Flashback on

Depois de cinco meses liderando a escavação e trabalhando duro, fomos recompensados. Em uma tarde quente encontramos o começo de uma ossada. Nos dias seguintes, à medida que cuidadosamente trazíamos os esqueletos à luz, nos surpreendíamos cada vez mais. Era um conjunto enorme de ossadas, como uma vala conjunta. Havia também ossadas de animais e resquícios de objetos pessoais, e isso nos levou a cogitar que algo pudesse ter acontecido àquelas pessoas, 17 mil anos atrás.

–Cerca de 45 ossadas de Homo florensiensis foram encontradas essa semana, nas Ilhas Molucas , na Indonésia. Vamos falar agora com a responsável pelas escavações, Dra. Temperance Brennan.

Brennan nunca havia sido de assistir TV, há pouco tempo atrás nem tinha uma em casa. Mas havia criado o hábito de assistir ao noticiário enquanto jantava, uma vez que sempre que Booth ia à sua casa, ele reclamava de não haver uma TV para 'fazer barulho; e sempre que ela ia à casa dele, ele ligava o noticiário. Por isso, quando voltava para o hotel no fim do dia, ligava a TV no canal de notícias, e isso lhe trazia um senso de normalidade reconfortante.

–Essa descoberta nos leva a uma nova análise a respeito da evolução humana. Há informações preciosas a respeito da forma de vida destes humanóides, descendentes diretos do Homo habilis, e a comprovação de que o Homo erectus não foi a primeira espécie a migrar da África. Há cerca de dois milhões de anos...

Ela viu sua imagem na TV e a analisou. Naquele dia usava uma regata com um casaco solto e sem mangas por cima, amarrado na frente. Sua barriga estava começando a aparecer, e, apesar do calor, ela já não se arriscava a sair só de regata. Tinha certeza que assim que isso fosse descoberto, várias pessoas viriam questioná-la, não só colegas da escavação, mas também jornalistas interessados em soltar uma fofoca sobre a famosa autora Temperance Brennan.

A grande descoberta havia sido feita. Dali em diante, o trabalho se resumiria a processar a informação e chegar a uma teoria. Da mesma forma que uma investigação de assassinato, pensou Brennan, com ironia. Se qualquer outra descoberta fosse feita, só serviria para reiterar o que já havia sido encontrado e concluído.

'Está na hora de eu me retirar.'

Flashback off

–Brennan! – quando Angela finalmente achou a voz, a usou com força total – O que acon... como você faz... eu não acredito! Simplesmente não acredito!

–Não entendo por que você está assim, Angela. – disse Brennan, franzindo a testa.

–Acho que ela está surpresa com a criança, Dra. Brennan. – disse Cam, um sorriso de quem ainda estava habituada a lidar com gênios não-sociáveis.

–Ah, entendo. Me desculpe por não ter contado antes, Angela, mas eu me afastei nos últimos meses da escavação, e no lugar que estava havia pouca conexão com o mundo exterior.

–Brenn, quem é o pai?

–Preciso pegar minhas malas, se importa de segurá-lo um pouco?

Antes que Angela pudesse responder, ela se aproximou, colocando a criança adormecida com muito cuidado nos braços da amiga. Hodgins observou a esposa por alguns segundos, um sorriso bobo no rosto, então foi ajudar Brennan a pegar as malas.

Cam se aproximou de Angela e as duas trocaram elogios sobre quão bonitinho era o bebê e quão inacreditavelmente sem noção era a amiga.

–Então, você acha que a despedida rápida deles no ano passado escondia algo mais? – perguntou Angela, baixinho, segurando uma das mãos do bebê adormecido.

–Se escondia ela não contou para ele.

–De quem mais seria, Cam? Olha pra essa criança, impossível que tenha menos que três meses. Faz um ano que ela foi, é só fazer as contas.

–Pode ser de alguém que ela conheceu assim que chegou à Indonésia.

–Não seria impossível que ela conhecesse alguém logo que chegasse. Mas seria impossível que tivesse um filho com ele. Ela só seria descuidada se fosse ... acho que você entendeu o ponto.

As duas pararam de falar, pois Brennan e Hodgins haviam voltado.

–Ainda não acredito que você não contou isso para a gente, Brenn. – disse Angela, devolvendo o bebê à amiga – Como é o nome dele?

–Nicholas. – disse ela, um olhar carinhoso para o filho.

Flashback em

Brennan se lembrava bem daquele dia. O dia 63, faltando 302 para voltar.

Fazia três meses que estava ali, por isso achou estranho o fato de começar a passar mal. Já havia se habituado ao clima tropical e à comida diferente. Mas à medida que os dias passavam, ficava pior. Tonturas no campo de escavação, enjôos logo que se levantava.

E então, no dia 63, ela percebeu. Estava deitada na cama, ouvindo o rugir suave das ondas. Faltava ainda uma hora para que tivesse que levantar e começar sua rotina diária, mas ela não tinha sono. Pensava nos acontecimentos da última semana, da nova área que estavam escavando e parecia cada vez mais interessante à medida que avançavam. Pensava em Daisy, e na conversa com a menina, a conversa que a incomodara.

–Eu sinto falta do Lance, Dra. Brennan. Não achei que ia ser dessa forma, acho que não tinha dado tanta importância para isso quando estava com ele porque achei que ficar longe por um ano ia ser mais fácil.

Ela tagarelava, como sempre, até perceber que falara demais e se desculpar. Mas Brennan não respondera. Ainda estava pensado no que ela falara. Ainda estava pensando em como o que ela falara se aplicava tão bem a si própria. E pensar na falta que sentia de Booth, nesse sentimento que estava sempre ali, inconscientemente, e a fazia sentir uma dor no peito quando vinha à consciência, pensar nisso a lembrava da última vez que o vira. Da noite que tiveram juntos.

Ela parou de brincar com as mechas soltas do cabelo, momentaneamente surpresa. A última noite que passaram juntos. Dois meses antes.

Ela fechou os olhos com força, não acreditando que aquilo havia realmente acontecido. Ela nunca havia sido descuidada antes. Mas também, nunca havia dormido com Seeley Booth antes.

Flashback off

Continua...