The Amazing Spider-Man escrita por Leinad Ineger


Capítulo 16
Capitulo 16 - Café da Manhã dos Campeões




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Peter olhou para o relógio: seis e treze. Precisava criar coragem, sair da cama e ir para a Universidade Empire State. Abriu a janela do quarto e deixou a luz do sol entrar, esplendorosa, revigorante. Aos poucos, o sono abandonava suas pálpebras. Tinha dormido bem, era só não deixar a preguiça tomar conta. Saiu apressado, sem tomar café. Mal disse “bom dia” à tia May.

A reunião na UES foi apenas rotineira. Tinha o dia livre. Resolveu tomar um café decente. Passou em uma banca, comprou o Clarim e procurou uma boa mesa, coisa fácil de se achar em Nova York por esses dias.

Entrou num café chamado “13”, que não se lembrava de ter visto antes. O lugar estava movimentado, parecia recém inaugurado e era barato. Pediu um especial da casa (sequer olhou no cardápio. Num café com esse nome, achou que os pedidos tivessem nomes estúpidos como “gato preto”, “pé de coelho” ou “olho gordo”), abriu o jornal e esperou.

Esperou sem saber o quê, mas sabia que algo ia acontecer. Sequer estava lendo o jornal, apenas olhava para aquelas páginas tentando entender por que estava naquele local, naquela hora. Começou a suar frio, preocupado, mas seja lá o que estivesse incomodando Peter, não acionava seu Sentido de Aranha. Estaria preocupado à toa?

Foi quando eu entrei.

Cheguei fazendo um pouco de barulho, o suficiente para chamar a atenção de Peter e duas ou três pessoas que estavam lá. Sentei ao lado dele, num banco que ele não tinha certeza se estava ali antes, e pedi um especial da casa também.

(Peter ficaria surpreso se soubesse que o especial da casa se chamava apenas “Especial da Casa”, mas eu acabei não contando essa história a ele.)

Ele ainda estava meio tenso, mesmo sem dar muita atenção a minha presença. Folheava o jornal, indo e vindo, sem ler nenhuma notícia. Procurou o relógio: nove e treze. Teve um deja-vu. Foi quando resolvi puxar papo pra quebrar o gelo:



– Não costuma fazer um sol desses nessa época do ano, hein!?

– Huh!? Ah, é... Efeito estufa, eu acho...



Os pedidos chegaram ao mesmo tempo. Peter abaixou o jornal para comer, sem se dar conta de que meu prato ficou pronto em menos tempo que o dele. Mas ninguém repara nessas coisas.



– Ei! – disse ele, já mais à vontade – Não é todo dia que servem um negócio bom assim!

– Não mesmo. Eu tou acostumado a comer pastel nas quintas-feiras, mas hoje resolvi abrir uma exceção.

– Onde servem pastel de manhã aqui em Nova York?

– Ah, eu não sou daqui. Prazer, Peter. Meu nome é Raul.

– E de onde você é, Raul?

– Brasil. Mas! Por favor, não venha me falar de futebol ou carnaval. Eu odeio esses estereótipos.

– Ah, nem esquenta. Eu trabalho pra um grande jornal, sei que o Brasil tem mais do que isso a oferecer. Como... Por exemplo... Hã...

– Tua comida vai esfriar.



Até que isso é divertido.

Ele continuou comendo, e nosso encontro casual não ia dar em nada, até que resolvi dar-lhe um estalo:



– Ei! Peraí, como você sabe meu nome?

– Nós já nos conhecemos, Peter. Há um bom tempo.

– É mesmo? De onde?

– Da história que estou escrevendo. É sobre você. Você está dentro da história nesse instante.



Ele me olhou intrigado, com vontade de rir, caso entendesse a piada. Caso fosse uma piada.

Mas não era.

Fiz uma pausa dramática (e você, que está lendo isso, ia se divertir muito se estivesse lá) antes de jogar mais lenha na fogueira:



– Estou escrevendo uma história sobre você, o Homem-Aranha. E sobre a tia May, o Jameson, o Lagarto, o Morcego-Humano, Asa Noturna, o Espantalho, Venom, a Liga da Justiça, o Duende Verde, Christina McGee, Kim Fox, homens-aranha mortos, encontros de Natal...



A expressão dele misturava incredulidade e espanto. Eu admito, fiz de propósito. Nada como deixar uma pessoa atônita. Só esperava conseguir acalma-lo agora...



– Ta tudo bem, Peter?

– Ta. Ta, sim. Eu só agradeceria se você não mencionasse o “H.A.” em voz alta...

– Não se preocupe. Ninguém nos ouviu. Estamos sozinhos aqui.



Peter olhou ao redor. Era verdade. De repente, o lugar estava vazio. Nem o garçom estava mais lá.



– Como...? Como você...?

– Eu escrevi assim. Mudei tudo. Ficou incoerente, eu sei. É provável que o Zago e o Sorvillo leiam isso e digam “tem um furo de continuidade”, mas eu sou teimoso e vou deixar assim mesmo. Foi feita uma concessão este mês para eu poder falar com você.

– ...

– Ei...

– Hã!? Ah, entendi... Quer dizer, eu acho... Do que falávamos?



Só rindo mesmo. Provavelmente, é assim que eu reagiria.



– Falávamos sobre a história que estou escrevendo. Você está nela agora.

– Quer dizer que eu não existo?

– Existe, sim. Como história.

– Isso é bobagem! Eu tenho lembranças, cara, memórias de uma vida inteira...

– Em primeiro lugar, não me chame de “cara”. Eu tenho nome. Em segundo lugar, você só tem as memórias que eu criei para você.

– Ah, corta essa.

– Quer que eu prove?

– Se você acha que pode...

– Muito bem. Lembra da primeira vez que você saiu com a Tina?

– É claro!

– Ótimo. Que roupa ela estava usando?

– Eu sei lá!

– Ta vendo? Você não lembra. Quando eu escrevi essa história, não descrevi o que ela vestia. Ela podia estar nua e você nem se daria conta. Mas agora eu resolvi que ela estava usando uma blusa verde. Lembra?

– Lembro, eu... Cara... Quer dizer, Raul... Como... Como você... Quer dizer, isso não prova nada! Você me induziu a pensar que é verde!

– Se você quer acreditar nisso, tudo bem. Vamos apelar um pouco. Quantos anos você tem, Peter?



Agora sim, as coisas estavam realmente interessantes.



– Você não sabe, não é? Não sabe a própria idade. Porque eu o escrevi dessa forma.

– Quer dizer que, tudo de ruim que aconteceu na minha vida...?

– Ruim, não. Difícil. Você precisava aprender alguma coisa, e algumas lições são mais difíceis do que as outras.

– Meu tio morreu por sua causa!?

– Peraí, Peter... Deixa eu fazer um mea culpa. Analise de maneira fria o que você estava se tornando: jovem, com poderes espetaculares, um monte de planos, nenhuma responsabilidade... Além do quê, não fui eu que escrevi essa história em particular...

– Mas você poderia mudar isso... Se quisesse?

– Poderia se quisesse. Mas o que você prefere? Alguém que resolva todas as mágoas de sua vida num passe de mágica ou ser digno de honrar a memória de seu tio? Ele tem muito orgulho de você e das escolhas que você fez, Peter. E não é porque eu escrevi.



Nessa eu peguei pesado. Deu pra notar que ele ficou emocionado? Poizé. Eu conheço uma garota que também ficaria, se lesse. Mas isso é outra história e eu tenho a impressão de que já falei demais sobre isso.



– Deixa ver se entendi... Tem mais gente que... “me” escreve? Eu estou, agora, dentro da sua história?

– É por aí. Sabe qual é a grande ironia disso tudo? Hoje à noite eu vou encontrar o Walter ou o André no ICQ, e nenhum de nós vai ser capaz de se lembrar de um monte de coisas também. Eu não lembro o que comi três dias atrás, ou que roupa estava usando no meu primeiro dia no emprego. Como se quem escreve as minhas histórias também não desse atenção a esses detalhes. Eu nem sei se vou me lembrar dessa conversa amanhã! Somos todos rabiscos num caderno velho, Peter. Todos parte de uma história maior. Então, sempre que você pensar em me xingar, porque eu “manipulo” sua vida, não se esqueça que alguém pode estar me manipulando para que isso aconteça também.

– ...

– ...

– ...

– Alguma pergunta?

– Só uma. Você leu o “Mundo de Sofia”?

– Li. Três vezes. Mas você não leu nenhuma, apesar de se lembrar de ter lido.

– Você se lembra de ter lido, mas quem garante que leu?

– Bingo, Peter! A idéia é essa. Mas eu tenho que ir agora. Isso é tudo. Com relação a você, isso é tudo. Eu sempre gostei do Homem-Aranha, sabe? Me sinto em débito com você. Por isso resolvi dar uma passadinha para conversarmos.

– Hã... Ok. Você, tipo... aparece de novo?

– Espero que não. Esse papo é sinistro.

– Heh! Espero que eu esqueça isso...

– Eu posso providenciar...

– Ta... Escuta... E quanto a...

– Não se preocupe. Já estou cuidando disso. Vai dar tudo certo.

– É meio difícil de entender a sua idéia de “vai dar tudo certo”...

– Apenas confie em mim.

Quando eu cheguei perto da porta, olhei para trás uma última vez, mas Peter não estava mais lá.


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