Regis um menino no espaço escrita por Celso Innocente


Capítulo 18
As peripécias de um menino feliz.


Notas iniciais do capítulo

Este é o penúltimo capítulo desta aventura/drama.
Tomara que você esteja gostando.



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Talvez sem ter o que fazer, continuava ao lado do senhor Frene, revendo lembranças de minha longínqua infância. Quer dizer: nem tão longínqua assim.

A máquina me mostrava então, quando, ainda aos cinco anos, à tardinha, estava com meus irmãos mais velhos, Leandro e Carlos Henrique, que faziam seus deveres escolares em nosso quarto e vi pela janela, uma cobra, que passeava por ali toda garbosa. Avisei meus irmãos e fomos segui-la, que encontrando um buraco na parede, no quarto de meus pais, aproveitou para fazer uma visita; subiu no berço e se atreveu a passar por cima do corpo do caçula Paulinho, que recém-nascido, por sorte dormia tranquilo, caso contrário, poderia querer brincar, pegando inocentemente tal bicho. Dali, ela desceu ao chão, subiu na bicicleta de papai, que estava na sala, embaixo do periquito, que gritava sem parar. Carlos Henrique correu a apanhar sua avezinha, temendo que a cobra o apanhasse. Enfim, um valente adulto vizinho chegou a nossa casa e acabou com a festa, quer dizer, passeio, daquele infeliz réptil verde, despedaçando sua cabeça a poder de pauladas.

— Como será que aquela cobra não fez nenhum mal a Paulinho? O senhor o protegeu?

— Não! Era um réptil inofensivo! — Alegou o senhor Frene.

— Réptil inofensivo?! — Duvidei. — Uma cobra venenosa?

— Depois que Deus amaldiçoou a serpente do paraíso, pobrezinha de qualquer cobrinha boba! São sempre recebidas a golpes imperdoáveis de pauladas!

— Quem o ajudou a não apertar tal cobra, pensando que fosse brinquedo?

— Primeiro, porque ele estava dormindo! Depois, porque realmente a cobra verde é muito inofensiva e também, Deus é poderoso e não permitiu!

— Não foi mesmo o senhor?

— Não! Foi Deus mesmo!

— Gosto muito dele!

— De quem? De Deus, ou do Paulinho?

— Dos dois!

— Você sabia que as cobras, mesmo as venenosas, só atacam quando são perturbadas?

— Já ouvi falar por aí! Como o senhor sabe tanto sobre elas? Aqui não existem!

— Quando nos falta alguma coisa, a gente se diverte estudando sobre aquilo.

— O senhor tem sorte em não ter cobras em seu mundo. Por que perder tempo estudando?

— Vocês tem sorte em não ter dinossauros na Terra. Por que perdem tempo estudando-os?

— Entendi sua comparação. — Dei leve sorriso.

— O que mais você se lembra de sua vidinha, Regis?

— Muita coisa!

— Por exemplo!

— Do sítio: quando me levantava cedo e ia correr pelos campos orvalhados, em busca das milhares de bolas coloridas, que caiam do céu. Elas eram de todas as cores e estavam sempre fugindo de mim, nem sei por quê!

— Mas eu sei!

— Sabe?

— Sei! Aquelas lindas bolas coloridas, só existiam em sua mente, em sua visão! Quanto mais você as tentasse pegar, mais longe elas ficavam!

— Parecia ser tão real! — Insinuei triste.

— Pois é! O mundo da criança é colorido e cheio de imaginação! As lindas bolas coloridas eram nada mais do que os raios do Sol, que surgia no horizonte, refletindo sobre o orvalho da manhã, impregnado nas folhas de todas as plantas.

— Como o orvalho consegue ser colorido?

— As cores vinham das diversas tonalidades, na pigmentação das folhas e flores das diferentes plantas. Algumas mais verdes, outras mais secas... Algumas amareladas, outras roxas, ou vinho, ou escura...

— Era tão real, que, quando já morava na cidade, ao dormir à noite, as imaginava tão bem, quanto as que viam pela manhã no sítio.

— E as via?

Acenei que sim.

— Neste caso, elas realmente só existiam em sua imaginação fértil.

Agora, a máquina me mostrava, quando, aos sete anos de idade, no rio Lajeado (o rio que cortava nosso sítio), estávamos em um bando de garotos, entre eles, meus dois irmãos mais velhos, meus dois primos, filhos do falecido titio Cilmar e dois vizinhos de sítio, todos nus, na maior naturalidade, nadando. De repente, alguém começou a nos jogar pedras e gritar que iria nos capar a todos. Todos, inclusive eu, saímos rapidamente da água, nos vestimos e fomos atravessar o rio andando para fugirmos. Todos os demais conseguiram menos eu, que sendo o menorzinho, a água molharia minha tal calça curta e como eu era um machado dentro d’água, “se jogado vai direto ao fundo”, retornei à margem e tornei a me despir. O terrível castrador de meninos aventureiros se aproximou e era nada menos do que o senhor Sebastião, primo de papai.

— Ao ver que era ele, tive um alívio! — Aleguei.

— Teve medo de ter a mesma sina dos infelizes leitõezinhos?

— Afinal de contas, por que os adultos gostam de assustar as crianças, com brincadeiras idiotas?

— Dizendo que vai castrá-las?

— É!

— Não sei! Devem achar divertidos! Os adultos, às vezes querem se aproximar das crianças, mas como não têm argumentos apropriados, inventam brincadeiras desse tipo!

— Tem hora que dá raiva deles! Criança é gente e não é boba!

— E por que você não ficou com vergonha de que eu tenha visto estas imagens? Você estava nu e não gosta de ser visto assim.

— Sei lá! — Balancei os ombros.

— Porque a cena mostra uma ação natural da infância, Regis! Nada de mais!

— No sítio, estava acostumado a viver assim! Minha madrinha disse que eu, até aos quatro anos, só vivia pelado pelos terreiros, junto às galinhas.

— Posso lhe mostrar, se você quiser!

— Não é necessário! — Neguei balançando as mãos. — Já me conheço, obrigado!

—Você se lembra do dia em que seu pai lhe deu um tapa no rosto e você ficou com raiva dele, pro resto da vida? Depois, você foi erguer um pedaço de pau e tinha uma cobra embaixo?

— Quando papai me bateu, na frente de um monte de seus empregados, eu disse pra mim mesmo, que ele era um homem cretino e que eu jamais falaria com ele!

— É! Mas muiiiito tempo depois, quando a cobra apareceu à raiva acabou na hora! Não foi?

— Chamei papai na hora e me esqueci da raiva. Ele matou a cobra e me abraçou! Mas não foi muiiiito tempo depois!

— Eu sei! Era metáfora. Não se passara nem cinco minutos.

— Metá...fora! O que é isso?

— Alguma coisa sem sentido! Igual ironia ou sarcasmo.

— Cada palavra! Eu nunca vou aprender! Sar...cas-mo! Metá...fora!

Ligou sua máquina de reprisar lembranças e disse:

— E por falar em matar, veja isto!

Junto com papai e o senhor José, padrinho de minha irmã Letícia, estávamos no chiqueiro de porcos, onde eles apanharam um dos condenados, arrastaram-no para fora e o derrubaram ao chão. O senhor José, apanhou uma peixeira com dois de meus palmos, só de lâmina e me entregou. A seguir, seguraram o porco, abriram suas patas dianteiras e o senhor José me mandou sangrá-lo, dizendo que fizesse com muita força e sem piedade. Fiz cara de malvado, acunhei a lâmina sobre o peito da vítima e depois, descobrindo que só a cara era de impiedoso assassino, devolvi aquela arma e corri para dentro de casa.

— Acha que eu teria coragem de matar um porco? — Perguntei ao senhor Frene.

— Acho que jamais! — Afirmou ele. — Logo um menino com o enorme coração que você tem!

— Falando em porcos: um dia, eu e meus irmãos mais velhos, estávamos consertando o chiqueiro. Carlos Henrique, após dar boas marretadas sobre uma estaca, colocou o dedo sobre ela e alegou estar super quente. Leandro fez o mesmo e quando fui fazer o mesmo, Carlos, sem perceber, deu uma marretada e eu saí chorando, com o dedo indicador da mão esquerda, exangue.

— Imagino o quanto doeu! — Afirmou o senhor Frene.

— O senhor viu?

— Como não?

— Por que não me protegeu?

— Quem disse que não?

— Se tivesse me protegido, não teria me machucado!

— A pancada da marretinha teria esmagado seu dedo inteiro; porém, na hora “agá”, segurei a marreta e ela bateu com pouca força, lhe machucando sim e lhe deixando cicatrizes eternas. Mas, apesar de tudo, seu dedinho ficou inteirinho e sadio.

— Sadio!? — Mostrei-lhe a cicatriz. — Espedaçado! Me conte coisas mais importantes.

— Não vou contar! Vou mostrar.

Estava com seis anos de idade e voltava de um passeio que fizemos a uma fazenda à beira do Rio Tietê, com meus irmãos mais velhos, dois primos e um amigo. Ao atravessarmos defronte a uma velha casinha abandonada, construída à beira da estrada, meu irmão Leandro, perguntou indiferente, o porquê daquela casinha velha, ali na beira do mato. Naquele instante, soou um assovio estridente, que se fazia parecer, com alguém correndo por três vezes, em volta da casinha... ou igrejinha e depois entrou. Todos nós, corremos assustados e só paramos a mais de cem metros de distância, onde um de meus primos nos disse que ali era um local que marcava, onde havia morrido uma pessoa.

— Isso foi verdade! — Exclamei sério.

— Eu sei que foi verdade!

— E por que alguém que já morreu vai à Terra, assus-tar as pessoas?

— Foi vocês quem abusou! Depois, ela não queria assustá-los! Só queria fazer um pedido. Mas ninguém esperou!

— O senhor disse, ela! Como sabe que era mulher?

— Não sei! Eu disse, ela, a pessoa!

— E que pedido ela queria fazer?

— Não sei! Oração, talvez!

— Por quê?

— Algumas almas se perdem e ficam vagando em busca de ajuda. Essa ajuda é difícil, pois quando tal alma perdida consegue contatar alguém, acontece o que aconteceu a vocês crianças. Medo!

— Nos sítio, acontecia cada uma conosco!

— Claro! Vocês eram arteiros! Lembra quando vocês castravam os ratinhos? Os pobrezinhos condenados grita-vam na mais cruel das dores, até morrer agonizando!

— São nocivos!

— Mas não são culpados por serem nocivos! Até concordo que devemos exterminá-los! Mas não com tamanha crueldade.

— Apesar de estar com eles, eu jamais fiz esta maldade!

— O senhor só se lembra das coisas ruins! E as coisas boas?

— Me lembro também! Exemplo: Seu primeiro beijo...

— Eca! Nunca fiz isso!

A máquina nos mostrava que nós, crianças, meninos e meninas, brincávamos de namoro no escuro. Era minha vez de escolher: Quer? Não! Quer? Não! Quer? Sim! Uva, maçã, pera, melão, abacaxi! Preferi uva, que era... beijo na boca. Porém, só disse uva, pois não sabia o que era. Não tinha me familiarizado com o nome da fruta e a ação; se tivesse, sempre escolheria a que fosse aperto de mão, ou no máximo uma voltinha até a esquina. Pelo menos, percebi que a escolhida fôra a menina de onze anos, Maria Lúcia. Eu tinha oito! Naquele momento, apareceu mamãe e eu fiquei ainda mais tímido. Jamais beijaria uma menina... na boca, na presença de mamãe. Os colegas insistiam que eu era obrigado a beijá-la, cumprindo o que eu mesmo desejara. Neguei, sem chance de acordo e assim sendo, a própria condenada, concordou com um beijo no rosto.

— Tímido! Não? — Caçoou o senhor Frene.

— Natural! — Aleguei. — Mamãe estava olhando!

— E o que tinha isso a ver?

— Muita coisa! Ela me bateria!

— E se a menina fosse a Beth?

— Mamãe me bateria do mesmo jeito!

— E se fosse a Regina?

— Cinta na bunda do Regis! — Ri, fazendo gestos.

— Acho que por elas a surra valeria a pena!

Mostrei um largo sorriso de concordância. De repente, os alto-falantes da residência, nos interrompeu, dizendo:

— Senhor Frene, favor comparecer à portaria, com a máxima urgência.

— É com o senhor! — Avisei-o.

— Quer ir comigo?

— Não! Vou tomar banho e depois comer!

— Boa idéia! Tome seu banho, depois me espere pra irmos juntos ao refeitório.

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Notas finais do capítulo

Só falta mais um capítulo para encerrarmos esta aventura.
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