Raito anotava calmamente as indicações do professor sem no entanto prestar 100% de atenção. A sua mente vagueava para o caderno preto que guardava em casa, no seu esconderijo secreto. Não se sentia seguro sem o Death note por perto, mas era arriscado demais trazê-lo para a escola.

Ryuuku, o shinigami original dono do caderno, repousava no parapeito de uma das janelas e olhava aborrecido para as árvores que rodeavam a escola. Lançou um olhar venenoso ao professor que, como não o podia ver, continuou a dar a sua aula monótona e despreocupadamente.

Ryuuku teve vontade de escrever o nome do professor na caderno para a aula acabar mais cedo mas conteve-se. Tinha de ser imparcial nesta guerra e matar agora estava fora de questão. Finalmente a campainha tocou e todos os alunos se levantaram, arrumaram os materiais e seguiram para o intervalo.

Raito abriu a lancheira revelando uma sanduíche de fiambre e queijo, um sumo de laranja engarrafado e uma bela e reluzente maçã que Ryuuku cobiçou de imediato. A maior paixão do Shinigami eram as maçãs e Raito sabia disso.

- Podes ficar com ela! Eu estou sem fome, mesmo!

Ryuuku não esperou o consentimento uma segunda vez. Quando ia pegar a maçã, porém, alguém pareceu ter a mesma ideia e as mãos acabaram por roçar uma na outra. Ou melhor, a mão humana atravessou a do Shinigami.

- Ai! – Exclamou uma voz feminina.

- Que foi? – Perguntou Raito, disfarçadamente. Ele sabia muito bem o que tinha acontecido.

- Uma sensação estranha! – Respondeu a menina olhando atentamente para a mão.

Ryuuku analisou a garota que nunca tinha visto antes. Era baixinha, tinha um longo cabelo loiro escuro e olhos verde vivos. A cara redonda estava marcada por sardas. Usava uma saia simples, verde e uma camisola de um amarelo aguado que tinha uma inscrição que logo chamou a atenção do Shinigami: I Love Apples!

- A sensação que tu sentiste foi porque eu armei um campo elétrico em volta da maçã que tocaste. Apanhaste um choque simples.

Ela olhou para Raito espantada antes de soltar uma sonora gargalhada:

- Ai Raito-kun, és tão engraçado!

- Mas tu não és! É a segunda vez que tentas roubar-me o lanche.

Ela fez biquinho.

- Gomen, Raito-kun! Sabes que não resisto a uma maçã tão bonitinha! E tu não dizes onde as compras!

- Kaori, vai tratar da tua vida!

Ela baixou os olhos. O seu lindo sorriso tinha sumido.

- Certo... Raito-kun, podíamos fazer o trabalho de Biologia juntos? Sabes, eu não percebo muito daquela matéria mas sei que tu podias salvar a minha nota.

Kaori esperou impaciente. Mordeu o lábio inferior e juntou as biqueiras dos pés, enquanto esperava o consentimento ou a rejeição do primeiro classificado dos exames. Ryuuku não pode deixar de notar que ela estava corada. Vermelha como uma maçã.

- Lamento imenso, Kaori, mas já tenho par!

- Ah, tá... fica para uma outra vez então!

Kaori voltou para perto das suas amigas a arrastar os pés, desanimada. Não só por causa do trabalho, mas porque não iria poder ficar perto do Raito-kun, que sempre fora, digamos, a sua paixão escolar.

A campainha tocou de novo, indicando que o tempo do intervalo terminara. Ryuuku seguiu Yagami Light, planando a poucos centímetros.

- Porque fizeste aquilo? Tu não tens par, pois não?

- Não tenho e não preciso! Sempre trabalhei sozinho e sempre me dei muito bem assim!

O rapaz entrou na aula de Biologia e sentou-se na carteira respetiva. Kaori entrou também na sala e sentou-se três carteiras atrás. Como era baixinha tinha de se esticar para conseguir passar os apontamentos do quadro. Ryuuku pensou que talvez fosse essa a razão dela não estar a perceber bem a matéria.

A amiga disse-lhe qualquer coisa sussurrada ao ouvido e logo ela voltou a ostentar aquele belo sorriso de maneira que parecia que ninguém era mais feliz que ela. Nesse momento o professor chamou o nome dela e fez-lhe uma pergunta à qual a menina não soube responder. Afundou-se para debaixo da mesa, com o rosto vermelho de vergonha.

Sem dúvida aquela humana era... interessante! Parecia uma versão humana da maçã, mesmo com o cheiro que se desprendia dos seus cabelos, aquela fragrância citrina.

- Ryuk, estou intrigado! – Fez ver Raito, no caminho para casa. – É impressão minha, ou passaste a aula de biologia inteira a olhar para a Kaori?

- Quê? Quem é a Kaori? – Tentou disfarçar o Shinigami.

- Kaori, a garotinha chata que anda sempre a perseguir-me! Aquela que tentou roubar-me a maçã no intervalo.

- Ah, não sei do que estás a falar!

- Disfarças excepcionalmente mal, Ryuk! Estás a agir estranhamente desde que ela te «tocou» - Fez aspas com os dedos. – Se eu não soubesse que és um demónio da morte, até diria que estás apaixonado!

- Ora, não digas disparates Raito! A que te referes como agir estranhamente?

Ele virou-se para trás com um sorriso debochado.

- Além de não conseguires tirar os olhos dela? Simples, tu esqueceste-te de comer a maçã que eu te ofereci no intervalo! – Concluiu atirando a mesma para as mãos de um confuso Shinigami.