Perdidos escrita por Meus Contos


Capítulo 2
A caçada


Notas iniciais do capítulo

HEY! Mais um hoje!



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Depois de lavar as poucas roupas, minhas e de Natan, tomei um banho no canto sul do rio. Bem rápido. Tinha medo dos homens daquela comunidade. Mesmo que não tenham nunca mexido comigo, talvez por respeito a Natan, já ouvi casos abafados de estrupo por aqui. O homem que foi pego, foi expulso do acampamento. A parte sul tinha algumas arvores que encobriam a beira do rio o que escondia a visão de alguém que queria observa. Sai do rio, me sequei e pus as roupas ali mesmo. Rapidamente. Sai secando os cabelos negros e encaracolados pelo caminho e fui parada por Jeredy.

– O que faz aqui? – Fiquei surpresa. Será que?

– Não estava te observando. Passava por aqui agora. – Falou seco e cruzou os braços.

– O que foi? – Perguntei com a cara dura.

– Eu agi por impulso. Não era para ter feito aquilo. Você poderia ter entregado toda a comunidade. Se um Infectado sentisse o cheiro do alce, chegaria perto demais e notaria o nosso cheiro também. – Falou rápido e nervoso.

– É só isso? – Perguntei.

– Espera, O que? Você não vai nem pedir desculpas por ter posto nossas vidas em risco. – Descruzou os braços e eu nem me movi.

– Seu tapa no meu rosto, já foi o suficiente. Não preciso pedir desculpa. – Desviei dele e sai caminhando em direção ao acampamento.

O deixei para trás com seus murmúrios e xingamentos. Caminhei rápido até a minha barraca. Chegando lá notei Natan no colchonete com o medalhão de nossa mãe nas mãos.

– Me dê meu medalhão. – Corri até ele e tomei o cordão de suas mãos.

– Calma, não tenho intensão de pega-lo para mim. – Bufei e me virei para minhas coisas.

Ajeitei as cobertas no chão e fui deitando. Pronta para dormir e descansar até a hora da caçada.

– Não fique de fraqueza amanhã. – Falou brusco.

– Não ficarei. E se ficar não se preocupe. Vai ser a minha carne que vai ser devorada mesmo. – Falei de olhos fechados.

– O que pensa que está falando? – Gritou.

– Se preocupe com a sua carne, e com a sua caça Natan, não tenho mais treze anos. Tenho dezoito, sei me cuidar. – Ele ficou em silêncio, e eu aproveitei para dormir.

– Claro que sabe. – Falou saindo da barraca. Notei ironia na voz dele.

Abri os olhos sentindo meu corpo pesado. Aqui ninguém dorme de verdade, só fechamos os olhos. Levantei e estiquei meu corpo. Peguei o casaco de couro maior do que eu e sai da barraca. Era noite. Caminhei até a fogueira e peguei dentro de uma das panelas improvisadas um pedaço de carne, pus na vasilha ao lado. Algumas mulheres me olhavam, como se estivesse controlando o tanto de carne que iria pegar. E era isso mesmo.

– Odeio o olhar dessas mulheres. – Jeny chegou perto e pegou carne também. – Dá vontade de xinga-las.

Comecei a caminhar para longe da fogueira. Ela me seguiu. Sentei perto de umas pedras longe de todos.

– Jeredy foi falar com você? – Perguntou comendo sua carne.

– Imaginei que você que tivesse mandado. – Ela sorriu.

– Pior que não. Ele se sentiu culpado e ao mesmo tempo agradecido. O Alce deu para essa noite e para a manhã do dia seguinte. – Comi a carne do alce. Era saborosa. Como frango. Tudo que comia por aqui tinha gosto de frango.

– Ele não precisava. – Ela bufou.

– Precisava sim. E eu adorei quando ele disse que você nem deu ideia. – Eu sorri com a sinceridade.

– Não gosto muito do seu irmão. Ele se acha o líder entre nós. – Ela concordou.

– Talvez ele se sinta responsável não só pela vida dele, mas pela dos outros aqui também. – Olhou para longe.

– Ele deveria se importar só com a sua vida, e com a dele própria. – Ela me olhou.

– Por que não podemos ser mais alegres por estarmos vivos? Por que não se sentir agradecido pelo menos uma vez? Tudo bem que estamos em uma poça de sangue chamada mundo, e que somos caçados por zumbis, mas olha isso Clair. – Apontou para as montanhas a nossa volta. – Estamos vivos.

– Ainda. – Disse seca. – Quanto tempo acha que vamos sobreviver? Acha que vamos envelhecer? Ter filhos, netos... uma cadeira de balanço? – Ela sorriu.

– Não sei do amanhã. Mais esperar pela morte e não valorizar a vida me parece meio sem sentido. – Fiquei em silêncio. – Deveríamos ser mais ligados. Mais companheiros.

– Quer ser minha amiga Jeny? – Ela me olhou surpresa. – Acha que vou ser uma boa ouvinte e vamos trocar roupas, e escrever nos nossos diários com quantos caras ficamos?

– Talvez seja legal. – Ela sorriu comendo mais um pedaço de carne.

– Senhoritas. – Charlie se aproximou e sentou ao nosso lado. Legal! – Fazia tempo que não comia uma carne assim. Os esquilos e coelhos tem gosto de mato.

– Verdade. As vezes tem gosto de coco. – Dessa vez quem apareceu foi Elliot. Eu ri quando ele disse isso.

– Prontos para a caça amanhã a noite senhores? – Jeny perguntou.

– Nunca estamos Jeny. Hoje na madrugada éramos nós no muro, amanhã a noite, seremos nós caçando. Eles deviam poupar os jovens. – Charlie disse.

– A gente tem que aprender alguma coisa. Tem crianças no acampamento. São eles que devem ser poupados. – Eu disse.

– Hoje os homens e algumas mulheres ficaram no muro. E vão nos cobrir amanhã também. Já que a gente vai caçar. – Jeny disse.

– Quem vai na caçada? – Elliot perguntou.

– Clair, eu, Charlie, Jeredy, Natan, os irmãos Clinton, que ao todo são cinco, e mais cinco dos jovens que só vivem isolados então não sei o nome. – Jeny fez a contagem.

– Só vai o Natan de adulto? – Elliot perguntou.

– Ele é o caçador do acampamento. Ninguém mais quer ir com os jovens. Eles acham que será o nosso fim. – Charlie ajeitou os óculos.

– Deveria ser como sempre foi. Essa ideia de mandar todos os jovens juntos não pareceu muito boa. Deveria ser uma mistura. Iam só os jovens que já caçavam antes. Desculpe Elliot, não deveriam mandar você. – Falei olhando Elliot.

– Eu também acho. – Ele mesmo confirmou.

– Jeredy não queria que eu fosse também. – Jeny disse.

– Ele está certo. Não é algo que eu goste de fazer. – Eu sempre vou caçar. Desde os meus quatorze anos eu acho.

– Mais é algo que precisamos fazer. – Jeredy veio atrás de mim. – Isso trás comida.

– O problema não é caçar em si. O problema é atravessar o Muro. – Eu disse. Ele sentou do lado da irmã.

– Precisamos fazer isso. – Ele confirmou de novo.

– Eu não disse que não iria fazer. – Ele me encarou.

– E eu não disse que você falou isso. – Falou seco.

– Clair é boa no arco. Se não fosse o problema dos infectados seria uma caçadora profissional. – Jeny riu e eu também.

– Ela tenta. Tem sorte. – Eu encarei Jeredy.

– Você acha que só você é ótimo em tudo não é Jeredy? Por que não cuida da sua vida? – Ele sorriu debochado.

– Porque tenho que cuidar da sua e da dos outros. – Me levantei.

– Eu não pedi pra você cuidar da minha! – Sai andando.

Jeredy sempre me causou irritação, mas parece que de uns meses pra cá ele tem piorado e implicado mais comigo do que o normal. Voltei para a barraca e me deitei no meio das cobertas.

Foi a madrugada e a manhã toda acordada. Eu poderia descansar mais era sempre assim. Não conseguia. Antes das seis horas da tarde, comecei a preparar a mochila. Peguei alguns casacos e as flechas guardadas em um colchonete na barraca. O cantil estava cheio e tudo preparado. Nunca tinha saído a noite. E eu estava com mais medo que o normal. Sai da barraca com a mochila nas costas. Jeny estava em frente a barraca me esperando.

– Pronta? – Perguntou seria.

– Eu nunca estou. – Falei caminhando.

No meio do caminho encontramos os outros. Paramos todos no muro. Natan explicava o que deveríamos fazer. Sempre juntos, e se nos perdêssemos deveríamos nos esconder e ficar em silêncio. Ele sabia que a pessoa que se perdesse, estaria morta. Depois de uma serie de ordens e recomendações, começamos a caminhar para o lado norte do muro, onde havia uma passagem. Foi devagar a caminhada. Já estava escuro, e eu tremia. Mesmo com a jaqueta de couro sentia frio. Mas não tremia de frio, e sim de medo. Jeny sempre ao meu lado. Jeredy seguia em frente com Natan. Eu sempre pensava no dia em que eu ficaria para trás, e morreria na floresta. Talvez eu esperasse por isso ansiosamente. Por que viver em um mundo que já acabou? Eu não vejo nada de bom nisso. Pareço até meio mal agradecida por estar viva. Eu não ligo. Não sou uma adolescente normal, não tenho como ser. Não a esperança para nós do acampamento, vamos acabar morrendo, ou vamos ser mortos e devorados. Poderia ser minha ultima noite de vida. Eu não ligava.

– Clarisse? – Natan sussurrou. – Seja cuidadosa. – Ele sempre dizia isso antes de irmos. Eu era meio barulhenta quando caminhava, e meio desajeitada também.

– Tudo bem. – Sussurrei de volta.

– Preciso de todos vivos. – Natan falou para todos.

Ficamos em fila, para atravessar o muro. Primeiro Natan, e então ele deu sinal para Jeredy, e todo o resto também atravessar. Um por um foi saindo. Eu olhei para trás uma ultima vez, e então passei pelo muro. Logo atrás veio Jeny.

– Jeny sempre por perto. – Ela concordou.

Começamos a caminhar devagar no meio das arvores. Eu armei o arco, estava preparada. A medida que andávamos, parecia que as arvores escuras cresciam e ficavam em maior quantidade. Depois de cinco minutos andando paramos todos juntos para escutar.

Grilos, rãs, morcegos... E o silêncio apavorante. Fechei os olhos por um segundo, e então senti o movimento do arbusto que estava a uns cem metros de mim. Mirei com o arco e flecha e agachei devagar. Com o olhar atento e só contando com a iluminação da lua disparei a flecha notando a atenção de todos a minha volta. O que acertei se mexeu um pouco no mato, mais logo parou. Fui devagar me aproximando e entrei nos arbustos para pegar o que tinha acertado. Uma gazela? Por aqui?

– É grande. – Olhei para Natan. Ele sorriu e me ajudou a pegar o animal.

– Vocês não estão com medo de um infectado sentir o cheiro? – Elliot parecia amedrontado.

– Como Clarisse fez ontem, calculamos o vento. Esta para o lado oposto da cidade. Onde eles estão é longe demais para sentir o cheiro. – Jeredy disse.

– Mais se tiver um perdido por aqui?- Charlie falou dessa vez.

– É provável, então temos que fazer silêncio. Pegue a caça e separe no canto daquela arvore. – Natan ordenou os meninos. Eles pegaram a gazela que abati, e separaram no canto.

Todos tínhamos suas próprias armas. As de fogo ficaram com Natan, uma pistola e um fuzil. Mas ele só usaria na emergência. Os outros tinha arco e flechas e facões tão grandes como espadas. Jeredy saiu entrando mais pela floresta para montar suas armadilhas. Elliot foi com ele. Eu, Jeny, Charlie e Natan ficamos juntos, caminhando devagar para ver se achávamos algo a mais. O resto ficou com a caça na arvore. Jeny pegou um coelho com seu facão. Natan pegou um pássaro em uma arvore, com as mãos. Tudo que matávamos, era posto perto da gazela. Os outros caminhavam por perto, mas estavam distantes de nós. Começamos a entrar mais na floresta. Devíamos voltar pela manhã, era o combinado.

– Natan. – Ele olhou para trás. – Onde estão Jeredy e Elliot?

– Montando armadilhas. Para pegarmos o que estiver nela pela manhã. – Falou sussurrando.

– Já deveriam ter voltado, são quase 2:00 da manhã. – Jeny estava preocupada.

O tempo foi passando como se estivesse quase parando. Estávamos longe demais do muro, dava para imaginar. Depois de vários animais juntos no canto da arvore gigante e rondas pelos matos. Senti o arrepio da morte. O grito de um infectado. Era baixo, ele estava distante, mas isso não era bom. Paramos todos em um silêncio amedrontador. Observando de onde vinha o som. “Jeredy”! Porque pensei nele? Não sei. Só sei que precisava achar aqueles dois.

– Natan! – Sussurrei chegando perto do meu irmão. – Precisamos achar Jeredy e Elliot.

– Não dá pra procurar nessa escuridão e com um infectado por ai. Vamos voltar. – Ele já foi se movendo para a direção contraria. Fiquei apavorada.

– Não! – disse baixinho. – Não deixar ninguém para trás era a regra.

– Não temos regras aqui. E você não decide por nós. – Todos estavam apavorados, me olhando e olhando para Natan.

– Decido por mim. – Peguei minha mochila no chão e meu arco. Natan segurou em meu braço.

– Não vai sozinha! – Apertou meu braço, me fazendo empurra-lo.

– Sua divida com papai já acabou! – Comecei a caminhar. Jeny me acompanhou. – Fica Jeny. É melhor morrer um do que dois. Fica! – Ela chorava e isso fez meu coração arder. Continuei caminhando.

– Não posso te impedir. – Natan falou com a voz fraca. – Tenho que levar os outros em segurança.

Apenas olhei para trás. Depois segui pelo mesmo caminho que Elliot e Jeredy Seguiram. Eu não tinha nada a perder.


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Notas finais do capítulo

e então? é.... :s Gostaram?