou aqui? - pergunto cansada.

– Depois de me dizer a quem está atada - ele teima e empina o nariz esculpido perfeitamente.

– Hein? - pergunto, piscando confusa.

– Os jovens de hoje em dia já não têm mais um palavreado culto... - ouço-o resmungar - está noiva de quem?

– Eros - respondo ainda sem entender o sentido da pergunta.

– Pois desnoive ou seja lá como se diz - ele ordena numa carranca.

– Escuta aqui, bem que eu quero isso, mas não é tão simples assim - me irrito e levanto da cadeira, erguendo o olhar para vê-lo bem de perto - e não pense que porque governa seus egípcios como bem entender que pode me governar também, eu só obedeço ao meu PAI... As vezes.

Já estamos há vários minutos nos encarando. Parece uma espécie de competição. Quem tiver o olhar mais intenso e autoritário/amedrontador, vence.

Quando estou prestes a desistir, ele pisca e solta um chiado de dor.

Dou um passo para tras e apesar de confusa e curiosa com o que acaba de acontecer, raciocino. Será que essa é minha chance de fugir?

Mas quando tomo fôlego para disparar porta afora, Hórus grunhe e esfrega os olhos.

Dois pontinhos translúcidos caem no chão. Os encaro com um ponto de interrogação estampado na cara.

– Droga, bem melhor assim - ouço Hórus murmurar e direciono meu olhar à ele.

No lugar dos seus olhos com lentes, agora dois pontos luminosos predominam o rosto de Hórus.

Um olho dourado, e outro prateado.

Sua expressão é de desconforto e hesitação.

– Posso saber por que usava lentes? - pergunto achando graça da situação.

Quem em sã consciência tem dois olhos diferentes e quer esconder?!

Hórus me lança um olhar feio do tipo "não pergunte, apenas finja que não viu" e dou de ombros.

Me lembro do que eu deveria estar fazendo. Fugindo.

Tento Viajar, mas a cada tentativa falha, um estalo pode ser ouvido e hieróglifos dourados aparecem no ar, envolvendo meu corpo.

– Não vai conseguir fazer aquela coisa estranha aqui - ele diz, parecendo satisfeito com isso.

– O que Anúbis acha disso? - rosno em sua direção, disposta a lhe arranhar a cara.

Um de seus olhos possui uma cicatriz em forma de fenda. Me lembro de uma lenda em que meu irmão, Anúbis, entrou em conflito direto com o deus papagaio e lhe arrancou uma órbita.

Hahah. Ótima inspiração pro momento.

Hórus segura minha mão com expressão confusa.

– O que está fazendo? - ele pergunta detendo minhas frustradas tentativas de lhe furar o olho são.

Percebo que minha força está reduzida pela metade nessa sala. Principalmente com hieróglifos pequenininhos e brilhantes me cercando.

Seria algo lindo de se contemplar, se eu não estivesse um pouquinho ocupada.

– Tentando te dar uma cicatriz pra combinar! - respondo e tento chutar o meio de suas pernas.

Me sinto mais fraca. Minha visão fica turva e sinto que se eu estivesse bem, não estaria fazendo papel de tonta como agora.

Hórus percebe meu estado e estala os dedos, fazendo com que os hieróglifos caiam murchos, sem brilho e sem vida no chão.

– Ei, menina - ele me deposita na cadeira como se eu fosse quebrar - tudo bem com você?

Não respondo. Sinto minha força voltando a mim aos poucos e fecho os olhos. Finjo que ainda estou mal.

– Sagira... - ele me chama com um tom de voz culpado e arrependido - olha, é só se comportar, não vou machucar você.

Assinto e abro um dos olhos para encará-lo.

Ele está ajoelhado na minha frente. Ah, deuses. O faraó está ajoelhado na minha frente!

E vai me matar pelo que vou fazer agora.

Empurro Hórus com força e uso o que me sobra de energia para Viajar para qualquer lugar que não seja aqui.

A ultima coisa que ouço é um Hórus furioso e gritando palavras sem sentido.

Quando me dou conta do que ele está recitando, já estou na metade do "caminho". Sinto minha garganta se fechar, estou sufocada no espaço escuro que nunca reparei como era. O desespero me atinge como um soco no estômago quando me dou conta de onde estou e que isso nunca me aconteceu.

Estou presa no meio da Viagem nas Sombras.


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